A cruzada de um prefeito mimado contra seus críticos, por João Filho

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Foto: Cesar Ogata/Secom

Do The Intercept Brasil

A cruzada de um prefeito mimado contra seus críticos 

por João Filho

“Liga nas de cem que trinca
Nas pedra que brilha
Na noite que finca as garra
SP é fio de navalha
O pior do ruim
Doria, Alckmin
Não encosta em mim playboy
Eu sei que tu quer o meu fim”

Este trecho da canção da banda Aláfia foi removido antes de ir ao ar pela TV Cultura, emissora ligada ao governo de São Paulo. Além da censura na televisão, os vídeos da apresentação da banda no programa “Cultura Livre” também foram removidos do Youtube. Segundo a emissora, a intenção foi“não difundir ideias ou fatos que incentivem a polarização, independentemente do indivíduo a quem esse discurso se destina”. Essa justificativa da TV Cultura fica ainda mais engraçada quando lembramos que Augusto Nunes, conhecido por sua fervorosa militância antiesquerdista, é o jornalista escolhido para mediar entrevistas do Roda Viva.

Apesar de serem notórios defensores da liberdade de expressão em Cuba e na Venezuela, os tucanos nunca se deram muito bem com ela no Brasil.

Nas eleições de 2014, Aécio Neves processou 66 usuários do Twitter que, segundo ele, formavam “um grupo remunerado para veicular conteúdos ilícitos na internet”. Ele requisitou ao site os dados cadastrais dos donos dos perfis, dentre eles o crítico de cinema Pablo Villaça e o jornalista Paulo Nogueira. Em outra ação no início daquele ano, Aécio também tentou censurar pesquisas em ferramentas de busca, pedindo para que Google, Yahoo e Bing removessem do sistema “notícias que o acusam de desvio de verbas na saúde em Minas, além de 19 termos detectados nesses sites às sugestões de pesquisas feitas automaticamente”. Aliás, sobre Aécio e liberdade de imprensa, recomendo que pesquisem sobre o jornalista Marco Aurélio Carone, que ficou preso por 9 meses antes de ser absolvido por denúncias contra Aécio. Obviamente, não vimos nenhuma cobertura na grande mídia a respeito deste caso.

Alckmin também não costuma dar moleza para seus críticos. Conhecido como Santo nas planilhas da Odebrecht, o governador já entrou com ação na justiça pedindo quebra de sigilo cadastral de seis perfis do Twitter que o chamaram de “ladrão da merenda” “corrupto”. Quanta injustiça!  

E qual seria a postura do tucano mais badalado do momento em relação às críticas nas redes sociais? Bom, o homem que se julga portador de novos ares para a política está lançando mão do mesmíssimo modus operandi dos seus colegas. Quer dizer, temos algumas novidades. Antes de iniciarem um processo, advogados de Doria estão pedindo para usuários do Facebook alterarem conteúdos que possam ferir os sentimentos do prefeito. Uma notificação extrajudicial que, na prática, funciona como censura prévia. Guilherme Coelho usou seu Facebook para criticar Doria por cortar o ponto dos grevistas e recebeu esse pedido gentil através das mensagens particulares do Facebook:

“Prezado Dr. Guilherme, tudo bem? Em consulta à sua página do Facebook, verifiquei a existência de um ‘post’ sobre o direito constitucional à greve em que há menção a João Doria. Como faço parte da equipe jurídica do João, eu gostaria de lhe pedir apenas uma gentileza: que você retire do texto a parte em que se estimula a ‘ovada’. Você poderia fazer isso? Obrigado e bom final de semana.”

Assim como Le Penn e Macron receberam ovadas de protesto nas eleições francesas, Guilherme sugeriu o mesmo para o prefeito, que chama os grevistas de “preguiçosos”, “vagabundos”, “que não merecem respeito”. É assim que o prefeito se dirige aos trabalhadores que exerceram um direito constitucional.

Mas, convenhamos, os advogados têm certa razão em se preocupar. Se uma bolinha de papel já levou político experiente ao hospital para fazer tomografia, pode-se imaginar a alta periculosidade de uma ovada no gestor.

