Bolsonaro ao dizer “eu sou a Constituição”, assume um erro filosófico e psicológico, por Marcelo V. Miranda Barros

A ideia de que a “política é disputa de convencimento e persuasão” ou títulos como “Bolsonaro e a comunicação como ‘arma’ persuasiva” precisa ser revista.

Bolsonaro ao dizer “eu sou a Constituição”, assume um erro filosófico e psicológico no mundo de Adorno, Horkheimer, Freud, Marx, Engels, Foucault e Sartre

por Marcelo Vinicius Miranda Barros

Na nossa atualidade política encontramos muitos artigos, colunas de jornais, dentre outros textos, falando sobre capacidade de persuasão. A ideia de que a “política é disputa de convencimento e persuasão” ou títulos como “Bolsonaro e a comunicação como ‘arma’ persuasiva” precisa ser revista. Uma matéria no jornal El País, intitulada “Como ganhar uma eleição sem precisar ter razão”, coloca a questão: “a pergunta mais ampla é: como se faz para convencer alguém de uma promessa?”. Nessa mesma matéria segue uma afirmação de que o cartunista Scott Adams sintetiza uma resposta a respeito disso ao discorrer sobre o poder de persuasão em seu livro “Win Bigly” (Portfolio, 2017). Adams – que se define como ultraliberal – afirmou que Trump era o mestre da persuasão, isso ao analisar o comportamento de Trump ao longo da campanha eleitoral do seu primeiro mandato (ADAMS, 2017).

Já no Brasil, Bolsonaro, nas eleições presidenciais, foi bastante criticado por ensinar crianças a simular armas com as mãos, porém conseguiu atenção. Ainda de acordo com a tal matéria do El País, os possíveis danos causados pelo que pode parecer um comportamento errático por parte de Bolsonaro seriam compensados pela exposição permanente dele – entre as idas e vindas, só se falava de Bolsonaro na época –, na perspectiva de Scott Adams.

Porém, o que os muitos colunistas de jornais, autores de artigos e até mesmo o Scott Adams não pareciam observar era o povo, a sociedade, a massa. Para entenderem o poder de persuasão, ao invés de olharem para massa, eles se voltaram para os políticos supramencionados. Essa perspectiva, de forma isolada, é problemática, porque parece que tais políticos têm um “poder” de dominar uma determinada massa, mas diversas análises da Psicologia Social e da Filosofia Social contrariam essa forma de posicionar o poder de persuasão, forma essa que faz de Bolsonaro, por exemplo, uma espécie de “feiticeiro”, capaz de “dominar mentes”. Essa análise de Adams, inclusive, é tão reducionista que anula qualquer possibilidade do povo reagir, criar resistências e modificar alguma coisa no âmbito social, colocando-o como uma simples marionete, enquanto, na verdade, não é bem assim. Bolsonaro – entre outros como ele – não tem essa força toda, pelo contrário, no final das contas, ele é que precisa do povo. Vejamos o porque disso.

Os filósofos frankfurtianos Adorno e Horkheimer foram dois pensadores que analisaram o psicanalista Freud no que tange a psicologia das massas, isto é, considerando o conceito de Indústria Cultural e Comunicação em massa, tecido pelo pensamento frankfurtiano, a análise de tecnologias como ferramentas de manipulação de massa por parte de líderes, outrora entendidas como o fator mais decisivo da alienação social – como pensa Scott Adams –, sofre uma mudança de perspectiva ao se ter contato com a literatura freudiana, colocando também no centro dessa questão a própria população que se mostra alienada ou submetida a uma ideologia que ela mesma é igualmente contribuinte, mesmo que inconsciente (ADORNO; HORKHEIMER, 1973).

Atualmente, no Brasil, vimos uma polarização política centrada, principalmente, nas figuras do ex-presidente Lula da Silva e do então eleito presidente Jair Bolsonaro. Sem nos prendermos tanto aos julgamentos morais, entendemos que a ideologia de Lula – com o seu apelo popular e quase progressista –, e a ideologia de Bolsonaro – com seu apelo popular e de extrema direita neo-liberal –, não ganharam espaços na nossa política de 2018 por acaso. Ambos os líderes políticos estão nesse patamar porque, de alguma forma, foram criados pela própria sociedade, ou seja, os “bolsonarianos” e os “lulistas” não são meros efeitos de seus líderes, ao contrário, estes são criações no bojo da sociedade e refletem esta de alguma forma, como bem mostra Adorno e Horkheimer via ao pensamento de Freud (ADORNO; HORKHEIMER, 1973).

O contexto atual que envolve questões econômicas, morais, políticas de todas as ordens – ou como diz Foucault, a existência de relação de poder –, são construídas na e pela sociedade. Bolsonaro, por exemplo, jamais foi um sujeito que sozinho começou a se construir e a criar seus seguidores do nada, ex nihilo. A ideia dele de ser presidente não surgiu fora de um contexto social. Na verdade é esse contexto que lhe dá condição para ele ser o que é hoje. Se olharmos o seu passado em 2014, com mais de 464 mil votos, Jair Bolsonaro (PP) foi o deputado federal com maior número de votos no Estado do Rio de Janeiro. Ele está na Câmara Federal há mais de seis mandatos consecutivos, ou seja, ocupa há mais de 24 anos a função. Isso mostra a disposição de uma parte da sociedade a seu favor[1].

Vale também ressaltar a visão que os eleitores de Bolsonaro têm dele: aos olhos de seus seguidores, é o salvador da pátria, o mito, o pai, o único homem capaz de pôr ordem no país[2]. Isso reflete evidentemente o que Adorno e Horkheimer disseram a respeito da transferência edipiana[3] ou da transferência da libido ao líder, esta é a energia que provém das pulsões ou instintos e que afeta nosso comportamento. No caso aqui, trata-se da transferência edipiana ao líder político, ou, como disse Freud a respeito da formação de um líder: “é um substituto paterno para eles” (FREUD, 2011, p. 36). Há na massa a substituição do ideal do Eu pelo objeto – ideal do Eu é a busca pela pessoa como objeto de amor; um pai, por exemplo[4]. Daí se tem uma formação de um grupo que envolve um líder ou uma ideia. A formação do grupo tem como condição o objeto que substitui o ideal do Eu, só que, além disso, existe a identificação com outros sujeitos na mesma massa ou grupo. Essa identificação é possível, porque todos os outros possuem, em certo grau, a mesma relação com o objeto, este pode ser um líder, como Bolsonaro, ou uma ideia por mais ridícula que seja, como o suposto marxismo cultural ou que o comunismo está dominando o mundo, segundo a posição do Ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, que afirma que o coronavírus é um plano comunista. Ernesto Araújo escreveu isso a partir da leitura do livro “Vírus” do filósofo Slavoj Žižek, que ele apresenta como um dos principais teóricos marxistas da atualidade.

Nos grupos ou nas massas há aquelas que se movem em relação ao um líder, no caso, o Bolsonaro. Assim, Bolsonaro “é um substituto paterno para eles” (FREUD, 2011, p. 36). Podemos usar também como exemplos, dentre outros, a religião e o exército. Na religião o tal pai é Cristo, um líder que permite a coesão de certos grupos. No exército, o capitão, como o general, é o pai de sua companhia (FREUD, 2011). Então em ambos os grupos, exército e religião, tem um fator libidinal que, na verdade, se estende para vários tipos de grupos, inclusive para os grupos políticos.

Então, segundo Adorno e Horkheimer, se a massa é entendida como indivíduos ligados libidinalmente e que os seus impulsos instintivos inconscientes vem à tona, a identificação com o líder da massa (ou com o pai simbólico) existe em decorrência da situação vivenciada na fase do Complexo de Édipo. A massa, que pode ter um líder ou uma ideia, transfere essa situação edipiana (simplificando: energia libidinal ou desejos) para um líder real ou imaginário (ADORNO; HORKHEIMER, 1973).

É aqui que entra a questão que pontuamos no início deste texto a respeito de Scott Adams e os demais que olham para o líder para entender a massa. O caminho precisa ser o inverso do de Adams. É pela massa que se compreende o líder. Posto por Adorno e Horkheimer, é que o líder ou a ideia não surge a margem das massas, ou melhor, não surge a margem da sociedade, pelo contrário, ambos surgem a partir da sociedade. E isso traz um uma observação importante: “o triunfo ou o fracasso do demagogo não depende apenas da técnica de domínio sobre as massas, mas também da possibilidade e capacidade para integrar a massa aos objetivos do mais forte” (ADORNO; HORKHEIMER, 1973, p. 86). Valendo-se, em parte, do seu conceito de Indústria Cultural , Adorno vai considerar que o líder não deve se valer somente da comunicação em massa (como TV, Rádio, Jornais e, considerando o nosso tempo, a Internet), já que isso não garante o domínio sobre as massas, pois mostramos que tal líder surge da massa, e não a margem desta. Assim, se o líder, via comunicação de massa, produz um resultado esperado, este só é possível porque já existe uma predisposição das pessoas em questão que integram a massa para uma submissão ideológica (ADORNO; HORKHEIMER, 1973). É o caso do WhatsApp como a principal rede de disseminação de fake news, na campanha eleitoral de Bolsonaro, por exemplo. Só essa comunicação não daria conta do fenômeno de persuasão se a massa não tivesse em seu bojo uma condição para tal.

