Como financiar o combate ao coronavirus? 10 observações.
por Pedro Rossi
- Primeiro é preciso largar o dogmatismo fiscal e rasgar a fantasia neoliberal. Temos que esquecer aquele papo de que não tem dinheiro, de que o Estado está falido. Por que isso é mito/mentira. Tem dinheiro.
- Não há restrições financeiras para o gasto público, além das regras instituídas. O governo gasta, depois o Banco Central avalia a base monetária/meta de juros e recolhe $ em troca de dívida. O governo não precisa de dinheiro prévio, nem de taxar pra depois gastar.
- Não faz sentido achar que tem que tirar de alguém para poder gastar. Não precisa tirar do policial e do professor, não precisa cortar 25% do salário de funcionários públicos. Isso só vai atrapalhar a recuperação econômica no pós-crise sanitária. A PEC Emergencial é estúpida.
- Quem ganha e quem perde? Qualquer gasto público é redistributivo. Se o Estado garantir renda para o mais pobres, $ para a saúde e para que o sistema econômico não colapse, uns ganham mais do que outros. Mas, ao evitar um caos social, a sociedade como um todo sai ganhando.
- O que vai acontecer se a dívida publica subir 10% do PIB, um caos social? Não, isso vai acontecer se o governo não gastar agora.
- O aumento de dívida NÃO precisa ser revertido em seguida. Alias, o padrão do comportamento das dívidas soberanas mostram: dívida pública não se paga, se rola. A tentativa de reduzir dívida em seguida da crise sanitária por meio de um forte ajuste fiscal seria trágica.
- Além de rasgar a fantasia neoliberal, devemos largar os mitos cultivados pela a esquerda. A dívida pública não é um problema moral. Não há limite mágico para a dívida publica. Dar calote na dívida em moeda nacional não faz nenhum sentido.
- NÃO FAZ SENTIDO VENDER AS RESERVAS CAMBIAIS ! Não precisa vender dólar para financiar gastos em reais, isso mantem a dívida líquida constante e aumenta a vulnerabilidade externa. Se for usar, que financie importação de medicamentos ou empresas endividadas em dólar.
- Quem acha que serão dois meses de aumento de gastos e depois voltamos para austeridade fiscal, tá enganado. O custo social disso seria enorme. Dívida publica se estabiliza com crescimento. Enquanto houve desemprego e capacidade ociosa, a política fiscal pode ajudar.
- Essa crise vai mudar paradigmas em termos de política fiscal. A realidade é tao chocante que as pessoas abandonam os dogmas. As ideias monetaristas foram por terra depois da crise de 2008/09. Agora é a vez definitiva dos dogmas fiscais.
OBS: Para o pessoal que aponta a Conta Única do Tesouro como nossa solução (tem R$1,2 tri -16% do PIB), isso é questão jurídica/contábil. Retirando as regras fiscais do caminho usa-se a conta unica. Retirando a proibição do BC financiar o TN, não há limites para o gasto público
Pedro Rossi (IE/Unicamp)
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A chamada esquerda “radical” ja deveria estar defendendo a moratória e a estatização do setor financeiro, e deixar a esquerda “reformista” defendendo a macroeconomia keynesiana. O debate publico ficaria muito menos desequilibrado.
Seria imprescindível também escalar quadros qualificados para o debate, para desmoralizar as boçalidades de mercado, de um modo geral, e os boçais ricos, um por um. O momento de cindir a aliança entre o estamento financeiro e o empresariado é este. Jamais terão outra oportunidade. Esperar que eles e seus representantes políticos com charutos e conhaques concluam “well, está na hora de trazer de volta o Estado pro jogo” é fazer força pra se enganar.