A Narrativa, por Renato Santos de Souza

A Narrativa, por Renato Santos de Souza

Tudo teria começado devido a mudanças decorrentes da atuação cada vez mais sofisticada do crime organizado e das organizações terroristas na Europa. Nas palavras do narrador, “os países europeus, que vinham estudando nos anos 1980 a possibilidade de formar uma União Europeia, saindo da mera zona econômica e constituindo uma comunidade integrada, perceberam que seria necessário dar um passo semelhante na área do Direito Penal, o qual deveria ser globalizado. Esse processo foi pensado a partir da premissa de que, ao invés de reprimir o crime organizado nas suas consequências seria melhor asfixiá-lo financeiramente – o mesmo valeu para o terrorismo”.

E ele continua, “com esse propósito, em 1989 foi constituído em Paris um grupo chamado para operar na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e que formará uma minuta de uma legislação penal econômica para todos os países membros da OCDE. A ideia seria trabalhar com o princípio da globalização econômica, o que exigiria, com o tempo, também a globalização de partes do Direito – não de todo ele, evidentemente. A minuta foi adotada pelos países membros da OCDE e, a partir daí, alguns países que não pertencem à OCDE, como é o caso do Brasil, foram convidados a adotar essa legislação em troca de uma série de vantagens, como acesso a mercados, novas tecnologias, linhas de financiamento com juros favorecidos”.

E mais:, “a adoção pelo Brasil teria se dado entre 1998 e 2000, quando o país passou a ser membro do GAFI. Nesse momento, o Brasil começa a trocar sua arquitetura jurídica no que diz respeito ao direito econômico penal. É a partir dessa mudança que se torna possível identificar nas novas gerações de graduandos e pós-graduandos de nossas faculdades de Direito – e com o tempo, esses novos quadros serão juízes, promotores e advogados – a consciência de que quem quisesse se especializar nessa área do Direito teria de estudar fora. E isso por uma razão muito simples: não houve uma renovação do pensamento penal brasileiro nas universidades, que ficaram encasteladas e presas a doutrinas superadas, com um viés que nós podemos chamar de romano-germânico – bastante litúrgico, cheio de entraves burocráticos, cheio de sistemas de prazos e recursos que permitiam aos advogados discutir não grandes questões factuais mas sim teses, pleitear vícios, aguardar que tais pleitos fossem julgados lentamente e, assim, obter a prescrição dos crimes dos seus clientes”.

Assim o jurista da FGV narra as novas formas de “fazer justiça” nascidas no âmbito do processo do Mensalão e aprofundadas com a Lava Jato.

O argumento é de que existiria um conflito entre dois paradigmas do Direito, um velho e outro novo, um de origem romano germânica – o velho – e outro de origem anglo saxônica – o novo.

E prossegue: “esses alunos vão estudar fundamentalmente em universidades americanas e inglesas. O resultado dessa formação foi uma renovação da mentalidade na Justiça brasileira, especialmente na primeira instância da Justiça Federal e no Ministério Público de um modo geral. Foi essa renovação que, a meu ver (o ver do narrador), ocasionou os conflitos geracionais, em particular nessa esfera do direito penal a que eu venho me referindo. Antes, no julgamento do Mensalão, os personagens envolvidos contrataram os grandes criminalistas brasileiros, inclusive com a articulação do falecido ex-Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos. Esse pessoal sofreu uma derrota, especialmente nos votos do relator, Joaquim Barbosa, que já tinha uma visão mais americana, mais voltada a esse direito penal que vai direto ao foco, que trabalha com a identificação de atos que fogem a determinados padrões. Em geral, essa nova visão do direito penal é, de fato, sustentada por pessoas e equipes que entendem de contabilidade, que usam bem a tecnologia, que têm formação interdisciplinar, que sabem identificar procedimentos de ocultação de propriedades e de patrimônio. É uma turma capaz de descobrir os rastros deixados por documentos em vastas cadeias utilizadas para ocultar patrimônio ou dinheiro sujo”.

