Vladimir Putin, a Arte da Guerra, por Sergio Medeiros R.

Os interesses da Europa não são os dos Estados Unidos da América neste terreno sempre (in)fértil da guerra, notadamente porque a destruição e os conflitos ocorrem no espaço deste primeiro ator.

Sputnik

Vladimir Putin, a Arte da Guerra

por Sergio Medeiros R.

Os analistas internacionais, aparentemente, estão perplexos com as iniciativas de Vladimir Putin, as quais, de forma uníssona, são consideradas fadadas ao fracasso. Na realidade, se observarmos com atenção esse comportamento muito mais midiático do que baseado em fatos e na racionalidade, verificaremos, sem sombra de dúvidas, que essa tendência não se mostra mais na forma aparente, mas praticamente se formou um consenso, ou seja,  eles efetivamente estão perplexos, pois não encontram motivação para os movimentos de Putin, e, no seu modo de ver, segundo as movimentações que de fato veem ou querem ver, sua estratégia estaria fadada ao fracasso.

Ledo engano.

A racionalidade dos atos de guerra e a forma como se desenrolam, ainda que possam ser percebidos por observadores mais atentos, ainda não se mostram em sua expressa finalidade, mas, aos poucos, poderão ser percebidos, exatamente em suas contradições.

Em outros termos, o que parece erro e direcionamento ao abismo, em outros campos, pode se revelar exatamente o contrário.

Pois bem, passemos a questão central.

A quais aspectos da arte da Guerra me refiro.

Por paradoxal que possa parecer, a principal estratégia, por milenar, e em razão da forma sutil como vem sendo implementada, ainda não foi vista em sua inteireza.

Estou falando da desgastada estratégia “Dividir para conquistar”.

Sim, mas dividir quem???

No caso, explicito a quem servem as guerras e as motivações econômicas.

A guerra e os enfrentamentos decorrem numa primeira e evidente abordagem dos interesses econômicos e estratégicos dos Estados Unidos da América, os quais são intencionalmente apresentados de forma simbiótica, de modo a uni-los indissoluvelmente aos interesses europeus.

Ocorre que esta equação não é verdadeira.

Os interesses da Europa não são os dos Estados Unidos da América neste terreno sempre (in)fértil da guerra, notadamente porque a destruição e os conflitos ocorrem no espaço deste primeiro ator.

Definida esta primeira premissa, dela decorrem as demais.

É preciso, primordialmente, separar esta aliança e desnudar esta pseudo composição necessária.

Claro também, de plano, que tal intento não seria possível em condições de normalidade ou de pequenas tensões. Sim, no caso, são necessárias condições extremas, ou seja, situações em que fiquem evidenciadas, de forma exponencial, a quem interessa e a quem serão debitados os prejuízos materiais e imateriais, no caso, principalmente os humanos de curto e longo prazos, sem que sejam deixados de lado os componentes econômicos. 

Tais circunstâncias, neste período de guerra, não precisam ser enumeradas, elas surgem aos borbotões e, se devidamente enumeradas e explicitadas, evidenciam os principais atingidos.

Ora, no caso, entendo que restará extreme de dúvidas, o imenso prejuízo humanitário e econômico da Europa e da Rússia em relação aos demais atores do cenário mundial, os quais terão problemas e prejuízos que se restringem, em sua maioria, a campos periféricos, não tão essenciais e sem que possam ser superados pelas vantagens de não serem o epicentro da crise, mas parte de sua composição dos danos.

Exemplificativamente, a questão alimentar é uma outra tragédia para a Europa considerando o relevo da produção da Ucrânia e da Rússia, sendo que, em relação ao prejuízo humanitário não há que se evidenciar, pois explicito demais, e, a premente questão energética que, ao mesmo tempo que impacta a Europa de forma brutal a torna mais dependente dos EUA. Assim, contraditoriamente,  talvez as sanções atinjam mais a Europa e se tornem menos prejudiciais a outros países componentes do conflito, nos quais vão se sobressair as oportunidades, mais que sanções, oportunidades para os EUA, Reino Unido, Japão e Austrália.

Feitas estas breves e essenciais considerações, anoto que, neste momento, estes apontamentos destinam-se apenas a delinear o atual cenário e não tem a pretensão de serem minimamente exaurientes.

Prossigo.

Para contextualizar as afirmações acima, verifica-se que, num primeiro momento, a ênfase foi dada a OTAN, e,  logo após a ONU, e, mais recentemente, a União Europeia, em face das consequências diretas, a fatores humanos próximos, dos quais avulta num primeiro momento  a crise humanitária, os impactos da iminente crise energética e alimentar, e os movimentos de refugiados em todo o continente europeu, tanto os novos como as demandas reprimidas de outros povos, principalmente oriundas do Mediterrâneo e Oriente Médio.

As sanções, em sua totalidade, incidem em sua forma direta de prejuízos, tanto ao povo russo como ao povo europeu, e, de forma mais branda e com ares de oportunidade para os EUA, Reino Unido após Brexit, e Oceania, todos eles em suas disputas concomitantes com a China.

Nesse contexto, a liberdade dada a Zelenski, não decorre de uma eventual necessidade de ter uma posição favorável perante a opinião pública (publicada) mundial, até porque, nesse momento, está acontecendo exatamente o contrário.

Na realidade, o que está acontecendo é uma preparação óbvia.

Assim, ao mesmo tempo que Zelenski fica efetivamente isolado, o estado russo lhe dá uma liberdade que pode ser considerada extrema e extasiante para o protagonista, mas, no decorrer do tempo – exíguo – resta demonstrado que lhe resta somente a retórica,sem grandes movimentos de ajuda militar (o que se  mostra praticamente inexistente e, de forma clara, sem nem mesmo expectativas de que isso se altere).

Deste modo, o discurso dele, Zelenski, passou a ter dois motes bem definidos, claro, o principal é dirigido à agressão russa, que se confunde com a defesa ucraniana e a ênfase ao engajamento e prejuízos da população civil. Obs: No caso, a forma como se desenrola a invasão, propriamente a guerra em si, mostra-se, a despeito da propaganda maciça ocidental, como sendo resultado de uma certa condescendência russa ao usar somente uma parcela reduzida de suas potencialidades militares disponíveis.

Mas, neste ponto, por questões de direcionamento do discurso e do local em que as tratativas se desenrolam (numa Ucrânia sitiada), pode-se notar que, cada vez mais, suas palavras mais fortes, agora se destinam-se à União Europeia.

En passant, ressalvo que esta nova inflexão, nem mesmo numa nova investida russa, mais radical e destrutiva, terá seu objeto de atenção alterado.

É que, a União Europeia, por sua proximidade e por sua possível interação social e econômica, passou a ser o único objeto de desejo possível.

Desta forma, os dados estão jogados (e não há, nessa expressão, nada de diminuição ou simplificação, mas de extremo horror) e, certamente, este pode ser apenas um movimento de torres, mas, não demora vem as ações de xeque mate… os limites toleráveis já foram largamente ultrapassados, agora vem a tensão absurda das próximas medidas…

A única solução, com a intermediação da China, é se a Europa se der conta e tiver forças para recuperar sua autodeterminação e ser capaz de jogar sua sorte.

Não há esperança em guerra ou na derrota de nenhuma das partes, apenas em sua composição e reagrupamento de forças.

Reitero, trata-se, em face da urgência que o momento exige, de rápidas considerações, a serem desenvolvidas mediante o debate, essencial ao desvendamento das questões cruciais deste momento trágico.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Redação

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