Déficit habitacional é obstáculo para isolamento vertical, dizem pesquisadores

Adensamento excessivo e coabitação caracterizam parte de um déficit habitacional que inviabiliza qualquer proposta de “isolamento vertical”.

Trabalho do Centro de Estudo da Metrópole mostra que, nas faixas mais pobres da população, não é viável separar os grupos de risco dos demais moradores. O problema afeta principalmente a região Sudeste, com a Região Metropolitana de São Paulo à frente (Paraisópolis, São Paulo. Foto: Vilar Rodrigo/Wikimedia Commons

da Agência Fapesp

Déficit habitacional é obstáculo para isolamento vertical, dizem pesquisadores

José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – No contexto da pandemia causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), o chamado “isolamento vertical” – que consiste em impor quarentena apenas aos grupos de risco (pessoas com mais de 60 anos e portadores de doenças crônicas, entre outros) e liberar o resto da população para circular livremente – tem sido contraindicado por autoridades de saúde do mundo todo.

Em um país com alto percentual de pobreza e infraestrutura deficiente como o Brasil, essa suposta opção torna-se ainda mais inadequada, pois, nas faixas de baixa renda, é impossível separar os grupos de risco. “Idosos e portadores de doenças crônicas convivem com os outros membros da família e até com outras famílias, em espaços apertados, muitas vezes dormindo no mesmo quarto”, diz à Agência FAPESP a pesquisadora Marta Arretche, professora titular do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP) e diretora do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) apoiados pela FAPESP.

Adensamento excessivo (definido como o compartilhamento do mesmo dormitório por mais de três pessoas) e coabitação (compartilhamento da mesma moradia por mais de uma família) caracterizam parte de um déficit habitacional que inviabiliza qualquer proposta de “isolamento vertical”.

Não existem dados atualizados, porque o último Censo Demográfico realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foi feito em 2010. E o Censo 2020 teve que ser adiado para o ano que vem, exatamente em função da pandemia. Mas estudo da Fundação João Pinheiro, de Minas Gerais, produzido com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), oferece um cenário aproximado, com números de 2015.

“Esse levantamento indicava que havia, naquele ano, um déficit absoluto de 6.356.000 habitações no Brasil. O adensamento excessivo respondia por 5,2% do déficit – ou seja, por 330.512 habitações. E a coabitação, por 29,9% do déficit – isto é, por 1.900.444 moradias”, informa o pesquisador Eduardo Marques, professor titular do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP), que integra o CEM.

A situação é ainda mais grave nas favelas, que, segundo o Censo 2010, abrigavam naquela data cerca de 11,4 milhões de pessoas. Mas o que a Fundação João Pinheiro classificou como déficit habitacional não se restringe às favelas, nem necessariamente inclui todos os edifícios existentes nelas, alguns com melhores condições de habitabilidade. Há déficit também em bairros de baixa renda não favelados. E até mesmo em enclaves de população pobre em bairros de classes média ou alta.

“Ao contrário do que se poderia supor, o maior déficit ocorre na região mais rica do Brasil: a Sudeste, onde a maioria dos números já detectados da doença se localiza. As regiões metropolitanas que lideram o ranking são as de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, com déficits aproximados de 640 mil, 340 mil e 159 mil unidades habitacionais, respectivamente. Realizar isolamento vertical nesse contexto é praticamente impossível”, afirma Marques.

Redação

2 Comentários

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  1. 90 anos sem o Brasil fazer Reforma Agrária onde realmente era necessária. Onde estão os BRASILEIROS !! Nas Cidades !! Principalmente RJ e SP. Berço da Moderna Esquerda. Endereço de FHC, Serra, Lula, Dirceu, Haddad, Boulos,….. Enquanto isto, tais Elites inflamavam o discurso do abandono, desertificação, atraso, internacionalização de todo território Nacional onde existem diminutas Populações de Brasileiros. 90 anos de Estado Absolutista de Elites Ditatoriais Fascistas Nepotistas a partir de Getúlio Vargas, sua Família como Leonel Brizola, João Goulart, Tancredo Neves, Ivete Vargas, Aécio Neves, seus lacaios como Juscelino Kubscheck, Filinto Muller, Gregorio Fortunato, Luiz Carlos Prestes e sua Instituições de Apoio como USP, Universidades Federais,MEC, OAB,…Como chegamos até estas Cidades Favelas? Como? Alguns fingem que não sabem. Terra das Coincidências e da Hipocrisia. Pobre país rico. Mas de muito fácil explicação.

  2. Nãoa existe déficit habitacional, existe superávit de miséria dos trabalhadores pela burguesia.

    Segundo Lenin:

    “Como se resolve, então, a questão da moradia? Em nossa sociedade atual exatamente do mesmo modo como se resolve qualquer outra questão social: mediante o gradativo equilíbrio econômico entre procura e oferta, uma solução que sempre gera de novo seu próprio problema, não sendo, portanto, solução nenhuma.
    O modo como uma revolução social poderia solucionar essa questão não só depende das circunstâncias do momento, mas também ter a ver com questões muito mais profundas, sendo uma das mais essenciais a supressão do antagonismo entre cidade e campo. Dado que não precisamos criar sistemas utopistas para instaurar a sociedade futura, seria totalmente supérfluo entrar nesse tema. Uma coisa é certa, porém: já existem conjuntos habitacionais suficientes nas metrópoles para remediar de imediato, por meio de sua utilização racional, toda a real “escassez de moradia”. Naturalmente, isso só poderá ser feito mediante a expropriação dos atuais possuidores, ou então mediante a acomodação, nessas casas, de trabalhadores sem teto ou trabalhadores aglomerados nas moradias atuais; assim que o proletariado tiver conquistado o poder político, essa medida exigida pelo bem-estar público terá sua execução tão facilitada quanto outras expropriações e acomodações feitas pelo Estado atual”.

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