A ascendência do liberalismo e o triunfo da escravidão, por Saulo Barbosa S. dos Santos

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

Vemos nas literaturas liberais que o estadista, fervoroso liberal e ex-vice-presidente dos Estados Unidos, John C. Calhoun ser um grande defensor das minorias e forte opositor à monarquia

A ascendência do liberalismo e o triunfo da escravidão

por Saulo Barbosa Santiago dos Santos

            Em meados do século XIX surgem grandes pensadores do liberalismo, cujo defesa se dá à igualdade entre os povos e as liberdades individuais ante à interferência do Estado e da religião. Junto dos pensamentos liberais, inova-se a contradição, desta forma, o objetivo deste texto é fazer uma breve análise sobre alguns conceitos liberais e como suas contradições culminaram no fortalecimento do instituto da escravidão no mundo.

            Vemos nas literaturas liberais que o estadista, fervoroso liberal e ex-vice presidente dos Estados Unidos, John C. Calhoun ser um grande defensor das minorias e forte opositor à monarquia, em seu livro “União e Liberdade: A filosofia política” ele diz, ainda nas primeiras páginas, sobre a necessidade de um sufrágio universal e a necessidade de proteger os direitos das minorias contra os perigos da tirania da maioria. Ao lado também há o inglês John Locke, considerado pai do liberalismo, se mostra incansável à abolição da escravidão e defensor da igualdade entre os seres humanos, em seu livro “Segundo tratado sobre o governo civil e outros escritos”, o nobre pensador deixa claro que “a liberdade natural do homem deve estar livre de qualquer poder superior na terra e não depender da vontade ou da autoridade legislativa do homem, desconhecendo outra regra além da lei da natureza”.

            Há duas questões paradoxais que precisam ser abordadas quanto ao liberalismo e seus defensores neste ponto exposto. Primeira é a contradição entre o que falam e fazem, tanto Calhoun quanto Locke mantêm ligações íntimas com a escravidão, enquanto este possui ações na Royal African Company, corporação que realizava comércio de escravos africanos, aquele tinha escravos e lhes viam como um “bem positivo” e natural. Segundo, liberdade e igualdade são autocontraditório, não há outros meios seguros se não o de limitar as liberdades daqueles que estão condições melhores em prol dos mais necessitados, se dermos liberdade total a todos, os mais favorecidos abusarão, em alguma medida, os desfavorecidos, interferindo, por consequência, a igualdade.

            A defesa das minorias e dos escravos que os liberais falam não são para  qualquer um, mas àqueles responsáveis pela monarquia, do contrário, se o escravo for responsabilidade de um cidadão livre, não tem problema porque as pessoas são livres para possuir escravos, para John Locke “sendo cativos aprisionados em uma guerra justa, estão pelo direito de natureza sujeitos à dominação absoluta e ao poder absoluto de seus senhores. Como eu disse, estes homens tiveram suas vidas capturadas, e com elas suas liberdades, perderam seus bens – e estão, no estado de escravidão, privados de qualquer propriedade – e não podem nesse estado não pode ser considerados parte da sociedade civil, cujo principal fim é a preservação da propriedade”.

            Para se ter ideia, ambos têm e investem em escravos, inclusive, lhes consideram um “bem positivo”, tão óbvio quanto natural, de fato, ambos buscam justificar que um homem livre pode ter escravos por tempo indeterminado e eles nestas condições também. Com o tempo, não foram só os negros que eram escravizados, o instituto da escravidão também se tornou uma ferramenta do direito penal para contra moradores de ruas, derrotada de guerra, criminosos e aqueles chamados de “vagabundos preguiçosos que não pode nem sustentar a família”.

            Em meados dos anos 1200, a monarquia e a igreja católica conseguiu limitar, seja por lei ou educação, a escravidão na Europa, segundo Dominico Losurdo, em seu livro “Contra-História do liberalismo”, o rei Luís XIV tentou criar o Código Negro, regulamento que tratava sobre a escravidão negra, em três artigos, que estão concomitante à religião católica romana, diz que “se considera “matrimônios válidos” os contraídos entre escravos que professam tal religião (art. 8), proíbe a venda separada dos membros da família constituída (art. 47) e procura conter a exploração sexual das escravas: um homem livre e celibatário, que tenha tido filhos de uma escrava, é obrigatório a casar com ela e a reconhecer a prole, liberta juntamente com a mãe”.

            Num conjunto só de leis o rei e a igreja trata da família, da exploração sexual, da abolição e do batismo católico para os negros, e isto enfureceu os liberais porque interfere na propriedade deles e jamais a igreja e o estado poderia fazer isso, malgrado, não tardou muito na busca do fortalecimento do instituto da escravidão porque escravo gera dinheiro e lucro a seus proprietários, curiosamente, a partir das três grandes revoluções liberais, francesa, americana e a gloriosa, começa a aumentar a escravidão. Na América, por exemplo, até o ano 1700 não se ultrapassava 300 mil escravos, mas no final do século 18, no auge das políticas liberais, já havia mais de 6 milhões. Talvez, a luta iluminista contra a monarquia e o poder da religião não fosse somente em prol da república e da ciência, mas porque também ambas impediam o crescimento da escravidão, com a vitória das luzes da razão, a escravidão triunfa e o liberalismo ascende.

Saulo Barbosa Santiago dos Santos – Guarda Civil, Professor de filosofia e Autista

Este artigo não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador