Entre o eufemismo e a hipocrisia, por Wagner Iglecias

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Entre o eufemismo e a hipocrisia, por Wagner Iglecias

O Brasil atravessa o melhor momento de sua História: há trinta anos retomamos a democracia, com a eleição de um presidente civil após duas décadas de ditadura militar; há vinte anos derrotamos a hiperinflação, com o bem sucedido Plano Real, após inúmeros planos e pacotes fracassados; e há dez anos temos combatido de forma mais efetiva a pobreza. Nunca antes na História deste país, como diria o outro, a maioria dos brasileiros teve a oportunidade de ir sete vezes seguidas às urnas escolher o presidente da república, como tem ocorrido desde 1989. Nunca os pobres tiveram tanto acesso ao consumo e provavelmente nunca se viu tanta mobilidade social.

Mas ao mesmo tempo o país enfrenta uma grave crise política. Como nunca tivemos desde a redemocratização. Acabaram-se os tempos de bonança econômica e do ganha-ganha dos anos Lula e agora o conflito distributivo e de poder está na ordem do dia, como também nunca tivemos desde o fim do regime militar. Ou melhoramos um pouco mais a vida dos mais pobres, aprofundamos a democracia e buscamos uma postura mais altiva para o país no cenário internacional ou regredimos para cenários anteriores, de mais concentração de renda, de domesticação da democracia e de subserviência internacional. Parece não haver mais espaço para meios-termos. Para desgosto daquele mesmo outro, o do “nunca antes”.

E a mãe de todas as batalhas continua sendo a de sempre, aquela que historicamente marcou o país em períodos em que dois caminhos se fizeram contrapostos de maneira radical: o mar de lama. Acuado, aparentemente atônito e envolvido em inúmeras denúncias de corrupção está o PT. Na ofensiva, escudado em parceiros diversos, está o PSDB. Curiosamente ambos, em que pese a onipresença do PMDB e a menção honrosa que deva ser feita ao PDT do velho Brizola, os dois partidos, PT e PSDB, que foram os principais fiadores do processo de consolidação democrática em nosso país.

Na guerra retórica entre um lado e outro chama a atenção o eufemismo com que autoridades petistas e do governo tratam as denúncias envolvendo o partido: falam em “malfeitos”, referindo-se a companheiros que eventualmente “erraram”. Já do lado tucano enche-se a boca para bradar por moralidade, reiterando o perfil daquele que é o partido mais indignado do Brasil quando a questão é a corrupção…dos outros. Malfeito é palavra quase escolar, carrega um quê de infantil, quase poderia ter traquinagem como sinônimo. Dá a impressão de coisa menor. Ouvindo-se lideranças do petismo referindo-se assim a gravíssimas denúncias envolvendo enormes quantias de dinheiro que têm sido imputadas à legenda fica-se com a impressão de que o partido ainda é aquele mesmo dos tempos em que militantes vendiam estrelinhas e camisetas nas ruas para bancar campanhas eleitorais. Escutando-se o discurso empolado de lideranças tucanas sobre moral e retidão quase se esquece dos tantos escândalos que envolveram a passagem do partido pelo governo federal e daqueles que ainda são imputados a algumas de suas gestões estaduais nos dias de hoje.

Muito se diz que o sistema eleitoral construído para viabilizar a passagem da ditadura para a democracia já não serve mais ao país. Ao se refletir sobre o que dois dos nossos principais partidos se tornaram, caminhando entre o eufemismo, por um lado, e a hipocrisia, por outro, fica-se com a impressão de que nosso sistema partidário talvez também já não responda assim tão bem aos anseios de um Brasil que já não é mais o de trinta, vinte ou mesmo dez anos atrás.

Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP.  

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

7 Comentários

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  1. talvez a dialética entre  o

    talvez a dialética entre  o projeto de inclusão social

    destes últimos doze anos

    e a tentativa da direita de retroagir aos tempos da absoluta estagnação economica

    nos leve a uma trerceira possibilidade, que encaminhe o país

    a um rumo que atenda aos interesses da maioria da população.

    a ver….

  2. Democracia? O método Moro de obter confissões,por Mônica Bérgamo

    Folha confirma Guantanamo da Lava Jato

    22 de fevereiro de 2015 | 11:09 Autor: Miguel do Rosário

    noam-chomsky

    O Brasil recebeu hoje a confirmação de uma denúncia já veiculada pelo blog Conversa Afiada.