O que quero mostrar é que o que está acontecendo hoje é consequência de algo que começou a ser percebido já a partir do processo do Mensalão e cujas origens remontam à década de 1980. É essa a história do conflito geracional e das visões do Direito que nós estamos vendo hoje, e são poucas as faculdades de Direito com professores preocupados em mostrar aos alunos esse confronto entre duas arquiteturas jurídicas – uma romano germância, tradicional; outra de corte anglo saxão, atrelada aos mecanismos de controle de uma economia globalizada”, conclui.

E referindo-se especificamente ao julgamento do Lula, afirma: “quando alguém diz que não há provas, quer isto dizer que não haveria provas do ponto de vista de uma leitura germano-românica do direito penal econômico. O que se procurou mostrar, tanto no caso do juiz Sérgio Moro quanto no caso dos desembargadores da 8a turma do TRF-4, é que, independente da inexistência de um título de propriedade ou do chamado “ato de ofício”, o que se tem é o desmonte de uma cadeia de documentos que identificam o crime e que justificam a condenação. Ou seja, é uma mudança no conceito de prova, uma mudança no conceito de processo e uma mudança no conceito do próprio delito”.

Ufa! Demorou, mas saiu a narrativa elaborada para tentar legitimar a aplicação da “justiça” de exceção que tem sido feita atualmente pela Operação Lava Jato, e anteriormente pelo julgamento do Mensalão. Sobretudo a justificativa para as inúmeras violações à Constituição, para o atalho às leis, a reiterada obstrução ao direito de defesa e a postura ativista de juízes e procuradores.

É interessante perceber que até agora poucos juristas haviam se arriscado a defender ou justificar pela doutrina jurídica a forma de aplicação da justiça nos casos do Mensalão e da Lava Jato, ao passo que pululam críticas a eles da parte de grandes nomes do Direito. Na verdade, não havia muita saída na doutrina jurídica para o que vem sendo feito na justiça brasileira, ao mesmo tempo em que se avolumam como leite fervente os fatos críticos, a ponto de parecerem permanentemente prestes a transbordar.

Uma saída doutrinária para os simpatizantes dos processos do Mensalão e da Lava Jato, talvez tivesse sido o chamado Neoconstitucionalismo, que advoga o poder vinculante da Constituição, de forma que os juízes poderiam escolher e aplicar diretamente os princípios constitucionais que conviessem aos seus processos e suas decisões, dando as costas para as leis quando estas, supostamente, obstruíssem a aplicação destes princípios. Mas o Neoconstitucionalismo é muito controverso para ser usado como narrativa legitimadora, sobretudo pela ala conservadora que apoia os justiceiros do momento por estarem purgando a ala mais pragmática da esquerda, aquela que mais ameaça as suas posições de poder. Mas esta é matéria para outro texto.

Então, faltava uma narrativa para legitimar o que tem sido feito da nossa Justiça.

Não tanto para convencer o meio jurídico, mais atento e afeito ao ofício de construir e destruir narrativas, mas para tranquilizar os incautos e sequiosos por justiçar políticos corruptos, em grande parte formados por aqueles membros da classe média que aplaudem o que tem sido feito nestas operações porque aprenderam, com a mídia, a odiar os suspeitos, os réus, os investigados, os políticos em geral, muito antes de amar a democracia e o Estado de Direito.

Então, ei-la aí! Na falta de uma narrativa baseada em filosofia jurídica, fique-se com uma calcada apenas em história e geopolítica. E torça-se para que ninguém note que não se falou em Direito propriamente dito.

Mas…. observemos, cada narrativa legitimadora tem uma lógica interna muito interessante e sofisticada, pois ela tem que colocar o objeto da legitimação em conformidade com os valores, normas e significados compartilhados por seu público. Esta é a essência da legitimação! Neste caso, para capturar este público com uma narrativa legitimadora, ela teria que conter alguns elementos que geralmente são dados como valorosos por ele, e que encontramos facilmente na narrativa apresentada.

