A já esperada queda nas receitas, por Paulo Kliass

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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do Vermelho.org

A já esperada queda nas receitas

A promessa da suposta eficiência e competência do “dream team” do financismo não resistiu a alguns meses de banho de realidade.

por Paulo Kliass

O noticiário está completamente tomado pelos sucessivos escândalos de natureza política, envolvendo os personagens mais próximos da Presidência da República. Denúncias e delações trazem para o centro do noticiário “politicial” a evidência da corrupção como prática “naturalizada” na Esplanada. São malas de dinheiro e depósitos em contas ilegais no exterior de membros do grupo portador da redenção. Os denunciados são aqueles que passaram a ocupar os postos da Esplanada, com a incumbência de tirar o Brasil do mar de lama em que estaria envolto até poucos minutos antes da definição do golpeachment.

Apesar disso, os meios de comunicação ainda oferecem alguma ou outra notícia a respeito das tentativas desesperadas da equipe econômica. Os representantes autênticos do financismo insistem em dizer que também estão “animadíssimos” com a perspectiva da superação da crise. A exemplo do chefe Temer, os ministros tentam exibir um otimismo que não se sustenta em nenhum relatório estatístico oficial e muito menos em avaliações prospectivas de curto ou médio prazos a respeito do ritmo da atividade econômica. Mas a força dos fatos faz com que os jornais agora comecem a estampar as ameaças do núcleo do governo em aumentar os impostos. 
Até pouco tempo atrás, a boia de salvação daqueles que promoveram a retirada ilegal de uma Presidenta eleita pela maioria da população resumia-se à nota promissória da aprovação das reformas trabalhista e da previdência. Constatada a incapacidade em oferecer o paraíso prometido ao empresariado e à classe média, os protagonistas do estupro constitucional tiveram de se resignar à evidência do engodo. Afinal, estava mais do que claro que não “bastava tirar a Dilma” para resolver os inúmeros problemas existentes no âmbito da economia. A promessa da suposta eficiência e competência do “dream team” do financismo não resistiu a alguns meses de banho de realidade.

Recessão e diminuição de receitas públicas

A verdadeira obstinação com que os representantes dos interesses do sistema financeiro brandiam as receitas do austericídio impedia a elaboração de um diagnóstico que fosse minimamente aderente à realidade dos fatos e à experiência internacional. Não que se esperasse deles uma retomada do projeto de distribuição de renda ou de inclusão social. Mas apenas e tão somente que sobrasse alguma pitada de racionalidade e realismo, caso a intenção fosse mesmo aquela tão alardeada pelos jornais – superar a recessão e buscar o caminho do crescimento.

O elemento mais dramático de todo esse processo talvez tenha sido o sentimento de enganação. Afinal, o discurso do establishment financeiro tupiniquim logrou unificar o conjunto dos setores das próprias classes dominantes em apoio a Temer e sua pinguela para o passado. Todos juntos em torno do projeto do parasitismo rentista. Um autêntico tiro no pé. O Brasil afunda a cada dia no fundo do poço e os custos sociais e econômicos para a retomada serão certamente ainda maiores do que o sofrimento vivenciado até o momento.

Ora, qualquer manual básico de macroeconomia nos ensina que o caminho para o equilíbrio fiscal passa pelo crescimento da economia como um todo. A política de aprofundar a recessão por meio do arrocho monetário e da contenção das despesas apenas nos afasta de uma desejada melhora nas contas públicas. Isso pelo simples fato de que o nível de arrecadação de tributos obtidos pelo Estado depende, essencialmente, da manutenção ou ampliação da atividade econômica. Se o Produto Interno Bruto (PIB) não cresce, não há meio de se obter aumento das receitas do governo. Como boa parte de suas despesas são obrigatórias, parece evidente que surgirão problemas para fechar a conta do orçamento público.

Capacidade de arrecadação em queda

E assim a realidade começa a incomodar os defensores dos cálculos de planilha. Os “modelitos” de arrocho conservador já não mais respondem aos anseios e desejos de seus proponentes. E mesmo os arautos da responsabilidade fiscal ensaiam algumas medidas que até pouco tempo atrás xingavam como sendo “pedaladas fiscais”. Apenas para ficar na meta oficial de resultado fiscal para 2017: Meirelles reluta em admitir que nem mesmo o déficit declarado de R$ 140 bilhões será atingido. Parece óbvio que tal resultado resultará em grave mancha na reputação de quem se intitulava guardião da competência e do equilíbrio.

O próprio Relatório Mensal da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) exibe as informações do desastre. Os dados obtidos para o mês de maio de 2017 mencionam o pior resultado para esse mês desde que a série foi iniciada em 1997. O governo central apresentou um déficit superior a R$ 29 bilhões no mês. Para fugir a um eventual casuísmo de análise de um período isolado de 30 dias, a mesma performance pode ser identificada na avaliação do acumulado dos 5 primeiros meses do ano. Assim, no somatório janeiro-maio o déficit foi de R$ 35 bi, também o maior já visto para igual período ao longo dos 21 anos da série.

