À imitação de Jim Jones, por Mino Carta

Da Carta Capital

À imitação de Jim Jones

Mino Carta

O espetáculo de insensatez, hipocrisia e prepotência prossegue implacável. E o drama desliza para a tragédia

Dúvidas, incógnitas, dilemas se apinham nesta nossa terra infeliz, embora destinada à felicidade, e não me refiro à importância da mandioca. Por que figuras como os presidentes das duas maiores empreiteiras do País, com endereço certo e sabido, são presos sob acusação a ser provada? E por que o Supremo não se manifesta a respeito: conivência ou covardia? Ou o ministro da Justiça, infatigável em suas omissões: covardia ou incompetência? Ah, sim, a Justiça na versão brasileira…

Vamos lá, este é só o começo. Por que Câmara e Senado são os domínios de dois sátrapas de passado largamente duvidoso? Incompetência do próprio Poder Legislativo e, também, clamorosa, do Executivo? E, na indagação, não caberia também a covardia?

Em frente. Por que setores da Polícia Federal se prestam a um jogo que desrespeita princípios básicos da Justiça e serve à casa-grande? Por ignorância, sincero reacionarismo ou ódio de classe? Ódio ao PT, portanto, na crença granítica e definitiva de seu esquerdismo?

E ainda. Por que a mídia permanece em campanha maciça contra o governo, na tentativa de justificar tanto a ideia do impeachment da presidenta quanto o envolvimento de Lula na Lava Jato? E que mudaria em relação à crise econômica e à insensatez dominante se afastadas Dilma e a ameaça de retorno de Lula em 2018? Por que, a despeito da minha aversão a teorias conspiratórias, às vezes sou assaltado por turvas suspeitas?

E por que o senador José Serra reedita o velho projeto tucano de privatização da Petrobras ao visar agora o pré-sal? Serra anos atrás declarava-se, em benefício dos meus ouvidos, mais esquerdista que Lula: estaria eu de escuta equivocada e a palavra seria entreguista? Por que o tucanato aprecia tanto as privatizações, quem sabe na esteira daquela das comunicações comandada por Fernando Henrique, a maior e mais escancarada roubalheira da história do País? Privatizar o pré-sal não configura puro entreguismo, a rendosa genuflexão do súdito?

Prossigo. Por que o noticiário das falcatruas da Fifa, de reconhecida inspiração brasileira, sumiram do noticiário das Organizações Globo, donas de um poder único na história mundial? Valeria dirigir a pergunta ao senhor Hawilla da Traffic (nome excelente, diga-se)? Será que, como Marco Polo Del Nero, os filhos do colega Roberto Marinho se abalariam a viajar ao exterior? E por que o resto da mídia não se interessa pelo assunto?

 Adiante. Por que o ministro Mercadante, bom de discurso, como sublinha Lula, não sai País afora para defender o governo diuturnamente agredido? E por falar no governo, por que aumentar os juros na conjuntura dramática que atravessamos? E por que Dilma descumpre as promessas da campanha eleitoral, como diz Lula com todas as letras?

O ex-presidente, aquele cujo retorno em 2018 se tornou pesadelo da casa-grande, no último dia decidiu falar, e fez a oportuna autocrítica do PT, que seria da competência, do próprio, hesitante partido. É bom que Lula fale, porque até ontem, no vácuo do seu silêncio, a mídia tratou de colocar-lhe na boca palavras jamais pronunciadas, ou inventar situações jamais ocorridas.

 Por exemplo, após a fala sobre o “volume morto” em que Dilma e ele teriam caído no momento, de verdade ouvida em um encontro do ex-presidente com religiosos. Bordou-se a partir daí, nas páginas impressas, no vídeo e pelos microfones radiofônicos, a história do dissabor da presidenta, duramente alvejada pela frase do criador. Não é que os barões midiáticos e seus sabujos primem pela imaginação. De todo modo, o enredo é outro. Foi Lula, dias atrás, quem levou a Brasília para uma conversa com Dilma uma pesquisa que mostrava a queda de ambos na preferência popular. Para comentar: “Companheira, estamos no volume morto”.