(1) Ela precisaria apresentar os fatos, o que está acontecendo (no caso, a nova forma de “fazer justiça” dos delegados, promotores e juízes destes processos), como resultado de uma grande transformação evolutiva, progressiva, mas conflituosa, de luta, que tem de um lado o novo, vibrante, esperançoso, moderno, e do outro o velho, arcaico, burocrático, decadente e ultrapassado.

(2) A narrativa precisaria, também – como fez o narrador -, apresentar este conflito como já superado em partes mais evoluídas do planeta, onde o novo já teria se estabelecido por estar mais sintonizado com os novos tempos: as novas formas de criminalidade, as novas tecnologias, os novos valores morais, a globalização e a novíssima compressão do espaço-tempo da era da internet, que já não tolera protelações ou longos prazos de espera.

(3) Era importante, da mesma forma, que apresentasse este embate não apenas como uma luta do novo contra o velho, mas como uma guerra de paradigmas: “o professor tentou esclarecer as atuais tensões jurídicas e políticas do país analisando os novos paradigmas globais do direito penal econômico”, traz a apresentação do texto; “a mudança no paradigma do direito penal econômico já tem aproximadamente 30 anos”, afirma o narrador. A palavra “paradigma” é central aqui, pois ela passa a impressão (falsa, diga-se de passagem) de que em ambas as posições há um lastro de fundamentação filosófica, alicerçado em formas de conhecimento e visões de mundo legitimados intelectualmente por gerações de pensadores e pesquisadores, mesmo que divergentes. A ideia de que ambos são “paradigmas” do Direito em disputa cria uma crença de que há um espaço de legitimidade intelectual para cada uma delas e, portanto, a escolha da visão mais adequada seria uma questão de conveniência em relação às exigências práticas dos novos tempos.

(4) Também, era importante apresentar a atualidade desta nova forma de fazer justiça como algo proveniente de uma cultura mais voltada à modernidade, ou até inventora da modernidade contemporânea: a cultura anglo saxônia alicerçada na Inglaterra, mas atualmente capitaneada pelos norte americanos. Trata-se de uma outra dimensão, agora institucional, que o american way of life tem como referência para países colonizados como o nosso; da cultura do Novo Mundo contra os resquícios culturais do Velho Mundo, em particular ainda gravados como digitais em sistemas jurídicos mais atrasados, como o nosso. Não esqueçamos de que, para o público mais provável desta narrativa a modernidade contemporânea tem um universo simbólico muito associado ao modo de vida, à cultura e às instituições norte americanas, não raro tidas como exemplos a serem seguidos e objetos de admiração e desejo por ele.

(5) Por fim, ainda sintonizada com este provável público, a narrativa deveria evitar os argumentos propriamente filosóficos e jurídicos, mais complexos de entender e ao mesmo tempo vulneráveis à desconstrução teórica, concentrando-se na ideia de que há uma imposição histórica (a necessidade de se alinhar com os novos tempos), uma necessidade prática de alto nível (dar conta de inimigos superlativos destes novos tempos, como o crime organizado e o terrorismo), e uma procedência baseada em nações e organismos multilaterais tidos como institucionalmente mais evoluídos (que emanam certa autoridade da fonte das mudanças, fazendo com que este público aceitem-nas dogmaticamente).

Ora, quem quer ficar do lado do que é decadente e ultrapassado? Quem não quer estar sintonizado com seu tempo? Quem não quer estar sintonizado cum uma cultura mais contemporânea e globalizada? E quem não se sente melhor quando suas crenças podem ser sustentados filosófica ou cientificamente? Esta é a lógica da legitimação presentes nos elementos desta narrativa. Ela não falou em Direito propriamente dito, falou em referências históricas e elementos simbólicos que dialogam com o universo simbólico e de valores do seu provável público. 

Mas, para entender todas as faces de uma narrativa, é preciso atentar não apenas para o argumento da narrativa em si, para o que ela diz. É preciso atentar também para quem é o sujeito da narrativa, da fala; para aquilo que é dito mas não faz parte do argumento da narrativa; e para tudo aquilo que não é dito mas depreende-se dela. Então vamos lá!

Quem é o sujeito desta narrativa?

