Castelo Branco e Michel Temer, vidas paralelas, por Fábio de Oliveira Ribeiro

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Castelo Branco era, em 1964, o militar mais respeitado no Brasil. Apesar de participar discretamente da conspiração para encerrar o ciclo democrático iniciado em 1946, ele não se comprometeu publicamente com o golpe de estado. De fato, após a a presidência do Brasil ser declarada vaga, Castelo Branco surgiu em trajes civis como uma liderança de consenso para comandar o novo regime.

Todavia, desde 1962 Castelo Branco vinha sendo cortejado pelo adido militar da Embaixada dos EUA. Os documentos e gravações oficiais do governo Lyndon Johnson liberados revelam que o marechal era considerado o substituto de João Goulart desejado pela Casa Branca se o golpe articulado por Abraham Lincoln Gordon  vingasse. O golpe vingou e Castelo Branco foi o grande beneficiário da quartelada comandada pelo General Mourão.

Segundo Luiz Alberto Moniz Bandeira (Presença dos Estados Unidos no Brasil), o governo Castelo Branco se caracterizou por uma aproximação exagerada entre o Brasil e os EUA. No princípio da ditadura militar agentes governamentais norte-americanos circulavam livremente pelos Ministérios e influenciavam as políticas públicas que seriam adotadas pelo nosso país. Castelo Branco também é censurado porque adquiriu o costume desagradável de discutir questões sensíveis e até sigilosas com seus amigos da embaixada dos EUA. A morte dele colocou um fim neste ciclo de submissão incondicional ao império norte-americano.

Como Castelo Branco, Michel Temer também se aproximou da Embaixada dos EUA antes de dar o golpe de 2016. Ao aderir ao neoliberalismo, ele também deve ter sido considerado o líder natural do regime que seria implantado após a derrubada de Dilma Rousseff. A dupla Eduardo Cunha/Aécio Neves agiram exatamente como o General Mourão. Enquanto ambos atacavam frontalmente o PT e a presidenta legítima do país, Temer ficou nas sombras como Castelo Branco preparando-se para emergir no momento adequado.

Os EUA reconheceram imediatamente a legitimidade do golpe de 1964. O golpe de 2016 parece não estar dirigido por Barack Obama. Ele não telefonou para Michel Temer felicitando-o por ter chegado ao poder. Antes da votação do Impedimento fraudulento pelo Senado, Obama transferiu a Embaixadora que se aproximou de Michel Temer. Não só isto, até o presente momento o presidente dos EUA se recusou a endossar publicamente o afastamento de Dilma Rousseff, ele sequer compareceu à abertura das Olimpíadas. Além disto, a crítica parlamentar e jornalística ao golpe de 2016 está se tornando um fato consumado nos EUA. Tudo isto sugere que o assalto ao poder no Brasil não foi necessariamente desejado ou tramado pela Casa Branca como em 1964.

Após o golpe de 1964 o General Mourão foi esquecido. Michel Temer não pode esquecer a Eduardo Cunha e Aécio Neves. O primeiro comanda informalmente quase a metade da Câmara dos Deputados e, ao que tudo indica, parece estar em condições de chantagear o presidente interino. Aécio Neves é presidente do PSDB e senador por Minas Gerais. O voto dele no Senado pode ser decisivo para sacramentar a queda de Dilma Rousseff. As manobras de Gilmar Mendes para salvar seu protegido no senado certamente contam com a aprovação do interino.

A morte acidental prematura de Castelo Branco interrompeu as relações promiscuas entre o Brasil e os EUA. Michel parece temer um fim semelhante ao de seu duplo. O interino tem se distanciado de tudo e de todos. Ele prefere ficar em segurança no Palácio do Planalto, sempre cercado dos soldados em que pode confiar. Castelo Branco sabia que não podia dar confiança para os militares ultranacionalistas, mas ele não foi capaz de impedi-los de chegar ao poder em 1968.

