Cassiano Ricardo e o Verde-Amarelo & Anta

Enviado por jns

Jogador de futebol

 

O pequenino vagabundo joga bola 
e sai correndo atrás da bola que solta e rola. 
Já quebrou quase todas as vidraças 
Inclusive a vidraça azul daquela casa 
onde o sol parecia um arco-íris em brasa. 
Os postes estão hirtos de tanto medo. 
(O pequenino vagabundo não é brinquedo…) 
E quando o pequenino vagabundo 
cheio de sol, passa correndo entre os garotos, 
de blusa verde-amarela e sapatos rotos, 
aparece de pronto um guarda policial, 
o homem mais barrigudo deste mundo, 
com os seus botões feitos de ouro convencional, 
e zás! carregava-lhe a bola! 
“Estes marotos 
precisam de escola…”
O pequenino vagabundo guarda nos olhos, 
durante a noite toda, a figura hedionda 
do guarda metido na enorme farda 
com aquele casaco comprido todo chovido 
de botões amarelos. 
E a sua inocência improvisa os mais lindos castelos; 
e vê, pela vidraça, 
a lua redonda que passa imensa, 
como uma bola jogada no céu. 
“É aquele Deus com certeza, 
de que a vovó tanto fala. 
Aquele Deus, amigo das crianças, 
que tem uma bola branca cor de opala 
e tem outra bola vermelha cor do sol; 
que está jogando noite e dia futebol 
e que chutou a lua agora mesmo 
por trás do muro e, de manhã, por trás do morro, 
chuta o sol …

 

Cassiano  Ricardo

 

 

Resta-me só esta graça
de ser poeta.
Poesia! única coisa
que, depois de sabida,
continua secreta.

 

 

Ficaram-me as penas

 

O pássaro fugiu, ficaram-me as penas 
da sua asa, nas mãos encantadas. 
Mas, que é a vida, afinal? Um vôo, apenas. 
Uma lembrança e outros pequenos nadas. 
Passou o vento mau, entre açucenas, 
deixou-me só corolas arrancadas… 
Despedem-se de mim glorias terrenas. 
Fica-me aos pés a poeira das estradas. 

A água correu veloz, fica-me a espuma. 
Só o tempo não me deixa coisa alguma 
até que da própria alma me despoje! 

Desfolhados os últimos segredos, 
quero agarrar a vida, que me foge, 
vão-se-me as horas pelos vãos dos dedos.

 

 

Não sou herói do dia

 

Não sou o herói do dia.
A vida me obrigou
a comparecer, sem convite, ao banquete,
em que me vejo, agora, erguendo a taça,
não sei a quem.
Soldado que lutou sem querer, por força
do original pecado, e em cujo peito não fulgura,
até hoje, nenhuma
condecoração.

Não sou o herói do dia. Passei pela vida
como quem passa
por um jardim público, onde há uma rosa proibida
por edital.
A rosa de ninguém, a rosa anónima
que aparece jogada sobre o túmulo
do desconhecido, todas as manhãs.

É bem verdade que, em menino, eu possuía uma banda de música
que tocava no circo, acompanhava enterro,
que tomava parte em procissão de encontro
e nos triunfos da legalidade.
Hoje, porém, – pergunto -, onde o pitão, o bombardino, o saxofone, a flauta, a clarineta,
os instrumentos todos
dessa banda de música?
Todos quebrados, os respectivos músicos caídos
num só horizonte.
Minha banda de música, se existe,
é agora
de homens descalços e instrumentos mudos.

Não sou o herói do dia.

Ah, o silêncio
de alguns amigos que deviam falar e não falam.
O grande silêncio
da banda de música que devia tocar e não toca.
O silêncio espantoso
de quem devia estar gritando
desesperadamente, e ficou quieto.
E ficou quieto, sem explicação.
Maestro, não é hora de tocar-se o hino nacional?

Ah, positivamente,
não sou o herói do dia!