Bem, a narrativa apresentada no início deste texto foi extraída de uma entrevista do professor de Direito da FGV José Eduardo Faria, em entrevista de 06 de fevereiro de 2018, ao caderno de Cultura do Estadão. Como professor Universitário e orientador de pós-graduação, o entrevistado cumpre o papel legitimador que a academia sempre tem para qualquer narrativa. Nenhuma narrativa se generaliza e/ou sobrevive ao tempo sem uma chancela acadêmica.

Mas o entrevistado é também editorialista do Estadão, um dos maiores órgãos de imprensa do Brasil, o que sugere que ele cumpre também o papel que a grande imprensa há tempos tem desempenhado na sociedade brasileira, o de escolher e difundir as narrativas que lhe interessam dos fatos.

E há aqui uma questão curiosa. Se o professor José Eduardo é editorialista do Estadão, ou seja, escreve as opiniões do próprio jornal em que deu a entrevista, porque divulgar sua narrativa numa entrevista e não num Editorial? Ora, a mim parece que para simular uma neutralidade em relação à opinião do próprio Jornal (que obviamente não há), dando mais credibilidade à narrativa por apoiar-se em sua posição como jurista e professor ao invés de como jornalista. Vou evitar de nominar esta estratégia, mas é o que posso pensar a partir disso.

Portanto, o “sujeito da fala” é fundamental aqui, pois ele cumpre uma dupla função na narrativa: a de dar legitimidade acadêmica e a da seleção e difusão da narrativa conforme os interesses da imprensa.

Além disso, há coisas ditas perifericamente pelo professor, mas que seriam fundamentais na construção de uma narrativa alternativa, que pretendo propor a seguir. Por exemplo: (1) que estamos aplicando uma legislação estrangeira em nosso país, a partir de uma minuta da OMC, sem necessariamente termos mudado nossas leis e nossa Constituição; por isso, provavelmente, os frequentes flagrantes de ilegalidade na aplicação desta “nova Justiça”; (2) que a Estratégia Nacional para o Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA), como parte deste novo sistema de colaboração internacional de combate ao crime organizado, foi criada em 2003, ou seja, já no primeiro ano do Governo Lula, o que deixa sem sentido a narrativa de que o PT teria montado, sob o comando do próprio Lula, o gigantesco mecanismo de corrupção do qual ele foi acusado e condenado; (3) que nossas novas gerações de promotores e juízes têm sido formadas em universidades americanas e inglesas, para aplicar uma concepção de Direito oriunda de lá, por e para atender aos interesses deles e não aos nossos; (4) que há um o novo conceito de prova, mas que é apenas um conceito em aplicação, provavelmente a partir da minuta da OMC, mas sem tipificação e materialização na nossa legislação; por isso, talvez, o Juiz Moro tenha tido que inventar um tipo novo de propriedade, a “propriedade atribuída” (uma que não é nem de direito, nem de fato), para justificar sua sentença condenatória ao Lula no caso do triplex. E assim por diante…

Além disso, há pelo menos duas coisas dramáticas, que não foram ditas nesta narrativa mas se pode depreender dela: (1) que este “novo” modo de fazer justiça não tem base legal na nossa legislação, portanto, os juízes passaram a legislar por suas próprias sentenças. Sem amparo legal na nossa legislação, juízes aplicam esta “nova justiça” de costas para as leis, cometendo ilegalidades e criando as próprias tipificações quando lhes faltam amparo legal; e (2) que esta nova forma de fazer justiça tem sido aplicada tendo o Judiciário como protagonista, a revelia da nossa Constituição e do nosso sistema legal, sem que tenha havido um debate público a respeito, sem que tenha sido refeito o nosso marco legal pelas instâncias competentes, e sem qualquer tipo de controle público, que, como se sabe, só é possível nos poderes Legislativo e Executivo. Portanto, esta “nova justiça” é uma imposição norte americana, feita pela cooptação de um poder que não permite qualquer controle público. É sua nova forma de ser império, e nossa nova forma de ser colônia.

