As novas loucuras no zoológico de Maquiavel, por Fábio de Oliveira Ribeiro

As novas loucuras no zoológico de Maquiavel

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Jair Bolsonaro ganhou a eleição fazendo uma campanha massiva de Fake News contra Fernando Haddad. Entretanto, ele foi ajudado por Sérgio Moro, TRF-4, STJ e STF. Os juízes impediram Lula de se candidatar e abriram caminho para a vitória do inimigo do PT. As duas virtudes que Maquiavel gostaria de ver combinadas num mesmo governante* foram separadas. Bolsonaro agiu como uma raposa, mas não teria conquistado a vitória se hienas de toga não tivessem acuado e encarcerado o leão petista que ganharia facilmente a presidência.

Lula tinha o apoio popular, mas não foi capaz de contornar os obstáculos criados pelos juízes. Bolsonaro ganhou a eleição, mas foi rejeitado por quase 2/3 da população e já começou a perder apoiadores em virtude de se unir ao PMDB/PSDB/DEM e de ter afundado num escândalo financeiro. O vácuo político criado para remover Dilma Rousseff do poder não foi preenchido com a eleição de 2018. Isso ficou bem claro para mim quando vi um dos juízes do TSE virou as costas para a cerimônia de diplomação futuro ex-presidente. 

O tranquilo exercício do poder político num contesto de normalidade democrática não se tornará uma realidade. Novas e maiores turbulências polícias são previsíveis à medida que a irracionalidade neoliberal e o autoritarismo de Bolsonaro começarem a provocar o recrudescimento da resistência popular, da repressão estatal. O aprofundamento da crise econômica irá rapidamente desgastar o pequeno capital político que Bolsonaro conseguiu amealhar.

A restauração da normalidade política não era algo desejado pelos juízes. Eles desestabilizaram o país para ganhar aumentos salariais generosos (incompatíveis com a situação do Brasil), garantir seus penduricalhos suculentos e preservar seus privilégios previdenciários (odiosos aos olhos da população em geral). Entretanto, quanto mais o Brasil se tornar instável menos os juízes irão se sentir seguros. Como interpretam sua segurança em termos financeiros/salariais, eles irão se sentir tentados a continuar fragilizando o Executivo e o Legislativo para poder continuar rapinando os cofres públicos “com o Supremo com tudo”.

Bolsonaro é impopular, assume um Executivo frágil sujeito a ser ainda mais fragilizado pelos juízos e prometeu adotar medidas que o tornarão mais odiado do que apoiado pela população brasileira. O presidente diplomado pelo TSE forneceu provas de que é mentalmente inapto para tomar posse https://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/inaptidao-mental-para-tomar-posse-por-fabio-de-oliveira-ribeiro. Ao dizer que muita gente irá se beneficiar com sua morte, o novo presidente também demonstra sinais de paranoia. Mas as palavras dele nesse caso podem ser interpretadas de outra maneira.

Maquiavel disse que “…um príncipe deve ter em pouca conta as conspirações enquanto o povo lhe for favorável, mas, quando este se tornar seu inimigo ou lhe tiver ódio, deverá temer todas as coisas e todo mundo.” (O Príncipe, Maquiavel, Martins Fontes, São Paulo, 2004, p. 90). Ao demonstrar medo de tudo e de todos, Bolsonaro pode ter revelado que é um discípulo do célebre pensador florentino. Se for esse o caso, é digna de nota a situação paradoxal em que Bolsonaro se encontra: ele deve prestar atenção à lição do mestre, mas é obrigado a despreza-la por causa dos compromissos neoliberais que voluntariamente assumiu.

O instinto animal da raposa levou Bolsonaro à presidência, mas ele não é um leão nem pode estraçalhar os banqueiros. O leão petista está preso e impossibilitado de deter a onda neoliberal. As hienas de toga querem continuar a devorar o orçamento, mas não conseguirão se alimentar mais caso o Estado (que já foi transformar num cadáver em decomposição) entrar em processo de radicalização política e fragmentação territorial. O general-vice comanda a tropa (ou pelo menos uma parte dela), mas a história demonstra que o uso da força bruta pode causar mais problemas do que soluções.

Apenas uma coisa é certa: no Brasil tudo continuará incerto por um longo período de tempo. E quem tiver mais não perderá menos. A adorável raposinha diz ao Pequeno Príncipe**: Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas… Nós já somos cativos da realidade instável criada pelas hienas de toga irresponsáveis e gananciosas, mas elas não conseguirão manter esse zoológico em paz por muito tempo.

 

 

*Vide capítulo XVIII, O Príncipe, Maquiavel, editora Martins Fontes, São Paulo, 2004, p. 84.

** Referência a obra O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry.

 

 

Fábio de Oliveira Ribeiro

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