A incrível confissão do cabeça-de-planilha de Paulo Guedes, por Luis Nassif

Diagnóstico é de que o País não enfrenta um problema de expectativa, mas de má alocação de recursos. Aqui, a bela entrevista escancarando a burrice nacional

A entrevista a Renata Agostini e Eduardo Rodrigues, do Estadão, de Adolfo Sachsida, secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, é de doer, de desanimar. Poderia ser saudada pela coragem de autocrítica. Mas apenas reforça a sensação de que estamos sendo dirigidos, na política econômica, por burros, ineptos, irresponsáveis, amadores. E não é de agora. Vem do período Dilma, amplia-se no período Temer e prossegue no período Bolsonaro.

O que diz Sachida?

Primeiro, uma obviedade: “Só a Previdência não vai nos recolocar na rota das altas taxas de crescimento”. Alvíssaras!

“Honestamente, estamos numa situação tão ruim que só isso não basta mais. O PIB vai sair de 0,8% e vamos para 1,6%? Continua sendo baixo. “Hoje esse 1,6% está quase um sonho muito distante. Temos de agir para a coisa não ficar pior ainda”.

Pelo menos há uma pessoa que acordou do sonambulismo de Paulo Guedes.

“Se essas medidas saírem em um ou dois meses, ainda tem efeito. Mas, se formos começar em setembro, por exemplo, muito difícil. Tem de ficar muito claro para todos: a economia brasileira não está indo bem”.

Finalmente, rompe o tabu e diz o óbvio.

O economista, que apoiou Jair Bolsonaro desde muito cedo e ajudou o ministro Paulo Guedes a montar o programa de governo, diz que a equipe econômica trabalha hoje com o diagnóstico de que o País não enfrenta um problema de expectativa, mas de má alocação de recursos.

Aqui, a bela entrevista escancarando a burrice nacional.

As etapas da recessão

Temos dois grandes problemas. Um fiscal muito grande. Outro é de má alocação de recursos. Uma coisa que sempre tive dúvidas é se o que estava acontecendo no Brasil era só um problema de expectativa ou se realmente era algo que ninguém estava olhando. Todos falavam que era expectativa, que quando passasse o cenário eleitoral o País voltaria a crescer.

Já aqui na Secretaria de Política Econômica pedi para estudarem o problema. Em 2014, a economia estava ruim.

Em 2015, naquele ano horroroso, as empresas foram queimando garantias. A empresa tinha, por exemplo, um terreno e vendeu para continuar produzindo. Em 2016, já sem o terreno, ela vendeu os recebíveis do cartão de crédito. Em 2017, a economia então não cresceu novamente. Aí, quando em 2018 a economia ia voltar, o cara já estava fora do mercado, já havia fechado a empresa. Esse problema foi identificado em outros lugares do mundo e começamos a trabalhar com ele aqui.

Inacreditável! Um dado óbvio, as etapas da economia do desaquecimento à recessão, que os doutos economistas só se deram conta depois de identificado em outros países do mundo. Bastava um mínimo de conhecimento da lógica empresarial, e um mínimo de raciocínio microeconômico para entender os impactos desse desaquecimento continuado.

O problema da má alocação de recursos

Estamos com um problema muito sério de má alocação. Tecnicamente é quando você, por meio de uma política pública, direciona recursos para setores que não são os mais eficientes. Exemplo: você direcionou R$ 2 bilhões para construir um estádio de futebol em Brasília. Para que serve? Para nada. Só que tem outro problema: todo ano tem de colocar R$ 40 milhões para mantê-lo. Mas há outro problema ainda: tem shopping, centro de convenções ali? Não. Se eu quiser construir qualquer coisa lá ainda tenho de colocar abaixo aquele estádio. Esse é o problema de má alocação. Não é apenas que você gerou um erro no passado. É que esse erro continua custando à economia todo ano.

Evidente que houve muitos problemas de má alocação de recursos, especialmente com a megalomania da Copa. Mas a crise de hoje nada tem a ver com isso. Desde 2015 o problema é da não alocação de recursos, mas de cortes fiscais rigoríssimos, continuados, que acentuaram a queda da economia.