Parece-nos, então, que o líder é realmente uma projeção, uma transferência libidinal dos sujeitos ao seu objeto de liderança. O líder, assim, precisa ter algo em comum, precisa de característica que permita a massa se identificar com ele. A massa não é um mero rebanho passivo ou irracional (ADORNO; HORKHEIMER, 1973).

Nesse ponto nos remetemos também ao outro filósofo, Foucault. A relação de poder na sua filosofia tem uma grande importância no seu pensamento, já que é essa relação que permite mover uma sociedade. Contudo, para esse filósofo, o poder não está centralizado em uma figura (como um líder) ou em uma instituição (como um Estado). O poder é difuso, disseminado em todos os setores da sociedade. Essa relação de poder, que atravessa os seres humanos, é o que o Foucault chamará também de microfísica do poder (FOUCAULT, 1979).

É importante salientar também que Foucault não nega o Estado, mas mostra que a relação de poder ultrapassa o Estado, estando diluída por toda a sociedade, ou seja, o poder está por toda parte, nas próprias relações sociais, “sendo ações sobre ações” (FOUCAULT, 1979).

Dessa forma, entendemos que um líder de uma massa, no caso o Bolsonaro, não é o detentor do poder. Se considerarmos a existência de um rei, há a necessidade de súditos, se há leis, há também a necessidade daqueles que operam e, ainda, os que devem obediência. Portanto, grosso modo, se entendemos que não faz sentido apreender o poder como uma coisa, já que Foucault dizia que o poder estava nas relações, então, isso nos faz refletir como essa apreensão do pensamento foucaultiano interage com o pensamento freudiano a respeito da psicologia das massas.

Em suma, segundo os filósofos e marxistas Adorno e Horkheimer ao discorrerem sobre a psicanálise de Freud –, o líder, na perspectiva freudiana, não surge a margem da sociedade, pelo contrário, surge a partir da sociedade (ADORNO; HORKHEIMER, 1973). Se o líder surge tendo como condição a massa ou a sociedade, logo entendemos que o poder não se resume ao líder, pois se faz necessário ali a relação entre o líder e seus seguidores, até porque um não existe sem o outro. Trata-se de uma mútua pertinência. Portanto, o poder não se restringe ao líder, pois o poder é “diluído” por todos envolvidos, no caso: o líder e os membros da massa. Isto é, o poder deve ser analisado como algo que circula, ou melhor, como algo que só funciona em cadeia. Nunca está localizado aqui ou ali, nunca está nas mãos de alguns, nunca é apropriado como uma riqueza ou um bem. O poder funciona e se exerce em rede. Nas suas malhas os indivíduos não só circulam, mas estão sempre em posição de exercer este poder e de sofrer sua ação; nunca são o alvo inerte ou consentido do poder, são sempre centros de transmissão (FOUCAULT, 1979, p.103).

Em síntese, o que Foucault afirma é que os indivíduos estão sempre em posição de exercer este poder e de sofrer sua ação. Além disso, o poder não está nas mãos de alguns, ou seja, o poder não está nas mãos de um líder, por exemplo (FOUCAULT, 1979). Assim, considerando agora o pensamento freudiano, o líder não surge a margem da sociedade, pelo contrário, ele precisa dela para ser como tal (ADORNO; HORKHEIMER, 1973), já que, como entendemos em Foucault, o poder estar em toda parte (FOUCAULT, 1979).

