Alguns precursores da ideia de evolução adaptativa, por Felipe A. P. L. Costa

Caberia citar aqui ao menos dois: o médico estadunidense William Charles Wells (1757-1817) e o comerciante e silvicultor escocês Patrick Matthew (1790-1874).

Alguns precursores da ideia de evolução adaptativa

Por Felipe A. P. L. Costa [*]

Já foi dito que Darwin e Wallace não foram os primeiros a falar em evolução. Mas eles também não foram os primeiros a pensar em seleção natural. Outros haviam formulado algo parecido antes, ainda que em versão embrionária e de alcance restrito e enviesado. Entre os antecessores, caberia citar aqui ao menos dois: o médico estadunidense William Charles Wells (1757-1817) e o comerciante e silvicultor escocês Patrick Matthew (1790-1874).

Em 1813, em um encontro científico, Wells evocou a ideia de seleção para explicar as diferenças na cor da pele de europeus (pele clara) e africanos (pele escura). (Artigo dele tratando do assunto foi publicado postumamente, em 1817.)

Matthew vislumbrou algo parecido. O trecho a seguir, extraído do seu livro On naval timber and arboriculture (1831, p. 364-5; tradução livre), bem poderia ser atribuído a Darwin ou Wallace:

Há uma lei universal na natureza que tende a tornar cada ser reprodutivo o mais bem ajustado possível às condições a que o seu tipo, ou a matéria assim organizada, está exposto, a qual parece destinada a modelar os poderes físicos e mentais ou instintivos à mais elevada perfeição, e a prosseguir sem cessar. Esta lei sustenta o leão em sua força, a lebre em sua rapidez e a raposa em sua astúcia. Como a Natureza, em todas as suas modalidades de vida, tem o poder de prosperar muito além do que é necessário para suprir o lugar do que sucumbe à decadência do Tempo, aqueles indivíduos que não possuem a força, rapidez, audácia ou astúcia necessária sucumbirão prematuramente sem se reproduzir – ou a presa aos seus devoradores naturais ou arruinada por uma moléstia, em geral induzida pela má nutrição, o seu lugar sendo ocupado pelos mais perfeitos do seu próprio tipo, que estão a pressionar os meios de subsistência [1].

Até 1859, Darwin e Wallace desconheciam esses trabalhos.

Após ler uma resenha da 1ª edição de Sobre a origem das espécies (1859), Matthew escreveu aos editores da revista, reivindicando para si a autoria da ideia de seleção. Darwin prontamente respondeu, dando-lhe o devido crédito e pedindo desculpas por ter ignorado o seu livro – disse que não imaginou que o assunto pudesse ser discutido em um tratado de silvicultura. O nome de Wells emergiu logo depois. A partir da 3ª edição (1861), Darwin acrescentou um registro histórico, citando o nome desses e de outros autores.

O mérito de Darwin e Wallace foi fazer o que ninguém até então havia feito: eles burilaram o conceito, ampliando e aprofundando o seu alcance. O esforço deles viria a culminar com a ideia de que a seleção natural – operando no interior de cada população, geração após geração – estaria a moldar as mudanças adaptativas.

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Notas

[*] Artigo extraído e adaptado do livro O que é darwinismo (2019), assim como 20 artigos anteriores – ver aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui. (A versão impressa contém ilustrações e referências bibliográficas.) Para detalhes e informações adicionais sobre o livro, inclusive sobre o modo de aquisição por via postal, faça contato com o autor pelo endereço [email protected]. Para conhecer outros artigos e livros, ver aqui.

[1] Compare: “Tiveram então que desaparecer muitas raças de seres vivos que não puderam, reproduzindo-se, dar origem a uma descendência. Todas aquelas que vês se alimentarem das auras vitais, têm, ou a manha, ou a força, ou então a mobilidade que, desde o princípio, protegeram a raça e a conservaram.” […] “A cruel espécie dos leões e as gerações bravias foram guardadas pela força, as raposas pela manha e os veados pela fuga.” – Tito Lucrécio Caro (c. 99 – c. 55 aC) (De rerum natura 5: v. 855-9, 862-3).

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Redação

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