Quebra da Solyndra expõe políticas energética nos EUA

Do Blog Infopetro

O caso Solyndra: um revés às políticas de incentivos às renováveis nos EUA

Por Jacqueline Batista Silva

Na postagem anterior, discutimos alguns dos mecanismos de financiamento para as tecnologias de implantação de energias renováveis.  Vários incentivos foram apresentados e foi então discutido um ponto de fragilidade do sistema: o custo de oportunidade gerado por esses incentivos num momento de crise econômica mundial.

Nos EUA, a discussão sobre a quebra da Solyndra – empresa produtora de painéis solares –, depois de ter recebido vultuosos incentivos governamentais, serviu para promover um questionamento a respeito do direcionamento dos investimentos, explicitando de maneira ainda maior o atual contexto conflituoso da definição da política energética americana.

A Solyndra, empresa californiana, produtora de painéis solares, fundada em 2005, tinha como principal proposta a utilização de uma tecnologia inovadora, que revolucionaria completamente a maneira como os painéis eram produzidos até então, viabilizando, dessa forma, uma redução significativa nos custos da energia solar.

Uma lei do setor energético de 2005 autorizava o Departamento de Estado de Energia (DOE) a fornecer garantias de empréstimo realizadas por parte do governo americano para projetos inovadores que contribuíssem para diminuição da poluição atmosférica. Em 2009, uma lei estabeleceu um programa específico para renováveis, transmissão elétrica e projetos avançados em biocombustíveis.

A Solyndra foi considerada uma potencial destinatária da garantia tanto pela administração Bush como pela administração Obama. Uma revisão do projeto se estendeu pelos dois governos, tendo continuidade no governo Obama, quando já havia a lei de estímulo.

Em 2009, o DOE anunciou que ofereceria a garantia de empréstimo à Solyndra para financiamento da planta industrial de painéis solares no valor de US$ 535 milhões.  Ela foi a primeira companhia a receber este tipo de incentivo por parte do governo americano.

O Presidente Obama, numa visita às instalações da Solyndra em maio de 2010, a apresentou como um modelo do programa de energia verde, apesar de já haver algumas considerações sobre a péssima saúde financeira da empresa, de acordo com e-mails internos enviados aos responsáveis pelo programa de financiamento – que inclusive advertia a respeito de uma possível apresentação muito otimista dos resultados. Também via e-mail, uma conselheira do governo foi advertida especificamente a respeito da estrutura de custos da empresa. Apesar disso, o DOE reassegurou à Casa Branca que a Solyndra tinha boa saúde financeira.

Posteriormente, a companhia cancelou uma oferta pública inicial e fechou uma de suas fábricas. Isso fez com que Republicanos do Comitê de Comércio e Energia iniciassem uma investigação sobre a administração das garantias de empréstimo feitas pelo governo Obama. O Escritório de Orçamento e Gestão da Casa Branca foi, então, intimado a apresentar os documentos referentes ao financiamento e acompanhamento da situação da companhia, após a decretação de falência.

Houve acusações de que a administração aprovou a concessão da garantia de empréstimo pelo fato da fundação George Kaiser, um importante arrecadador de fundos para a campanha Obama, ser um investidor-chave no projeto. Isso foi negado pela Casa Branca, e os Republicanos não encontraram provas de haver razões políticas para o financiamento, mesmo após cerca de 200 mil páginas de documentos verificados – o que não quer dizer, no entanto, que não teham sido expostas situações embaraçosas para a Casa Branca. Uma delas foi o fato de representantes do DOE terem pressionado a Solyndra a postergar um anúncio de demissões para depois das eleições.

Houve um problema relacionado, ainda, à aplicação da legislação do incentivo. Num acordo/planejamento de reestruturação – ainda numa tentativa de evitar exposição e derrocada da empresa – o DOE assegurou a investidores que se injetassem uma quantia adicional à companhia seriam reembolsados antes dos contribuintes, caso a Solyndra entrasse em colapso. Os Republicanos argumentaram que este mecanismo iria de encontro à legislação do programa. O DOE teve, então, que explicitar detalhadamente a base legal para essa possibilidade, num memorando. Chegou a haver uma solicitação pela apresentação de toda a documentação referente à comunicação interna da companhia.

Após intimações, depoimentos e muitas novas páginas de documentação aditadas à investigação, o bombardeio à administração Obama continua e a investigação foi estendida a outros projetos – como a garantia de empréstimo à Beacon Energy, uma empresa de armazenamento de energia de Massachusetts que decretou falência em outubro de 2011.

A situação vivida pelos EUA, em meio a uma severa crise econômica, e que teve grandes perdas com as garantias de empréstimo, estimulou maiores ponderações sobre o tipo de incentivos e gastos governamentais a serem dados às inovações em energia verde.

O CEE –Center for Energy Economics – divulgou algumas considerações sobre tecnologias de energia e empregos verdes.

Algumas das considerações dizem respeito à dificuldade em mensurar adequadamente o peso dos empregos verdes na economia. Essa dificuldade poderia levar a um investimento maciço numa área que não seria a vocação regional de investimento/produção.  Esse é um tema recorrente no estudo da Brookings, mencionado em um artigo anterior neste Blog.  Apesar das inovações propostas pela Solyndra, em tese, permitirem diminuir os custos dos painéis solares; ainda assim eles não seriam competitivos com a produção chinesa.

Segundo o CEE, em períodos de dificuldade econômica – que gera enormes custos de oportunidade ao investimento – há espaço para estímulos fiscais, mas tais incentivos deveriam ser direcionados (nos EUA) para os setores em que gerassem maiores níveis de emprego e atividade econômica por dólar investido, nos quais o país tivesse vantagem comparativa em seus recursos naturais, humanos e tecnológicos, sem mencionar os financeiros. É ressaltado, ainda, o fato de que os EUA não teriam vantagem financeira comparativa contra a China – que introduziu US$ 30 bilhões em subsídios à indústria solar no ano de 2010. Além disso, os altos custos de produção dos EUA e da Europa tornam grandes competidores a Coréia do Sul, o Brasil, os Emirados Árabes Unidos e outras economias emergentes.

Isto é o que não se pode perder de vista: cada economia é diferente em termos de recursos (natural, humano, tecnológico, financeiro), de sua matriz industrial, do estágio de desenvolvimento econômico e extensão e qualidade de infraestrutura.  É esse o conjunto de condições que determinam as vantagens comparativas. Ignorar essas condições e tentar construir estas vantagens a partir de garantias e subsídios governamentais ou barreiras comerciais raramente logram algum êxito ou, quando parecem bem sucedidas, custam grandes somas; o pior é que os programas ficam sujeitos a mudanças vinculadas ao quadro político – situação pouco sustentável e que compromete a segurança energética.

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Luis Nassif

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