É o Brasil sendo o Brasil da senzala e da casa grande, por Mauro Santayana

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por Mauro Santayana
 
(JB) – O Datafolha acaba de divulgar análise estatística multivariada sobre a base de dados da última pesquisa nacional de intenção de voto, com o objetivo de identificar nichos da população brasileira em que são observadas altas concentrações de eleitores dos dois principais candidatos à Presidência da República até o momento.   
 
Nenhuma grande surpresa.
 
Entre garotos brancos escolarizados de até 24 anos – com uma compreensível ignorância que advêm também da idade e uma enorme penetração nas redes sociais – Bolsonaro é majoritário.
 
Quando a idade sobe para mais de 33 anos – a idade de Cristo – o desempenho do ex-capitão cai e Lula ganha disparado entre os nordestinos de modo geral e entre mulheres mais velhas negras e de menor renda, que ainda não usam todos os recursos de seus celulares, mas têm título de eleitor e não dão bola para as redes sociais.
 
O eleitor de Bolsonaro é contraditório.
 
Conservador em itens como segurança e corrupção, defensor – “bandido bom é bandido morto” – do desempenho violento e genocida da polícia no combate – custe o que custar – aos crimes da “periferia” – onde, ironizando, diz que segundo os “direitos dos manos” só moram “santinhos” – e apoiador – no país em que a polícia mais mata no mundo – de que se armem os “homens de bem” contra “vagabundos”, ele não é, paradoxalmente,  contra a  descriminalização da maconha ou, a priori, do aborto.
 
As velhas senhoras de Lula são, poderíamos dizer, mais coerentes.
 
Elas sabem – sem necessitar conhecer precisamente os números – que o salário mínimo aumentou de 81 para quase 300 dólares depois que Lula foi eleito, que a renda per capita saiu de 2.810 dólares em 2002 para 10.183 dólares em 2015, e que a economia cresceu, também segundo o Banco Mundial,  praticamente 5 vezes, de 504 bilhões de dólares em 2002  para quase 2.4 trilhões de dólares em 2014.
 
Que o preço do gás – e da gasolina – ficou praticamente sob controle durante anos e que foram construídas no nordeste mais de um milhão de cisternas,  e, em todo o país, quase 3 milhões de casas populares.      
 
Lula desistiu de comprar um apartamento que hoje pertence à Caixa Econômica Federal.
 
Bolsonaro desistiu de receber doação de campanha de uma empresa investigada por corrupção, e estornou dinheiro ao partido, pegando com o partido uma quantia do mesmo valor.
 
Lula é acusado de beneficiar seus parentes.
 
O irmão de Bolsonaro, que recebia, segundo noticiado pelo SBT, mais de 17.000 reais como funcionário da ALESP – enquanto administrava uma rede de lojas de venda de móveis de sua propriedade no interior de São Paulo – foi demitido quando veio à tona o fato de que ele, apesar de receber esse montante, não estava comparecendo ao “trabalho”.
 
Lula é acusado por seus inimigos de dizer que “não sabia de nada”.
 
Bolsonaro negou ter conhecimento do “emprego” do irmão, dizendo a mesma coisa.
 
Para a “justissa” da República de Curitiba e os jovens eleitores do messiânico ex-capitão do Exército, Lula é um bandido condenado e Bolsonaro – que, assim como Lula, do nosso ponto de vista, não deveria ser incomodado pela “justissa” nem devido aos erros do irmão nem pelo financiamento de campanha – é paradigma de honestidade.
 
O primeiro corre o risco de ser proibido de ser candidato, enquanto o outro corre o risco de ser eleito presidente da República devido justamente à descarada, já anunciada,  interferência da “justissa” no processo político e eleitoral brasileiro, impedindo uma disputa direta por livre manifestação popular e que vá para o Palácio do Planalto aquele que tiver mais votos.
 
O estudo do Datafolha esclarece o porquê da diferença e o que está por trás de Lula estar na frente das pesquisas para a eleição presidencial do próximo ano.    
 
Quem é maioria entre os procuradores da Operação Lava Jato, com suas fotos posadas,  seus impecáveis penteados – na cabeça só gumex – e seus armanianos ternos?
 
Oh! Surpresa!
 
Na maioria dos casos, jovens brancos, de alta renda, preconceituosos, conservadores,  “escolarizados”, que passaram em concurso graças a cursinhos pagos pelos pais, ou, em certos casos, por moverem, com a ajuda deles,  ações, ou as senhoras de baixa renda que compõem, com outros segmentos menos favorecidos, a maioria da população brasileira?     
 
O que existe por trás da campanha jurídico-midiática contra Lula, em plena marcha no Brasil deste momento?
 
Sem querer ser simplista ou ignorar outros  fatores – no fundo, no fundo – é a mesma e velha luta de classes, senhores.
 
É o Brasil sendo o Brasil da Senzala e da Casa Grande.
 
