Observatório dá sugestões para prevenir e combater intolerância na rede

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Do Blog do Sakamoto

Pesquisa aponta como combater o ódio e a intolerância na rede

Pode não parecer uma ideia saudável, mas um grupo de pesquisadores e ativistas espanhóis decidiu acompanhar cotidianamente os fóruns de comentários de notícias da internet no país. O resultado não surpreende quem acompanha esses espaços: o discurso intolerante está amplamente disseminado.

Mas nem tudo está perdido, segundo a pesquisa, participar de fóruns com argumentos dissonantes à lógica da intolerância e favoráveis aos direitos humanos apresenta um impacto positivo.

Durante oito meses, o Observatório Proxi (Projeto Online contra a Xenofobia e a Intolerância), impulsionado pelo Instituto de Direitos Humanos da Catalunha e pela organização espanhola United Explanations, acompanhou as opiniões em notícias sobre imigração e população roma (conhecida como cigana), dois temas especialmente delicados no país. Foram mais de 400 notícias e 4.700 comentários analisados nos três sites com maior audiência do país – El País, 20minutos e El Mundo. Além disto, o projeto se dedicou também a intervir nos fóruns, com o objetivo de reduzir os níveis de aceitação do discurso intolerante.

Segundo o informe final do Observatório, mais da metade das intervenções, cerca de 60%, possuía discurso intolerante. Nesta categoria estão mensagens que, por exemplo, contêm estereótipos ou preconceitos, rumores, discurso de ódio ou desprezo indireto. A realidade pode ser ainda mais preocupante do que os dados revelam. “Há comentários que não passam nos filtros de moderação prévios [que barram determinados termos], então estamos diante de um universo maior de intolerância”, explica a pesquisadora do projeto Laia Tarragona.

Ódio aos migrantes – A situação mais preocupante se viu nos debates sobre a população migrante, nos quais o ódio se fez mais presente. Esta categoria, que abarca linguagem insultante e degradante ou incitação e apologia à violência, representa 11% dos comentários. Depois das opiniões intolerantes (60%, incluídas as de ódio), as mais recorrentes são as intervenções classificadas como neutras (29%), que não expressam nenhum posicionamento ou que não tem a ver com o tema da notícia. Minoritariamente, com 11% de ocorrência, está o discurso alternativo que tem como base a tolerância e o respeito à diversidade.

Em relação à população roma se destacou a marcada presença de estereótipos e preconceitos, como principal forma de intolerância. A categoria representa quase um quarto (23%) dos comentários. Já o discurso de ódio direcionado a eles não chega aos 5%. No quadro geral, os dados são semelhantes aos dos migrantes: de cada dez intervenções, seis são intolerantes, três são neutras e uma possui discurso alternativo.

Para o pesquisador do projeto Alex Cabo, o discurso intolerante é mais recorrente no ambiente virtual do que na vida real na Espanha. “Há pesquisas que indicam que cerca de um terço da sociedade é tolerante à população imigrante, mas nos comentários somos apenas 11%”, problematiza. “Temos que sair da nossa zona de conforto e debater”, defende.

Estimular os leitores tolerantes a debater – Tentando equilibrar o debate, o Observatório também se dedicou a intervir nos fóruns. A participação não almejava dialogar com quem havia escrito mensagens intolerantes e sim com o leitor ambivalente, que não necessariamente participa do fórum, mas utiliza estas opiniões na construção da sua própria. “Há estudos que indicam que os comentários podem interferir na percepção que o indivíduo tem da própria notícia”, reforça Alex.

Na avaliação dos pesquisadores, a ação teve bons resultados já que possibilitou diálogos construtivos entre alguns comentaristas e estimulou a participação de outros leitores tolerantes. Alex explica que se obteve um resultado melhor quando interviram no início dos debates e conseguiram o apoio de outros internautas, “mas, em outros casos, chegamos tarde demais e a bola de neve já estava formada e rolando”.

Por que tanta intolerância na internet? – Entre as conclusões do projeto, está a constatação de que o espaço virtual se converteu no último reduto para a expressão aberta da xenofobia e racismo. Para a diretora do Observatório, Aida Guillén, apesar do discurso de ódio estar presente no cotidiano, a internet o favorece. “O anonimato contribui bastante já que a pessoa apenas coloca um avatar e fala o que quiser. Outro fator é a imediatez da internet, que não favorece a reflexão”, explica.

Os meios de comunicação também desempenham um papel importante nesse contexto como, por exemplo, em relação ao tom das notícias. “Em geral, os veículos usam termos que criminalizam os migrantes e o uso desta linguagem, por parte do jornalista, impacta o leitor e o predispõe à intolerância” explica Laia. Como exemplo, está o uso dos termos “ilegais” ou “carga humana” para se referir aos migrantes.

Outro ponto de responsabilidade dos veículos é a moderação dos comentários. É importante tanto ter um filtro automático que barre determinadas expressões como ter uma equipe qualificada acompanhando os fóruns. Como instrumento para que os portais retirassem opiniões insultantes e degradantes, o Observatório fez ações de pressão nas redes sociais, junto a outros internautas. Utilizando a hashtag do projeto e taggeando os meios de comunicação, conseguiu-se a exclusão de muitos comentários ofensivos.

Como parte de suas conclusões, o Observatório Proxi apontou sugestões para a prevenção e combate à intolerância na internet. As indicações se dirigem à mídia, à sociedade civil e ao poder público, a partir de uma constatação de que o fenômeno é complexo e necessita diferentes frentes de atuação.

Veja algumas das recomendações formuladas:

Aos meios de comunicação

Aprimorar os sistemas de moderação e reforçar as equipes responsáveis pela triagem dos comentários;
Dar tratamento adequado e respeitoso à diversidade social;
Estabelecer mecanismos de colaboração com entidades dedicadas à luta contra a intolerância.

Aos poderes públicos

Impulsionar iniciativas contra a intolerância na internet;
Fomentar a capacitação de profissionais da comunicação e internautas na identificação da intolerância;
Mapear o fenômeno na internet e impulsionar pesquisas sobre o tema;
Criar ou reforçar órgãos públicos para o combate ao discurso de ódio.

À sociedade civil

Coordenar estratégias de mobilização e participação de ativistas online;
Levar campanhas sobre tolerância para espaços virtuais dominados pelo discurso negativo;
Pressionar os meios de comunicação a manterem um tom mais respeitoso em seus fóruns;
Demandar que os poderes públicos intervenham em casos flagrantes de ódio.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

3 Comentários

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  1. Meios de comunicação

    “Pressionar os meios de comunicação a manterem um tom mais respeitoso em seus fóruns;”

    Deveria pressioná-los para manterem um tom mais respeitoso em suas reportagens, aquelas com nitido viés direitista.

  2. Discordo. A intolerância

    Discordo. A intolerância virtual é a única maneira de controlar ou moderar a intolerância política. Nesse sentido, acabei de ficar sabendo que, se eleita for, Hillary Clinton continuará apoiando o terrorismo na Síria. Por isto mandei um Twitter torpedo nas ventas dela:

     

    wants to continue supporting terrorism in . Fucking bitch. Blocked.

     

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