 

Cassiano Ricardo , 1895 – 1974

 

 

Nasceu em São José dos Campos, formado em Direito, foi um dos líderes do Modernismo , iniciado em 1922, tendo participado dos grupos “Verde-Amarelo” e “Anta”. Estréia em 1915, com o livro Dentro da Noite, de cunho sentimental, passou pelo parnasianismo com A Frauta de Pã  e define-se como modernista e nacionalista, a partir de 1925, com Vamos caçar papagaios, Borrões de Verde e Amarelo.

 

 

Sua obra mais notável é Martim Cererê, dentre muitas outras, cabendo destacar O Arranhacéu de Vidro (1956) e o notável Jeremias sem chorar (1965). Versátil, criativo, lírico e satírico, crítico e memorialista, valeu-se de uma técnica sempre ousada e renovada, às vezes desconcertante, mas sempre fascinante. Traduzido para muitos idiomas mas sempre para a leitura dos iniciados.

 

 

Academia Brasileira de Letras

 

Monteiro Lobato (centro), indicado para figurar na história da Academia Brasileira de Letras, pois que indicado, em 1944, por Cassiano Ricardo e Menotti Del Picchia (acima), para dela se tornar um membro efetivo, eis que recusa o fardão.

 

Trecho do Discurso de Posse de Cassiano Ricardo na ABL

 

“Quando estou triste, leio Musset. Se a minha tristeza tem um sabor português (há uma tristeza para cada terra) recorro ao Antônio Nobre que é mais chegado à intimidade de minha raça. Quando estou áspero, exaltado no meu apego à terra, leio Euclides de Os Sertões. Quando necessito de mocidade para meu espírito, leio o velho João Ribeiro nacional ou o velho Bernard Shaw estrangeiro. Quando fico meio céptico, que fazer? Sirvo-me do Anatole dissolvente para dissolver em água-de-rosas o meu cepticismo. Quando me ponho a brincar com realidades mais sérias, leio o incrível Wells. Quando quero escarnecer dos homens, leio Voltaire. Quando estou farto de artifício literário e procuro maior soma de verdade humana e profunda, leio Cervantes. Quando me enfastiam as verdades correntes ou os conceitos usuais da vida, agarro-me a Chesterton. Poderia fazer o contrário: ler Voltaire ou Juvenal quando me sentisse triste e Musset ou Antônio Nobre (ou o nosso Rodrigues de Abreu, tão humilde na sua desesperança) quando me sentisse alegre. Mas não. O mal cura-se com o próprio mal. O bem paga-se com o próprio bem. A estante de minha sensibilidade é feita de momentos. E cada escritor tem, aí, o seu momento próprio e inevitável. Também, quando quero ser simples ou ser eu mesmo, expulso essa gente toda do meu convívio. Abro a janela que dá para a vida e restabeleço, como disse alguém, as minhas relações líricas com a Natureza. E faço de cada dia uma página branca. E faço de cada noite uma reticência de estrelas…”

 

Campanário de S. José

 

Quem

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Tem

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Que

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Vem?

 

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Redação

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  1. Dele nunca esqueci do poema

    Dele nunca esqueci do poema “O Relógio”, que li num livro de literatura do segundo grau:

    “Diante de coisa tão doida
    Conservemo-nos serenos

    Cada minuto da vida
    Nunca é mais, é sempre menos

    Ser é apenas uma face
    Do não ser, e não do ser

    Desde o instante em que se nasce
    Já se começa a morrer.”

    1. A canção do monjolo

      O arco-íris já se pôs debruçado no morro
      como um fantasma, sete cores na cabeça,
      contando histórias pela boca do trovão…
      O monjolo, a bater na encosta do grotão,
      soca o pilão.

      Passa correndo por um vão de serra braba
      a sucuri de rabo azul que é o ribeirão.
      Os ecos em redor ficam de boca aberta
      e fazem o sinal da cruz por todo o boqueirão.
      Tenho a doida ilusão de que todos os ecos
      e o próprio arco-íris que casou com a solidão
      estão pasmados de chapéu na mão.