Publicado em 26/12/2017
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

4 Comentários

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  1. O julgamento de Nine

    O réu é de origem pobre e oriundo da região Nordeste
    Criado e crescido na metrópole de São Paulo
    Foi treinado e exerceu trabalhos braçais
    E fala mal a língua pátria
    O que torna, de saída, todos os seus atos suspeitos

    Não é negro de pele mas exames acurados de sua psique
    Evidenciam uma alma enegrecida, certamente por conviver,
    Desde tenra idade, muito misturado à gente de cor e paupérrima
    O que eleva consideravelmente a suspeição de seus atos

    Como atenuante, o réu ascendeu na vida, ocupou cargos importantes
    Usou terno e gravata exigidos pelo exercício do cargo
    E tem, atualmente, um padrão de vida relativamente elevado

    Porém, o atenuante é completamente anulado
    Pois o réu, embora livre da praga da pobreza
    Insiste em trazer dentro de si a alma negra
    E pobre e nordestina e de trabalhos braçais
    E barba muito suspeita e recusa em elevar seu português operário
    À língua culta dos doutos que somos nós

    Declaramos, então, o réu indigno dos cargos que ocupou
    E o proibimos de ocupar este ou qualquer outro cargo
    Exclusivo da gente clara e esclarecida, como nós
    Declaramos também o réu indigno de nosso convívio
    Pois fala mal, não se barbeia e certamente cheira mal
    Como costuma acontecer a todas as almas ou corpos empestiados
    De pobreza, negritude, Nordeste ou trabalhos braçais

    Em conclusão, o réu é culpado
    Não por ser nordestino, de alma negra e pobre e braçal
    Pois somos capazes de reconhecer a utilidade
    E até mesmo de amar tais tipos, desde que se resignem
    À sua condição inferior e nos sirvam com amor
    Pois precisamos de domésticas, babás, motoristas,
    Garçons, pedreiros, garis e jagunços
    Para o bom funcionamento de nossas casas e cidades

    O réu é culpado pelo crime hediondo
    De querer viver conosco em nossa casa grande
    Sem perder a alma negra e pobre e nordestina e braçal
    E mais culpado ainda por fazer crer à ralé que nos serve
    Que nossa bela e exclusiva casa grande é dela também,
    Que a casa é de todos: pretos, pobres, nordestinos, braçais…
    Quanta heresia! É culpado, mil vezes culpado
    De querer nos fazer conviver como iguais (oh! horror)
    Oh! horror) com a gente serviçal, tosca e fétida!

    Prendam o réu!
    Em nome de Deus e da família!
    Torturem a ele e a seus companheiros!
    Ponham-no no tronco e lhe apliquem mil chibatadas!
    De pau de arara veio, ao pau de ara retornará!
    Cortem-lhe a cabeça! Mas não rapidamente, que o réu sofra antes,
    Que perca a mulher, que seus filhos e netos paguem por seu atrevimento
    Que seus companheiros sejam perseguidos! Que o seu sonho
    De promover a ralé malcheirosa à dignidade de nós doutos
    Desmorone diante de seu olhar triste e impotente!
    Que ele perca todas as batalhas! E que gozemos,
    Que gozemos no ódio que nos move a sua dor mais funda!
    Gozemos a tristeza sem esperança da ralé que o tem como ídolo!
    E que nossa Pátria amada verde amarela seja desinfetada,
    Para todo o sempre, de seu corpo e de sua alma
    Negra, vermelha e criminosa!

    1. Lembrando-nos a sentença

      Lembrando-nos a sentença condenatória a Tiradentes, o autor traz-nos a confirmação de que o Brasil ainda está longe da luz.

  2. É….

    Realmente o Brasil de Lula, é o país da Senzala à Casa Grande. Não mudou em nada. Grande parte da estrutura que apoiava Lula, agora virou Casa Grande. E Casa Grande virou Mansão. Muitas vezes em Lisboa, Paris ou NY. Outra parte que o apoiava já era a Casa Grande. Elite que não se enxerga. A senzala continua a mesma. O fanatismo é que cega e não deixa enxergar. Aqui ao lado tem ‘Rua de Pobre’ ou dos Abandonados de Luciano Hortencio, mostra a diferença entre pobreza e falta de Estado, falta de representatividade. Se houvesse Democracia no Brasil, e não esta busca incessante por Caudilhismo, Rua de Pobre, teria asfalto, teria iluminação pública, rede de esgoto e de água potável, transporte público no mínimo razoável, arborização, alguma pracinha limpa ou parquinho infantil, talvez um clube ou piscina pública, creche,…E mesmo assim seria rua de pobre. E o pobre continuaria pobre. Se tívessemos Democracia. E não a busca imbecil por um Salvador, por um Dom Sebastião, por um Caudilho, por um Pai dos Pobres, por alguém que não sejamos nós. A pobreza, esta só se resolve com a riqueza. E a riqueza é o acumulo de bens e capital. Que a Industrialização, depois da Revolução Industrial, democratizou através de Empregos e Salários. Mas fanáticos ainda crêem que o que resolverá isto é algum Ser, que deve estar sentado ao lado de Deus Pai Todo Poderoso. E não cada um de Nós Brasileiros. O Brasil é de muito fácil explicação..     

  3. O que posso obter das
    O que posso obter das notícias globais, forças potencialmente sãs estão se rebelando no Irã. Em caso de vitória, pode levar a consequências a longo prazo, incluindo mudanças no envolvimento do Irã na guerra Síria. Primeiro Mugabe, então Irã … ou talvez Assad?
    Feliz Ano Novo para todos!

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