Exposição Toulouse-Lautrec em Vermelho, por Rosângela Vig

Ana Gabriela Sales
Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.
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Imagem: Acervo Masp O Divã, Toulouse Lautrec, 1893

do Obras de Arte

Exposição Toulouse-Lautrec em Vermelho

por Rosângela Vig

” Nos fanados divãs das cortesãs mais velhas,
Pintada a sobrancelha, o olhar langue e fatal,
Num esgar, a fazer das pálidas orelhas
Tombar um retinir de pedra e de metal;

Sobre um verde tapiz, muitos rostos sem boca,
Como bocas sem cor, maxilares sem dente,
Dedos em convulsão pela febre mais louca,
Sondando o bolso roto ou o seio fremente;

Sob os estuques vis, fila de frouxos lustres,
De candeeiros de mal projetados fulgores
Sobre as frontes letais dos poetas ilustres
Quem vem desperdiçar os seus sangrentos suores;

 

Eis o negro painel que num sonho noturno
Vi desdobrar-se a meu olhar claro e curioso.
Eu mesmo, num desvão do covil taciturno,
Encostei-me a tremer, o mais mudo e invejoso.”
(BAUDELAIRE, 2006, p.110)

A vida boêmia parisiense do final do século XIX nunca foi tão bem retratada: na Poesia, pelas palavras de Charles Baudelaire (1821-1867), em seus Quadros Parisienses; na Pintura, pelas formas e pelas cores de Henri de Toulouse-Lautrec (1864-1901). De ambos, os mais poéticos retratos de Paris e de suas pessoas. E Lautrec foi além da vida noturna, na cidade francesa; passeou pela forma peculiar com que conseguiu expressar seu traço; divagou pelas cores, pelo movimento e pelos lugares que ele mesmo frequentou.

De família rica e aristocrática, o artista teve vida boêmia e chegou a frequentar o Moulin Rouge, os cafés e os bordéis da cidade. Vítima de uma rara doença, a estatura de Lautrec era baixa; suas pernas eram curtas, mas o corpo era de um adulto. De sensibilidade aguçada, até mesmo em virtude de sua aparência, o artista conseguia perceber a fragilidade das pessoas que retratava. Seus personagens eram as prostitutas, os bêbados, as dançarinas e as cantoras dos cabarés. Lautrec desenhou cartazes para o Moulin Rouge e para outras casas noturnas que frequentou, além de expor e de vender seus trabalhos nesses locais. Sua morte foi precoce, antes mesmo de completar 37 anos, em virtude do alcoolismo e da vida desregrada. Do artista, ficou o legado de mais de 360 cartazes e gravuras, mais de 1000 quadros e de 5000 desenhos. Seu estilo antecipou a Art Nouveau, além de seus cartazes terem servido de referência para o Design Gráfico e para a Publicidade.

Poderão ser vistos no MASP, em São Paulo, 75 obras de Lautrec, além de 50 documentos da época, fotografias do artista e de seus amigos, de 30 de junho a 1 de outubro de 2017, numa mostra produzida pelo MASP; patrocinada pelo escritório Pinheiro Neto Advogados, com a expografia do escritório METRO Arquitetos Associados. Muitas dessas obras são de coleções particulares nacionais e internacionais como Musée d’Orsay (Paris), Tate e Victoria Albert Museum (Londres), The Art Institute of Chicago, National Gallery of Art de Washington e Museo Thyssen-Bornemizsa (Madrid).

A telas e os cartazes de Lautrec fazem uma viagem no tempo e visitam os locais por onde o artista passou, fragmentos de cenas. Há registros das danças, com seus movimentos exacerbados, das pessoas bebendo, dos vícios e da sexualidade. Considerado pós Impressionista, sua forma de pintar apresenta linhas sinuosas contornos, muitas vezes em preto, com cobertura leve da cor. Os contornos sinuosos e ondulados sugerem um leve estremecimento da imagem, proporcionando a ideia de movimento.

Suas imagens são registros fotográficos de momentos, de fragmentos das cenas noturnas. Na obra A Roda (Fig. 2), o artista optou por não usar muitas cores e exagerar no movimento que fica por conta dos cabelos da dançarina, jogados para trás, num exato momento em que roda o vestido para o alto. Em Descanso durante o Baile de Máscaras (Fig. 4), a moça que chega ao balcão está de máscaras e seu corpo parece chamar a atenção de um rapaz, ao lado, também mascarado. Lautrec parece ter captado a expressão de abatimento das Mulheres na Sala de Jantar (Fig. 5) em um momento de conversa. Na mesa quase vazia, apenas o copo apresenta o líquido vermelho que pode ser vinho, acentuando a ideia do alcoolismo. O som embala a dança na figura 11. Os riscos e a falta de nitidez dos corpos parecem acentuar o movimento e o salão todo tem a aparência de um só corpo se locomovendo ao ritmo da música. As pessoas no balcão parecem estar distraídas, distantes com os olhares perdidos, em melancólica expressão, aguardando o tempo passar.

Ao espectador fica o convite para apreciar as obras de Lautrec e, feito um flâneur 1perambular pelas formas e pelas cores que o artista utilizou para expressar seu tempo, as pessoas com quem viveu e os lugares por onde passou. Talvez seja esse o maior atributo da Grande Arte, conduzir a mente a outros tempos, por meio da imaginação, da forma e da cor.

“Quero, para compor meus castos monólogos,
Deitar-me junto ao céu, à moda dos astrólogos
E bem perto do sino ouvir-lhe cismarento
As solenes canções, levadas pelo vento.
As mãos postas no queixo, eu do alto da mansarda,
Hei de ver a oficina a cantar na hora parda:
Torres e chaminés ou mastro da cidade,
Grandes céus a fazer sonhar a eternidade.”
(BAUDELAIRE, 2006, p.110)

Flâneur significa errante, observador de rua ou caminhante. Para Charles Baudelaire, o termo se refere ao artista e poeta, que observa a vida da metrópole moderna. (BAUDELAIRE, 1997, p.14)

Referências:

1. BAUDELAIRE, Charles. As Flores do Mal. São Paulo: Ed. Martin Claret, 2006.

2. BAUDELAIRE, Charles. Sobre a Modernidade. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1997.

3. CHILVERS, Ian; ZACZEK, Iain; WELTON, Jude; BUGLER, Caroline; MACK, Lorrie. História Ilustrada da Arte. Publifolha, S.Paulo, 2014.

 

Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

5 Comentários

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  1. exposição….

    Paulistanos passam um vida inteira na frente do MASP sem nunca entrar num dos mais importantes museus do planeta. A maioria dos paulistas e brasileiros nem sabe onde fica. Nem mesmo as escolas e rede de ensino se atentam á dimensão do que temos em nosso país. Diz muito do Brasil que somos. Vale demais a visita mesmo sem exposição. Com uma exposição única como esta, então?

    1. MASP

      Olá Zé Sérgio, 

      é verdade, o brasileiro não conhece seu país. 

      Há tanto de cultura numa cidade como São Paulo, bsta preservar e conhecer.

      se puder, visite a exposição, está linda demais

      um grande abraço

       

  2. Nao tenho acesso a arte; sou
    Nao tenho acesso a arte; sou de familia humilde. Um dia assistindo tv ouvi o silvio santo falando sobre esse artista, logo peguei meu cel e comecei a pesquisar; me interessei muito pela historia da vida dele e por suas pinturas. Nao entendo nd de arte mais achei suas pinturas extremamente delicadas msm sendo pintadas pelas mãos de um homem. Certamante se tivesse condicoes e recursos eu iria prestigiar essa exposição …

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