Pirataria: A Farsa da Propriedade Intelecutal

 

Propriedade Intelectual 


Fotos de Ivaldo Reges


Mônica Lustosa é advogada especialista em Direito Empresarial e Propriedade Intelectual e sócia do escritório de advocacia Siqueira Castro Advogados, em Pernambuco. Batemos um papo leve e interessante sobre um tema cada vez mais discutido:

REVISTA NEGÓCIOS PEO que é Propriedade Intelectual?

MÔNICA LUSTOSAÉ o domínio que um indivíduo exerce sobre o fruto da sua criatividade.

NPEQual o escopo dessa “criatividade” do ponto de vista jurídico?

MLPara efeitos jurídicos o universo da propriedade intelectual se divide em Propriedade Industrial que compreende marcas, patentes, desenhos industriais, indicações geográficas (como o Vale do São Francisco para uvas e vinhos) e transferências de tecnologia; e direitos autorais e conexos que envolvem softwares e obras literárias artísticas e científicas.

NPEAlém desses temas a Propriedade Intelectual abrange outras responsabilidades?

MLApesar de não se encaixar juridicamente no termo, uma vez que não há uma relação jurídica de propriedade, a área também responde por domínios na internet, denominações empresariais (nomes de empresas) e repressão a concorrência desleal.

NPEComo proteger a Propriedade intelectual?

MLO regime que vai disciplinar essa relação jurídica de propriedade depende das características do objeto da criação intelectual. Se o assunto for uma marca, ela será regida pela lei de propriedade industrial. Nesse caso, a relação jurídica de propriedade nasce com a concessão do registro pelo INPI – Instituto Nacional de Propriedade Intelectual. Se for uma invenção (como um liquidificador, por exemplo) ou um modelo de utilidade (um recurso acrescentado a uma invenção que a torna mais eficiente) o regime jurídico é o mesmo, mas o título que protegerá essas criações intelectuais é denominado patente.

NPEEntrando especificamente no universo das marcas, quais as motivações para protegê-la?

MLTodas. A começar pelo conjunto de investimentos empreendidos pelo empresário, envolvendo análises, pesquisas e risco assumido, que resulta na criação de um produto, serviço ou negócio, constituindo uma proposta de valor para o consumidor. A síntese dessa proposta é representada pela marca. Portanto, é justo que esse esforço desprendido seja protegido pelo direito à propriedade industrial. Trata-se de um monopólio legal, mediante o qual o titular do registro tem o direito exclusivo de utilizar a sua marca registrada como uma forma de proteção ao iinvestimento feito na construção de um relacionamento com o consumidor, o que inclui as vendas no presente e no futuro.

NPEComo é a realidade de Pernambuco envolvendo o registro de marcas?

MLAinda existe um longo caminho a ser percorrido. Em Pernambuco, por exemplo, menos de 5% das empresas depositam pedidos de registro de suas marcas, ocupando o Estado o 11º lugar no ranking nacional, participando com apenas 1,28% dos pedidos de registro de marca em todo o País.

NPEQual o problema mais comum relativo ao registro de marcas?

MLA falsificação. Dentro dela a mais danosa é a pirataria. Ela tira proveito do prestígio de uma marca conhecida. Agora imagine, o empresário investe em tudo. Inovação, ciência, tecnologia, design, modelo de negócio. Depois investe em publicidade para promover a marca. Paga uma carga tributária e trabalhista, e se não registrar seu esforço corre o risco de ter, ainda, grandes prejuízos.

NPEComo é a ação do governo em relação a esse assunto?

MLTímida. Os políticos brasileiros têm medo de desgastar sua imagem em virtude da idéia de que a pirataria atenua o desemprego. Porém, segundo a FIESP, no Brasil cada pessoa que trabalha com pirataria tira seis postos de trabalho com carteira assinada.

NPEComo se podem mensurar as perdas em relação a esse assunto?