      O monjolo, a bater na encosta do grotão,
      soca-pilão, soca-pilão.

      Meu pangaré trotão de olhos azuis como turquesas
      põe-se a cismar na tarde roxa e quer parar
      antes do tempo,
      quando lhe dou a rédea a subir o grotão:
      é a eterna música do pilão
      que está batendo como um coração…

      A minha namorada, uma trigueira
      de treze anos em flor, lábios cor de pinhão,
      vai buscar a canjica loura que ele soca
      e pára a ouvi-lo junto às águas da barroca,
      como a um relógio de repetição.
      E fica-lhe no ouvido a música que ele toca,
      socapilão, socapilão!

      A enxada brilha nas tigueras do espigão.
      O lavrador que anda a estalar duas espigas
      vai arrancar cruas mandiocas cor de terra
      ao roxo terra que anda roxo pelo chão.
      Os cafeeiros qual soldados muito verdes
      marcham de dois, de dois em dois contra o sertão.
      A enxada brilha nas tigueras do espigão…
      Sooooooooóóóca-pilão!

       

      Foto: http://blogdoeduambiental.blogspot.com.br/2013/07/monjolo.html

  2. Ultranacionalista

    O Brasil no original

     

    Pensar brasileiramente. Ter o Brasil presente a todos os nossos atos. Defender o Brasil no original.

     

    44ª SEMANA CASSIANO RICARDO, DE 25 A 31/10

     

    Por certo que o Brasil se defenderá, principalmente, com a grande e invencível arma da sua originalidade.

    Sua originalidade não é, portanto, uma forma neutra de vida.

    Quando Keyserling, nas suas Méditations Sud-Américaines, afirmou que nada devemos temer da onda vermelha de russos e asiáticos e que jamais nos tornaremos americanos nos moldes ianques, do mesmo modo que a Grécia antiga jamais se romanizou, foi porque ele confiou em nossa originalidade, que até inconscientemente defendemos quando nos refugiamos em nosso próprio ser.

    Acontece, entretanto, que a luta entre o sentimento desprevenido da terra e as idéias diabólicas que não são da terra tomou caráter agudo e decisivo.

    Os “ismos” literários de 1922 viraram “ismos” políticos terrivelmente desnacionalizantes em 1937. Não apenas no Brasil, como no mundo, a revolução operada pela técnica determinou uma violenta e descêntrica atividade racionalista, crítica, dispersiva, senão anárquica. As seduções do demagogismo insuflam a “rebelião espiritual” das massas, desarraigando nelas o sentimento da tradição e o apego à idéia da Pátria.

    Qual o meio de que dispomos para nos defender desse ataque?

    Apelar para focos de cultura desinteressada? Basear-nos na educação, nas formas puramente racionais de esclarecimento ou na “pseudológica” das idéias claras?

    Não, o meio será a criação de uma polícia da inteligência, que vele pelos destinos da nacionalidade.

    No atual momento, essa polícia consistirá numa doutrina (consciência de pátria, consciência de nossa originalidade no mundo) ou numa ideologia (instinto de legítima defesa em face das demais ideologias que tentam assaltar a todo transe as nossas fronteiras espirituais e morais.)

     

    Nacionalismo, condição de humanidade

     

    Quando alguém entendeu que le patriotisme exige la haine de l’étranger, foi porque não conhecia o Brasil. Quando outro alguém afirmou a origem pagã e telúrica de todo e qualquer nacionalismo, foi porque não se lembrou de que o Brasil realiza, na sua inédita democracia social e biológica, o anelo total do mundo a que se refere o visionador da “raça cósmica”. O telúrico é, para nós, a assimilação das raças dentro da máxima de Cristo: amai-vos uns aos outros. Cristo abençoaria o telurismo que fez, do Brasil, o refúgio de todos os oprimidos, a libertação de todos os preconceitos sociais ou de classe, a fusão de todas as cores étnicas para o mais belo milagre humano da sua doutrina.

