Intelectualidade italiana sai às ruas contra Berlusconi

Vinte mil nas ruas de Milão com Dario Fo, Umberto Eco, Saviano e Ginsborg contra Berlusconi

Personalidades da cultura, politicos, jornalistas e sociedade civil ‘na rua’ para o evento. O prefeito Pisapia: “O berlusconismo está acabando, venceremos de novo”. Saviano: “É o momento de ousar mais”

Grande multidão na manifestação de Liberdade e Justiça

“Chegou o momento em que todos devermos nos dedicar ao bem da coletividade”. Esse apelo de Dario Fo – Prêmio Nobel de Literatura de 1997 – é talvez a melhor síntese da manifestação “Recosturar a Itália”, promovida por Liberdade e Justiça no Arco da Paz de Milão, com a presença estimada de 25 mil pessoas.

“Vivemos um escândalo por tudo que transparece dos cômodos do governo, mas nos parece mais ofensivo ao pudor político um parlamento cuja maioria continua a sustentar-lo além de qualquer dignidade pessoal dos seus membros”, declarou Gustavo Zagrebelsky, presidente emérito da corte constitucional, na abertura do evento.

Umberto Eco enviou a seguinte mensagem ao evento: “Neste declínio espantoso da vida política italiana, ouçamos a voz de uma sociedade civil ainda sã, de modo a demonstrar também no exterior que a verdadeira Itália somos nós”.

Várias personalidade da sociedade italiana subiram ao palco antes do discurso do novo prefeito de Milão, Giuliano Pisapia, que recentemente derrotou a coalizão de Berlusconi no poder da cidade. Segundo ele, “Milão é a cidade de onde partiu a mudança da Itália. Durante a campanha, desafiou Berlusconi dizendo que “iria se tornar o seu prefeito” (onde ele mora). “Vencemos em maio e vamos vencer de novo, que tenho certeza será logo”, acrescentou. E continuou dizento que “o governo percebeu que um vento novo está soprando de cada cidade, por isso castiga os governos locais para segurar a mudança, mas o vento vai aumentar”, disse o prefeito antes de ceder o lugar para a apresentação da videomensagem do escritor Roberto Saviano, autor de Gomorra, sobre o crime organizado da Camorra em Nápoles.

Saviano reivindicou o “direito à felicidade”, que “só pode existir numa ‘sociedade de direito’ [então ele discorda do Mino, que sustenta que a Itália é um ‘estado de direito’]. “O trabalho informal está protegendo a Itália da crise, frequentemente os patrões são ex-trabalhadores informais que vivem nessas condições. Estar juntos é um modo de não perder a esperança, de resisitr á idéia que o talento não vale nada, que o que vale é um indicação. Se pensarmos assim eles já venceram, quem está no governo agora tenta nos convencer da conversa de que somos todos iguais e que quem critiva é hipócrita, porque se comporta do mesmo jeito e só quer o nosso lugar”. Para ele, a melhor resposta a isso é “envolver as pessoas num grande projeto de reforma para alterar o passo e superar essa realidade enferrujada. Chegou a hora de ousar mais”, concluiu.

O pensamento do premiado Nobel Dario Fo, para quem na atual situação todos devem participar em primeira pessoa:  “é preciso uma participação extraordinária, tem que discutir, brigar e procurar avançar tendo os interesses coletivos como objetivo. Todos devem se interessar pelos problemas dos outros: não por curiosidade, mas por amor pelos outros”.

Para o historiador inglês Paul Ginsborg, no entanto, Berlusconi “ainda não caiu, é um homem muito tenaz e determinado. Foi subavaliado mil vezes, mas é um homem que luta até o fim. Trata-se de um regime, continuou – várias vezes o Corriere della Sera e a oposição nos gozaram por dizer isso. Mas na realidade este é um regime caracterizado por um conflito de interesses patológico que deforma a democracia, mas é difícil que consiga se manter além de 2013. Nem mesmo [o mágico] Houdini-Berlusconi pode fazer tudo isso”. Em seguida, Ginsborg apresentou a situação italiana sob uma perspectiva internacional: “Na Europa todos perguntam como os italianos não conseguem se livrar de Berlusconi. É difícil explicar, mas claro que tendo uma maioria no parlamento, [o presidente da República] Napolitano não pode não pode dissolver as câmaras”. A situação, segundo ele, “faz muito mal à imagem da Itália, inclusive nos mercados financeiros”.

Praça lotada, empenho civil, idéias para o futuro e luta pela liberdade de informação no presente [o controle dos meios de comunicação na Itália é pior do que no Brasil]: a mensagem de Recosturar a Itália foi clara. O discurso de encerramento de Gustavo Zagrebelsky resume tudo isso; “Não digam que esta nossa praça é antipolítica ou apolítica”, disse o presidente emérito da Corte Constitucional. “É uma praça prepolítica, porque daqui parte uma pergunta aos nossos partidos políticos referenciais, quaisquer que sejam, afim de que recuperem a sua função política”. A receita de Zagrebelsky é uma só: “abandonar as divisões pessoais, as correntes e encontrar a unidade em torno de algumas grandes idéias políticas, sem programas eleitorais de oitenta páginas. Eles precisam entender que o que nós precisamos é a presença deles. Eles tem que perceber que se esse vácuo não for preenchido o que está em risco e a democracia”. Ou seja: uma praça pela democracia.

A manifestação de Dario Fo , Nobel de literatura 1997 (vídeo abaixo)

Ele recorda uma pantomima de Buster Keaton nos anos trinta, cujo personagem principal era um superministro poderoso, um manda-chuva do governo de uma daquelas nações impossíveis, fantásticas, um reino, enfim. Que se encotrava na mesma situação em que hoje está Berlusconi. Com medo de enfrentar o povo revoltado, mandava uma estátua sua representá-lo. Uma bela estátua dourada, mas não muito firme, de vez em quando balançava.

E, numa dessas ocasiões em que estava discutindo os rumos do governo, a estátua começou a estalar e a ameaçar cair. Correm, pegam uma escada, tentam mantê-lo em pé.Ai foi um corre-corre, tinha gente que o segurava, gente que o abraçava e até o beijava. “Pomba, se você cair estamos ferrados!!!! Quem vai nos sustentar, nos dar privilégios e carros chapa-branca”? E a estátua continuava rangendo, balançando e ameaçando cair. “Não falem nada, fiquem quietos, só façam gestos, senão vamos derrubá-lo”, e todos os puxa-sacos passam a coxixar baixinho, até que um espirra, a estátua balança e todos começam a gritar para ninguém espirrar, que a estátua pode cair e ai ela começa realmente a cair.

Todos fogem do palácio e ao sair dele percebem que não só a estátua havia caído como todo o palácio começa a desmoronar. E, enquanto comemoram terem escapado, de repente percebem que estão cercados do povo que ri, aplaude e comemora: “FINALMENTE! Caiu, finalmente caiu!!! CAIU!!!!!!!!!!!!!! CAIU!!!!!!!!!!!!!!!!!!”

Já vi tantas vezes nestes tempos que não funciona mais. Agora ensaio sozinho diante do espelho. Tudo, especialmente o final: “CAIU!!!”

Façam assim: “CRAC!, CROC!, RAC!, BUM”!

Que belo sonho!

http://www.ilfattoquotidiano.it/2011/10/08/ricucire-litalia-a-milano-in-…

Luis Nassif

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