Arnaldo Antunes: crônicas viáveis

Enviado por Odonir Oliveira

 
Do EL PAÍS
 
Livro, exposição e show: Arnaldo Antunes ao mesmo tempo agora
 
Uma coleção de poemas, uma mostra poética e um show gratuito neste sábado, 25 de junho, para mergulhar no universo de um multiartista brasileiro
 
Para quem tem uns 40 anos ou mais e vive no Brasil, é como se Arnaldo Antunes sempre tivesse estado lá. Com os Titãs, no começo da carreira musical nos anos 80, com a poesia nos 90, quando ele publicou vários livros e recebeu prêmios literários. Nos anos 2000, lá estava Arnaldo com as artes visuais, quando juntou canções e poemas no suporte do vídeo – e aí já não se preocupava mais, de fato, em classificar o tipo de criação que fazia.
 
A verdade é que para o compositor, cantor, poeta e artista visual nascido em São Paulo, em 1960, nenhuma dessas fronteiras de tempo ou gênero artístico existem ou existiram. É “tudo ao mesmo tempo agora”, citando o último disco lançado pelos Titãs em 1991, que ele deixou um ano depois para embarcar em uma carreira solo pautada por uma regra apenas: a palavra. “É uma matéria comum a tudo o que eu faço. A palavra com esse perfil de trampolim para que eu alcance outras linguagens e explore esses atritos entre o verbal e o visual”, ele explica.
 
Mas a conversa não precisa ficar nas explicações. Quem quiser ir além e sentir a palavra na pele, tem neste momento três – quase quatro – maneiras de se envolver com o trabalho de Arnaldo.
 
A primeira é um livro lançado recentemente, no marco da 15ª Festa Literária de Paraty, em que ele esteve presente ao lado da cantora e também poeta Karina Buhr, debatendo música e poesia em uma mesa batizada de “Desperdiçando verso”. Agora Aqui Ninguém Precisa de Si (Companhia das Letras; 2015) é uma coleção de 65 poemas escritos nos últimos cinco anos. Exploram temas como o tempo e o espaço, a insignificância e a morte e são marcados, como sempre, pela sonoridade e pelos registros visuais patentes em sua obra literária. O poema de abertura é sobre o “nada”, e o último, sobre o “silêncio”.
 
Se o livro pode esperar (mas não muito, afinal as edições se esgotam), a atual exposição Palavra em movimento, tem as portas abertas só até 30 de agosto no Edifício dos Correios e Telégrafos, no centro da capital paulista. Com a proposta de sintetizar para o visitante uma carreira tão eclética, ela mata a curiosidade de quem quiser ver de perto caligrafias, colagens, instalações e objetos poéticos, além de adesivos, cartazes, áudios e vídeos de trabalhos realizados por Arnaldo Antunes nos últimos 30 anos – além de inspirar os mais poéticos.
 
Por fim, o artista faz um show gratuito no anfiteatro do Centro Cultural da Juventude, no bairro paulistano da Vila Nova Cachoeirinha, neste sábado, dia 25 de julho. É uma apresentação intimista que reúne canções já conhecidas do público, como “O pulso”, “Não vou me adaptar” e “Essa mulher”, mas em sonoridades diferentes. “Me apresento com dois músicos: o Chico Salem, que toca guitarra e violão, e o André Lima, que toca violão, teclado e sanfona. Isso acaba dando umas composições e arranjos inusitados”, diz o músico.
 
Depois dessa oportunidade musical, outra só deve surgir a partir de setembro, quando sai o novo disco que Arnaldo está gravando atualmente no Rio de Janeiro. Virá pelo seu selo, o Rosa Celeste, depois de ter sido composto ao longo de uma viagem por Estados Unidos, Índia e Itália, durante um período sabático de seis meses. É o período máximo de descanso que, desde sempre, ele se permite, e isso sem deixar de trabalhar.
Redação

24 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Exposição “Palavra em movimento”, tem as portas abertas só

    até 30 de agosto no Edifício dos Correios e Telégrafos, no centro da capital paulista.

  2. TUDOS, Arnaldo Antunes

    Estou cego a todas as músicas

    Não ouvi mais o cantar da musa.

    A dúvida cobriu a minha vida

    Como o eito que me cobre a blusa.

    Já a mim nenhuma cena soa

    Nem o céu se me desabotoa.

    A dúvida cobriu a minha vida

    Como a língua cobre de saliva

    Cada dente que sai da gengiva.

    A dúvida cobriu a minha vida

    Como o sangue cobre a carne crua,

    Como a pele cobre a carne viva,

    Como a roupa cobre a pele nua.

    Estou cego a todas as músicas.

    E se eu canto é como um som que sua.

