Para poupar Aécio, STF tomou a decisão mais “antidemocrática e intolerável” desde a ditadura

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Foto: Reprodução
 
Jornal GGN – O jornalista Janio de Freitas usou sua coluna na Folha, neste domingo (15), para classificar a decisão do Supremo Tribunal Federal em favor da revogação de medidas cautelares contra congressistas pelo próprio Legislativo como “a mais antidemocrática e intolerável de suas deliberações desde o fim da ditadura.”
 
“Tanto por seus múltiplos sentidos, como pela maneira de construí-los até os consagrar por um voto. A rigor, não um voto, mas uma confusão de sub-ideias e palavras titubeadas pela própria presidente do tribunal, no papel de política”, acrescentou Jânio.
 
“Assim foi, no dizer de muitos, porque a causa interessava ao afastado Aécio Neves. Ou seria por uma pretendida conciliação com o Congresso, negociada com senadores, mas à custa do Supremo. Não faz muita diferença”, disse.
 
Para ele, o pior dos argumentos foi o da ministra e presidenta da Corte, Cármen Lúcia.
 
Por Janio de Freitas
 
Na Folha
 
Supremo por baixo
 
 
A “última do Supremo” é a mais antidemocrática e intolerável de suas deliberações desde o fim da ditadura. Tanto por seus múltiplos sentidos, como pela maneira de construí-los até os consagrar por um voto. A rigor, não um voto, mas uma confusão de sub-ideias e palavras titubeadas pela própria presidente do tribunal, no papel de política.
 
Ao Supremo cabe ser, no conjunto dos Poderes, o repositório da racionalidade e do bom senso. Uma pergunta singela denuncia, porém, a falta desse atributo no mais recente e importante julgamento. Nele ficou reconhecida a competência desse tribunal, nos casos de parlamentares denunciados, para sujeitá-los a “medidas cautelares”, ou preventivas. Como o afastamento de Aécio Neves. Mas estabeleceu, também, que tais medidas sejam submetidas à aceitação ou recusa da Câmara e ao Senado, como queria parte dos congressistas. Foi dado aos congressistas, portanto, o poder de revogar as medidas do Supremo. Logo, quem dá a decisão, a palavra que vale, é só o Congresso.
 
O bom senso indaga: afinal de contas, esses processos ocuparão o Supremo para quê? Nada. Ou nada mais do que fingimento, a encerrar-se, no máximo, com votos reduzidos a meros palpites, sem validade. Melhor farão os magistrados com o nosso dinheirinho, não o queimando com inutilidades e usando-o para os julgamentos e decisões, tão atrasados, a que ainda não se furtam.
 
Com o editorial sobre a “última do Supremo”, disse a Folha (13.9): “Decisão do Supremo recoloca nas mãos do Legislativo a tarefa de não compactuar com o corporativismo e a desfaçatez de seus membros”. No Senado, por exemplo, 33 dos seus integrantes, ou o equivalente a 40% dos 81, têm problemas na Justiça. É isso, então: os parlamentares portadores de desfaçatez e corporativismo foram incumbidos, pelo Supremo, de julgar os parlamentares portadores de desfaçatez, corporativismo, acusações de corrupção e falcatruas sortidas.
 
A presidente Cármen Lúcia sabia, no entanto, do que se tratava: “A importância desse julgamento é dar clareza às regras e segurança jurídica”. Resultou no oposto. Os ministros Luís Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Edson Fachin e Celso de Mello deram votos firmes e bem fundamentados, entendendo que ceder ao Congresso seria dar ainda mais imunidades aos congressistas, violar a separação dos Poderes e de suas respectivas atribuições e, com isso, negar o Estado de Direito Democrático. Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello, por diferentes vias, apoiaram a revisão pelos congressistas das decisões do Supremo sobre parlamentares. Com o poder de rejeitá-las. Cinco a cinco.
 
O voto da presidente para fazer o desempate foi patético. Até um dos seus prazeres de sempre – o cuidado com a expressão verbal – foi desprezado. “Considerando (…) considero” serviu só de amostra. Assim foi, no dizer de muitos, porque a causa interessava ao afastado Aécio Neves. Ou seria por uma pretendida conciliação com o Congresso, negociada com senadores, mas à custa do Supremo. Não faz muita diferença.
 
O nervoso e confuso desempenho de Cármen Lúcia fez um momento triste. Apesar disso, ou por isso, muito próprio para o que impôs. Hoje, centena e meia de deputados, mais 33 senadores, e amanhã nem se imagina quantos, estão e estarão protegidos pelas combinações políticas e interesses pessoais em comum. Só deixarão de escapar, por mais sobrecarregados de denúncias que estejam, quando entregá-los convier à salvação de outros.
 