Como corrigir a má alocação de recursos

Temos de corrigir a má alocação. Temos de rever vários dos fundos que direcionaram recursos para lugares que não dão retorno. Por exemplo, o FI-FGTS. Outro é o PIS/PASEP.
É surreal! Diz que vai resolver o problema da má alocação de recursos desviando recursos do financiamento à construção civil (FGTS) e do investimento do setor privado (PIS/PASEP), liquidando definitivamente com qualquer veleidade de alocação de recursos.

(…) Porque no governo passado, o que acontecia era uma insistência do lado da demanda. A economia está indo mal, então o governo gasta e estimula. Essa agenda está fora e não será repetida. Não tem aumento de gasto público. Ah, mas a demanda está fraca. Para corrigir um problema de má alocação de recursos, você tira de um setor e coloca em outro (lugar). É corrigir a curva de oferta, melhorar a produção da economia. Você gera, porém, um choque de demanda.

Do lado da demanda, significa melhorar o salário mínimo e a política de subsídios. A tal economia do lado da demanda, segundo esses gênios, consiste em tirar recursos do investimento. E ir para onde? Para onde iriam esses recursos do FGTS e PIS/PASEP. Se não vao para o investimento, irão para a demanda. Que mané economia do lado da oferta é essa?

Sobre a mudança do discurso

Infelizmente, você só vai se dando conta do tamanho do problema quando entende a complexidade dele. Quando corrigir o problema fiscal, principalmente da Previdência, vai entrar muito dinheiro. O que acontece é que hoje o PIB brasileiro está estimado em 1% (para 2019). Está muito baixo. Aprovar a Previdência vai, sim, nos trazer investimento e ajudar muito. Agora, honestamente, estamos numa situação tão ruim que só isso não basta mais. Vai sair de 0,8% e vamos para 1,6%?

São os gastos mais onerosos de educação, o da formação de economistas in companhia, isto é, administrando o país. O aprendizado desse pessoal custa pontos do PIB! Quando começam a aprender, estao politicamente tão desgastados que são demitidos. E o país tem que pagar novo curso para os seus sucessores, à custa do PIB.

Para onde irá a boa alocação de recursos

Não sei e não é a minha função saber. Esse é o erro do passado. Tenho de parar de tirar dinheiro de alguns e colocar no campeão nacional. Na hora que eu parar com isso, o dinheiro vai migrar naturalmente para os setores mais eficientes. Essa é a estratégia do governo. Insisto: é a economia do lado da oferta.

Não se tem a menor ideia sobre o que seria a economia do lado da oferta. O sujeito cria um slogan vazio e não sabe como rechear de teoria.

Sobre a promessa de zerar o déficit público no 1º ano

A gente tinha certeza do tamanho do desafio fiscal. Mas muitas vezes se comunicar é mais difícil do que a gente pensa. Você acha que vai falar uma coisa e todo mundo vai entender. Me parece que estava claro o seguinte: vamos vender uma estatal. Daí alguém levanta a mão: mas isso não entra no primário! Então o que estava na cabeça do ministro e na minha era que iríamos resolver o problema do lado econômico.

Agora, o detalhe é como você endereça medidas econômicas. Essa é a nossa prioridade, tomar medidas que façam sentido do ponto de vista econômico. O que acontece é que boa parte dessas medidas não geram resultado primário na hora de contabilizá-las.

Luis Nassif

18 Comentários

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  1. Sinto muitíssimo, bovinocaprismo. Amontoado. Nada como transferir sua incapacidade ao passado. Elemento apenas passadiço: pela prancha. Lamentável tal lenga-lenga neo-liberal-de-faz-de-conta: vender, vender e vender, mesmo que as pessoas não entendam? Ora, ora e ora, obviamente que não podemos – nem poderemos – entender o que logicamente se apresenta sem capacidade para o entendimento. Não fala uma vírgula sobre a dívida-rentista-pública. Nem consegue dizer como a tal reforma da previdência, de imediato, seria capaz de qualquer transformação da nossa trajetória-vai-pro-buraco. Haja.

  2. Ele sabe que fala abobrinha.
    Ele sabe que mente. Não é uma mentira que é fruto da lavagem cerebral que se faz ao cidadão comum, é uma mentira que tem um objetivo muito “certo”.
    O objetivo é afundar o Brasil numa recessão desgraçada, acabar com a capacidade de investimentos do estado e ASSIM permitir a entrada do capital estrangeiro.
    Assim, depois.
    Depois que tudo virar um fim-de-feira o capital estrangeiro vem pra comprar terra, pra transformar esse país numa fazenda de plantaction. Com a posse da terra na mão do estrangeiro, of course!

    1. O capital estrangeiro já entra aqui quando quer e como quer. E com certeza não virá para cá comprar terra.

      Evidente que o desgoverno é desnacionalizante, mas ele não tem uma estratégia coerente de desnacionalização. Agora, o problema é tático, não estratégico. Não têm ideia de como reestimular a economia, por que, evidentemente, isso não é possível sem estimular a demanda, o que a religião deles proíbe, por que achata os lucros. E sem esse reestímulo, não haverá investimento estrangeiro. O capital só vai para onde há valor sendo gerado; a economia brasileira está entrando em colapso, não há nenhuma perspectiva visível de retomada. Então o capital estrangeiro fica fora. E ficará tanto mais fora quanto mais o país “afundar numa recessão desgraçada”.

  3. Qualquer analfabeto sabe que só se aquece a economia com empregos e salários valorizados. Façam comparações com pib’s de presidentes anteriores e verão que a era Itamar Franco foi a melhor. Moeda forte trás emprego e salários. Quando temos um presidente analfabeto economicamente falando e um ministro da Economia com visões fantasiosas o PIB com certeza cairá. Decepcionante este governo.

  4. Mais um que não serve ao povo…….pergunto:

    Onde está e qual o montante total até agora economizados com a pec da morte? Ninguém fala, parece que querem esconder…
    E esse ministro não veio para resolver nada, porque não tem competencia para tanto, sua missão é aprovar a maldita destruição da previdencia e cair fora………….é o espelho de um presidente que não entende nada de presidir…..

  5. Meninos eu li:”Evidente que houve muitos problemas de má alocação de recursos, especialmente com a megalomania da Copa.”
    Me recordo perfeitamente o quanto eu li neste blog um sem número de comentaristas, quiçá até o Nassif, defendendo a Copa e o que traria de bom, não enxergando o que agora é posto. Eu comentando que era dinheiro no ralo sendo totalmente ignorado, como provavelmente serei. Pô, não enxergavam por causa de quê?

  6. Jessé, tenho a maior admiração e respeito pelo seu monumental trabalho de renovação da sociologia brasileira e com ele oferecer uma interpretação lúcida de grandes questões naciomais, históricas e presentes.
    Resisto, entretamto, a aderir a sua explicação de que o eleitor pobre de Bolsonaro é vítima indefesa, indefesa posto que lhes foram retirados os mecanismos para compreender quem provoca sua ruína e sua pobreza. Enquanto o eleitor classe média é apenas um racista covarde. Presta atenção ao comportamento dos pobres benefíciados por programas do lulismo e que pôde, portanto, retomar ou construir os mecanismos para a compreensão do quadro amplo da pobreza e do atraso brasileiro. Eles, na maioria negros e pardos, elevaram sua renda, se graduaram, tiveram acesso à saude privada… e se voltaram contra o lulismo, reproduzindo com ferocidade o discurso moralista, não só racista mas também religioso, homofoóbico, violento.

  7. Me desculpem mas a solução é a mesma que Lula usou; simples assim: por dinheiro a juros barato na mão de quem gasta: pobre e classe média bsixa. Distribuição de renda.

  8. “Exemplo: você direcionou R$ 2 bilhões para construir um estádio de futebol em Brasília. Para que serve? Para nada. Só que tem outro problema: todo ano tem de colocar R$ 40 milhões para mantê-lo. ”

    Não foram só 2 bilhões, foram 30 bilhões… Problema relatado x 15… Adivinha de onde vinha os aloprados… E tem gente que batia e ainda bate palma.

