A ética médica e a discriminação contra o idoso, por Flavio Goldberg

Em plena pandemia, um Ministro da Saúde que esposa a retro-referida filosofia causa pânico justificável nos acometidos pela Covid-19 com mais de 60 anos.

A ética médica e a discriminação contra o idoso.

por Flavio Goldberg

Segundo um vídeo exibido na internet o atual ministro da saúde Dr Nelson Teich teria declarado, anos atrás, a preferência de investimento na escolha de tratamento de um jovem em detrimento de um idoso. O Dr Teich monetiza vidas humanas?

Ao assumindo o ministério houve por bem afirmar que a referida tese foi citada fora de contextualização.

Acontece que dada a gravidade do conceito, claramente, eugenista nenhum contexto de nenhuma natureza alivia suas implicações.

No dramático momento em que as autoridades afirmam a lotação dos leitos nas UTIs de todo o país, o que pode demandar uma “escolha de Sofia” de quem irá viver ou morrer, não se trata de mera polêmica teórica.

Assim sendo cabem algumas considerações urgentes:

Sabemos que o indivíduo na faixa etária da terceira idade enfrenta o medo da morte como uma realidade na probabilística que causa sofrimento. Em plena pandemia, um Ministro da Saúde que esposa a retro-referida filosofia causa pânico justificável nos acometidos pela Covid-19 com mais de 60 anos.

Sob o ponto de vista moral é justo infligir esta dor à uma parcela da população já vulnerável e fragilizada? Vejamos o que reza o juramento de Hipócrates “Ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda” que o médico brasileiro promete honrar.

E acrescentamos tendo em vista a religião judaica do Dr Nelson Teich o “Juramento de Maimonedes” que o médico judeu deve honrar “que eu nunca veja no paciente nada mais do que um semelhante em sofrimento”.

Podemos abordar ainda a Constituição Federal em seus preceitos fundamentais de acesso à saúde para todos sem discriminação corroborando com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, nossas leis especiais como o estatuto do idoso, e o próprio código de ética médico que elenca de forma explícita “Capítulo 1 – 1- A Medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza”.

No meu parecer chegou a hora do Presidente Bolsonaro exigir uma afirmação de compromisso que enterre, esta é a expressão ‘enterre’, a malsinada ideia discriminatória do isolamento vertical, que inclusive o inabilitaria de suas funções do exercício fático da Presidência da República por sua idade, 65 anos, assim como atingiria também o seu vice-presidente, juntamente, com esta postura do seu Ministro como critério para quem deve ser socorrido ou morrer.

Fecho com a citação do 5º mandamento das Tábuas da Lei “Honrarás teu pai e tua mãe, para se prolonguem teus dias sobre a terra”.

Ora a própria promessa de longa vida implica que os filhos honrem no sentido amplo de contrato o dever, a devoção geracional do jovem em relação ao velho.

Flavio Goldberg, advogado e mestre em Direito.

Redação

1 Comentário

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  1. Concordo plenamente com o artigo acima, porém acho que acrescentarei algo bem mais pragmático, a incapacidade de qualquer médico por melhor que seja em sua especialidade em julgar entre dois pacientes que estejam APARENTEMENTE na mesma situação clínica de proximidade a morte.
    Minha avó, sabiamente dizia:
    – Ninguém é tão jovem que não possa morrer amanhã e ninguém é tão velho que não possa durar mais um ano de vida.
    Ela foi um exemplo disso, nasceu em 4 de janeiro de 1900 e viveu até o ano 2002, só perdeu a sua lucidez cinco dias antes de morrer, nos mais de cem anos restantes era lúcida e os bem mais jovens do que ela, pessoas de zero a 70 anos a cercavam, amavam muito e se divertiam com suas palavras.
    O seu velório, como dá para se perceber, não tinha ninguém da sua idade, porém foi o único velório que vi pessoas que não estavam chorando, estava cheio de bebes (menores de 50 anos) que cada um com alegria contavam coisas maravilhosas que tiveram com a sua convivência.
    Ela tinha uma saúde de ferro, mas mesmo assim quase todo inverno de Porto Alegre ela desenvolvia uma pneumonia e ia ao hospital, era uma festa entre as enfermeiras e demais corpo médico, seu quarto era permanentemente visitado não para tirar pressão ou algum tratamento, mas para conversarem com ela.
    Se aos 70 anos, ou seja, trinta e dois anos antes de sua morte, alguém julgasse que ela deveria morrer no lugar de sobreviver, seria muito provável que se fosse escolhido um jovem de 40 anos provavelmente ele teria falecido antes dos 102 anos de minha avó.
    Nenhum médico é deus, nenhum médico tem a capacidade de em sã consciência dizer que entre dois doentes terminais os dois tem a mesma probabilidade de morrer e escolher quem morre e quem não morre, cabe ao médico fazer o melhor do que sabe fazer (nenhum médico é mago) se um ou até os dois morrerem logo, quem escolheu o destino foi a morte, logo a noite o médico poderá deitar tranquilo na sua cama e pensar, fiz o melhor do que pude, mais não sabia, não tinha recursos, mas não matei ninguém.

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