Esperava-se da presidência de Cármen Lúcia o que ela não é. Com a sequência de espetáculos e decisões oferecidos nos últimos tempos, começa-se a nada esperar do Supremo. Quem espera sempre cansa.
 
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

7 Comentários

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  1. Se o STF tivesse declarado inconstitucional o impeachment de um

    Se o STF tivesse declarado inconstitucional o impeachment de um presidente sem crime de responsabilidade no momento oportuno todo esse caos não teria existido. Os ministros do STF são responsáveis por tudo o que está acontecendo de ruim no país, seja com a tolerância com as práticas mais obscuras e covardes praticadas na Lava Jato, seja com o endosso à perseguição imoral ao Lula pelo juiz sérgio moro.

    Como se deixaram dominar por um juiz provinciano de primeira instância que passou a impor ao país os seus caprichos? O poder que o juiz moro, a força tarefa lava jato e do Gilmar Mendes é proporcional à covardia dos ministros do supremo, notadamente da Carmen Lúcia.

    A história será implacável com aqueles que aceitaram fazer parte do golpe de estado que o Brasil sofreu em 2016!  

  2. para….

    40 anos para descobrir que temos um Estado, que existe apenas para perpetuar sua Elite Nababesca. Não serve para nada. ConstiuiçãoCaricaturaEscárnioCidadã. STF “inventado” para julgar “nada”. O papagaio da vizinha que incomoda o sono do quarteirão. A última pérola de 11 “Notáveis”. Todos são iguais perante a Lei (VÍRGULA)… 

  3. Em outras palavras…

    … O poder juciciário faz política; e o legislativo, “justiça”… Dissolvidosos os limites e prerrogativas  entre os poderes, o jogo  os embaralha num só corpo despótico, cujas iinteresses – sob aparência republicana  e para além da democracia e da lei – são os mesmos. Mais um catafalco parao o cadáver de um estado brasileiro, velado para um triste enterro militar…

  4. stf, assim mesmo, no minusculo.

    Há uma máxima, nascida  da arrogante vaidade, do meio jurídico que diz: “decisão da justiça, não se discute, se cumpre”. Com que cara esse “supremo” vai se apresentar a Nação Brasileira, depois de descaradamente se assumir como golpista?!!

  5. Para um observador à

    Para um observador à distância, ou seja, aquele não dotado de formação jurídica e que baliza suas avaliações mais pelos aspectos políticos ou outros mais prosaicos, o nosso indefectível STF parece,”rogando por todas as vênias”, um autêntico saco de sacos com um pitbul no meio. 

    Uma hora decide de uma forma, noutra totalmente diferente. Em que difere, a propósito, o caso Delcídio do caso Aécio Neves? Se para prenderem o primeiro mandaram às favas os escrúpulos institucionais, ou seja, não estiveram “nem aí” para o que reza a Constituição sob o argumento de “continuidade deletiva”, poer que para o segundo, mesmo com provas substanciais de autoria de crimes restou somente muitos pruridos jurídicos? 

    Até prova em contrário. o Direito praticado por essas bandas é o positivado, ou seja, vale o que está escrito. Entretanto, o que transparece é que cada um dos ministros, ou bloco, segundo o viés político-ideológico, toma esse “escrito” a seu bel prazer e ao sabor das circunstâncias. Será assim tão difícil a exegese da Constituição? Ou a dificuldade reside na “feira de vaidades” em que se transformou essa Corte? Nesse sentido, o “biquinho” do ministro Barroso, as mímicas e citações em alemão do ministro Gilmar, as soporíferas citações do ministro Celso de Melo e os falsetes vocais do ministro Marco Aurélio se equivalem. 

    E haja “istas” para todos os gostos: garantistas, beletristas, escapistas, nascisistas, paraquedistas e, para fugir da rima, vistosos  “líderes” informais de partidos políticos. Os votos, quilométricos. parecem que são formulados mais para enrolar e confundir que decidir. À exceção, claro, do emitido pela ministra Rosa Weber na base do “voto com o relator”. 

     

  6. Jânio

    A voz e Jânio de Freitas é lúcida e poderosa. Carmem Lúcia encobre, sob a aparência de humildade e comedimento, um conflito inquieto entre o esquerdismo militante de outrora e a pressão incômoda da toga. Esta não foi sua pior atuação de minerva, mas sim o desempate do ensino confessional na escola pública.

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