“Reformas”: Autoritarismo e retrocesso, por Paulo Kliass

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Temer não se importa com sua popularidade e parece ter aceito a tarefa a ele confiada pelos representantes do financismo e dos grandes meios de comunicação (Foto: Marcelo Camargo – Agência Brasil)

Marcelo Camargo - Agência Brasil

da Carta Maior

“Reformas”: Autoritarismo e retrocesso

por Paulo Kliass

A insistência do governo Temer em levar à frente sua agenda de retrocesso social parece ter finalmente encontrado um obstáculo em seu caminho. Consolidou-se uma resistência ampla e organizada a tais medidas, dirigida pelo movimento sindical de forma unitária e por um conjunto amplo de setores descontentes com o rumo dado ao País pelo grupo que se instalou no comando da Esplanada após o processo do golpeachment.
 
Ao que tudo indica, aquele que foi eleito como vice-presidente em 2014 não se preocupa mesmo com seus baixíssimos índices de popularidade. Parece que teria aceito, entre resignado e orgulhosos, a tarefa que lhe foi confiada pelos representantes do financismo e dos grandes meios de comunicação. As classes dominantes exigem dele ações com o intuito de promover a verdadeira liquidação daquilo que ainda resta de um arremedo de Estado de Bem Estar Social em nosso País. Consumado o afastamento definitivo de Dilma Roussef, entrou em campo a montagem de uma estratégia de fazer terra arrasada da experiência iniciada em 2003. 
Além disso, o comitê central dos chamados “formadores de opinião” resolveu que a nossa Constituição não cabe mais em nosso Orçamento. E ponto final! Assim, a única solução possível seria aproveitar a generosa disponibilidade oferecida pelo presidente interino para promover a eliminação dos dispositivos mais significativos aprovados pelos constituintes em 1988. As garantias de direitos sociais básicos devem ser retiradas para que se consolide o processo generalizado de mercantilização de nossa economia e a máxima já anacrônica do Estado mínimo deve ser transformada urgentemente em política orientadora do governo. Esse é o mote norteador do retrocesso, pisando forte no acelerador para tentar fazer o estrago o mais rápido possível. Afinal, 2018 é ano de eleições e os congressistas – por mais servis que sejam – não podem abusar tanto das medidas impopulares.
 
Sucesso da greve e fissuras na base aliada.
No entanto, por mais que o governo tenha tentado passar a imagem de solidez, austeridade e inflexibilidade, a sua situação político-parlamentar começa a se agravar e a base aliada apresenta os seus primeiros sintomas de desmantelamento. Por um lado, vozes importantes no Senado Federal alertam para a necessidade de mudanças no projeto de desconstrução da CLT, tal como ela foi aprovada na Câmara dos Deputados recentemente. Por outro lado, são perceptíveis as movimentações para redução das maldades no Projeto de Reforma Previdenciária, antes mesmo da votação do Parecer do relator na Comissão Especial da Câmara.
 
As alternativas de configuração final do processo dessas 2 propostas que são a espinha dorsal – a razão mesma de existir do governo Temer – permanecem cada vez mais no campo das incógnitas. Desde um recuo total e abandono dos projetos originais até a votação de propostas tal como nas versões atenuadas que circulam atualmente nos corredores do parlamento, o fato é que a missão inicial de desmonte integral está fadada ao fracasso. Apesar disso, alguns analistas ainda lançam mão da analogia com a estratégia do “bode na sala” para considerar que qualquer mudança que seja aprovada ainda pode ser avaliada como uma vitória de Temer. Ainda é cedo demais para arriscar qualquer balanço, uma vez que o jogo ainda está totalmente aberto e o governo conta com instrumentos de muita capacidade de “sedução” no interior da base aliada. Conhecemos muito bem a capacidade de influência da caneta e das verbas quando se trata de inverter votos e tendências no bloco do fisiologismo.
 