Diante da notificação do advogado, Guilherme decidiu alterar o conteúdo da postagem para evitar uma briga judicial com um homem rico e poderoso. É compreensível. Todos sabemos o peso que isso tem na Justiça brasileira, haja vista seu histórico.

Segundo o escritório de advocacia de Doria, que curiosamente pertencia ao seu secretário municipal de Negócios Jurídicos até ele assumir o cargo, não há nenhum monitoramento das críticas nas redes sociais. As denúncias são enviadas por “simpatizantes de Doria”. Ou seja, os advogados descobrem tudo através de uma rede de caguetas. Espanta a similaridade com 1984, de George Orwell.

E não é a primeira vez que Doria recorre à Justiça contra seus críticos na internet. Ele já pediu a retirada de um evento criado no Facebook chamado “Virada Cultural na Casa de João Dorian” – um protesto contra as mudanças que desfiguraram o tradicional evento paulistano. Também solicitou que fossem fornecidos os IPs dos autores. O juiz não aceitou o pedido de remoção da página, porque considerou legal a manifestação, mas permitiu a divulgação dos IPs – uma flagrante violação do Marco Civil, que determina que os registros dos usuários sejam divulgados apenas em casos de indícios de crime. Era tudo o que Doria precisava para seus planos de intimidação.

É claro que todas as críticas devem respeitar os limites da lei. Mas em um regime democrático, uma pessoa pública, um governante, deve estar preparado e ser tolerante com as críticas mais ácidas. Querer jogar tudo para o campo judicial e torcer para que o juiz decida se é calúnia, difamação ou não apenas revela a pequenez e o pouco espírito democrático do político. Dilma, por exemplo, apanhou muito mais nas redes sociais durante o processo de impeachment e aguentou firme, sem espernear como Doria. Teve sua imagem associada até à pornografia, mas nunca processou ninguém.

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Prefeito joga no chão as flores de protesto que recebeu de cicloativista (TV Globo/Reprodução)

O gestor demonstra enorme dificuldades em lidar com as críticas, provando que, como político, ele é um excelente marqueteiro. Mas nem sempre o marketing é capaz de substituir a política. Com frequência, Doria se envolve em bate-boca na rua, responde manifestações contrárias com agressividade e faz promessas pirotécnicas que não será capaz de cumprir.

Outro exemplo da falta de traquejo político foi a demissão da secretária Soninha, feita através de uma transmissão ao vivo pelo Facebook. A impressão é que ele administra o município como uma empresa – ou um reality show – e confunde cidadãos com funcionários. É um patrãozinho bravo que ainda pensa estar apresentando O Aprendiz.

No dia 10 de abril, o prefeito participou em Porto Alegre do – contenha o riso! – Fórum da Liberdade. Lá apresentou seus feitos revolucionários na saúde paulistana, com números que deixaram todos boquiabertos. Mas aí a Agência Lupa, que faz checagem de dados, passou o pente fino no discurso marqueteiro do prefeito e refutou praticamente todas as informações prestadas. Os dados apresentados foram classificados como “exagerado”, “contraditório” e “insustentável” – uma trinca de adjetivos perfeita para qualificar a gestão do gestor que faz política jurando não ser político, mas que já mira as eleições presidenciais.  Como diz Criolo em seu novo disco, “meninos mimados não podem reger a nação”.

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Redação

19 Comentários

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  1. Comentário.

    É só eu assistir ao Jornal da Cultura que esse papo de não haver polarização cai por terra.

    Mas, como diria um amigo, meu, não há polarização. Afinal, precisariam de dois lados. E lá tem um só.

  2. Comentário.

    Quer dizer, só se pode descrever objetivamente a respeito do que aconteceu de fato na época em que o sr. Doria esteve à frente da Embratur.

    Entendi, entendi tudo!

    1. leve desvio

      Pobre no mercado rouba uma laranja, e… vai preso.

      Rico desvia (desvia) 6,5 milhões, seis milhões e meio, e…vira celebridade !

  3. O ramo do Grupo Doria é

    O ramo do Grupo Doria é comunicação e marketing.
    É o que diz no Google.
    Não produz nada, nem gera empregos.
    Promove eventos para apresentar e confraternizar empresários ricos e políticos.
    Os relacionamentos dali nascidos visam a concretização de negócios.
    Os lucros do Grupo Doria vem das intermediações dessas negociações.
    Doria quer privatizar todas as atividades do governo.
    Assim, posso concluir que nesses eventos:
    – políticos explicarão aos empresários quais serviços contratarão;
    – empresários montarão empresas capacitadas para realizar esses serviços;
    – os funcionários serão contratados através de terceirizadoras;
    – a prioridade para contratação será dada aos funcionários indicados pelos políticos; 
    – os políticos também determinarão os salários a serem pagos aos seus indicados;
    – a parcela da classe média composta por funcionários públicos será extinta;
    – em seu lugar teremos uma classe média e rica composta por terceirizados indicados pelos políticos para funções qualificadas; e
    – uma classe baixa composta por terceirizados indicados pelos políticos para as funções básicas, muito mais fiéis ao partido/politico que o indicou, do que supostamente o são os beneficiários do Bolsa Família;
    – Doria, como gestor honesto e competente que é, cuidará para que esse novo esquema não custe mais caro para o governo do que a contratação de funcionários públicos por concurso;
    – só quem criticará esse projeto serão os esquerdopatas e os petralhas, sempre dispostos a sabotar a modernização do Brasil.

  4. Caso do Guilherme Coelho

    Se alguém sugerisse tacar uma ovada no Lula eu acharia ruim, a maioria dos comentaristas do blog acharia ruim. Por mais que Doria mereça e sua fala sobre os trabalhadores seja indefensável, sugerir publicamente que joguem ovos nele é no mínimo algo muito discutível. Se eu fosse uma figura pública de grande exposição e alguém sugerisse nas redes sociais que me dessem ovadas eu me sentiria no pleno direito de iniciar uma briga judicial nesse caso.

    Nesse caso ficou pior ainda para o Guilherme Coelho pegar pesado e depois ter que recuar. Isso fragiliza a esquerda como um todo, dá ao Dória o argumento de que tinha razão, tanto que o Guilherme recuou. Isso alimenta a claque do Dória e dá a eles e ao seu ídolo um aumento da sensação de poder. Se o Guilherme tivesse feito uma crítica dura mas sem sugerir agressões físicas (uma ovada é sim uma agressão. Se você nunca tomou uma não sabe como doi e machuca), não teria de recurar e Doria teria de engolir a crítica dura calado.

    De resto, irretocável o texto acima.

  5. a cruzada….

    Dória é uma invenção da centro-esquerda e da esquerda paulista, Depois de incompetência atrás de incompetência. Fracasso atrás de fracasso, agora sem mais argumento, para distrair a socedade, começam a apresentar seus palhaços: Dória, Haddad, Hulk…. Deste picadeiro pode até sair o próximo candidato à Presidência. Quando achavamos que não poderia se afundar mais?! (P.S. Mas uma atitude deve se louvar sobre Dória, que fiquei sabendo hoje, irá derrubar aquela aberração de muro que outro incompetente chamado Mario Covas mandou colocar na frente da raia olimpica da USP. Parabéns. Aproveite e dê à USP,  portarias dignas da maior universidade da Am. Latina, principalmente aquela saída/pinguela na lateral da Marginal Pinheiros que dá acesso a estação de trem do outro lado da marginal.  Funviona´rios e alunos merecem pelo menos uma via coberta e iluminada na lateral da ponte da Cidade Universitária até a estação. Pessoal da FAU, cadê vocês? 

    1. a….

      E aproveitando a matéria, já que o Dória teve um lapso de bom senso, construa ciclovias no lugar mais óbvio, necessário e útil para se ter ciclovias. Nas laterais das Marginais Tiete e Pinheiros. 120 Kms de vias totalmente planas,  interligando toda a cidade, como já existe embaixo dos estúdios da RGT, para fazer propaganda enquanto agrada “gente diferenciada” dos Jardins. E aproveite e estenda a ferrovia existente neste lugar para o restante das marginais, iguais na “média” com os estúdios da tal. É muito fácil resolver os problemas de São Paulo. É só querer. É só acordar cedo e trabalhar, playboy.    

  6. Personagens fictícios

    Já que não se pode usar o nome de “Você_sabe_quem” nas críticas, proponho criar um personagem (obviamente fictício) para direcionar nossas críticas: o Cudeveludo. Esse tal personagem fictício certamente ficará conhecido para todo o sempre por esse nome, neste mundo de ficção em que vivemos. Por ser um personagem de ficção fica, desde já, aqui declarado que qualquer semelhança com qualquer personagem real ou “fake” é apenas uma infeliz e patética coincidência.

    Assim, todos estarão livres para criticar ou até mesmo fazer campanhas: “Cudeveludo para presidente”.

    Da mesma forma, podemos criar outros personagens fictícios (se já não tiverem sido criados) tais como o Santo, o Careca, o Mineirinho, o Vizinho, o Mateus,  o Baiacú, o Todo-Feio, o Cagatoga, o Powerpoint etc.

  7. Acho que se dá muita

    Acho que se dá muita importância a pessoas pequenas como esse prefeito do São Paulo. Ele não é nada, não representa nada e nada acrescenta. Porém, o pessoal de esquerda como sempre, fica dando publicidade a naninicos, como fizemos com o extra nanico bolsonazi e agora o vemos crescer nas pesquisas. Essas pessoas deveriam ser apenas ignoradas. Deixá-las em seus verdadeiros lugares: O nada.

    1. Não é bem assim..

      É preciso mostrar o contraditório do marketeiro.
      Ou, você acredita que Collor cresceu e ganhou uma eleição como? Na época, ele tinha muita propaganda a favor, veiculada pela globo, pela revista veja e outras mídias. Não havia contraditório. Não era possível desmentir o marketing de Collor, porque, para fazê-lo, seria necessário publicar algo na própria mídia, na veja e desmentir a globo. Algo complicadíssimo para a época.

      Se não fosse os tantos esclarecimentos que leio na mídia alternativa, eu também estaria considerando Dória um excelente prefeito.

  8. “O gestor demonstra enorme

    “O gestor demonstra enorme dificuldades em lidar com as críticas”

    O gestor, como TODO membro da direita mundial, demonstra enormes dificuldades em lidar com seu gigantesco e merecidissimo complexo de inferioridade, isso sim.

    Vide Temer, Aecio, Serra, etc.

    Antes fosse so no Brasil:  Trump passou dois meses insistindo que a evidencia fotografica estava errada e que a “multidao” da inauguracao dele era maior que a da inauguracao de Obama.

    >Entao ta…

  9. Ditadura é assim mesmo.
    E

    Ditadura é assim mesmo.

    E quem viveu a anterior se lembra de que, por óbvio que seja, jamais os ditadores assumiram que aquilo era uma ditadura. Dessa vez parece que não há tanques de guerra na rua. Mas isso é só aparência, as PMs vêm fazendo esse trabalho.

    A meu ver estamos sob ditadura aberta, escancarada.

  10. Doriana

    Faz um mal desgraçado, mas a propaganda é uma maravilha.

    Ah, esse mininu João Agripino não tem jeito mesmo.

    Ovada não pode!

    Contenha o riso………..

    …………………………….

    huashuashuashuashuashuash

    kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

     não deu, foi mal aeh agripino

     

     

  11. Dória enganou muitos

    Dória enganou muitos trouxinhas ao se apresentar como trabalhador, exibindo carteira de trabalho como prova de que teria começado a trabalhar aos 13 anos: só não disse que trabalhava na fábrica da familia, ou seja, era burgues – dono de meios de produção –  e não trabalhador. Era burguês, como sempre foi, tendo sido sincero, ou seja, ele mesmo, quando dias atrás chamou de vagabundos quem faz greve. Doria é burguês e não trabalhador.  Entenda quem é trabalhador e quem é burguês

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=XU0XCuFzchE%5D

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