A partir daí, então, com todos estes elementos postos, dá para construir uma outra narrativa, apenas com os dados fornecidos pelo ilustre professor, o que prova que seu argumento é apenas mais uma narrativa que serve às suas intenções e a de seu jornal de legitimar os atos jurídicos que têm sido feitos no âmbito do processos do Mensalão e da Lava Jato.

Minha narrativa, então, vai noutro sentido, embora sem ignorar os fatos narrados pelo professor. Ei-la aqui:

Tudo teria começado quando países da Europa e EUA tentaram resolver seus problemas com o crime organizado/narcotráfico e o terrorismo por meio da asfixia econômica de suas organizações criminosas. Para isso, precisariam de uma Justiça mais célere e focada nas novas dinâmicas econômicas da criminalidade, e que além disso seguisse o modus operandi norte-americano de combate aos suspeitos de terrorismo, já ensaiado grosseiramente com o Macartismo na perseguição aos comunistas, de prender e depois investigar, atirar e depois averiguar.

Dado que este tipo de organização criminosa tem ramificações internacionais, eles precisariam da colaboração de outros países, que adotassem esta nova “filosofia” de combate. Os países mais interessados na disseminação de seu novo modo de tratar estas organizações e seus membros, como EUA e Inglaterra, por sua grande influência no ocidental, conseguiram que fosse disseminada uma minuta de legislação (espécie de inspiração estrangeira das 10 medidas para combate à corrupção) via OCDE.

Como esta nova forma de operar a justiça era estranha aos interesses, ao pensamento jurídico e a própria noção de democracia que voltava a ressurgir das cinzas em muitos países latino-americanos com suas novas constituições, eles passaram a comprar com créditos e benesses econômicas o alinhamento de países como o Brasil a esta nova doutrinação jurídica. E passaram a treinar nossos jovens advogados, promotores e juízes nos EUA e Inglaterra, para que aplicassem aqui estes novos modos de operar a justiça desenvolvidos por lá, dando a eles cursos acadêmicos, e também palco para palestras e prêmios de reconhecimento quando se mostravam diligentes nesta tarefa de serem úteis aos interesses estrangeiros (todos nós sabemos como um acento, um título e um púlpito em uma universidade americana ou no Departamento de Estado dos EUA faz brilhar os olhos dos jovens, a ponto de se tornarem, aqui, fieis replicantes do que aprenderam lá, como quem presta reverência por fazer parte de algo superior ou sagrado).

Com suas particularidades, esta geopolítica judiciária lembra muito as formas de influenciação já usadas pelos EUA em outros tempos, com o Plano Marshall e os convênios MEC-USAID.

E assim, os EUA principalmente, montaram uma legião de servidores do Estado brasileiro a trabalharem pelos seus interesses aqui no Brasil, não apenas no combate ao crime organizado e ao terrorismo como manifestado inicialmente, mas também, indiretamente, favorecendo os seus interesses econômicos imediatos: a ocupação dos enormes mercados deixados pela destruição que esta forma de justiça fez da nossa indústria de infraestrutura, que vendia serviços para o mundo todo; a ocupação de boa parte de nossas riquezas do pré-sal; e o favorecimento aos americanos na verdadeira indústria de indenizações que se tornaram os processos movidos nos EUA contra empresas estrangeiras que praticam corrupção, mesmo que fora do território americano, que rende anualmente grandes recursos financeiros a eles (lembremos que recentemente a Petrobrás pagou uma indenização de quase US$ 3 bilhões aos americanos pela corrupção feita aqui).

A conclusão desta narrativa é de que, uma vez que toda esta nova arquitetura jurídica está em desconformidade com o nosso marco legal, quem tem reformado a legislação e a Constituição brasileira, assim como os conceitos de prova, de processo e de delito para se adequarem a esta minuta que atende aos interesses estrangeiros, tem sido estes promotores e, principalmente, juízes formados pela doutrina das escolas americanas. E eles não têm feito isso se submetendo ao voto popular e conquistando um mandato político que legitimasse a proposição destas mudanças legislativas: não, eles têm feito isto usando de um poder quase despótico que têm, inacessível a qualquer forma de controle externo. Eles têm legislado por sentenças, criando conceitos e formas jurídicas novas que se alastram como jurisprudência por todo o sistema judiciário, numa usurpação do poder político do legislador sem precedentes na história, que se pode caracterizar, até mesmo, como uma nova forma de golpe, desta vez contra o poder Legislativo.

