Andre Motta Araujo
Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo
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As domésticas de Guedes e o Rei Jorge VI, por Andre Motta Araujo

A ideia é que o titular da economia precisa ser HOMEM DE ESTADO, com visão de País, visão geral das funções do Estado, nada de um tipo preocupado apenas com bolsa e índices

As domésticas de Guedes e o Rei Jorge VI

por Andre Motta Araujo

Durante a fase aguda dos bombardeios de Londres pela Luftwaffe, os soberanos da Inglaterra, Jorge VI e a Rainha Mary, mal eram acionadas as sirenas de fim das bombas, se dirigiam aos bairros atingidos para prestar solidariedade às vítimas, levavam cobertores e café, ficavam bastante tempo entre os escombros, trazendo apoio, reconforto e solidariedade aos londrinos vitimados pelas bombas alemãs, um gesto nunca esquecido pelo povo inglês.

O governo insistiu que os Reis, ou ao menos as filhas Elizabeth e Margareth, fossem para o Canada, mas os soberanos jamais cogitaram de deixar Londres, mesmo quando o Palácio de Buckingham foi alvo de bombas. Jorge VI entendia que era seu papel estar ao lado de seu povo sempre.

Um Ministro da Economia precisa muito mais do que conhecimento técnico, ter uma visão de conjunto do País, de seus problemas sociais e estruturais e, mais do que tudo, ter EMPATIA com o sofrimento de seu povo que hoje é talvez o maior na história moderna do País. A vida dos pobres no Brasil nunca foi fácil, nas periferias das cidades, nas carências de tudo e, especialmente do Estado, mas se já era ruim com emprego e a economia crescendo, é muito pior com a economia em recessão e com altíssimo desemprego e quando há emprego é na informalidade do subemprego ou do bico, com baixíssimo ganho.

Não se percebe, porque não existe, um mísero sinal de empatia do Ministro Guedes com o povão. Não há na sua vida anterior a ser Ministro qualquer sinal de atenção ao social, ao cultural, a algo mais do que ficar rico. Simonsen era apaixonado por ópera, por música clássica, por xadrez, Roberto Campos por cinema e literatura, Delfim se orgulha de sua imensa biblioteca, todos tinham ampla visão geral do País, poderiam ser Ministros de qualquer pasta, da Fazenda ou das Relações Exteriores, alguns foram das duas porque tinham essa amplitude de interesses e acumulação de conhecimentos.

Guedes faz questão de ostentar sua pequenez, sua aridez intelectual, plasmada em um curso no exterior na década de 70, onde os ensinamentos já foram há muito tempo para o arquivo morto das ideias econômicas. Hoje o mundo é outro, aquele neoliberalismo de Friedman está enterrado, mas agora no Brasil se pretende resolver gigantescos problemas econômicos e sociais com uma receitinha de farmácia antiga e superada na fonte.

OS MINISTROS DA ECONOMIA DO BRASIL E DOS EUA

Desde a República, cerca de 96 Ministros da Fazenda, Economia ou Planejamento do Brasil, cujas biografias levantei em meu livro MOEDA E PROSPERIDADE, tiveram currículos e estórias de vida muito diferentes, a maioria advogados, alguns engenheiros, dois médicos e poucos economistas.

Nos EUA, os Secretários do Tesouro, desde a Segunda Guerra, são na esmagadora maioria políticos, empresários e advogados, um só economista profissional.

A ideia é que o titular da economia precisa ser HOMEM DE ESTADO, com visão de País, visão geral das funções do Estado, nada de um tipo preocupado apenas com bolsa e índices, “economista de mercado” é um personagem muito precário para uma enorme função pública, é FUNDAMENTAL A EXPERIÊNCIA EM FUNÇÃO PÚBLICA ANTERIOR. Delfim Neto foi, antes de ser Ministro da Fazenda, Secretário da Fazenda do Estado de S. Paulo; Roberto Campos, Ministro do Planejamento com funções de chefe da Economia, tinha vasta experiência anterior em funções de Estado, criador e Presidente do BNDE, Assessor Econômico de Vargas, diplomata de carreira; Octavio Bulhões e Ernane Galveas eram executivos de alto nível do Banco do Brasil, MAS Guedes nunca teve função pública anterior, não é familiarizado como o Estado opera, sua distância dos problemas sociais é total, não parece que tenha qualquer sensibilidade para o drama da imensa maioria da população brasileira, seu negócio é dólar e juros e ponto final, equipamento insuficiente para gerir a economia de um grande País em crise. Nos EUA jamais seria escolhido para Secretário do Tesouro, mesmo em governos reacionários como o de Trump. Lembrando que na direção do Federal Reserve, o banco central dos EUA, não pode ter NINGUÉM LIGADO AO MERCADO FINANCEIRO, os sete dirigentes são economistas acadêmicos de diferentes escolas e linhas de pensamento econômico. No Brasil, TODOS os dirigentes do BC vêm e voltam para o mercado financeiro, um absoluto conflito de interesses. E ainda se pretende, nesse cenário, a independência do Banco Central, o que significa para sempre o controle do BC pelos bancos privados, que em plena recessão de 2019 lucraram R$ 87 bilhões de Reais, um escândalo fenomenal em um país onde todos perderam.

