Júlio Pompeu: o secretário de direitos humanos do ES seduzido pelo poder

Breve história do professor de ética da Ufes que se encantou com o poder acenado por Paulo Hartung

Júlio Pompeu: seduzido pelo poder

 
Jornal GGN – Não é de hoje que o governo Paulo Hartung, do Espírito Santo, é acusado de administrar mal a segurança pública. Em 2010 o peemedebista foi denunciado na ONU por causa das condições aterradoras das cadeias no Estado. 
 
Mas foi justamente um crítico das “masmorras de Hartung”, o filósofo e professor de Ética e Teoria do Estado no curso de Direito da Ufes, Júlio Pompeu, que aceitou, em 2015, o cargo de secretário estadual de Direitos Humanos neste governo. 
 
No artigo à seguir, para o Século Diário, Henrique Alves procura entender o que fez o, até então, admirado filósofo, expressamente sensível aos direitos humanos, a aceitar o convite de Hartung:
 
“Como Pompeu conseguiu dissimular por tanto tempo e de tantas pessoas que o que lhe importava não era desenredar questões de filosofia moral coisíssima nenhuma, mas, antes, reservar um bom lugar à mesa farta do poder? E por que escolheu um caminho tão difícil?”.   
 
Século Diário
 
Júlio Pompeu: de crítico das ‘masmorras’ a porta-voz de Hartung
 
Por Henrique Alves
 
O secretário estadual de Direitos Humanos Júlio César Pompeu irrompeu no caos da segurança pública capixaba quando as negociações entre governo e mulheres de militares não conduziam o Espírito Santo a outro lugar senão ao apocalipse. O governo do Estado adotou uma nova estratégia na quarta-feira (8), instituindo um Comitê Permanente de Negociação, que, em suma e na prática, mudou os atores de interlocução com os representantes dos amotinados. 
 
Saía de cena a dureza tão xucra quanto estéril do secretário de Segurança Pública, André Garcia, e entravam a candura e a sofisticação do secretário Júlio Pompeu. 
 
Habituado a contemplar o Leviatã do lado de fora, o filósofo e professor-adjunto do Departamento de Direito da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), agora do lado de dentro, arrostaria seu primeiro grande desafio. Homo homini lupus?
 
Até então, Pompeu era um gracioso bibelô na vitrine do governo Paulo Hartung (PMDB).
 
A intenção era simples. Assombrado de um lado pela memória ainda palpitante das “masmorras de Hartung” nos corações e mentes capixabas e, do outro, pela nuvem gélida do discurso de ajuste fiscal, do corte de despesas a qualquer custo, o governo precisava fazer alguma coisa para mostrar que as moiras não teceram o destino de Hartung para tão-somente cevar a porca do grand monde capixaba. Era preciso mostrar que naquele peito batia um coração.
 
Aqui entra Júlio Pompeu, figura cuja atuação socialmente reconhecida contra as mazelas humanas iria, ao lado de projetos como Ocupação Social e Escola Viva, conferir alguma sensibilidade ao senhor Ajuste Fiscal. 
 
A ascensão de Pompeu à Secretaria de Direitos Humanos, no entanto, cumpriu um roteiro incomum, junto com a criação da própria pasta. Fora nomeado coordenador estadual de Direito Humanos em maio de 2015 sob a expectativa de assumir uma prometida, e inédita, Secretaria Estadual de Direitos Humanos. No entanto, não se importou em emprestar sua grife ao governo quando ainda nem produto havia: aguardou, digamos, platonicamente, pouco mais de um ano até o governo criar a secretaria. Foi nomeado em julho de 2016.
 
É óbvio dizer que o ingresso de Pompeu no governo Hartung não foi recebida sem estranhamento entre antigos companheiros de movimentos sociais e no curso de Direito da Ufes. Um travo amargo que deve se deteriorar em decepção e desaguar na infâmia.
 
Graduado em Direito e Filosofia, mestre em Direito e doutor em Psicologia, Pompeu ostenta um respeitável currículo Lattes. Leciona Ética e Teoria do Estado no curso de Direito da Ufes e outras disciplinas nos programas de pós-graduação em Direito Processual e no Mestrado Profissional em Gestão Público da instituição. 
 
Escreveu quatro livros, três dos quais por editoras de porte (Objetiva e Casa do Saber) e dois dos quais em conjunto com o filósofo Clóvis de Barros Filho, professor da Escola de Comunicações e Arte da Universidade de São Paulo (ECA-USP) e uma estrela pop da divulgação do pensamento filosófico. 
 
Sem contar os inúmeros projetos de pesquisa, artigos, capítulos em livros, textos em jornais e revistas, apresentações de trabalho, orientações e supervisões concluídas na graduação e no mestrado e a quase uma centena de participações em entrevistas, mesas-redondas, programas e comentários na mídia. Ministrou palestras para grandes empresas também, como Banco Safra, Unilever, Coca-Cola, Vale, entre outras.
 
Mas Pompeu não se restringe a um bem fornido Lattes. É descrito como um ponto fora da curva no Direito da Ufes, curso de carregado perfil processualista (especialmente Processo Civil) que lega à sombra docentes de perfil filosófico – caso de Pompeu. A vestimenta também destoava: dificilmente era visto enfiado em um terno e gravata, ao feitio do dress code jurídico, observado mesmo na academia, mas em confortáveis paletó e calça jeans.
 
Impecável orador – como atestam muitas de suas palestras disponíveis no You Tube, as principais com mais de mil visualizações – apresenta com linguagem fácil reflexões difíceis em torno de teorias filosóficas e dilemas éticos, razão pela qual era amiúde convocado para ministrar aulas inaugurais, que, ao final, embeveciam calouros babando por elevação intelectual. Professor sério e comprometido, dava aulas instigantes com igual graça, resgatando alunos do deleite das zonas de conforto.
 
É um perfil que, se não suscita a idolatria, é o suficiente para angariar o respeito e a admiração de estudantes. Assim aglutinava, especialmente em torno do projeto Balcão de Direitos, do qual era coordenador, alunos que de uma forma ou de outra se identificavam com o mestre que apresentava questões instigantes sobre as ações humanas, o convívio social. Foi paraninfo e professor homenageado de turmas de formandos na Ufes. 
 
Com o projeto de extensão, Pompeu conjugou teoria e prática ao oferecer assistência jurídico-humanitária global às comunidades indígenas e quilombolas, que, atacadas por poderosos entes industriais (menção honrosa à eterna Aracruz Celulose, hoje Fíbria) e ignoradas pelo poder público, são um retrato fiel da violação aos direitos humanos no estado.
 
Não era um homem destinado a trancafiar-se nas torres da egolatria acadêmica. 
 
A sensibilidade para as mazelas sociais ficou mais evidente do que nunca durante a crise das nacionalmente famigeradas “Masmorras de Hartung”, que em, 2010, levou o governador à ONU para explicar gravíssimas denúncias de violações aos diretos humanos, como tortura e esquartejamento de presos, no sistema prisional capixaba. 
 
Continue lendo…
 
 
Redação

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  1. Ponto para Nassif por ter

    Ponto para Nassif por ter descoberto o Espírito Santo.

    E através das contundentes páginas do sempre correto

    “Século Diário”.  Tomara que a partir deste caminho

    encontre o “Porto Central”, aí sim, iremos descobrir

    o verdadeiro Espírito Santo.  Vai Nassif, faça uma

    digressão até o municipio de Presidente Kennedy.

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