Outro ponto importante que nos parece dialógico entre Freud e Foucault – considerando, como sempre, as diferentes premissas de cada um –, é o entendimento freudiano de que um líder pode minar o poder que ele acredita ter, se caso o tal líder não corresponda com os interesses libidinais da massa (ADORNO; HORKHEIMER, 1973). Esse suposto poder dado ao líder pode ser manifestado pelo discurso deste. Geralmente – mas não somente – é pelo discurso do líder que a massa pode ou não se identificar com ele. Destarte, considerando isso pela perspectiva foucaultiana, “o discurso veicula e produz poder; reforça-o, mas também o mina, expõe, debilita e permite barrá-lo” (FOUCAULT, 1988, p.96).

Já na perspectiva de Freud, o processo de identificação com o líder por parte da massa é necessário para que o líder seja considerado como tal, caso contrário, ele perde o investimento libidinal que recebe, perdendo, assim, o seu posto de líder. Por exemplo, se o discurso do líder manifestasse somente um poder repressivo, ele não se sustentaria por muito tempo, já que a massa precisaria de um objeto para que pudesse realizar a sua transferência ou desejos, num processo de identificação (FREUD, 2011). Com outras palavras, agora novamente na visão de Foucault, se o poder fosse somente repressivo, se não fizesse outra coisa a não ser dizer não, você acredita que seria obedecido? O que faz com que o poder se mantenha e que seja aceito é simplesmente que ele não pesa só como uma força que diz não, mas que de fato ele permeia, produz coisas, induz ao prazer (FOUCAULT, 1979, p.8).

O que Foucault nos diz é que se apenas o poder exercesse um modo negativo, ele seria muito frágil. “Se ele é forte, é porque produz efeitos positivos a nível do desejo” (FOUCAULT, 1979, p.84). Ou, agora pelo viés de Freud, parece-nos, então, que o líder é realmente uma projeção, uma transferência libidinal dos sujeitos ao seu objeto de desejo. Assim, o tal líder precisa ter algo em comum, precisa de característica que permita a massa se identificar com ele. A massa não é um mero rebanho passivo ou irracional, como já observado aqui (ADORNO; HORKHEIMER, 1973).

Também diante dessas duas principais visões colocadas aqui, a freudiana e a foucaultiana, o que podemos dizer é que se o líder surge pela condição da massa ou da sociedade e não a margem desta, e se o poder é sempre uma relação e não um objeto natural, então, é possível inferir que a existência de um líder corresponde a um momento histórico. A respeito disso – se já consideramos aqui também o pensamento de Adorno e Horkheimer, sendo estes de tradição marxista –, então, não fica difícil para nós expormos uma afirmação de Friedrich Engels[5]: “nós mesmos é que fazemos a história, mas o fazemos sob condições e suposições definidas” (ENGELS, 2010, p. 35)[6]. Ou seja, o líder na sua relação libidinal com a massa, nos coloca diante de uma relação de poder que se constrói historicamente. Assim, “se é verdade que o homem está na história, também é verdade que é ele que faz a história” (LEOPOLDO E SILVA, 2015, pp. 39-40).

Se recorrermos do mesmo modo ao filósofo Sartre na sua obra “Crítica da Razão Dialética”, Sartre vai considerar a afirmação feita por Engels e que já expomos aqui. Vejamos o que pensamento sartreano diz sobre isso:

nesse caso, há de iluminar a frase de Engels: os homens fazem a sua história na base de condições reais anteriores […] mas são eles que a fazem e não as condições anteriores: caso contrário, seriam os simples veículos de forças inumanas que, através deles, regeriam o mundo social (SARTRE, 2002, p. 74).

Entendemos que para Sartre são os humanos do mesmo modo que estão produzindo a história. Logo, aquele líder também é histórico; uma história que consideramos aqui com um sentido libidinal, de desejo projetado e de relação de poder, até porque, considerando Roberto Machado a respeito desta relação – na introdução da obra “Microfísica do poder”, de Foucault –, “o poder não é um objeto natural, uma coisa; é uma prática social e, como tal, constituída historicamente” (FOUCAULT, 1979, p. 12).

Dessa forma – apesar de perpassarmos rapidamente por alguns outros pensadores –, tentamos, aqui, um diálogo entre relação de poder, de Foucault, e a psicologia das massas, de Freud, mas, considerando, obviamente, a limitação natural desta atividade, além de ponderarmos que esses pensadores possuem premissas diferentes. Assim, o nosso intuito era somente buscar “pontos de confluências” entre eles. Entendido isso, então, em suma, numa linguagem quase freudiana, o que podemos observar é que a libido se faz necessária em toda a massa, além de que o líder precisa sustentá-la para que o grupo se mantenha coeso. Já numa linguagem foucaultiana, a relação do líder com a massa pode ser interpretada como relação de poder, isto é, que o poder não está nas mãos de um líder necessariamente, mas sim que o poder se “dilui” em todos os envolvidos que, no nosso caso, são os membros de uma massa e o próprio líder desta, e, assim, estes também fazem história.