MLAtravés dos números divulgados. O comércio ilegal de roupa, tênis e brinquedo causaram uma perda de arrecadação de R$ 18,6 bilhões em 2006, valor suficiente para cobrir 45% do déficit da previdência social.

NPEQual é o perfil do consumidor de produtos falsificados?

MLNo Recife foi feita uma pesquisa pelo Ibope patrocinada pela Câmara de Comércio dos EUA em parceria com a Associação Nacional pela Garantia dos Direitos Intelectuais com um universo de 511 entrevistados que concluiu que a maioria são jovens entre 16 e 24 anos que compram motivados pelo desejo de inclusão social, motivados pelo preço baixo.

NPEQuais os caminhos para estimular o empresário a investir na Propriedade Intelectual?

MLO estímulo a exportação é um excelente caminho. O Brasil tem apenas 1% do mercado internacional porque exporta predominantemente commoditties. Para mudar esse quadro é preciso evoluir para a exportação de produtos que tenham valor agregado, e isso significa investir em inovação. Ao agregar valor surge a necessidade de proteger a inovação através da patente. Pernambuco particularmente ainda está engatinhando, afinal nosso empresário, de maneira geral, ainda não se abriu para o mundo e, além disso, temos uma economia com baixa participação industrial no PIB.

NPEQual a abrangência do registro de uma marca ou patente?

MLElas são regidas pelo princípio da territorialidade, só tendo validade dentro do país de origem. Pelo tratado da Convenção da União de Paris assinado por cerca de 170 países, quando ela é registrada você tem até seis meses no caso de marcas e um ano no de patentes para pedir o registro no país de seu interesse, considerando como data de referência o registro no seu país de origem, o que considera o princípio da anterioridade.

NPEPorque se especializou nessa área?

MLQuando comecei a atuar (em 2001) observei que existiam poucos profissionais no nordeste que se dedicavam a esse ramo. Além disso, observei que em função da globalização, essa seria uma matéria do direito que ganharia importância crescente. Fiz a coisa certa.

 

Grupos de defesa da propriedade intelectual 
Documentos do WikiLeaks revelam o verdadeiro objetivo do combate à pirataria

O governo dos EUA financiou a advogada Mônica Lustosa para que esta atuasse em defesa de seus interesses 

S01h – 13 de julho de 2011

 

 

Um telegrama enviado pelo consulado norte-americano do Recife e que vieram à público por causa do WikiLeaks mostram a atuação do governo norte-americano no combate a pirataria na região Nordeste. O documento foi enviado em 10 de maio de 2007 e foi publicado pela agência de notícias Pública, sendo parte dos 2.500 telegramas secretos sobre o Brasil que estão sendo revelados.

A principal revelação dos telegramas é a articulação do governo norte-americano para defender a propriedade intelectual. O consulado norte-americano no Recife relata uma reunião entre a advogada Mônica Lustosa, presidenta da Associação Nordestina de Propriedade Intelectual (Anepi) com o representante diplomático dos EUA.

Os documentos mostram que o encontro é parte de uma articulação entre as duas partes para a realização de uma campanha em toda a região contra a pirataria. Mônica Lustosa tem recebido apoio do imperialismo para combater a pirataria desde 2005 e através das ordens do governo dos EUA, ela fundou o Grupo Estratégico de propriedade Intelectual de Pernambuco da Câmara América de Comércio (AMCHAM).

O documento também mostrou que Mônica Lustosa foi financiada e protegida pelo imperialismo para defender esta política. Em um trecho do telegrama o consulado relata o seguinte ao Departamento Norte-Americano: “a senhora Lustosa disse que consideraria continuar a defender a necessidade de proteção dos direitos de propriedade intelectual, mas somente se a sua segurança pessoal fosse garantida e ela fosse paga pelo trabalho.” E também dá detalhes da atuação de Lustosa junto ao governo: “ela fez lobby com sucesso para que o governo estadual estabelecesse uma unidade policial especializada no combate à pirataria – o Núcleo Especializado na Prevenção e Repreensão à Falsificação e Contrafação de Marcas e Produtos (NEPREFC)”.