Isto pode ter cara de novo, pode parecer moderno, pode ter as luzes das vitrines da 5ª Avenida e o caimento perfeito dos ternos de Miami, mas não é nenhuma coisa nem outra, porque não é democrático, é pré iluminista e faz parte de uma geopolítica obscurantista para atender a interesses que não são os nossos

Os preços são a nossa democracia e a nossa soberania!

5 Comentários

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  1. Inacreditável…

    Olha, qualquer primeiranista de direito sabe que essa ideia de que o direito anglo-saxônico é “novo” ou “moderno”, enquanto o direito romano-germânico seria “obsoleto” ou “atrasado” é absurda. Ambas são velhas tradições no direito, a primeira remontando à Idade Média, a outra ao Império Romano, depois atualizada na Renascença. Não dá pra levar a sério a ideia de que uma tradição medieval poderia ter o tipo de impacto que o professor José Eduardo Faria quer que a gente acredite que tenha. E nem, aliás, que os países europeus, cujos direitos internos, todos eles, com exceção justamente daqueles que brexitaram recentemente, são firmemente assentados na tradição germano-germânica, possam ter sido os iniciadores dessa suposta modernização através da medievalização…

    Eu fico pensando como é que um jurista põe seu nome embaixo desses absurdos.

  2. poderia concordar

    mesmo sem ler, venham com todas conversas moles do fim do mudo, mas não existe justificativa que justifique ser aplicada qualquer lei ou joça que seja só de um lado.SOLTEM LULA POIS É O PRESIDENTE 2018 DESTA NAÇÃO!

  3. Sérgio Moro e Deltan

    Sérgio Moro e Deltan Dallagnol foram estudar nos EUA e deu no que deu.

    “Ah, não… mas você acha que vou desperdiçar essa oportunidade de dar um upgrade na minha carreira rejeitando um curso nos EUA? Tudo bem, não é em Harvard mas, sacumé: com esse estágio no meu CV qualquer empresa me paga meu peso em ouro!”

    Grigory Perlman, matemático russo que conseguiu resolver um dos sete problemas matemáticos mais complexos do mundo, a conjectura de Poincaré, recusou não apenas o prêmio (um milhão de dólares) e a medalha estadunidenses, como declinou definitivamente do convite para dar aula em universidade dos EUA.

    Não há coxinha – e até não-coxinha – que não o taxe como bobo. Taxação, essa, que pode ser tomada como elogio por quem quer ver o próprio país numa boa.

  4. Como professor Universitário
    Como professor Universitário e orientador de pós-graduação, o entrevistado cumpre o papel legitimador que a academia sempre tem para qualquer narrativa. Nenhuma narrativa se generaliza e/ou sobrevive ao tempo sem uma chancela acadêmica.
    Inclusive a narrativa do golpe hahahah

  5. André

    Cara, seu comentário não desqualifica o argumento do autor, e nem coloca em pé de igualdade a narrativa do professor descrita no texto com a “narrativa do golpe” que vc citou, percebes isso? Ou só quis dar pitaco do contra mesmo?
    Muita gente vem nesses artigos só pra discordar por discordar, sem argumentos e sem a honestidade intelectual de discordar decentemente. Basta que suponha ou identifique uma abordagem que lhe soe de esquerda ou de direita para, antes de entender o raciocínio, já previamente se posicionar contrário ao texto, esquecer de compreende-lo e o contrapor apressada e deficientemente.
    Não sei se é o seu caso, mas preciso pontuar isto pra que, se não for o caso, vc repense sua postura na contra- argumentação.
    Não é para ser uma competição. É para ser uma ampliação da nossa capacidade de ler a realidade.

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