Consolidado o golpe, os temores do interino não irão se dissipar. Muito pelo contrário, o mais provável é que Michel Temer se torne extremamente paranoico. O problema do Brasil pós-Dilma é, portanto, evidente. Governantes que alimentam o temor de morrer como seus duplos históricos raramente conseguem agir de maneira racional, tolerante e moderada.

Michel Temer é, sem dúvida alguma, um clone civil de Castelo Branco. Mas ao contrário do seu duplo, Temer não governará com autoconfiança, nem inspirará esperança na população. Assim que for definitivamente entronizado, o vice de Dilma Rousseff começará a ver inimigos nas sombras e a perseguir quem ousar desaprovar as decisões presidenciais. A menor crítica será considerada um prenúncio de conspiração política ou sedição terrorista. Qualquer desobediência será interpretada como um ato de rebelião intolerável. Sob o temeroso Michel, o Estado rapidamente se transformará numa máquina implacável de repressão política. O Direito Penal do inimigo será deixado de lado, pois o inimigo não pode ter direito algum.

Ao votar em favor do Impedimento, os senadores não estarão apenas condenando Dilma Rousseff mediante fraude. Eles condenarão o Brasil a se transformar numa tirania repressiva comandada por um homem dominado pelo medo da morte violenta. A conta terá que ser paga pelos eleitores, pelos filhos e netos dos senadores que levarem Michel Temer ao poder. Se é isto que eles desejam, assim seja. Eu não lamentarei as desgraças que os senadores causarão às suas próprias famílias.

Castelo Branco pode ter morrido porque resistiu à ala militar que desejava reprimir com mais rigor os brasileiros que exigiam a imediata redemocratização do Brasil. Michel Temer será o instrumento da repressão em escala industrial que vários comandantes militares não desejam. Eles são duplos históricos sim, mas operam em sentidos opostos. A história é quase sempre paradoxal. Em 1964 o mundo estava mergulhado na Guerra Fria e tolerou a tirania brasileira. Em 2016 o mundo anseia pela democracia que está chegando ao fim no Brasil isto se o próprio Brasil não chegar ao fim ao se fragmentar.

Fábio de Oliveira Ribeiro

8 Comentários

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  1. A lógica é simples: o golpe

    A lógica é simples: o golpe dentro do golpe já começou, e os tucanos serão os primeiros expulsos do banquete pós-impeachment. Chega 2018, Temer com 0% de popularidade, vai passar o bastão pra quem? Todos eleitoralmente viáveis serão oposição. Conclusão: nada de eleição,ditadura e fim de papo.

     

    A questão é: Quem vai bancar a repressão? Falta combinar com os russos, digo os militares. Não acho que estão dispostos a fazer o jogo sujo novamente. 

    1. A lógica é simples: o golpe

      Bem ao contrário.

      O golpe dentro do golpe levará os tucanos et caterva ao poder.

      Aliás já estão sinalizando a não concordância com as medidas de Termer, verdadeiramente suicidas, e falando em não apoiá-lo APÓS o impeachment.

      Saindo Temer via TSE ou vazajato, entra o Maia como presidente da câmara, minúsculas, e prepara-se uma eleição indireta para o restante ou inviabiliza-se os candidatos não aceitáveis.

      Mais claro só desenhando.

      1. os tucanos entram nessa

        os tucanos entram nessa história como o Lacerda em 64. Serviu pro golpe, depois rua, exílio, lixo.

        O Tucanato só tinha representatividade pros donos do poder quando serviam de anti-PT. Agora, não servem pra mais nada. O que importa mesmo, Meirelles, Goldfajn e a turminha toda já estão lá. 

  2. Das semelhanças entre Castelo

    Das semelhanças entre Castelo e Temer, será que outra virá, e talvez a mais deplorável? Refiro-me ao fato de que Castelo prometeu assumir a Presidência para entregá-la posteriormente a um civil. 