     

    Vídeo: jns- jnscam

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=IEP0ZN2U7-c%5D

    1. No dia em que eu chovi Arnaldo Antunes foi mais ou menos assim .

       

      [video:https://www.youtube.com/watch?v=SPlplZi89dU%5D

       

       

      A CHUVA

       

       

      A chuva derrubou as pontes. A chuva transbordou os rios.

      A chuva molhou os transeuntes. A chuva encharcou as

      praças. A chuva enferrujou as máquinas. A chuva enfureceu

      as marés. A chuva e seu cheiro de terra. A chuva com sua

      cabeleira. A chuva esburacou as pedras. A chuva alagou a

      favela. A chuva de canivetes. A chuva enxugou a sede. A

      chuva anoiteceu de tarde. A chuva e seu brilho prateado. A

      chuva de retas paralelas sobre a terra curva. A chuva

      destroçou os guarda-chuvas. A chuva durou muitos dias. A

      chuva apagou o incêndio. A chuva caiu. A chuva

      derramou-se. A chuva murmurou meu nome. A chuva ligou o

      pára-brisa. A chuva acendeu os faróis. A chuva tocou a

      sirene. A chuva com a sua crina. A chuva encheu a piscina.

      A chuva com as gotas grossas. A chuva de pingos pretos.

      A chuva açoitando as plantas. A chuva senhora da lama. A

      chuva sem pena. A chuva apenas. A chuva empenou os

      móveis. A chuva amarelou os livros. A chuva corroeu as

      cercas. A chuva e seu baque seco. A chuva e seu ruído de

      vidro. A chuva inchou o brejo. A chuva pingou pelo teto. A

      chuva multiplicando insetos. A chuva sobre os varais. A

      chuva derrubando raios. A chuva acabou a luz. A chuva

      molhou os cigarros. A chuva mijou no telhado. A chuva

      regou o gramado. A chuva arrepiou os poros. A chuva fez

      muitas poças. A chuva secou ao sol.

       

      Arnaldo Antunes

       

      …………………………………………………………………………………………………………………………………….

      Vai chover poesia 

      Use o concretismo de Arnaldo Antunes para iniciar uma viagem pela linguagem poética 

      Sá para imaginar um poema sem versos? Até 1956, quando surgiu a poesia concreta, poucas pessoas ousavam pensar assim. Décio Pignatari e os irmãos Haroldo e Augusto de Campos deram destaque a aspectos visuais e sonoros e o papel principal do texto passou a ser da palavra. A seguir, você conhece as sugestões de Odonir Araújo de Oliveira, professora de Língua Portuguesa e Literatura e assessora pedagógica em São Paulo, para trabalhar o poema de Arnaldo Antunes em aula de aula. As ideias servem para todas as séries. Aprofunde as atividades de acordo com a resposta da turma. “Para explorar a linguagem poética é fundamental estimular as descobertas, mostrando que é possível ter inúmeras impressões”, ensina Odonir.

      Inicie com a leitura frase a frase para que os estudantes percebam o ritmo, as rimas e a estrutura. Estimule-os a dar explicações que justifiquem o modo como o autor construiu o texto. Em seguida peça que leiam novamente, deste vez prestando atenção à sonoridade: a repetição da palavra chuva e o efeito causado pelo som /ch/. Afinal, o que o poeta quer dizer? 

      Forma trabalhada, é hora de explorar o conteúdo. Promova uma discussão sobre as prosopopéias (personificações das ações e características atribuídas à chuva) e as metáforas. No texto, a chuva passa a agir como ser humano? Todas as descobertas podem ir para um grande painel, em que os alunos retratarão com desenhos, colagens ou pinturas as diversas situações imaginadas pelo poeta. O resultado será uma visão global daquilo que o texto sugere. Nesta fase, inclua o colega de Arte para uma aula sobre grafite, expressão artística típica das grandes cidades (leia uma sugestão sobre o tema no Site do Professor). 

      Para turmas mais avançadas é possível também explorar a estrutura sintática. Compare as frases em que a palavra chuva aparece como sujeito agente, orações em que o verbo está elíptico (“A chuva sobre os varais”) e frases nominais (“A chuva apenas”, “A chuva de canivetes”). Questione sobre as diferenças e o efeito que cada uma confere aos versos. Peça que listem todas as estruturas que aparecem no poema e os exemplos que correspondem a cada uma delas. 

      Toda essa discussão vai abrir espaço para desenvolver uma série de atividades. Peça uma pesquisa sobre o concretismo. Vale trazer outros poemas e letras de músicas de Arnaldo Antunes para cantar e declamar na sala de aula. Sugira que todos criem as próprias poesias.

      http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-1/chuva-634351.shtml

      1. Via Crucis na Rodovia da Morte

        Odonir, viajei durante sete horas pela Rodovia da Morte.

        O Demo tava de olho no Mineirinho zangado, que finge ser forte.

        Na BR-381 o pavor e o risco acompanham quem conta com a sorte.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador