A parcialidade de Moro já exposta no Supremo, por Felipe Mello e Luiza Pitta

Não se pode deixar de observar que a matéria já fora enfrentada e as decisões do proferidas pelo juízo de piso de Curitiba continuam intactas

Foto: Divulgação

(Im)parcialidade: STF x Moro

Por Felipe Mello de Almeida e Luiza Pitta

Ao estar em frente ao Supremo Tribunal Federal – STF, uma imponente estátua, de autoria do mineiro Alfredo Ceschiatti, pode ser notada. Uma mulher, sentada, vendada e com uma espada em seu colo. Muitos não sabem, mas essa obra representa a deusa Têmis, divindade grega por meio da qual a justiça é definida e que normalmente é representada vendada, com uma balança em uma das mãos e uma espada na outra. Ela é a deusa da justiça, da lei e da ordem, protetora dos oprimidos, sendo representada com a venda nos olhos para demonstrar sua imparcialidade.

Segundo a mitologia grega, a deusa Têmis, filha de Urano e Gaia, como dito, é a deusa da justiça, da lei e da equidade. No mundo jurídico, é representada com uma balança, uma espada e, geralmente, com uma venda sobre os olhos. Para Pierre Grimal, a balança serve para “pesar” o equilíbrio do cosmo; a espada, o poder de punir quem estiver fora de seu lugar e a venda sobre os olhos simboliza a imparcialidade da decisão.

Ocorre que, com base em acontecimentos recentes, percebe-se que, infelizmente, a imparcialidade daqueles que julgam nem sempre é seguida à risca.

Em 28 de agosto deste ano, na operação BANESTADO, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, em decisão empatada, em razão da ausência do Ministro Celso de Mello – de licença médica, a parcialidade do ex juiz Moro, declarando a nulidade da sentença que impunha uma pena de 11 anos de reclusão, em regime fechado, pela prática de crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro (HC nº 144.615).

A sentença, proferida pelo juiz então juiz Moro, neste tocante, já havia sido revisada, e mantida, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ. No Supremo, o procedimento em questão, foi distribuído ao Ministro Edson Fachin que negou seguimento monocraticamente, impossibilitando, posteriormente, a sustentação oral pela defesa.

O STJ, contrariando o julgamento realizado no intitulado “inquérito das Fake News”, reconheceu que “a CF consagra o sistema acusatório no processo penal brasileiro, o que impõe a separação das funções de acusar e julgar atores distintos na justiça criminal (…) a imparcialidade somente pode ser assegurada em um sistema acusatório que delimite adequadamente a separação das funções de investigar, acusar e julgar”.

Ainda segundo o Supremo: “verifica-se que houve uma atuação direta do julgador em reforço à acusação. Não houve uma mera supervisão dos atos de produção de prova, mas o direcionamento e a contribuição do juiz para o estabelecimento e para o fortalecimento da tese acusatória… O cenário é evidente: o magistrado produziu provas, sem pedido das partes, a prova que ele mesmo utilizou para proferir a condenação que era almejada, por óbvio… o juiz ultrapassou em muito a função de mero homologador dos acordos e atuou verdadeiramente como um parceiro do órgão de acusação na produção de provas que seriam posteriormente utilizadas nos autos da Ação Penal que tinha como réu o paciente… o juiz efetivamente guiou e reforçou a tese acusatória com a direção do interrogatório”.

Neste julgamento, o Supremo Tribunal Federal reconheceu o que parecia ser óbvio nas manifestações públicas do ex-juiz de Curitiba, que, de fato, ele, enquanto juiz, trabalhou pela condenação, contribuindo com a acusação na produção e colheita das provas. A parcialidade do magistrado ficou, ainda, mais evidente com o escândalo da “vaza jato”, suposto vazamento de conversas entre os procuradores e magistrado, veiculado pela imprensa, por um aplicativo de celular.

Diante deste emblemático julgamento, fica evidente que as circunstâncias jurídicas são complexas, com opiniões dissonantes, o que causa imensuráveis dificuldades jurídicas.

O reconhecimento da parcialidade da participação do ex magistrado celebridade, na intitulada Operação Lava Jato, não causa espécie sequer para seus apoiadores, que sempre o admiraram pela atuação implacável com os acusados. Não existe qualquer novidade nos fatos recentemente reconhecidos pelo STF.

No entanto, não se pode deixar de observar que a matéria já fora enfrentada e as decisões do proferidas pelo juízo de piso de Curitiba continuam intactas. Contudo, no processo em questão, a parcialidade do ex magistrado foi reconhecida em agravo de Habeas Corpus, recurso que na maioria dos casos é negado de plano, pela impossibilidade de revolvimento de provas, pelo mesmo Tribunal.

Em relação ao resultado do julgamento, não se tem qualquer dúvida de seu acerto, mas conforme se observa, quando se quer, as nulidades são reconhecidas sem qualquer dificuldade, superando todas as dificuldade e resistências. Em contra partida, o inverso é absolutamente verdadeiro, quando não se quer reconhecer a nulidade, valem-se de amarras procedimentais, afastando de plano.

Não é possível ignorar que a decisão, reconhecendo a parcialidade do então juiz Moro, vai de encontro com diversos precedentes da Suprema Corte, especialmente no julgamento no intitulado “inquérito das Fake News”, tendo em vista que, naquele caso, os Ministros investigam e extrapolam os pedidos da acusação. Outrossim, no referido inquérito, os Ministros também figuram como vítimas e a confusão das partes salta aos olhos, uma vez que, ao que parece, ali aplicam-se dois pesos e apenas uma medida, situação que contribui ainda mais para a insegurança jurídica e, consequentemente, para o aumento da sensação de injustiça.

Felipe Mello de Almeida é advogado criminalista, especialista em Processo Penal, Pós-Graduado em Direito Penal Econômico e Europeu e em Direito Penal Econômico Internacional.

Luiza Pitta é advogada criminalista, Pós-Graduada em Direito Penal Econômico e associada do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCRIM.
Redação

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