     

    Democracia e democracias

     

    Nosso nacionalismo significa, pois, humanidade. Defesa do Brasil para que ele se conserve Brasil, a fim de continuar o seu papel de redenção e humanização.

    Quanto mais Brasil ele for, mais humano ele será.

    E que dizer, agora, da obrigação do escritor, em face da democracia brasileira?

    Não há mais democracia, o que há são democracias. O reajustamento do mundo partiu a palavra em muitas palavras, que parecem iguais mas que são muito diferentes: democracia imperial, democracia igualitária, democracia liberal.

    Não obstante a confusão propositada, o conceito de democracia, no Brasil, não pode sofrer deturpação alguma.

    Por ser o caso de uma “democracia social” tipicamente nossa.

    Nascida em circunstâncias que não ocorrem, absolutamente, em outros países do mundo.

    Se a lei não lhe vinha correspondendo ao sentido exato, o caminho a seguir, então, não havia de ser, como não foi, o de ir buscar lá fora o remédio. Nem o de recorrer à cópia de meios violentos que não correspondem à índole do nosso povo e ao ritmo de nossa História. Seria, muito ao contrário, reajustar a democracia brasileira dentro da nova concepção de Estado triunfante em toda a parte. Mas dentro, também, do seu sentido irremediavelmente brasileiro. Ou dentro de um Brasil irremediavelmente democrático. Tudo entrou nessa democracia que é um fenômeno climático (somos um país tropical), que é um fenômeno étnico (a mistura de raças), que é um fenômeno geográfico (a terra niveladora, anticentralista), que é um fenômeno social (o operário de hoje é o patrão de amanhã), que é um fenômeno psicológico (a bondade na sua acepção brasileira, tipicamente democrática). É uma democracia “ser vivo”.

    É uma democracia que, antes de ser uma realização político-liberal, é uma razão brasileira de humanidade.

     

    Arte é democracia

     

    Mas qual a democracia que interessa aos escritores?

    Ora, todo artista é necessariamente individualista.

    Arte é democracia, porque democracia é individualismo.

    Admitir como “desumanas” as sociedades onde o homem procede, “não como pessoa, mas como indivíduo”, é coisa que não tem fundamento em nossa democracia social e biológica.

    O individualismo das comédias eleitorais nada tem que ver com o individualismo criador de beleza e de riqueza para o Brasil.

    Em certos países, inventou-se que o mal do individualismo podia ser curado com o coletivismo. Em outros, o remédio estaria no estatismo, desindividualizador, feroz. Uma teoria engenhosa lançou mão de outro corretivo: o neo-individualismo. Falou-se muito num remédio espiritual bem-intencionado: o personalismo.

    No Brasil, onde o individualismo é condição de aventura criadora, o interesse social está justamente em que o indivíduo “se realize” o mais possível, para realizar mais. Mesmo porque o nosso individualismo tem, na bondade típica do brasileiro, o seu corretivo natural. Claro que não me refiro à bondade (é indispensável frisar este ponto) no seu sentido de cordialidade. Não me refiro ao “homem cordial” de Ribeiro Couto e de Sérgio Buarque de Holanda. Refiro-me a uma bondade mais envolvente, mais política, mais assimiladora; uma bondade que nada tem que ver com o “homem cordial” dos aperitivos nem com as “cordiais saudações” que são fechos de cartas tanto amáveis como agressivas. Força secreta e invisível que tudo domina, e que tudo submete com doçura. Fazendo mais do que todas as técnicas de violência, que dividem os homens e que só os submetem à custa de sangue. Poder-se-ia dizer que se trata, como já fiz ver alhures, de uma bondade que se defende sempre, mesmo quando parece submeter-se. A função desse material afetivo difere muito da que cabe à bondade em sua acepção hospitaleira, liberal ou lírica. Está longe de confundir-se com a daquela outra bondade que certo historiador carão denominou “incapacidade de realizar o mal, por indolência”. Também não se confunde com a “bondade natural”, que Afonso Arinos de Melo Franco, em recente e brilhante ensaio, fez entrar, como contribuição do índio brasileiro, nas origens da teoria de Rousseau. Também não se enquadra na espécie de bondade que tanto interessou a Stefan Zweig e que é a do “faça o favor de entrar”; bondade de sala de visitas. Que encanta, mas brilha falso.