    Temer não está precoupado com as eleições de 2018, o que o coloca distante da política democrática, na medida em que não tem compromissos com votos, e, por conseguinte, com o povo. Por isso, fazer a analogia entre ele e Castelo como um próximo ditador não é tão impossível assim. Os congressistas estão dispostos até a aprovar emendas constitucionais, sobretudo se Cunha voltar ao seu posto, o que não está fora de cogitações.

    A paranoia, a meu ver, já se faz presente. Temer sabe, como todo homem maduro, experiente na política, que não está lidando com crianças inocentes. Os que sustentam sua base são tão hipócritas e traíras quanto ele. 

    Será que Requião está profetizando quando entende que o caminho desse imbróglio é uma guerra civil?

     

  3. Duvidas…

    Queira ou não queira o Brasil pós-1964 tinha um norte econômico, ampliar a industrialização com a substituição da importação. Assim a ampliação de investimento em infraestrutura – estradas, hidrelétricas e siderúrgicas – permitiram que uma parte da população, não só a classe média, terem empregos e um certo confortos social. Aliado a isso houve uma necessidade de ampliação do ensino superior, não associado ao ensino fundamental, que beneficiou a classe média. Talvez por isso a população de maneira geral foi indiferente ao movimento de resistência-guerrilheira, que nunca foi grande. 

    O movimento sindical aumentou, em que a população participou, na década de 1970 desejando manter os benefícios que estavam perdendo. Curiosamente através de São Paulo.

    O que Temer e o mercado estão propondo é diferente, é um esfacelamento dos benefícios sociais e do emprego. A população e a classe média, estão indiferentes ainda. Suas avaliações é tudo continua a mesma coisa, o culpado é o governo que não me representa. Estão imaginando que não fazendo política tudo irá mudar. Ledo engano. 

    A dúvida é quando o povo e a classe média irão acordar da letargia que se implantou no Brasil? 

     

     

     

  4. castelo….

    Não comparem Castelo Branco com Temer. Isto é coisa da mesma centro esquerda pirada que nos afundou nestes 30 anos.  Os militares se aproximaram dos EUA, para se fortalecer contra lunáticos que queriam impor uma ditadura do proletariado socialista à base da luta armada. Uma sandice, que comunistas históricos afiramarm que só provocou o atraso da democracia no país por mais de1/4 de século.  Quando os americanos tentaram impor seus interesses, os militares industrializaram o país, alavancaram obras de infra estrutura, aumentaram nosso poder de defesa e investiram na soberania energética e nuclear. Temer apoiado por uma parte da centro esquerda, principalmente psdb, a famosa República da USP, a economia da PUC/RJ, de ideais e idéias pseudo-socialistas, está traindo todos os principios que jurarm defender e que embasaram suas carreiras politicas. Sartre que era tão mencionado nas exposições ideológicas desta gente, deve estar se revirando no caixão.  É puro entreguismo. Não tem ao menos nem uma estratégia politica nacional por trás de tal crime de lesa-patria. Estão transformando o país num “shopping-center”, tratando soberania, interesses nacionais e o futuro da nação como um produto a ser vendido. Paixões politicas e ideológicas de grupelhos lutando pelo poder a qualquer custo estão destruindo qualquer possibilidade de desenvolvimento nacional, comprometendo qualquer projeto de nação. Erros houverão por parte dos militares, mas nada comparado à desgraça irresponsável do neo-colonialismo, da globalização, do Consenso de Washington, das privatarias que estamos aceitando novamente com Temer e o retorno da politica tucana. 

    1. Castelo Branco e Michel Temer
      Castelo Branco e Michel Temer são semelhantes, pois ambos chegaram ao poder através de um GOLPE DE ESTADO e ambos se colocaram a serviço da Embaixada dos EUA. Os idiotas que se recusam a aceitar esta verdade são os mesmos que apoiam o GOLPE DE ESTADO de 1964 e o de 2016. Castelo Branco morreu logo depois de submeter o Brasil à condição de colônia do Pentágono. O mesmo ocorrerá com Michel Temer? Pequena perda, direi.

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