  9. Até as pedras da calçada do Ministério sussurram quando eles passam: a Ley de Say não funciona em economias debilitadas! a retomada se dá pelo aumento do investimento e do consumo! o déficit público é vítima do austericídio e mais do mesmo só aumentará o tombo. Mas, é como falar com uma porta.
    Agora, chegar a conclusão que gastar mal é ruim para nossa (e qualquer) economia foi o supremo insight, o rapaz é um gênio.
    Quanto a pensar em aumentar investimento com fim da previdência (e assistência social), é uma sandice insana. Primeiro porque a fadinha da confiança de há muito se foi. Desde os tempos da dupla Temer/Meirelles que sua vinda é prometida e a turma cansou de esperar. Está tal qual a volta de Jesus Cristo, nem evangélico de carteirinha ainda acredita. Essa tal fadinha já bateu asas e voou para algures, onde ainda exista investimento na economia real, em ativos de produção, que é o que dá retorno e sustenta os investimentos financeiros. Segundo, porque ninguém, em sã consciência, vai por dinheiro bom em dinheiro ruim. Será que ninguém ainda notou o tamanho da bolha “assassina” que se formou na Bolsa de Valores? 100 mil pontos e arriba com o ouro subindo sem parar, o fluxo de petróleo do Golfo (1/3 da oferta mundial) sob risco real e as empresas nacionais indo pro brejo? Apesar das empresas listadas na Bovespa serem relativamente poucas (+/- 340) e entre elas as principais serem razoavelmente independentes de desempenho da economia local é óbvio que os preços dos papéis estão inflados e, não há bases reais para sustentar esse patamar, quanto mais o crescimento. O índice Bovespa é baseado em um carteira teórica composta por papéis de uma amostra das empresas listadas onde cerca de 75% são formados por papéis de apenas 20 empresas, sendo 6 bancos (29%), 3 de alimentos & bebidas (8%) e 1 de cada um dos seguintes setores: celulose & papel; energia; distribuição de derivados de petróleo; logística; mineração; petróleo; serviços financeiros; seguros; serviços; telecomunicações e; varejo. Isoladamente, O Itaú (o banco e a holding) responde, em números redondos, por 13% dos papéis, seguido pela Petrobrás com 12% e pela Vale e Bradesco na casa dos 10%. A B3 S/A (ex-BMF/Bovespa) representa perto de 5%. Estas 5 companhias, portanto, somam em torno da metade dos papéis usados para a formação do índice Bovespa. Prova cabal da concentração da vulnerabilidade, em todos os aspectos, do mercado de ações no Brasil. E, mesmo assim, o mercado e os técnicos do Ministério da Economia usam isso como parâmetro de desempenho da economia nacional.
    Pior é ter que ir dormir com isso tudo.

  10. Excelente matéria sr. Jessé de Souza. Pena que material dessa categoria, não alcança o público em geral. Que bom seria… Um povo sem informação, presa fácil dominada.

  11. Duas palavrinhas mágicas em e na Economia: Oferta e Demanda. O resto é detalhe.
    Florear a retórica com termos pomposos como “alocação de recursos”, “desafio fiscal”. e correlatos, é só enchimento de linguiça. Ainda por cima com os faróis na popa, como diria Roberto Campos, ou seja, remoendo o passado para justificar a inaptidão e o imobilismo do presente.
    As nem é preciso apelar para “genialidades”, coisa típica de economistas com “pós”. Exemplificado: em 2003 ou 2004, não lembro ainda, como gerente de um agência do BB, recebemos uma diretriz de caráter urgente, qual seja, transformar todos os “nossos” aposentados em clientes. À época por volta de 3000 futuros demandantes por crédito que por sua vez iriam irrigar a praça(mercado) que na sequência iria demandar para a indústria e serviços que por sua vez iriam também demandar por mais mão-de-obra(emprego) com reflexos na arrecadação de impostos que fariam melhorar a eficiência da máquina pública fechando com elevação dos indicadores econômicos-sociais.
    Isso só com uma simples diretriz: dar crédito a um segmento até então desprezado.

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