Se Lula se dispõe a dizer o que pensa, tira a bala da boca das crianças fantasiosas, desobedientes contumazes à verdade factual. Melhor inventar, ou silenciar a respeito das mazelas tucanas, e mesmo das patetices. Fernando Henrique Cardoso, diante de uma plateia que o encara como o Oráculo de Delfos, admite que também seu instituto, igual ao de Lula, recebeu doações de várias empresas, com a diferença seguinte: “Nós não fazemos política”.

E a plateia? Engole, como se não fosse político todo gesto ou palavra de FHC. Sem contar que o inefável esquece ter recebido uma doação de uma empresa pública, a Sabesp, que lida com o dinheiro de todos nós, e, isto sim, é totalmente irregular. Para dizer pouco. Mas quem se incomoda, em meio a um festival de desfaçatez e hipocrisia?

Gostaria, aliás, de ter lido, além da informação correta, também algum saboroso comentário a respeito da patética aventura venezuelana de um grupelho de senadores tucanos e democratas, mais um peemedebista, um do PPS e outro do PSD, Sérgio Petecão (mais um nome excelente). Visitavam Caracas, para apurar os atentados aos direitos humanos cometidos pela corja bolivariana, sem terem dado até hoje mostras de se preocupar com o comportamento pífio da nossa Comissão dita da Verdade e com a confirmação, tudo indicaad aeternitatem, de uma lei da anistia imposta pela ditadura.

Permaneceram em Caracas nada além de seis horas, regressaram pomposamente ao pretender terem sido barrados a caminho do centro da cidade por um engarrafamento de trânsito provocado para tanto e por uma manifestação convocada para apedrejá-los. Do ataque e das pedras falta qualquer prova, quanto ao engarrafamento, de fato houve, provocado, no entanto, pelo trânsito indiferente, infenso ao mais tênue propósito político. Em outros tempos, o episódio patético teria merecido relatos humorísticos, hoje impedidos, creio eu, pelo emburrecimento progressivo.

Refiro-me à época em que uma marchinha carnavalesca cantava tirou o seu anel de doutor/ para não dar o que falar/, a PRK-30 era um impagável programa radiofônico, Millôr Fernandes nos brindava com seu Pif Paf e Péricles com o Amigo da Onça em O Cruzeiro, Silveira Sampaio ridicularizava os graúdos sem perder a elegância e enfim chegaria Chico Anysio com seu extraordinário Show. Refiro-me apenas a alguns exemplos de refinado humor.

Nada sobrou. A quadra atual é macambúzia, a cerração tão densa que já não enxergamos o Cruzeiro do Sul e, logo abaixo, Castor e Pólux. É o breu, e nele estão claras apenas a falta de liderança, aterradora, e a insensatez e a ignorância da maioria, a repetir, multiplicado ao inverossímil, o fenômeno que redundou no suicídio coletivo liderado, décadas atrás, por certo e malfadado Jim Jones.

A lembrança da tragédia, absurda até a estupidez, sugere-me, entre tantas, mais uma pergunta: se a lei prevê um acordo de leniência, por que não aplicá-lo se preciso for, a bem do País, no caso das empreiteiras envolvidas na Lava Jato? Provadas as acusações, punam-se os culpados, está claro, e sem concessões ou resguardos. Salvem-se, porém, as empresas, que garantem trabalho e progresso. 

 

Redação

12 Comentários

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  1. Pelo visto não sou o único a

    Pelo visto não sou o único a notar que Mercadante não faz absolutamente NADA no Governo.

    Vai para SP ajudar o Haddad!

     

  2. O Brasil é um país inovador

    O Brasil é um país inovador Mino.

    Continua tendo uma Justiça inisenta. Uma polícia partidarizada. E dois direitos: o dos tucanos de governar sem votos e o dos petistas e seus aliados irem para a jaula sem provas. 

    Tradição. 

    O Estado foi construído como instrumento de exclusão (de índios, negros, colonos pobres e negros fugidos durante a Colônia e Império; de anarquistas, sindicalistas, socialistas, comunistas e descontentes nas diversas Repúblicas que tivemos; e de petistas na atualidade). A repressão aos ricos é uma novidade que impede a conciliação das elites.Fato que você não notou.

    Pode este Estado sobreviver à guerra aberta das elites? Esta meu caro é a verdadeira pergunta.

    Sérgio Moro paraliza as construtoras que prestam serviço para as Forças Armadas. Alguém ficará surpreso se ele sofrer um acidente “verde-oliva” como Zuzu Angel?

  3. Já os EUA sabem muito bem proteger suas empresas

    Já os EUA protegem suas empresas, mesmo que cometam crimes  como o de contrabando de pedras de esmeralda baiana, no valor de uns 400 milhões de reais.   “O Estado brasileiro se declarou legítimo proprietário da Esmeralda Bahia, mas a Suprema Corte de Los Angeles decidiu em favor da empresa FM Holdings.” O máximo que a Justiça Americana garantiu até agora foi a apreensão das pedras de esmeralda até que o processo seja concluido. Como o Judiciário brasileiro teria agido no caso de furto praticado por empresa nacional nos EUA? Prenderia o executivo e fecharia a empresa.  A Justiça americana é bem rápida, sabemos disso, porém este rola por lá há anos desde o começo deste século. A pedido da AGU, governo e Justiça dos EUA determinam bloqueio da Esmeralda Bahia, o que não quer dizer que a FM Holdings tenha perdido a causa apesar do crime cometido.

    http://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/335973

     

    1. nao entendi!!
       
      Entao devemos

      nao entendi!!

       

      Entao devemos bater palamas a empresa e ajustica americana que sob  a desculpa de proteger suas empresas, nao da bola para os argumentos dos  reclamantes brasileiros??

      Entao para proteger as empresas, nada de justica, “vamos continuar fazendo o que fazemos porque senao teremos um cataclisma

       

       

      Nao e o procedimento que sempre criticamos do capitalismo?

      Quer dizer o capitalismo eo grande sata, mas quando for para proteger nossos socios/parceiros  ele tem recursos muito inteligentes e devemos usa-los, contra os sevangens sulamericanos?

      Um pouco de coerencia noa faria mal a ninguem.

      Podemos ver quase quebrar a Petrobras, patrimonio de decadas de todos os brasileiros, mas como ela é vitima nao é agente ela pode quebrar.

      As emresas envolvidas na sua quebradeira com corrupcao, subornos, superfaturamentos  etc  claro que nao podem quebrar, ai teremos um cataclisma que fara muito mal ao pais.

      Menos hipocrisia.

      A maioria destas empreiteiras podem ser facilmente substituidas por outras.

      Onde estao CR Almeida do Don Cicero?

      A Delta dos guardanapos em Paris?

      a Grande Mendes Junior?

      E o pais quebrou?  Náo so subsituiu por outras mais ao gosto dos novos donos do poder, que agora auxiliados pelos seus subsmissos simpatizantes, dizem que o pais vai perder muito ou quebrar  se elas forem responsablizadas.

       

      O que é uma empresa  coo a Odebrecht sem os seus donos?  Quer dizer que ela tem vida propria e seus donos sao apenas uma direcao como outros executivos contratdos nomercado que seguem as ordens de?????

      Menos hipocrisia e cara de pau. Se as empresas sao a cara de sesu donos, se les mandam e desmanadam, se eles ficaram bilionários com a acao delituosa delas, como dissocia-los??

       

  4. Descrição irretocável

    Do nosso circo dos horrores (ou teatro do absurdo) de cada dia. Tantas são as perguntas lançadas no vácuo da nossa incredulidade que a menção de Jim Jones não é nenhum exagero, infelizmente.

  5. Mino e desesperança

    Não que a cronica de Mino deixe de conter fiel retrato do podre do Brasil., mas, entre nossas desventuras do presente e o amanhã temos uma noite para arrumar boa parte destes descalabros. O ensinamento de Chico Buarque, no “apesar de você” nos dá esta esperança.

  6. Desconhecimento

    Mino Carta apontando as supostas falhas em nossa justiça no caso da prisão de empreiteiros. O mote neste caso é que o juiz tem motivação política em suas decisões intespestivas e açodadas, Os jornalistas ditos de esquerda igualmente estão apressados em seus julgamentos . É sabido pela imprensa do quanto há de suspeição em todos os contratos que envolvem licitações .Isto já foi demonstrado jornalisticamente em várias oportunidades.O caso mais emblemático foi provado por Jânio de Freitas na década de 1980. Também ninguém desconhece que a corrupção no país é descomunal. Nada mais justo que haja uma investigação implacável para derrotar este feroz inimigo da nação.

