César Augusto Teles, presente!

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
[email protected]


Família Teles: Os filhos Janaína e Edson, e o casal Amelinha e César Augusto Teles
 
Jornal GGN – Morre César Augusto Teles, aos 71 anos, preso e torturado no DOI-Codi paulista em 1972, junto com a sua esposa Amelinha Teles, Criméia de Almeida e o companheiro de militância Carlos Nicolau Danielli. “Uma dessas personagens que deveriam estar estampadas nos livros de história, mas que preferiram a cultivar a discrição e a humildade de quem é grande demais para se seduzir por vaidade. Sua trajetória e militância na resistência à ditadura e na luta pela justiça na democracia são dignas de toda a admiração e reconhecimento”, descreveu o ex-deputado estadual Adriano Diogo (PT).
 
O casal foi militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), à época da guerrilha do Araguaia, durante o período da ditadura do regime militar brasileiro. Presos no dia 28 de dezembro de 1972, foram levados à Operação Bandeirantes (Oban), onde foram submetidos a sessões de torturas, pessoalmente pelo major do exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, então comandante do DOI-Codi de São Paulo. 
 
Junto a eles, também foi presa a irmã de Amelinha, Criméia, grávida de 8 meses, e o companheiro de militância Carlos Nicolau Danielli. A esposa de Cesar Teles testemunhou o assassinato de Danielli. Seus filhos, Edson e Janaína, com 4 e 5 anos de idade, também foram sequestrados e levados à Oban, onde viram os pais serem torturados.
 
Em depoimento transcrito na publicação Brasil Nunca Mais (1989), o casal disse que “foram trazidos sequestrados, também para a Oban, meus dois filhos, Janaína de Almeida Teles, de 5 anos, e Edson Luiz de Almeida Teles, de 4 anos, quando fomos mostrados a eles com as vestes rasgadas, sujos, pálidos, cobertos de hematomas (…) sofrendo ameaças por algumas horas de que nossos filhos seriam molestados”.
 
Ao lado de Criméia, os três trabalharam para sustentar a imprensa clandestina do PCdoB e combater a ditadura. Chegaram a ficar anos isolados, no dia-a-dia da gráfica que César mantinha em sua casa. No vídeo, a seguir, eles relatam episódios do período do jornal e histórias de suas prisões:
 
https://www.youtube.com/watch?v=cLUViNNNKVk width:700 height:394
 
Em entrevista em 2004, Amelinha declarou:
 
“O coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra foi o primeiro a me dar um tapa na cara, me jogou no chão com aquele tapa. Me torturou pessoalmente. (…) Foi ele quem mandou invadir a minha casa, buscar todo mundo que estava lá, meus filhos e minha irmã. Durante cerca de 10 dias, minhas crianças me viram sendo torturada na cadeira de dragão, me viram cheia de hematomas, com o rosto desfigurado, dentro da cela. Nessa semana em que meus filhos estavam por ali, eles falavam que os dois estavam sendo torturados. Disseram: ‘Nessas alturas, sua Janaína já está dentro de um caixãozinho’. Disseram também que eu ia ser morta. Isso foi o tempo todo. O tempo todo, o terror. Ali era um inferno”.
 
Juntamente com a filha Janaína, o casal entrou com ação declaratória contra Carlos Alberto Brilhante Ustra, com o objetivo de que a Justiça o reconhecesse como torturador, o que ocorreu em 2008, quando a ação foi julgada pela 23ª Vara Cível de São Paulo. Na ocasião, o juiz reconheceu que César Augusto Teles, Maria Amélia de Almeida Teles e Criméia Alice Schmidt de Almeida, autores da ação, foram torturados por Ustra.
 
Em 2010, por sete votos a dois, o STF confirmou a validade da lei que anistiou casos de tortura e crimes comuns cometidos, tanto por agentes do Estado, quanto por civis durante a ditadura militar (1964-1985), o que foi usado como argumento para invalidar ou protelar todas as ações que penalizariam o coronel reformado. Carlos Alberto Brilhante Ustra morreu no dia 15 de outubro de 2015, sem cumprir nenhuma pena.
 
“Mesmo com todos os problemas de saúde, agravados pela prisão na ditadura e pelas torturas que sofreu, sempre manteve a leveza, a gentileza e o bom humor que contagiavam todos ao seu redor. As conversas sobre política, literatura e música, que ele conhecia como poucos, vão deixar muitas saudades”, publicou Adriano Diogo.
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

8 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Triste

    Eu e minha mulher somos amigos da Amelinha, da Criméia e do César. Pessoas maravilhosas!

    Que tristeza a morte do amigo César. A lembrança que ficará será exatamente a descrita com precisão pelo Adriano Diogo: 

    “Uma dessas personagens que deveriam estar estampadas nos livros de história, mas que preferiram a cultivar a discrição e a humildade de quem é grande demais para se seduzir por vaidade. Sua trajetória e militância na resistência à ditadura e na luta pela justiça na democracia são dignas de toda a admiração e reconhecimento”.

    César era extatamente assim. Uma pessoa com uma história incrível de vida, e com uma discrição e uma humildade impressionantes, raros. 

    Descanse em paz, meu amigo

     

  2. a monstruosidade da ditadura

    Quem ainda pede intervenção militar nos dias de hoje corrobora com todas as monstruosidades cometidas, fisicas e psicologicas pelo ditadores. E a monstruosidade maior que foram as torturas de bebês e crianças. Quando é que as escolas, ja que os jornais e as televisões falam nada, vão tratar realmente desse assunto?

    Solidariedade à familia Teles.

  3. Obrigado!

    Não os conheço, já li muita coisa a respeito da Sra. Criméia, mas fico muito sentido nesses momentos. O que posso fazer é agradecer a todos por terem dado a vida para garantir minha liberdade e direitos.

    Obrigado César!

  4. à época, essa converda mais

    à época, essa converda mais parecia

    lenda da esquerda….

    hoje demonstra-se que a tal lenda era realidade….

     

    hoje, ao invés da tortura, é o assassinato de reputações…

    na ditadura, era a extinção dos sindicatos,, dos parttidos,

    a morte da política, a morte da palavra, de tudo que

    dissesse respeito a democracia…. 

    o golpé civil militar reverenciava a violencia….

    hoje, essa elite escravocrata que remanesce da história e da ditadura,

    escarenece dos partidos, das instituições, parece acima de todas as leis,

    judicializa tudo….

    apega-se ao tal direito do inimigo para punir advesários políticos…

    provoca o golpe com o pedido de impeachment….

    e o escambau.,… 

    mas parece que a sociedade percebe essa violencia

    inerente a esses  interesses espúrios 

    que querem sacrificá-la mais uma vez…

     

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador