Tunísia freia influência religiosa em nova Constituição

Tatiane Correia
Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.
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Sugerido por Gunter Zibell – SP

Do Opera Mundi

Tunísia freia influência religiosa em nova Constituição

Por Felipe Amorim

Parlamentares rejeitaram os princípios da sharia e fixaram o país como uma república ”civil” com liberdade de crença e culto

Os primeiros artigos aprovados da nova Constituição da Tunísia indicam que o país deve rejeitar o islamismo como fonte de suas leis.

Após as sessões iniciais da Assembleia Nacional constituinte tunisiana, as cláusulas aprovadas rechaçam a adoção dos princípios da sharia, a lei islâmica, como pedra de toque da Carta Constitucional pós-revolução. Os parlamentares tunisianos têm até o dia 14 de janeiro para votar o restante dos 146 artigos rascunhados da nova Constituição. Embora muitos achem difícil que o prazo seja cumprido, a data representa o terceiro aniversário da deposição de Zine El-Abidine Ben Ali, que esteve à frente do país por 23 anos. O levante acabou se espalhando pelos vizinhos Egito, Iêmen e Líbia, no movimento que ficou conhecido como Primavera Árabe.

Logo no preâmbulo, a Constituição fixa a Tunísia como “república civil” baseada no Estado de Direito. No entanto, resguarda o islã como religião oficial do Estado, mantendo o seu papel como autoridade moral (e não legal) na Tunísia. “O Estado é o guardião da religião. Ele garante a liberdade de consciência, de crença e de culto”, diz um dos primeiros artigos do documento em análise, cuja apreciação teve início na última sexta-feira (03/01).

Os parlamentares também rejeitaram duas emendas que conferiam poder jurídico ao Alcorão (livro sagrado dos muçulmanos) e à Suna (os atos, dizeres e recomendações do profeta Maomé). Dessa maneira, mesquitas não poderão ser usadas como centros de atividade política.

Direito das mulheres

A nova Constituição também dá um importante passo ao reconhecer homens e mulheres como cidadãos “iguais perante a lei, sem discriminação”. Embora o artigo limite-se apenas ao reconhecimento da cidadania formal, uma entidade tunisiana que milita pelos direitos das mulheres reconheceu a mudança como “uma vitória”.

Também estão garantidos na nova Carta Constitucional liberdades de opinião, pensamento, expressão e informação. O direito à greve e à sindicalização dos trabalhadores também foi já foi aprovado pela Assembleia Nacional. Em matéria penal, a tortura — “moral” e “física” — foi qualificada como “crime imprescritível”.

Alguns setores religiosos mais extremistas criticaram duramente a abertura da Constituição tunisiana, afirmando que desvincular o islã do arcabouço jurídico do país abriria as portas para o “satanismo e idolatria”.

Cenário político

O rascunho da Constituição tunisiana está sendo trabalhado há pelo menos dois anos. A Assembleia Nacional pós-revolução foi eleita em 2011 com o objetivo de promulgar uma nova Carta Constitucional em até um ano. No entanto, a forte polarização política entre os partidos islâmicos (maioria no Parlamento) e a oposição laica brecou o processo e dificultou a estabilização da Tunísia depois dos levantes. Em julho de 2013, no auge da tensão, líderes políticos da oposição laica foram assassinados por grupos extremistas islâmicos.

Há alguns meses, entretanto, a Ennhada, partido que comanda o país, concordou em fazer um acordo com a oposição para dar celeridade ao governo. Decidiram passar o poder a um governo provisório, preenchido por tecnocratas, que ficaria encarregado de, após a aprovação da Constituição, regulamentar as próximas eleições gerais.

O mesmo processo de conciliação aconteceu na Assembleia Nacional. Embora o partido islâmico Ennhada detenha maioria na Casa, ambas as forças políticas concordaram com o caráter “civil” e “laico” que a nova Constituição deverá ter. Para cada um dos artigos, é necessária a aprovação de pelo menos dois terços dos parlamentares constituintes.

Alguns setores da oposição laica temem, entretanto, que a redação excessivamente “vaga” de alguns artigos possa dar margens para diversas interpretações futuras.

Embora concordem com os termos gerais da nova Constituição, as diversas correntes políticas não deixaram de protagonizar embates duros e acalorados na Assembleia Nacional. No final de semana, parlamentares da oposição laica receberam ameaças de morte e tiveram que interromper a votação.

http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/33325/Estopim+da+primavera+arabe+tunisia+freia+influencia+religiosa+em+nova+constituicao.shtml

Tatiane Correia

Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.

5 Comentários

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  1. TUNISIA DÁ EXEMPLO AO BRASIL

    Quem falou que somos uma república, quando o Congresso está sendo invadido pelos representantes do poder religioso,  oom suas idéias formadas por crenças sobrenaturais?

    O poder temporal tem que ser respeitado e não poderíamos aceitar que membros de igreja, seja lá quais forem, fossem candidatos a cargos eletivos, de qualquer natureza.

    Estamos caminhando em direção contrário a maioria das Nações. E agora, incrível, até da Tunísia.

    1. Acho que você quis dizer

      “poder secular”. Poder temporal é justamente o de religiões influenciarem a sociedade.

      No México é proibido clérigos se candidatarem a cargos políticos. Não sou contra mas também não sou a favor. 

      Não vejo problemas em clérigos se elegerem no Brasil, só estão fazendo a parte deles.

      Vejo problemas nos que fingem concordância com seus discursos para receberem minutos de TV.

      1. De fato, equivoquei-me.

        Você tem razão, no que concerne à significação de poder temporal. Realmente, é poder da Igreja. Porém, com a República, estou percebendo o crescimento de seu poder dentro do Estado. Na próxima eleição, ultrapassará a 20% da representatividade do povo brasileiro. Crescendo, assim, inclusive com a Igreja Católica entendendo que deva começar a participar também das eleições, logo teremos uma maioria de religiosos no Congresso, um golpe contra a Republica.

  2. Excelente notícia, Gunter. A

    Excelente notícia, Gunter. A gente aqui fica discutindo, mas onde o bicho pega mesmo para as minorias são nos países islâmicos. Voce vê que falaram em direitos das mulheres. Mas para chegar nos dos LGBTs vai demorar

    1. Sim, vai demorar para islâmicos abordarem LGBTs

      Mas na Turquia já se avançou um pouco. Há liberdade para Paradas Gays (o que não há na Rússia ‘democrática’), há candidatos políticos gays, há até a proposta de incluir proteção contra a discriminação por orientação sexual na Constituição.

      Na Indonésia a homossexualidade também não é proibida por lei, ao contrário da Nigéria ‘democracia da maioria’.

      Mas, como sabe, eu acho que o bicho anda pegando nos LGBTs aqui no Brasil mesmo. Se na França secularista (que proíbe véus em escolas, p.ex.) já houve deputado propondo a cópia de leis russas, o que impede que políticos brasileiros proponham?

      Pior, o que me garante que o PT não ficará do lado disso? Na verdade, infelizmente, nada. 

      Você deve ter visto a pesquisa Ibope sobre questões religiosas. 55% dos brasileiros apoia o combate à homofobia em escolas e 60% apoia a criminalização de religiosos que façam discursos homofóbicos.

      Um dia o “poder” perceberá o equívoco de comprar essa briga ficando ao lado do fundamentalismo.

      Eleitores conservadores não se deixam seduzir por isso.

      Eleitores ‘descolados’ (não de esquerda em economia mas preocupados com direitos civis e difusos) ficam espantados

      Mais cedo ou mais tarde a oposição e a mídia percebem o caminho de discurso (mais um) para erodir o governismo (essa pesquisa Ibope não é à toa às vésperas da discussão PSB/PSDB em SP)

      Eu votei em Mercadante em 2006 e 2010. Votaria hoje? Não. Votarei em Padilha? Não mesmo. Acho que será extremamente difícil recuperar a confiança depois que a mesma é perdida.

      Eu sou apenas um voto irrelevante. Mas quantos estão se sentindo do mesmo modo?

      Essa é a questão.

       

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