Então o pensamento de Scott Adams, colocando o poder de persuasão somente no político, como Trump e Bolsonaro, ao mesmo tempo, coloca o povo como incapaz de agir e meramente conformado. Mas, como vimos, não é assim que funciona. Seguindo, mesmo que sintetizado, os pensamentos de Adorno, Horkheimer, Freud, Engels, Foucault e Sartre, como expostos aqui – obviamente cada um a seu modo –, então, é da sociedade, é de uma massa que um líder, como Bolsonaro, pode surgir, o que nos afirma que o poder de fato está na mão do povo, independente de que forma este o utilize. Isso permite uma esperança, pois se um líder depende da massa, esta pode a qualquer momento subverter o líder, ao mesmo tempo, ela pode também manter o tal líder. Trata-se de uma faca de dois gumes, por isso Marx afirmou que “o povo que subjuga outro, forja suas próprias cadeias” (MARK, ENGELS, 1962, p. 25)[7], como é o caso dos bolsonaristas pedindo a volta da ditadura militar. De qualquer forma, a perspectiva de Adams exposta aqui paralisa o povo, já os outros filósofos mencionados também aqui, mesmo considerando as suas diferentes premissas, dão movimento ao povo.

A partir disso, se tudo está no povo, o pensamento de Marx continua presente na atualidade, quando ele compreende o processo de transição, na qual a sociedade socialista é o Estado tomado pelo povo. Portanto, como uma esperança para uma visão progressista por vir, quando Bolsonaro disse “eu sou a Constituição”[8], ele não sabe que não é a constituição que desenvolve um povo, mas um povo que desenvolve uma constituição.

Marcelo Vinicius Miranda Barros é graduado em Psicologia pela UEFS, especialista em Psicologia, mestrando em Filosofia pela UFBA e membro da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia – ANPOF

Referências

ADAMS, S. Win Bigly: persuasion in a world where facts don’t matter. Portfolio, 2017.

ADORNO, T; HORKHEIMER, M. Temas básicos da sociologia. São Paulo: Edusp/Cultrix, 1973.

ENGELS, F. Engels to Joseph Bloch. In:______. Marx & Engels: collected works: letters 1890-92. Vol. 49. Grã-Bretanha: Publishing Lawrence & Wishart, 2010.

FOUCAULT, M. A vontade de saber. In: História da Sexualidade I. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988.

FOUCAULT, M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979.

FREUD, S. Psicologia das massas e análise do eu e outros textos (1920-1923). Tradução Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

LAPLANCHE, J; PONTALIS, J. B. Vocabulário da psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

LEOPOLDO E SILVA, F. Sartre e a psicanálise: subjetividade e história. Cienc. Cult. São Paulo, vol.67 n.1, 2015.

MARX, K; ENGELS, F. Werke. V. 16. Berlim: Dietz Verlag, 1962.

SARTRE, J-P. Crítica da Razão Dialética. Tomo 1. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2002.

[1] Jornal Uol Eleições 2014. Bolsonaro (PP) é o deputado federal com maior número de votos no RJ. 05/10/2014. Disponível em: <https://eleicoes.uol.com.br/2014/noticias/2014/10/05/bolsonaro-rj-e-eleito-deputado-federal-no-rj-com-o-maior-numero-de-votos.htm>. Acesso em: 04/11/2018.

[2] Jornal Uol Eleições 2018. O poder do mito: A trajetória de Jair Messias Bolsonaro, de militar rebelde a presidente do Brasil. 28/10/2018. Disponível em: <https://www.uol/eleicoes/especiais/a-trajetoria-de-jair-bolsonaro-de-militar-rebelde-a-presidente-do-brasil.htm> Acesso em: 04/11/2018.