  7. Pergunta: “A lembrança da

    Pergunta: “A lembrança da tragédia, absurda até a estupidez, sugere-me, entre tantas, mais uma pergunta: se a lei prevê um acordo de leniência, por que não aplicá-lo se preciso for, a bem do País, no caso das empreiteiras envolvidas na Lava Jato?

    Resposta: “A quadra atual é macambúzia, a cerração tão densa que já não enxergamos o Cruzeiro do Sul e, logo abaixo, Castor e Pólux. É o breu, e nele estão claras apenas a falta de liderança, aterradora, e a insensatez e a ignorância da maioria, a repetir, multiplicado ao inverossímil, o fenômeno que redundou no suicídio coletivo liderado, décadas atrás, por certo e malfadado Jim Jones.”

    Comentário: Se depender da guantânamo do paraná, esteremos todos f………..

    Aliás, o estado do paraná parece mais uma fazenda mal administrada da familia richa.

  8. Republicanismo no dos outros

    Dificil entender o PT. Primeiro o PT estimula o “republicanismo”. Depois, quando este mesmo pensamento se volta contra o partido e o país, eles condenam o que eles mesmos ajudaram a criar..

    É como se um governo desguarnecesse as defesas do país por completo, e escancarasse as portas para que os inimigos pudessem entrar. Aí, logicamente os inimigos entraram. E arruinaram o país, e o governo. Seria a culpa só dos inimigos? Ou o “republicanismo” também teria sua parcela de culpa?

    Seria bom lembrar aqui que JB fez escola. Moro seguiu os passos de seu mestre, e fez além dele. Pois JB se contentou em prender petistas, Mas Moro quis superar seu mestre, além de prender, multou pesadamente empresas, e algemou empresários. Quem sabe se daqui por diante surgirão mais discipulos de JB tentando superar mais ainda ambos em severidade?

     

    ” Nunca é demais, lembrar que quem nomeou JB foi Lula”.

     

     

    Nestas horas é possível até entender por que FHC nomeou Brindeiro para o cargo de procurador geral da República. O Presidente FHC pode ter sido péssimo, mas sua equipe era sincronizada com as ordens dele, a disciplina e hierarquia não permitiam que algo acontecesse sem a ordem de cima.

    E por favor, não me venham com o argumento de que Lula não tinha como escolher outro, que foi obrigado a escolher JB. Pois até FHC quando quis, soube encontrar um Gilmar Mendes, fiel àquele que o nomeou.

    “Para aquele que não sabe navegar, todo mar é de tempestade”

  9. Mercadante e Plano Collor

    Há de haver quem seja daqueles tempos. Aliás, nada distantes.

    1990, meados de março, Collor de Mello assume a presidência, e no dia seguinte ao da posse (se não me engano), é anunciado o tristemente famoso “Plano Collor”. 

    Em meio à perplexidade daquele dia, algumas autoridades ou figuras públicas de expressão foram entrevistadas ao vivo na TV. 

    Não sei se o vídeo ainda existe. Não procurei na Internet. O que ocorreu, para os que não ainda não sabem, é que o senador Mercadante, hoje Chefe da Casa Civil, deu seu aval de economista ao caótico arremedo de plano. Disse, se não me engano, que alguma coisa do gênero deveria ter sido feito. 

    Se foi ou não pela amizade que teria com a Zélia Cardoso de Melo, não sei. 

    Pouco importa, também, convenhamos. 

    O absurdo – creio que a adesão pode ter sido até mais explícita – já havia sido dito. 

    Aloísio Mercadante. Este é ele. 

     

     

     

  10. Festa da Rede Globo

    A genialidade do extraordinário Jornalista, na sua linguagem erudita e precisa, calcada na experiência de muitas décadas, como eximio observador, deixou passar um acontecimento para lá de relevante. A Presidenta refestelando-se no rega-bofe dos marinhos, na comemoração dos 50 anos de vergonha Nacional, de imposições, de agressões, inclusive afronta desrespeitosa durante a campanha pela dupla Patriota e Boner. 

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