E, ao contrário daquilo que vinha sendo repetido “ad nauseam” pelos papagaios do financismo dentro e fora do governo, o principal responsável por tal desempenho não é a tal propalada explosão das despesas. O elemento que tem causado tal desastre é a brutal queda na arrecadação. Fato esse, aliás, já identificado há muito tempo por aqueles que alertávamos a respeito das consequências trágicas advindas da opção pelo austericídio.

Meirelles ameaça elevar impostos

A divulgação do resultado de maio elevou o total arrecadado ao longo dos 5 primeiros meses de 2017 para R$ 563 bi. Esse total representou uma queda real de R$ 10 bi em relação ao obtido em igual período de 2016, quando as receitas foram de R$ 573 bi. Ou ainda uma queda maior face ao resultado de 2015, quando a União arrecadou R$ 610 entre janeiro e maio. Caso consideremos o último período antes do início da opção pela austeridade nua e crua, veremos que esse acumulado de receita arrecadada estava em R$ 632 em 2014. Ou seja, houve uma queda de 11% no volume de recursos que ingressaram nos cofres do governo federal.

Caso o enfoque se concentre na avaliação do desempenho de arrecadação ao longo de período equivalente a um ano a tendência é a mesma. Antes do início do austericídio, o resultado de maio de 2014 exibia um acumulado de 12 meses equivalente a R$ 1,55 trilhão de receita federal. Ao longo dos anos seguintes, a opção pela recessão provocou queda nesse volume a cada novo ano, até atingir o valor de R$ 1,35 tri no maio mais recente. Isso representa uma queda de 13% na capacidade arrecadatória ao longo de 3 anos.

Com a popularidade de Temer no rodapé da sala e o envolvimento de seus principais colaboradores com a polícia e o Ministério Público, a performance econômica não autoriza nenhum tipo de otimismo. No entanto, a debacle fiscal já era esperada de há muito tempo. O austericídio havia cortado a fonte de receitas lá atrás, pré-anunciando a quem quisesse ouvir a chegada da etapa 2.0 da crise. Não por acaso a própria equipe que lá foi colocada com o apoio entusiasmado da turma do impostômetro, agora joga a toalha e fala em elevar tributos. Oh, santa heresia!

Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

10 Comentários

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  1. Quando escuto um desses

    Quando escuto um desses economistas do mercado financeiro falar (Meirelles incluso, diga-se) eu sempre fico na dúvida entre quatro alternativas:

    1. Será que são tão burros que não conseguem prever os resultados sociais danosos das ideias que defendem;

    2. Será que são desonestos e é tudo proposital, ou seja, empurram goela abaixo medidas de austeridade para justificar a adoção de medidas ainda mais duras, que prejudicam muitos e beneficiam poucos (tipo sucateamento de serviços públicos ou estatais para justificar a sua privatização);

    3. Será que são ingênuos o suficiente para realmente acreditar com toda a fé doentia que possuem nas teorias que defendem. Ou seja, acreditam mesmo no que fazem, mesmo que comprovadamente não funcione, pois são incapazes de admitir que sua fé está errada;

    4. Não passam de sádicos psicopatas que pouco estão se lixando para os outros. São mais doentes e perigosos do que um psicopata armado que invade uma escola para matar professores e alunos que não lhe agradam.

    Ao longo dos anos foi reforçando em mim a opção pela alternativa 4. Realmente, essa gente não passa de sádica, psicopata, capaz de defender suas ideias utilizando o mais profundo cinismo e desprezo para com outros seres humanos. Não os suporto. Sindo nojo deles. Não é possível serem tão desumanos.

    1. Marcos K…

      Item 2 e 4 (com certeza o 4). Aplicar uma recessão que diminui a atividade economica como um todo, incluindo as receitas tributárias oriundas dela; aumentar a taxa de juros, ou simplesmente não baixa-las, sobra a alternativa de subir os impostos. Quando a Dilma voltou de férias na segunda eleição com o Levy a tiracolo, em um comentário disse que diminuir as receitas, aumentar as despesas só sobraria aumentar os impostos, ou seja uma bobagem que leva a outra. 

      As respostas eficazes são bem mais complexas que esse jogo aritimético mas isso não importa ao grupo que toca isso e nem é percebido por quem deveria.

       

      1. Psicopatas? Não, eles não são

        Psicopatas? Não, eles não são psicopatas. Eles estão é possuídos, e quem os possui é Mammon.