O Brasil tem uma das Leis de propriedade intelectual mais restritiva do mundo, o que contribui para o atraso cultural do país. Em um estudo recente realizado pelo Consumers Internacional, organização que reúne entidades de direitos autorais de todo o mundo, o Brasil foi apontado como tendo a quarta pior legislação do mundo. Além de restringir o acesso da população à cultura, pois proíbe a cópia física e digital de livros, seja para uso educacional ou científico, a de defesa da propriedade intelectual também tem servido para reprimir a população.      

Um dos aspectos desta política, que visa beneficiar a indústria cultural, é o combate a pirataria. Em São Paulo, por exemplo, isto vem sendo colocado em prática pelo mini-ditador Gilberto Kassab como pretexto para perseguir os camelôs da cidade.

Por isso, a política do imperialismo de defender a propriedade intelectual constitui um atentado a soberania nacional, uma defesa da indústria cultural dos EUA e da repressão aos camelôs com a cobertura de luta contra a pirataria. 

 

 

WIKILEAKS: EUA por trás do combate à pirataria no Nordeste

Documento confidencial revela bastidores da formação de grupos de defesa da propriedade intelectual. Advogada pediu à embaixada dinheiro e proteção para continuar trabalho

Por Daniel Santini, especial para a Pública

O consulado dos Estados Unidos no Recife, seguindo orientação geral de Washington, teve papel de destaque na formação de grupos de combate à pirataria no Nordeste. É o que revela documento confidencial enviado pelo consulado em 10 de maio de 2007.

O texto é um relato do encontro da advogada Mônica Lustosa, presidente da Associação Nordestina de Propriedade Intelectual (Anepi), com representantes diplomáticos dos Estados Unidos, e traz detalhes dos bastidores da articulação em defesa da propriedade intelectual na região.

Lustosa, que até hoje é uma das principais figuras nas iniciativas anti-pirataria na região, tem recebido apoio internacional desde pelo menos 2005, ano em que foi selecionada para um programa de visitas internacionais para os Estados Unidos. Segundo relatou aos diplomatas, foi durante a viagem ao país que encontrou “inspiração” para fundar o Grupo Estratégico de Propriedade Intelectual de Pernambuco da Câmara América de Comércio (AMCHAM), do qual se tornou coordenadora.

No encontro no consulado em 2007, a advogada relatou dificuldades em prosseguir com o trabalho devido a ameaças e afirmou não estar mais disposta a continuar defendendo publicamente a propriedade intelectual se não recebesse dinheiro e proteção.

Segundo o documento, “a senhora Lustosa disse que consideraria continuar a defender a necessidade de proteção dos direitos de propriedade intelectual, mas somente se a sua segurança pessoal fosse garantida e ela fosse paga pelo trabalho.”

No relatório enviado, os diplomatas avaliam que em 2005 ela “fez lobby com sucesso para que o governo estadual estabelecesse uma unidade policial especializada no combate à pirataria – o Núcleo Especializado na Prevenção e Repreensão à Falsificação e Contrafação de Marcas e Produtos (NEPREFC)” e que o alerta feito por ela de que o governo estaria diminuindo os esforços em 2007 era bem fundamentado.

O consulado concluiu que a possibilidade de Lustosa recuar no combate público à pirataria seria um retrocesso na defesa dos direitos à propriedade intelectual na região.

Não há informações confirmando se o pedido de financiamento por parte dos Estados Unidos foi atendido na época, mas Lustosa continuou atuando no combate à pirataria e até hoje é uma das principais figuras públicas a se manifestar em defesa da propriedade intelectual na região. A Pública entrou em contato com a advogada, mas ela não retornou a mensagem enviada em seu correio eletrônico.

 

 

Redação

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