No entanto, parece inegável o fato de que a jornada de 28 de abril mudou a qualidade da movimentação política no País. O sucesso da greve geral e as perspectivas que se abriram a partir de então para as forças progressistas devem influenciar na dinâmica dos próximos passos para todos os atores envolvidos na disputa. O governo apostou no isolamento político do amplo movimento coordenado de forma unitária pelo conjunto das centrais sindicais. E considerou que bastava a cumplicidade dos grandes meios de comunicação para que se consolidasse na opinião pública a sua versão da narrativa que buscava qualificar o dia histórico como sendo sinônimo de fracasso, bagunça, agitadores e vagabundagem.
 
Banqueiro pede repressão.
Enquanto o movimento se articulava e ia para as ruas demonstrar sua indignação com as reformas trabalhista e previdenciária, a elite do financismo se resguardava nos escritórios e nas associações de classe para repetir o mantra por demais conhecido. Sempre a mesma ladainha para denunciar a ruptura do direito de ir e vir, o caos no sistema de transporte e as perdas econômicas provocadas pela irresponsabilidade dos sindicalistas. A amplitude e a profundidade da paralisação surpreenderam a todos, fazendo com que o governo lançasse mão da repressão policial explícita e violenta, em sua busca desesperada de contenção da greve.
 
Com isso, a sociedade brasileira parecia ter retornado aos tempos nada saudosos da ditadura militar, quando o lema condutor da ação do Estado era de que toda e qualquer greve fosse tratada como assunto de polícia. E o mais impressionante é que integrantes da elite das classes dominantes tenham recuperado esse triste passado e tenham incorporado tal orientação a respeito da conduta da repressão violenta perpetrada pelas forças policiais. O ex presidente do Banco Central, Gustavo Franco, saiu-se com a seguinte pérola ao avaliar a ação contra a greve:
 
(…) “Nenhuma boquinha terminou no Brasil sem certa dose de esperneio e gás lacrimogêneo. A sexta-feira que passou foi dedicada a isso. Vida que segue”  (…)
 
Esse é o banqueiro que não nega sua origem e tampouco os interesses de classe que defende. Pouco importa que a grande maioria da população brasileira já tenha se manifestado contra as mudanças que retiram direitos. Pouco importa que os integrantes do topo de nossa pirâmide da desigualdade socioeconômica não tenham sido chamados a dar um mínimo sequer de seus escandalosos ganhos para a busca do tal do equilíbrio fiscal.
 
O que é relevante é a tentativa de desqualificar o amplo movimento como sendo coisa de um bando de sindicalistas que não querem perder seus privilégios. Para tanto, vale tudo: a repressão desenfreada, a prisão arbitrária e até os ferimentos graves. Esse é conceito de democracia para essa gente que despreza a efetiva participação do povo no processo político e social. São os mesmos que reclamavam dos aeroportos transformados em rodoviárias, que bradavam contra os altos custos do trabalho doméstico com a inclusão de direitos trabalhistas e previdenciários, que vociferavam contra a máquina de vagabundagem operada por benefícios como Bolsa Família.
 
Enfim, são os mesmos que se locupletam com os 8% do PIB retirados do Orçamento da União e que são dirigidos ao financismo a título de pagamento dos juros da dívida pública. São os mesmos que vibram com o potencial do uso generalizado da terceirização da mão de obra. São os mesmos também que brilham os próprios olhos com a possibilidade de se considerar moradia e alimentação como forma de remuneração do trabalho no campo, a exemplo do que se caracteriza o regime de escravidão.
 
Contra o autoritarismo e o retrocesso, o único caminho é o da mobilização e da unidade. Caso o governo siga insistindo em sua estratégia de confronto, a tendência é da ampliação da solidariedade da população com o movimento. Se Temer não recuar, a única certeza é que novas jornadas virão.
 
Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.
 

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Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

2 Comentários

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  1. A pergunta que me faço a cada

    A pergunta que me faço a cada ação do Temer para afundar mais o país: quem foi o petista(s) que achou legal ter e manter o Temer como vice da Dilma?

    Queria muito conhecer essa ou essas criaturas para poder xingar.

  2. Medir índice de popularidade

    Medir índice de popularidade em ditaduras é coisa de mané, ou, de golpistas para dar a entender que vivemos uma linda democracia um pouco turbulenta. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

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