        Eles fazem o que é necessário para agradar o deus mercado, e se o deus mercado exige sacrifícios humanos, bora crucificar gente no altar da “lógica” econômica. Não vimos o outro ídolo dos mercadistas, Armínio Fraga, prometer aumentar o desemprego, que estava “baixo demais”? Com certeza não é pelo prazer de fazer gente sofrer, é para atender os desígnios da acumulação do capital. Com todo mundo empregado, como é que o capital vai impedir os salários de subirem? Com os salários subindo, como manter a taxa de lucro? Com a taxa de lucro caindo, como é que se vai fazer para que o dinheiro continue a se multiplicar?

        Eles são é fundamentalistas religiosos. O deus deles não exige atentados a bomba, exige um exército industrial de reserva que comprima os salários. Se isso mata mais do que bala de revólver ou veneno estricnina, é outra discussão.

  2. E o tal do Drimtiam ?

    Essa turma, que se acha portadora da verdade e da luz economica divina, presente nesse Titanique brasiliense, cheio de ratos, deveria era ter um pouquinho de vergonha na cara e abandonar esse barco naufragante, ao menos para salvarem o próprio currículo.

    Não o fazendo, estarão passando um atestado de membros da quadrilha, não é? Quem vier a passar o Brasil a limpo, proximamente, vai responsabilizar esses caras, como é o desejo de toda a sociedade.

  3. Temos uma elite presa ao seu
    Temos uma elite presa ao seu passado colonial e um povo sbmetido a 300 anos de escravidao: ou a Senzala se rebela ou seremos sempre isso: mais do mesmo…

  4. Comentário.

    Tem alguma coisa neste governo que não seja uma farsa escondida em falsas promessas? Frase estranha, mas é assim mesmo.

     

    Vão faltar poste e gasolina neste país.

     

  5. Economia

    Simplesmente, faltam lideranças ! Não se sentem à vontade em formar esse governo por nomes novos, mesmo que do mesmo partido, devido esses clássicos de um modelo superado estarem no final de suas vidas.

  6. Os Coxinhas são as Rãs que queriam um Rei

    Amigas de novidade, quiseram um dia as rãs ter seu rei, e pediram-no a Júpiter. O deus prestou-se benigno a seus desejos, e atirou ao charco em que viviam um pedaço de pão. Com o baque a água estremeceu, e as rãs, cheias de pavor, esconderam-se no fundo mais fundo, no lodo do charco. Para logo porém foram cobrando alento; levada pela curiosidade, uma sobe à tona d’água, levanta a cabeça e põe-se a admirar o seu rei. Imita a outra, e outra, e todas. E tomam ânimo, e aproximam-se nadando; vendo que o rei nem se movia, põem do lado toda a timidez, e começam a saltar sobre a inerte majestade.

    Não era isso que queriam as rãs; ei-las de novo ante o trono de Júpiter, queixosas do logro que lhes havia pregado. Já que por bom e manso vos não serve o rei que vos dei ides ficar satisfeitas, disse o deus, cansado desta tão louca importunação. E deu-lhes a cobra, a cobra que de hora em hora abria a goela, e engolia alguma de suas súditas.

    MORALIDADE: Contentemo-nos com o que temos; não queiramos novidades.

  7. Bando de maluco

    Desgraça anunciada aos quatro ventos e há tempos. O impressionante não é ter caido em ouvidos moucos, o que impressiona é que muitos ainda escutam o mantra da “saída” da recessão e negam as evidências de que vai piorar antes de melhorar. Sem contar que para melhorar é preciso, antes, parar a descida ladeira abaixo e isto só se dará quando outra política econômica vier para substituir o austericídio.

    É interessante observar as conclusões a que chegam os “agentes de mercado” e o governo ante os fatos. Lembra-me a velha piada do zoólogo louco e a aranha. O tal, em um experimento, prendeu uma aranha com uma pinça sobre a mesa. Abriu a pinça e disse: anda! E a aranha saiu em disparada. Arrancou uma perna da aranha e ordenou novamente: anda! Repetiu o experimento sucessivamente, arrancando uma pata a cada vez, até a extirpar a última, quando concluiu: o aracnídio, ao lhe serem retiradas as patas, quedou-se absolutamente surdo.

    O mesmo parece fazer o dream team capitaneado por Meirelles, o vendedor de seguros e por Goldjan, the Zero Zero Boy, o cara da zero inflação e do zero tudo o mais, investimento, produção, consumo, emprego e renda (exceto a dos juros, of course). Estão a matar o motor da economia nacional  e quando o carro parar de vez  irão concluir que foi por falta fé na tal da fada da confiança.

    Socorrendo-me do ilustre Ministro do STF Gilmar Mendes, deixo aqui um aviso, “não se corre atrás de doido porque não se sabe onde se vai parar”.

  8. “Paulo Kliass é doutor em

    “Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.”

    Bom ver que pelo menos alguns colegas não sucumbiram ao ódio de classe que tomou conta dos nossos senior civil servants…

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