[3] “Conjunto organizado de desejos amorosos e hostis que a criança sente em relação aos pais. Sob a sua forma dita positiva, o complexo apresenta-se como na história de Édipo-Rei: desejo da morte do rival que é a personagem do mesmo sexo e desejo sexual pela personagem do sexo oposto. Sob a sua forma negativa, apresenta-se de modo inverso: amor pelo progenitor do mesmo sexo e ódio ciumento ao progenitor do sexo oposto. Na realidade, essas duas formas encontram-se em graus diversos na chamada forma completa do complexo de Édipo. Segundo Freud, o apogeu do complexo de Édipo é vivido entre os três e os cinco anos, durante a fase fálica; o seu declínio marca a entrada no período de latência. É revivido na puberdade e é superado com maior ou menor êxito num tipo especial de escolha de objeto. O complexo de Édipo desempenha papel fundamental na estruturação da personalidade e na orientação do desejo humano. Para os psicanalistas, ele é o principal eixo de referência da psicopatologia” (LAPLANCHE; PONTALIS, 1992, p. 77).

[4] Em linhas gerais, é uma forma que a pessoa busca recuperar na vivência narcisista de sua infância o Eu ideal, só que isso é entendido como um objetivo a ser alcançado sem muito sucesso. Com outras palavras, Eu ideal passa a ser entendido como uma espécie de “nostalgia” de um narcisismo perdido.

[5] Friedrich Engels foi um teórico revolucionário alemão que junto com Karl Marx fundou o chamado marxismo.

[6] “We make our history ourselves but, in the first place, under very definite premises and conditions” (ENGELS, 2010, p. 35).

[7] “Das Volk, das ein anderes Volk unterjocht, schmiedet seine eigenen Ketten” (MARK, ENGELS, 1962, p. 25).

[8] Vide: Jornal Folha de São Paulo. Eu sou a Constituição, diz Bolsonaro ao defender democracia e liberdade um dia após ato pró-golpe militar. Publicado em 20 de abril de 2020. Disponível em https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/04/democracia-e-liberdade-acima-de-tudo-diz-bolsonaro-apos-participar-de-ato-pro-golpe.shtml

Redação

3 Comentários

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  1. Utilíssimo resgate. Nem precisa aprofundar o olhar para enxergar o texto no cotidiano. Exemplo: o racismo estrutural coloca tanto o guarda-costas negão no ombro do Presidente quanto o verbete zumbi em escritos progressistas. O coronavírus obriga o trabalho doméstico de A a Z, obviamente com ponderações mais cristãs (à esquerda) que humanistas (Humanidades). As cotas raciais são negadas ostensivamente nos campi pelos conservadores à direita e dissimuladamente pelos conservadores à esquerda, numa convergência clara, que engloba e embolsa a branquitude (branca atitude). O recorte em preto/vermelho e branco explicita uma profundidade resiliente. Outros imperativos, pobreza, fome, violência, moradia, educação, saneamento, emprego, crença etc. oferecem uma materialidade mais contraditória e discriminante.

  2. Diversas vezes, em diversos comentários no site do Nassif, este tópico foi comentado. O lado positivo é que há, no momento, uma análise se debruçando sobre o tema.
    Está correto em apontar as limitações da análise política. Não são poucos os que apontam isto. Que Bolsonaro diga bobagens, tolices ou barbaridades, isto é fato. Mas não adianta levantar a questão como “horrorosa”, numa “perspectiva moral” e até mesmo “legal”. A não ser que se pareça com alguém troçando de um proibidor, um superego brutal, onde cairíamos numa análise psicológica
    Aliás, uma parte substancial da esquerda, quando não faz análise política, cai numa perspectiva moral que apenas encobre suas deficiências práticas.
    Agora, não há nenhum “erro filosófico e psicológico” em Bolsonaro. A filosofia e a psicologia que “precisam explicá-lo”. Até mesmo pelo fato de, se não consigo “explicá-lo”, o problema não está nele, e sim, naquilo que tenho para “explicar”. O “político”, por exemplo, não explica diretamente como uma notícia falsa muda ou reforça a opinião de uma pessoa, em termos sociopsicológicos. Então, sou obrigado, para entender da maneira mais ampla possível, a rever meu instrumental teórico.

  3. Há um erro mesmo. Na perspectiva dos autores citados no texto. É isso que o texto quer mostrar. Agora se há uma explicação filosófica a respeito de Bolsonaro haveria de ser outro texto. Não pode se desviar do objetivo de tal texto. Uma análise não anula outra. Pouco de interpretação de texto é fácil compreender isso. E de certa forma esse texto, mesmo tendo outro objetivo que não é explicar Bolsonaro, mesmo assim o explica, mesmo que não seja na perspectiva e objetividade que o agrade.

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