Sim, é possível superar a crise, por Laura Carvalho

Jornal GGN – Laura Carvalho, professora da FEA-USP, acredita que o governo pode ajudar a superar a crise econômica, utilizando a força do mercado interno e também sua própria capacidade de endividamento. Ela compara o momento atual com o primeiro trimestre de 2009, quando a economia sofreu uma retração semelhante à atual, devido aos efeitos da crise internacional. Na época, o então presidente Luis Inácio Lula da Silva anunciou medidas de estímulo à economia, garantido os investimentos governamentais e pedindo a colaboração do empresariado e dos consumidores. No segundo trimestre de 2009, a economia já apresentava crescimento de 2,2%. 

Para a professora, a capacidade de endividamento do governo está sendo utilizada para cobrir as quedas nas receitas e o pagamento dos juros, cada vez mais altos, quando seria melhor endividar-se para preservar empregos e expandir investimentos em infraestrutura.

Enviado por Eliane Faccion

Da Folha

Yes, we can!

Laura Carvalho

Os mais recentes números do PIB (Produto Interno Bruto) indicam uma contração de mesma magnitude da que vivenciamos no primeiro trimestre de 2009, após a eclosão da maior crise internacional desde 1929.
 
Naquela ocasião, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi à TV e parece ter convencido a maioria dos brasileiros de que o Brasil podia superar a crise: tinha vultosas reservas internacionais, contava com a força do mercado interno e o comando firme do governo.

 
Após anunciar diversas medidas de estímulo à economia, o ex-presidente garantiu que os investimentos governamentais não seriam cortados, para então pedir a colaboração de todos: os empresários deveriam seguir investindo e as famílias não poderiam ter medo de consumir.
 
“Se você não comprar, o comércio não vende […] e aí a fábrica produzirá menos”, explica o ex-presidente, em uma verdadeira aula sobre o Princípio da Demanda Efetiva de Keynes. Já no segundo trimestre de 2009, a economia voltou a crescer 2,2%.
 
O governo Dilma, desde que ganhou as eleições, parece, ao contrário, ter se dedicado a convencer os brasileiros de que a oposição estava certa e de que estamos todos no mesmo barco em vias de naufrágio. O governo decidiu investir menos, incentivando as famílias e empresários a fazer o mesmo. Perde seu tempo procurando a fadinha da confiança, em vez de buscar a autoconfiança perdida.
 
Um manual de autoajuda bem simplório, desses disponíveis na internet, sugere que, para recuperar a autoconfiança, se faça um balanço de si mesmo e se reconheça o seu potencial.
 
Apesar dos erros na política econômica, o nível de dívida pública líquida, que era de 37% do PIB em 2011, hoje é de 34% do PIB. Esse patamar já foi de 60% no Brasil, em 2002, e é hoje de 170% na Grécia e de 50% na Alemanha.
 
A dívida bruta, que não desconta as reservas internacionais e outros ativos do governo, subiu nos últimos anos, é verdade, mas ainda nos mantem atrás da grande maioria dos países que conseguem se financiar no mercado de títulos. Além disso, seu perfil melhorou bastante, com prazos mais longos, quase nenhuma dívida externa e menos títulos indexados à Selic.
 
Assim, o governo ainda pode ajudar a superar a crise se contar, como em 2009, com a força do mercado interno e com sua capacidade de endividamento, que, aliás, já está sendo usada para cobrir sucessivas quedas nas receitas e o pagamento de juros cada vez mais altos. Melhor seria endividar-se para preservar empregos e expandir investimentos em infraestrutura física e social.
 
Já a alta do dólar, por encarecer produtos importados, é uma boa oportunidade para a indústria nacional, que tem hoje melhores condições de atender a um eventual aumento nas vendas.
 
Infelizmente os ideólogos de Chicago continuam a desdenhar da aula magna de economia que nos deu o operário ganhador de tantos títulos de doutor honoris causa mundo afora. Pior. Desprezam os gritos da realidade para os quais até simplórios manuais de autoajuda revelam-se mais úteis que seu cantochão ortodoxo.
 
A proposta de Orçamento para 2016, enviada na segunda-feira (31) ao Congresso Nacional, dá aos mais otimistas a impressão de que o realismo ainda tem alguma chance neste governo. O balanço feito também indica que o navio pode chegar a terra firme. Mas quem comanda?
 
Laura Carvalho é professora do Departamento de Economia da FEA-USP com doutorado na New School for Social Research (NYC).
Redação

6 Comentários

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  1. Não sei dizer se as condições

    Não sei dizer se as condições econômicas de 2009 e de agora permitiram adotar essa mesma política. Mas uma coisa eu sei = quem conduziu a travessia foi Lula e quem está tentando fazer a travessia agora é dilma. É como você comparar Móises a Tim Jones (rs).

  2. Quem comanda?

    Esta é fácil: a banca internacional.

    Agora, os outros pontos:

    Além do setor de petróleo e gás, paralisado pelos messiânicos, o que parou de vender, efetivamente, foram carros e imóveis. Os primeiros sempre foram caros no Brasil, os segundos estão caros, porque os métodos construtivos aqui são ultrapassados e não conseguem acompanhar o aumento de demanda.

    Além do mais, ambos dependem de crédito. E, como se sabe, vivemos no país da agiotagem.

    Ou seja, a junção de messianismo + cartéis financeiros e industriais + atraso tecnológico e mais, ainda, burocracia e baixo nível educacional nos permite dizer: não, nós não podemos.

    1. Sim, é possível superar a crise

      Talvez seja otimista mas acho que PODEMOS.

      O  grande nó é a incapacidade de o governo federal atuar politicamente contra a maré do “quanto pior melhor”. A presidente deveria ocupar institucionalmente espaços na TV e mostrar ao povo o que está sendo feito em seu governo e o que é dito.

      Mas só isso não resolve. O ajuste levyano deve ser relativizado, os gastos  cuidadosamente revistos, todos os poderes da República devem participar,- ? – , a sonegação combatida e com legislação dura contra os sonegadores e não esse arremedo que temos, impostos sobre grandes fortunas e transferências e uma redução da SELIC.

      Enquanto os demais países estimulam suas economias o governo federal promove uma contração com a redução dos investimentos  e juros criminosos. 

      Mais investimentos, redução da SELIC e dos juros dos bancos oficiais.

       

  3. Recuperação economica

    Há pouco incentivo em se investir em atividade produtiva, gerando empregos, renda e aumentando a propensão ao consumo, enquanto a taxa básica do BC regular a disponibilidade de recursos bancários para empréstimos e também remunerar a maior parte da dívida pública.

    Os títulos públicos, qualquer que seja seu prazo nominal de vencimento, têm liquidez diária garantida pelo governo.  além disto, a taxa básica por um dia é maior que as taxas de juros de médio e longo prazo. o resultado é um ativo financeiro que rende juros e nunca fica indisponibilizado.

    Esta anomalia proporciona uma rentabilidade diária alta, segura e sem os embaraços de ter que contratar e pagar salário a trabalhadores, sem as complicações com o Fisco, sem taxas e impostos, sem ter que cumprir regras ambientais, sem obrigações sociais.

    Hoje no Brasil os dois setores que mantem maior sustentação de equilíbrio financeiro são a agricultura e as pequenas e microempresas, juntos são responsáveis pela maior fatia da dinâmica economica. Junto com a indústria o Brasil teria tudo para se destacar dentre as nações do mundo e ocupar o verdadeiro lugar no concerto das Nações. 

    O Lula fez a coisa pela metade, turbinou o consumo e alavancou a macro economia via BNDES, esquecendo de que a lição de casa deveria priorizar as pequenas empresas que verdadeiramente dão base a economia, o melhor credito que deveria ser distribuido para o populacho, seria estabilidade no emprego e no salario. Não houve realmente uma politica seria de sustentação da base economica produtiva, preferiu-se o canto da sereia do consumo imediato, como se este fosse realmente alavancar todoas as outras areas da economia nacional. Não alavancou e ai os jovens academicos de uma nova geração começaram a mostrar a que vieram, com o nascimento da lava a jato. E a coisa desandou de vez.

    Se não se mecher nas estruturas do Pais vai ficar muito dificil qualquer plano economico dar certo. Politicamente seria necessario que de alguma forma se conseguisse um consenso de um grupo estabelecendo uma especie de centrão, o problema é encontrar um personagem que liderasse este processo e catalizasse os esforços numa mesma direção.

     

     

  4. Não é bem assim

    Há uma diferença fundamental entre 2009 e agora, que a articulista mencionou, mas não levou em conta: o câmbio. E outra que ela sequer mencionou: a redução em mais de 30% no valor das comódites.

    Ora, em 2009, com superávits permanentes na balança comercial e um câmbio relativamente valorizado, ampliar o mercado interno era sopa no mel, ainda mais com o mercado externo deflacionário. Portanto era só alimentar o mercado interno de crédito e subsídios, antendê-lo com produtos importado e estava resolvida a questão da crise, sem o menor risco de inflação. A indústria interna iria chiar, mas só ela, os demais sorririam a doce noite de verão cambial.

    Agora, uma elevação na demanda interna não pode ser atendida pelos importados. E ainda temos um outro fator a considerar, a diminuição de oferta interna que é pelo aumento da exportações – recentemente se tem notícia de que a indústria automobilística aumentou em 10% as suas exportações.

    Assim, o ajuste econômico com a nova taxa de câmbio é inevitavelmente duro.

    Isso é que dá fazer distribuição de renda com exportações e não com reforma agrária. O vôo é curto. Até que se tentou ampliar a duração da coisa com o pré-sal e o final das obras das refinarias, que teriam enormes impactos positivos na balança de pagamentos e nas contas públicas, mas de que jeito com essa pilantragem e partidarismo no judiciário.

    E para engroçar o caldo, a dura campanha de desestabilização da mais longa campanha eleitoral de nossa história transformou o remédio recessivo em veneno. Isto é, talvez a articulista tenha alguma razão afinal. Quem sabe?

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