    Bertrand Russel, não faz muito, em seu Ícaro o el porvenir de la ciencia, exclamava que “só a bondade salvará o mundo”. Seria preciso “fabricar” bondade. Não haverá jeito de se instituir uma junta secreta de fisiólogos, para se descobrir o meio de “criar” bondade? Como arranjar um remédio que torne os homens menos ferozes? A biologia oficial de certos países que procure responder, a seu modo, a pergunta angustiada e trágica.

    Nós, não.

    No país da bondade não existe o individualismo negativista e anarquizador. Tal individualismo, se existiu, foi amamentado pela politicagem profissional interesseira e particulista. Suprimida esta, o nosso individualismo voltará a ter o seu sentido exato, necessário, que não é o do individualismo burguês dos liberais incorrigíveis, que não é o do “personalismo” neutro e incolor de um Denis de Rougemont, que talvez não seja o do “neo-individualismo” yankee de um Overstreet, e sim um individualismo que, antes de ser corrigido pelo Estado ou por qualquer teoria, já o tinha sido pela bondade biológica do brasileiro. Bondade original e única. Fenômeno humano, sociológico, que não depende de nenhum decreto, senão do decreto de Deus que a instituiu no coração de todos nós. E haverá, no biológico, alguma coisa de pagão e de anticristão? Não. Não temos culpa da própria vida nos haver reservado, neste trecho da paisagem humana que é o Brasil, o milagre telúrico do Cristianismo pela fusão de todas as raças que se irmanam, sem preconceito de cor nem de origem, debaixo do mesmo céu. Em nosso clima humano não há como funcionar aquela máquina que estandartiza, nivela os homens e só os não numera porque teriam todos o mesmo número moral e econômico. Aqui, felizmente, não se fez mister ainda comprimir os indivíduos para os fazer solidários. Solidários à força, isto é, mais do que seria necessário. Nem foi preciso reduzi-los a pessoas, para inventar uma espécie de solidariedade passiva e igualitária. Nosso individualismo cria a interdependência, que é solidariedade ativa e confraternizadora. No amanhecer do nosso destino, enquanto a pessoa ficava em casa, o indivíduo é que saía para as suas aventuras gloriosas. Se abolíssemos o indivíduo e deixássemos apenas as pessoas, o Brasil estaria paralisado. Faltaria o movimento que leva os homens a abrir caminhos novos e a procurar novas fórmulas de vida e de beleza. Nem é caso de maldizer tanto o indivíduo quando ele é a nossa última esperança contra os regimes de compressão. Se o mundo fosse um paraíso, só existiriam pessoas singelas e harmoniosas, e não indivíduos inquietos e dissonantes. Mas inquietude e dissonância ainda são alimentos do mundo que precisa viver. Não me parecem desumanas, pois, as sociedades onde o homem procede como indivíduo mas aquelas onde a pessoa humana não se realiza por falta do indivíduo que a realize.

    Muitas vezes é o próprio indivíduo que luta contra a liberdade: que me adianta ser livre, se ninguém me vem garantir o gosto de ser livre? Que me adianta ser livre, se me falta capacidade para ser livre?

    O direito moderno de tornar o indivíduo “menos livre” impõe, entretanto, a obrigação moderna de fazê-lo “mais feliz”.

    Demonstrando o seu horror ao “homem coletivo”, Duhamel teve esta afirmação oportuna: é o homem individual que nos deu, nos tem dado e nos dará ainda os mestres, os sábios e os santos. Seria preciso ter caído numa desgraça imensa para pensar que sábios, santos e mestres não existirão mais.

    Tudo está indicando, portanto, a posição do artista em face da nossa democracia.

