A tática do confronto utilizada para conquistar eleições e para governar, por Arnaldo Cardoso

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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A tática do confronto utilizada para conquistar eleições e para governar

por Arnaldo Cardoso

Assim como quando Donald Trump venceu a eleição presidencial em novembro de 2016 nos EUA analistas no mundo todo indagaram se a agressividade e radicalismo presente no discurso do candidato poderiam ser mantidos a partir da posse como presidente o mesmo se deu com a campanha eleitoral de março passado na Itália, quando o partido de extrema direita Liga Norte, que tem em Matteo Salvini sua principal liderança, ficou em 3º lugar na soma dos votos e se credenciou a compor com o M5S o novo governo italiano.

Nesta última semana na Itália, marcada pelo acirramento do confronto do governo com a Comissão Européia que novamente rejeitou o orçamento apresentado para 2019 e deu início a um processo de sanção contra o país, que pode resultar em multa de € 3,4 bilhões, pesquisa de opinião mostrou que o partido de extrema direita Liga Norte continua em ascensão na aprovação da população, inclusive em regiões onde tradicionalmente a esquerda e a centro-esquerda recebiam maior apoio, como é o caso da Emília Romagna.

Apesar dos temores com o futuro da economia que não tem dado sinais de crescimento e com a queda na Bolsa de Valores registrada na última semana em função de retração de investimentos estrangeiros, a aprovação da performance da Liga Norte hoje no governo parece se sustentar em medidas como a de  redução de impostos, do controle de imigração e do avanço da proposta para a criação da renda da cidadania, além do sentimento continuamente estimulado pelo discurso de Salvini de defesa do nacionalismo, patriotismo e autonomia em relação a questões diretamente ligadas a idéia de soberania nacional, enfraquecida no  processo da integração regional européia que levou ao deslocamento do poder decisório para instituições supranacionais do bloco. O apoio a Liga Norte tem provindo de empresários, classe média e parcelas da massa de trabalhadores italianos que se sentiam abandonados pelo poder central.

O principal condutor da tática do confronto na campanha eleitoral, Matteo Salvini, que agora acumula os cargos de Ministro do Interior e de Vice-Primeiro Ministro, tem se afirmado a cada dia como a cara do novo governo tanto para o público interno quanto externo.

No Parlamento, as votações também seguem tensas deixando transparecer também dificuldades entre os dois partidos da coalizão  governista, chegando até a ameaças de rompimento, dada a maior radicalidade do estilo Salvini. Isso ficou mais explícito na votação do projeto anti-corrupção, uma das bandeiras do M5S durante a campanha eleitoral. Apresentando várias propostas de emendas a Liga Norte ameaçava desfigurar o projeto. Ao final o projeto foi aprovado, com incisivas intervenções de Salvini ordenando a retirada de propostas de emendas, demonstrando a importância de sua liderança para manutenção da aliança que sustenta o governo.

Outra medida que avança no Parlamento é o Decreto de Segurança e Imigração, que reduz radicalmente a proteção humanitária de imigrantes, chamado Decreto Salvini e ferozmente defendido pelo Ministro do Interior é indicador da proeminência do político da Liga Norte na conformação da agenda do governo.

É observando também o varejo das votações no Parlamento que se encontram elementos que ajudam a compreender as bases para sustentação e fortalecimento dos partidos que hoje formam o governo italiano. No conjunto de medidas de redução de impostos votadas pelo Parlamento pode-se encontrar reduções em setores específicos como para a indústria de cigarros eletrônicos. Não por acaso a principal beneficiária do setor na redução de impostos e perdão de dívidas do setor, que somam 180 milhões de euros, é a italiana Vaporart que, na última campanha eleitoral, doou 75 mil euros para a Liga Norte.

Na arena internacional Salvini além de seus diários embates com Bruxelas, mantém seu discurso pró Trump, pró Putin, elogia Orban da Hungria (também alvo de sanção da U.E.) se articula com a líder da extrema direita francesa Marine Le Pen (acirrando confrontos com Macron) e elogia o novo presidente eleito no Brasil.

A tática do confronto mantida no discurso de Salvini, tem encontrado também nos recursos das novas tecnologias, especialmente das redes sociais, um meio de disseminação que tem se mostrado até então eficiente para a manutenção da coesão entre seus apoiadores.

A mais arrojada aposta de Salvini está nas próximas eleições européias que ocorrerão entre os dias 23 e 26 de maio de 2019 quando ocorrerá a eleição de deputados que representam os países membros da União Européia no Parlamento Europeu. Há uma série de articulações em que Salvini se faz presente, buscando eleger uma liderança da direita nacionalista populista para o Parlamento Europeu, capaz de mudar os rumos do projeto europeu.

A História nos ensina que os desdobramentos desses processos europeus tendem a transcender o próprio espaço europeu e, portanto, é justo que motivem a preocupação de todo o mundo.

 

Arnaldo Cardoso é cientista político, pesquisador e professor universitário.

 
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

2 Comentários

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  1. Esse governo faz ensaios para

    Esse governo faz ensaios para todos os lados. Ora como cortina de fumaça; ora gerando espectativa e esperando receber apoio. O pega para capar será quando esse show de horrores começar de vez.

  2. Elites
    O ex presidente Lula usou o confronto do “nós contra eles” durante todas as suas campanhas e governos. E as elites, até hoje não claramente identificadas, foram o seu alvo preferencial. O Bolsonaro aprendeu bem essa lição. Elegeu a corrupção e a violência como inimigos reais a serem vencidos, e com isso iludiu milhões.

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