O PREÇO DO DÓLAR

Guedes disse que o dólar alto é bom para a economia, uma tolice sem igual, é bom para quem? Para alguns sim e para outros não. Grandes insumos da economia, como trigo e combustíveis, ficam mais caros com o dólar alto, as empresas com dívidas em dólar terão grande problema. Se o dólar alto é bom, PORQUE O BANCO CENTRAL INTERVEIO NO MERCADO NA SEMANA PASSADA para baixar o preço do dólar, gastando reservas preciosas? Ou é bom ou não é.

Ministro da Economia, por princípio, não FALA NADA sobre câmbio, é tabu. Porque Guedes diz que é bom dólar alto para todos? Que imensa tolice.

A FILA DO INSS

Uma das grandes tolices desse Ministro foi chamar para si outros Ministérios com funções muito especificas, como o Industria e Comercio, o Planejamento e, a maior estupidez entre todas, o Ministério do Trabalho, que em todos os grandes e médios países do mundo existe e é  um Ministério exclusivo, cuja clientela é o trabalhador e não o capital, que é cuidado pelo Ministério da Economia. NENHUM PAÍS DO MUNDO JUNTOU ECONOMIA E TRABALHO SOB O MESMO MINISTRO, mais que um crime, é um erro. Com essa ideia estapafúrdia, o INSS ficou sob o comando do Ministro da Economia e hoje está com um mega problema, de uma fila que chega perto de 2 milhões de trabalhadores com pedidos de aposentadoria sem atendimento. O que disse o Ministro Guedes sobre isso? NADA. Puxou para si o INSS, mas finge que o problema da fila não é dele. Não resolveu o problema e muito menos se desculpou.

Não quis tudo para seu império? E ainda queria o Ministério de Minas e Energia, os militares resistiram.  O problema do INSS é dele, agora resolva.

No meio da crise da fila do INSS, o Ministro Guedes foi tirar férias em Miami, com os desesperados idosos e grávidas na fila aqui, mas nem por isso ele suspendeu suas férias no paraíso tropical, que falta faz um espirito como o Rei Jorge VI, solidário com seu povo na desgraça.

Em política o gesto, o simbolismo do esforço e do cuidado com o povo é quase tudo, a presença física do Ministro no INSS, mostrando atenção ao problema seria o sinal do estadista, mas como esperar isso de um pequeno operador de bolsa? Administrar um fundo de investimento com dez funcionários não é a mesma coisa que gerir um INSS, é algo bem mais complicado e esse mega problema está hoje entregue a um calouro em função pública.

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Guerra aos pobres – O Brasil, único no mundo, extingue o Ministério do Trabalho, por Andre Motta Araujo

 

Andre Motta Araujo

Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo

4 Comentários

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  1. Piedosamente Carta Capital semanalmente disponibiliza uma pagina da revista para Delfim, leio o seu laitif motif e o deslumbramento com a reforma Frankenstein da previdência, do desmonte das lei trabalhistas, da torcida na implosão dos parasitas do funcionalismo, do estado sem Estado e assim por diante.
    Lembro dele deslumbrado saindo do valhacouto do Temer quando do golpista empossado pelo golpe e a declarar da certeza do mundo maravilhoso a seguir.
    Orgulha-se da imensa biblioteca, talvez seja este o grande legado.
    Triste figura, se fez algo positivo a historinha do bolo a ser distribuído será o seu epitáfio definitivo, verdade ou mentira sei lá mas tem cara de verdade.

  2. Guedes é um pirata que se apossou do leme econômico do país e só. Não podemos esperar nada de bom dele. Só podemos esperar alguma mudança de rota depois que for jogado ao mar.

    Mas o movimento pirata mais importante atualmente é o que Bolsonaro ameaça fazer: desmontar completamente o sistema político com apoio das forças armadas e policiais da ativa, da reserva e ex-policiais. Talvez não exista precedente de tamanha disrupção no mundo ocidental. Sabe-se lá o que vai restar da ordem atual das coisas se isso acontecer, mas quem sabe não surja uma oposição que funde um sistema político mais maduro e, sonhando alto, bem mais virtuoso.

  3. Chamberlain sabia disto. E evitou a guerra a todo custo. O falastrão do Churchill quis comprar a briga, mesmo com uma Inglaterra destroçada na 1.a Grande Guerra e sem a menor capacidade de enfrentar a Excelência Alemã. Passou toda Guerra escondido em algum buraco, fugindo das bombas voadoras alemãs. A Realeza tentando remendar o cacos que sobravam da destroçada Londres, pela provocação inconsequente. No final, entregaram aos Americanos até os saiotes da Rainha. O Falastrão entrou para a História, mas os Ingleses que penaram pela Guerra, não lhe deram nem mais um Mandato. Guedes não é novidade alguma. Seu Entreguismo e Privatarias são o mesmo Projeto e Teor da Escola Ditatorial Fascista de 1930, que tinha como seu Norte Econômico Eugênio Gudin. Replicado por JK, Factóide da República de Juiz de Fora. Restilizado por Malan, Fraga, Franco, ….da Economia de PUC / RJ. Seus súditos e lacaios. Novidade no Tucanato de FHC ou apenas mais um prego na cruz brasileira destas décadas todas? Mas dizemos não saber qual carroça nos trouxe de 1930 até 2020. Pobre país rico. Então neste Veículo, as revoluções e evoluções de Vietnã com Capitalismo e AgroNegócio pujantes. Não é o cúmulo da Bipolaridade? Mas de muito fácil explicação.

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