    Não só para defender uma “forma de ser” vinculada ao “ser brasileiro” como também para não sacrificar seu individualismo nos altares da violência.

    Se arte é necessidade de expressão, se o artista não cria para si mas para transmitir a outros a sua emoção, claro é que arte é democracia.

    Já disse o próprio Breton: não há cultura nem arte que não tenham mergulhadas, no povo, as suas raízes.

    E disse a verdade.

     

    Em conclusão

     

    Senhores acadêmicos.

    Estais no planalto da cultura brasileira.

    Obscuro bandeirante, vim até aqui.

    Ousei subir até onde estais.

    Não apenas para colaborar convosco em vossa imensa obra de brasilidade como também para reconhecer que sois o reduto supremo em que se apóia, neste instante, a nossa soberania de espírito e de sentimento.

    E também por acreditar que a defesa do Brasil, em sua originalidade, nunca foi tanto, como agora, uma função espiritual.

    A grande história da Cadeira que, com o vosso consagrador sufrágio, me concedestes, está ligada à pequena história da minha sensibilidade.

    Luís Guimarães Júnior, cuja “Visita à casa paterna” vivi declamando em menino, é o poeta que primeiro entrou em minha formação sentimental. João Ribeiro foi quem me distinguiu com o maior elogio a que eu pudesse aspirar na vida, chamando-me “brasileiro até à medula dos ossos”. E Paulo Setúbal? É aquele em cuja obra de escritor, em cujo entusiasmo pelos feitos de nossa gente e pelas coisas de nossa terra, irei sempre buscar inspiração segura para o meu nacionalismo, que é minha razão brasileira de humanidade. Faltava-me ainda, para redourar tão bonito sonho, agora transformado em mágica realidade, fosse eu recebido por Guilherme de Almeida: pois nem isso me faltou à emoção desta noite.

    Senhores acadêmicos:

    Quis o destino que houvesse vinte e uma formas de servir ao Brasil. Deu-me uma delas. Estou satisfeito com a forma que me coube nessa partilha fraterna, nessa divisão geográfica de trabalho para um só objetivo histórico.

    Mas, bandeirante obscuro, ia eu dizendo, vim até ao planalto onde estais vós, e onde guardais, viva como nunca, a chama sagrada do espírito brasileiro. Sopram ventos maus, lá fora. Aqui dentro, porém, esta chama simbólica estará sempre acesa. Porque Pátria é espírito. E o espírito da Pátria é imortal.

    Venho de Piratininga, senhores acadêmicos.

    Só não trago esmeraldas.

     

    Excerto do discuros de posse de Cassiano Ricardo na Academia Brasileira de Letras

    http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=6858&sid=295

    http://www.sjceventos.com.br/Noticias.asp?idNoticia=279

  3. A física do susto

    Cassiano Ricardo

    O espelho caiu a parede. 

    Caiu com ele o meu rosto. 

    Com o meu rosto a minha sede. 

    Com a minha sede eu desgosto. 

    O meu desgosto de olhar, 

    no espelho caído, o meu rosto.

     

     

    Neymar será expulso por fingir ser ele mesmo?

    Tomara não chegue a tanto…

    Sem cai, cai, já!

  4. Encontro marcado prá construir uma nação

    Zeca Pagodinho

    Tinham encontro marcado / Pra fazer uma nação
    E o Brasil cresceu tanto / Que virou interjeição

    [video:http://youtu.be/pDM2FYFGeLA%5D

     

    Mestre Sivuca Berimbando na Viola

     

    [video:http://youtu.be/nmQMhZcPYZQ%5D

    Quem é homem de bem, não trai / O amor que lhe quer seu bem
    Quem diz muito que vai, não vai / E assim como não vai, não vem
    Quem de dentro de si não sai / Vai morrer sem amar ninguém
    O dinheiro de quem não dá / É o trabalho de quem não tem
    Capoeira que é bom, não cai / E se um dia ele cai, cai bem!

     

    Viníciu de Moraes / Baden Powell

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