    A jornalista Monica Bergamo, flor rara no pântano da nossa imprensa, revelou a rotina dos executivos mantidos presos por tempo indeterminado pelo juiz Sergio Moro.

    Os presos da Lava Jato estão sendo mantidos em condições degradantes nas dependências da Polícia Federal do Paraná.

    Permanecem amontoados, aos quatro, em cubículos minúsculos, usando um buraco no chão como latrina.

    São obrigados a comer com as mãos.

    São humilhados constantemente pelos agentes.

    Agora se entende porque Sergio Moro ganhou um prêmio da Globo.

    O neoliberalismo é assim. Para banqueiros, a proteção dos deuses. FHC liberou aos bancos, quebrados por incompetência e corrupção, mais de R$ 300 bilhões.

    Para executivos de empresas que empregam centenas de milhares de pessoas, e que constituem um nó central da economia brasileira, o inferno dantesco.

    Só quem tem vida boa na PF é Alberto Youssef, o único que foi preso e condenado diversas vezes, e que, por ser tucano e ter um advogado tucaníssimo, tem o privilégio até de receber uma bela fisioterapeuta na cadeia.

    O objetivo, naturalmente, é torturá-los até que delatem o PT.

    Como não aceitaram, então continuam presos, mesmo que ainda não haja nenhuma condenação contra eles.

    Tem um lugar que faz igualzinho: Guantanamo, a prisão americana na ilha de Cuba.

    Os delatores, como Pedro Barusco, doente terminal, ou Paulo Roberto Costa, cuja família começou a ser integralmente perseguida, optaram pela delação e receberam imediatamente liberdade.

    A imprensa e seu público fascistoide aplaudem, naturalmente.

    Os pobres não são barbarizados? Então democratizemos a barbárie!

    A demagogia fascista encontra em nossa mídia um terreno fértil para florescer.

    Afinal, como explicava Joseph Pulitzer, inspirador do principal prêmio de imprensa e literatura nos EUA: “Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil como ela mesma”.

    Só nos resta perguntar: o Brasil caminha para uma ditadura midiático-judicial?

    Quem virá nos salvar?

     

  3. [   há vinte anos derrotamos

    [   há vinte anos derrotamos a hiperinflação, com o bem sucedido Plano Real   ]  A história já mostrou que toda desgraça foi porque o pobre estava começando, tanto quandosempre ocorreu com a elite, aprender como se ganha com inlação.  A últim eleição foi clara em prestigar  Dilmapor ter  mais condições de trazer todo inflação de volta

  4. [   E a mãe de todas as

    [   E a mãe de todas as batalhas continua sendo a de sempre, aquela que historicamente marcou o país em períodos em que dois caminhos se fizeram contrapostos de maneira radical: o mar de lama. Acuado, aparentemente atônito e envolvido em inúmeras denúncias de corrupção está o PT.   [    Apenas uma  visão sociologicamente imbecil do petismo.  Ao sair da visão politicamente idiota do ¨não rouba e não deixa roubar ¨o petismo entrou na faixa politicamente possível para se ter poder no Brasil.

  5. Falam tanto da corrupção do

    Falam tanto da corrupção do PT mas eu só me lembro mesmo do MIDIÀTICO MENSALÂO, onde os petistas foram pré-condenados pela mídia e condenados sem provas pela teoria esdrúxula do Domínio do Fato, pelos TOGADOS visivelmente adeptos do anti-petismo ….

     

    Desculpem e minha ingenuidade mas eu gostaria, realmente, que se fizesse uma lista dos escândalos do PT para a gente comparar com as já conhecídissimas listas de mal-feitos do PSDB, para a gente comparar, pois se o PT é realmente tão corrupto como apregoam, quem sabe eu devesse votar no PSOL, PSTU ou quaçquer outro mais à esquerda.

     

    Obrigado.

     

    “O BRASIL PARA TODOS não passa na REDE GLOBO DE SONEGAÇÂO & GOLPES – O que passa na REDE GLOBO DE SONEGAÇÃO & GOLPES é um braZil-Zil-Zil para TOLOS”

     

     

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