“Não sou político”. Não, obrigado, por Arthur Fisch e Ivan Mardegan

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por Arthur Fisch e Ivan Mardegan

Do CEPESP (CENTRO DE POLÍTICA E ECONOMIA DO SETOR PÚBLICO – FGV)

A quem serve o discurso de negação da Política? O discurso de que a atividade política não presta, de que ela é naturalmente corrupta e que causa mais danos do que benefícios para a sociedade tem ganhado proeminência nos últimos tempos, especialmente no Brasil. Em 2016, observamos essa narrativa ganhar força quando analisamos as eleições municipais. Foi comum no discurso dos candidatos a afirmação de que não eram políticos, mas gestores, médicos, advogados, etc. Estes candidatos anunciaram a falta de experiência política ou a ausência de vida partidária como trunfo, como algo bom e desejável. Fora os ganhos de marketing político podemos ver que a ideia de que é possível pensar a sociedade descolada da política, como no caso da proposta absurda de escolas “sem partido”, é cada vez mais presente.

Isso nos traz perguntas importantes: Quem está ganhando com este discurso? Quais as consequências que isso pode trazer para o sistema político?

A Política é a atividade social que envolve as relações de poder, ou seja, aquelas que se referem a quem manda e a quem obedece. Ter poder significa ser capaz de mandar e ter suas ordens cumpridas. A Política é, portanto, o conjunto de esforços feitos com vistas a participar do poder ou influenciar a divisão deste, seja entre Estados ou no seu interior. Esse é um fenômeno inerente à nossa sociedade. Assim, ao assumir que existam atores apolíticos, presume-se erroneamente que haja indivíduos/organizações/instituições imunes às disputas de poder joga-se uma cortina de fumaça sobre esse conflito e deixa-se de discutir sobre por quem e como esse poder é exercido. Esse debate é muito importante para a compreensão dos mecanismos de dominação que agem sobre a sociedade.

E quem se favorece mais com a popularidade desse discurso?

Os que se vendem como “gestores” vindos do setor privado. Aqueles que, apesar de se dizerem outsiders, já exercem o poder ou influenciam o poder. Não existe gestão sem relação de mando e obediência.

A gestão envolve poder e assim um gestor se afirmar apolítico é, no mínimo, suspeito. Estes gestores são no fundo a expressão do próprio status quo. São nada mais do que as elites econômicas e políticas que já dominam a sociedade e representam a continuidade da ordem vigente.

Ser somente “gestor” sem nenhuma experiência tampouco deveria representar uma virtude. Não parece uma boa prática de administração pública colocar para tomar decisões pessoas sem o menor conhecimento de processos e de funcionamento da máquina. Bons gestores não contratariam profissionais sem a menor experiência para lhes prestar serviços. As dinâmicas do setor público são muito diferentes das existentes no setor privado. A

Além disso, é importante frisar que os espaços de poder nunca ficam desocupados. Quando nos deixamos levar pelo discurso da não-política, abrimos espaço para que os setores que sempre se utilizaram de sua influência mantenham sua posição privilegiada.

Quais as consequências que o triunfo desse tipo de discurso pode incorrer ao sistema político? Com a condenação moral da política, ações que fazem parte do processo democrático como negociação, formação de acordos, de coalizões ou a concessão aos adversários de algum benefício em prol da construção de uma plataforma conjunta são deslegitimadas. Promove-se a figura do gestor autoritário, que não perde tempo negociando e que se enclausura em seu gabinete na hora de tomar as decisões. Fortalecer essa imagem é abrir um flanco de oportunidade para pessoas sem nenhuma capacidade de construção de consensos, capazes apenas de impor seus pontos de vista. A deslegitimação da atividade política abre espaço para autoritarismos. Não há algo mais antidemocrático. Não há como o país avançar dessa maneira.

A Política é inerente à nossa sociedade. Não há como escapar dela. Precisamos nos esforçar para melhorar seu exercício. E isso se faz com mais política, não com menos.

É preciso melhorar e aumentar as discussões ao invés de negá-las simplesmente. Acreditar que o privado é sempre melhor que o público ou que a técnica sempre prevalece sobre a política é um equívoco que pode ser facilmente aproveitado politicamente por quem tem interesse em enfraquecer a disputa democrática.

Oligarquias e elites nascem, crescem, perdem espaço e desparecem, mas sempre tentarão se manter por cima. O discurso de negação da política é mais uma forma encontrada pelos poderosos de distanciar parte importante da população das decisões relevantes, de alienar grandes contingentes das decisões importantes. A atuação política é, portanto, fundamental para a emancipação e o empoderamento dos cidadãos e para garantir o avanço de direitos e conquistas sociais.

Negar a Política é abrir espaço para pessoas sem compromisso com a democracia atuarem diretamente nas decisões públicas. O resultado pode ser mais atraso e menos desenvolvimento para nossa sociedade.

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Texto de Arthur Fisch e Ivan Mardegan, pesquisadores assistentes do CEPESP e doutorandos em Administração Pública e Governo pela FGV, em São Paulo.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

3 Comentários

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  1. Ontem no VIRALATAS CONNECTION

    Ontem no VIRALATAS CONNECTION um sofrego Diogo Mainardi fez questão de introduzir o nome de seu patrocinado Luciano Huck com otimo candidato, sem que lhe fosse perguntado. O apoio de Mainardi diz tudo sobre uma canidatura Huck.

    O entrevistado, ex-Presidente FHC, respondeu que gosta de Huck mas lhe falta estrada. Resposra sabonete, lisa.

    Em comepnsação FHC respondeu bem sobre punições na cruzada moralista, punir sim mas sem o escracho e a humilhação que é hoje a materia prima da midia, disse isso logo depois de Mainardi berrar que Lula tem que ser preso antes de qualquer coisa, Mainardi diz isso há dois anos em todos programas dessa Connection, o pior programa da TV brasileira, cuja linha central e FALAR MAL DO BRASIL sempre, em qualquer tema que se apresente, mostrar como o Brasil é um lixo.

    1. Não acredito que voce vê essa

      Não acredito que voce vê essa porcaria, AA. A degeneração desse programa fica patente ao observarmos que o papel de reacionário provocador passou do Paulo Francis para o Jabor e deste para esse moleque aí garoto de recados da gang do Aécio, Huk e Acioly.

      Com o desgaste do “político político” do grupo, o Aécio, essa turma que conta com o político juiz fake Moro tem que achar um novo candidato.

      Huk é o um engana trouxa nato. Acabou de convencer as pessoas de que desistiu de ser candidato. Veja lá na Revista Forum que ele pediu para que incluam seu nome nas próximas pesquisas.

      Haverão trouxas o bastante para eleger o garotão? Se Deus é de fato brasileiro não há de permitir tal disparate. Se bem que Ele já permitiu o Temer. 

  2. Pior é que isso desestimula o voto consciente

    Uma variante desse discurso é a de que todos os políticos sao iguais. Isso é a pior coisa possível, num momento em que a coisa mais importante nas próximas eleiçoes seria a eleiçao de um Congresso menos reacionário, de modo a que nao seja possível a reforma da Previdência e que seja possível a reversao da reforma trabalhista. E um congresso menos entreguista tb, menos dominado pela bancada ruralista.

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