Cenário: Aécio, um candidato nem tão novo, nem tão popular

Os convencionais do PSDB elegeram um novo presidente, no último domingo (19), e levaram de quebra um candidato à Presidência da República para 2014. O evento partidário colocou toda a máquina do PSDB a serviço da candidatura do senador Aécio Neves e consolidou as alianças internas necessárias para unir um partido desarticulado e enfraquecido por três derrotas presidenciais sucessivas e, antes disso, por oito anos no poder com Fernando Henrique Cardoso (PSDB), onde prevaleceu a estratégia de cooptar quadros de outros partidos para atender exclusivamente a demandas de governo.

Os termos da unidade interna do PSDB e a estratégia eleitoral para 2014 estão montados no reconhecimento de fragilidades do partido, mas trazem em si igualmente uma grande fragilidade e enormes contradições.

Aécio Neves (MG) catalisou os entendimentos entre os diversos grupos, mas numa costura política feita pelos paulistas tucanos – que, se garantem o partido estadual com mais força dentro do PSDB nacional, relativizam em muito a ideia de que a escolha de um candidato mineiro, e a decisão de colocar o partido em suas mãos, será, de fato, uma solução de renovação.

O senador mineiro chega ao palco eleitoral amarrado, por compromisso, à defesa dos governos FHC, que terminaram há 10 anos e simplesmente não estão na memória de um eleitorado jovem que cresceu sob governos inequivocamente mais identificados com setores mais pobres da população – os de Luiz Inácio Lula da Silva e o governo atual, de Dilma Rousseff. Esse compromisso torna difícil que ele seja, de fato, um candidato novo de uma proposta nova, pois condiciona o seu discurso a um período da história do país já superado e que foi rejeitado eleitoralmente em 2002, em 2006 e 2010. O simples compromisso de Aécio com FHC, que foi o grande fiador da articulação nacional para consolidar a sua candidatura, já o torna um candidato velho antes de ir às urnas.

Aécio não poderia abrir mão do eleitor de São Paulo, onde o PSDB de Geraldo Alckmin, FHC e José Serra é hegemônico. Aqui o PSDB não é o novo. E em Minas, o próprio Aécio, que se mantém hegemônico no Estado mesmo depois que o PSDB nacional ruiu eleitoralmente, não é novo. Ele será apresentado ao resto do país como novidade apenas pelo fato de ser mais jovem que os personagens paulistas – apenas por isso, porque ele é tucano há tanto tempo quando FHC, Serra ou Alckmin. Começou muito cedo na política, é fundador do PSDB (que tem 25 anos), desde então é o chefe político mineiro do partido e tem grande peso nas definições do partido nacional desde que a legenda foi criada. Portanto, nem no comando nacional do PSDB Aécio é novidade.

Nos governos FHC, foi líder do PSDB e presidente da Câmara. Junto com o filho de Antonio Carlos Magalhães, Luiz Eduardo Magalhães (PFL), que morreu em 1998, foi o grande articulador parlamentar das chamadas reformas estruturais do governo FHC – Previdência, fim do monopólio estatal na produção e distribuição do petróleo, fim do monopólio na exploração mineral, extinção da diferenciação entre empresas de capital nacional e capital estrangeiro, reforma administrativa, reforma fiscal etc.

O partido apresentará Aécio ao eleitor como “renovação” porque ele é mais jovem que os paulistas e porque ele é menos conhecido nacionalmente que José Serra, Alckmin ou mesmo FHC, que estiveram mais expostos nesse período.

O restante da estratégia eleitoral de Aécio é um reconhecimento de que o PSDB é destituído de organicidade. A proposta é tentar resolver isso, pelo menos para efeito dessas eleições, de fora para dentro, isto é, consolidar a imagem de Aécio Neves nas ruas e, a partir disso, fazê-lo a única referência partidária nacional.

A estratégia se baseia na experiência de construção da imagem nacional do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Inicia-se com as Caravanas Tucanas – que pretendem ser a cópia das Caravanas da Cidadania, que levaram Lula a todos os cantos do país a partir de 1993, depois de sua derrota para Fernando Collor de Mello e antes de sua derrota para FHC nas eleições presidenciais, e se estendeu até 1996. Aécio vai percorrer o país. O PSDB também acha que segue o exemplo de Lula ao tornar Aécio o único porta-voz do partido – desde a criação do PT, Lula é a pessoa central da sua legenda.

O furo dessa estratégia é que ela não leva em conta que Lula não foi meramente um personagem construído para fins eleitorais. Ele é uma figura central no PT porque emprestou ao partido, na sua fundação, a importância que já tinha como líder sindical – e porque o seu legado pessoal foi trazido para dentro como parte de uma articulação de forças progressistas. Lula é um líder atípico para os padrões da política brasileira, porque ele tem carisma e liderança pessoal, mas se integrou ao processo de construção ideológica do partido e nunca desprezou o jogo de forças interno. Na prática, emprestou seu prestígio pessoal para cimentar uma organicidade partidária. Os dois, Lula e PT, cresceram juntos – tanto que o PT, com todos os problemas que teve nos últimos anos, ainda é o partido brasileiro com mais popularidade, segundo as pesquisas de opinião.

Da mesma forma, a ação de Lula nas Caravanas da Cidadania esteve longe de ser pessoal ou meramente eleitoral. Nas andanças pelo país, ele não apenas articulou um partido, como cimentou compromissos com os movimentos sociais. Aliás, se o PT até hoje, mesmo sendo governo de uma ampla coalizão e com enormes dificuldades de atender plenamente a esses movimentos, ainda os mantém em sua base social, é em grande parte por conta do vínculo orgânico estabelecido entre partido e sociedade durante as Caravanas da Cidadania.

Na imitação de Lula, faltou ao sociólogo Fernando Henrique Cardoso constatar a grande fragilidade do PSDB, nos vínculos que mantém com a sociedade. Nos Estados em que é forte – hoje, praticamente só em São Paulo e Minas –, o é ou por força de um líder, como é o caso de Aécio em Minas, ou por força da gravidade de um eleitorado antipetista, como é o caso de São Paulo.

Redação

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