Caminho aberto para proscrever o PT, por Jeferson Miola

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por Jeferson Miola

Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores, matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada
”.
No caminho de Maiakówski, de Eduardo Alves da Costa

Na decisão em que aceitou a denúncia de setembro/2017 feita pelo ex-PGR Rodrigo Janot, o juiz Vallisney de Souza Oliveira da 10ª Vara do DF escreveu:

Considero ser a denúncia idônea e formalmente apta a dar início à presente ação penal contra os denunciados, […]como incursos nas condutas tipificadas acima (considerando-se na hipótese atos incriminadores a partir da vigência da Lei de Organização Criminosa/Lei n. 12.850/2013)”.

denúncia do Janot é a transcrição do power point delirante divulgado em 14/9/2016 pelo dublê de procurador federal e pastor fanático Deltan Dallagnol apesentando Lula como o maior corrupto do mundo e “comandante máximo da organização criminosa”.

O juiz Vallisney nem precisaria gastar seu tempo remunerado a peso de ouro para ler as 209 páginas do MP e constatar que nem na “novilíngua” ficcional de George Orwell a denúncia seria considerada “idônea e formalmente apta”.

Qualquer estudante de Direito percebe logo na leitura do primeiro parágrafo, pág. 5/209, que se trata de uma peça alucinatória cujo único destino aceitável seria o lixo e a interdição dos autores por insanidade mental e desvio funcional, mas jamais a abertura de ação criminal:

Desde meados de 2002 até 12 de maio de 2016, LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, DILMA VANA ROUSSEFF, ANTONIO PALOCCI FILHO, GUIDO MANTEGA, GLEISI HELENA HOFFMANN, PAULO BERNARDO SILVA, JOÃO VACCARI NETO  e EDSON ANTONIO EDINHO DA SILVA, na qualidade de membros do Partido dos Trabalhadores – PT, com vontade livre e consciente, de forma estável, profissionalizada, preordenada, com estrutura definida e com repartição de tarefas, constituíram, integraram e estruturaram uma organização criminosa, com atuação durante o período em que os dois primeiros denunciados sucessivamente titularizaram a Presidência da República, para cometimento de uma miríade de delitos, em especial contra a administração pública em geral”.

Ante a absoluta ausência de provas para sustentar a acusação fantasiosa e kafkiana, pelo simples motivo que tais crimes não aconteceram, o MP então acusou Lula e Dilma de terem ocupado “a Presidência da República para ocometimento de uma miríade de delitos” [sic]. Só faltou dizerem que o impeachment fraudulento foi um “remédio” para se “livrarem” do PT.

É prática de regimes de exceção atribuírem a inimigos a responsabilidade por crimes genéricos, sem provas, para condená-los, execrá-los e exterminá-los.

No vale-tudo do direito penal do inimigo, vale inclusive aplicar a Lei para surtir efeitos retroativos sobre fatos ocorridos antes mesmo da Lei existir, como fez o juiz Vallisney.

É gravíssimo alguém ser tornado réu em processo judicial sem sequer ter sido ouvido e exercido o elementar direito de defesa – como foi o caso, pelo menos, da Presidente Dilma.

O período abarcado pela ação, “desde meados de 2002 até 12 de maio de 2016”, não foi eleito por acaso: abrange o período dos governos petistas e, por isso, é funcional à narrativa criminalizadora daquele que foi o maior período de conquistas civilizatórias, de direitos sociais e afirmação da soberania nacional como nunca antes o Brasil havia experimentado.

Como não conseguem combater o PT com as armas da política e da democracia, adotam expedientes baixos, sujos, por meio de práticas ilícitas e arbitrariedades de segmentos fascistizados do MP, do PF e do judiciário.

Com este processo alucinatório, a classe dominante abre caminho para proscrever o PT. É claro o plano de eliminar e levar à clandestinidade o maior partido de representação dos subalternos e de assassinar Lula, o maior líder popular que o Brasil já conheceu.

Para concretizar o plano, sequer será necessário levar a cabo o banimento formal do PT: basta asfixiarem financeiramente o Partido mediante a cobrança de R$ 1,48 bilhão – cifra que os delirantes afirmam ter sido paga aos integrantes da “organização criminosa” a título de propina [sic].

A violência contra o PT afronta o Estado de Direito e representa um ataque ao povo brasileiro e ao direito de livre organização dos setores democráticos, progressistas e de esquerda.

Denunciar e resistir ao fascismo judicial para restaurar o Estado de Direito é o dever histórico a que todos os segmentos democráticos, humanistas e libertários da sociedade brasileira não podem faltar.

Não é a sobrevivência do PT que está ameaçada, mas o futuro da democracia, da liberdade, da pluralidade e da humanidade. É necessário, em momentos como esses, nunca esquecer o poema “No caminho de Maiakówski”, de Eduardo Alves da Costa: é preciso agir logo, antes que já não possamos dizer mais nada.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

15 Comentários

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  1. No princípio, a Lei da Ficha

    No princípio, a Lei da Ficha Limpa aterrorizou as lideranças de direita. Mas depois elas perceberam que poderia fazer um acordo “com o STF com tudo” para utilizá-la como um instrumento para impedir as lideranças petistas de ocuparem cargos eletivos. Portanto, não é mais necessário cancelar o registro do PT. Basta usar a jurisprudência do caso Lula. Essa tática oferece um bônus adicional: os líderes de esquerda que não forem condenados serão inutilizados pelo desgaste. Ao fim e ao cabo a tortura imposta através do processo criminal irá desestimular o surgimento de novas lideranças combativas. O projeto da direita não é destruir o PT, mas transformar os petistas em clones do Ciro Gomes.

     

     

    1. Jurisprudência do mensalão tb

      Jurisprudência do mensalão tb ..do domínio do fato ..do tinha que saber, e se não sabia, azar o seu, “pecou por omissão”

      LULA, ao ser condenado SEM PROVAS, não sendo proprietário, por ATO INDETERMINADO de corrupção, só reforça a tese de que pros malgistrados (os camisas pretas de Curitiba) basta exercer qq cargo de comando pra ter que saber (participar e se beneficiar) de todo e qq escândalo

  2. TUDO começou com GILMAR

    TUDO começou com GILMAR MENDES

    FOi ele quem, ainda no 1o mandato de DILMA, veio com a história de que o PT mantinha centenas de milhões de dólares no exterior (falava em mais de 300) ..depois disso eclodiria a Lava Jato (que saiu do controle dos morcegões, como se viu posteriormente)

    ..tudo fazendo parte dum “projeto de Poder” , dizia o BOCA MOLE, o supremo MILITANTE ..como se os tucanos e os GORILAS adestrados, os militares de agora, só quisessem dar uma passadinha de 4 anos pelos palácios e cair fora

  3. Viva o republicanismo!
    Começou com Lula e o PT assistindo a imolação de Dirceu e Genoino. Isso deixou claro que não haveria resistência por conta do republicanismo.
    O resto foi consequência.
    Vai ficar ficar mais difícil a cada dia.
    Haverá atentado a bolsanaro ‘realizado’ pelo PT, que levará ao fechamento do partido.
    Conforme disse Jucá. É com supremo, com tudo.
    Só quem acha que será diferente são os irmãos Gomes, que devem ser incorporados a ‘esquerda’ do PSL.

  4. Herança do janotismo

    A frase de que o PT era uma organização criminosa foi usada por Aécio Neves logo apos sua derrota para Dilma em 2014. Rodrigo Janot nem teve a originalidade e competência para fazer uma denuncia mais crivel que essa feita por um politiqueiro do naipe de Aécio e sua gangue mineira. 

    Agora se ser presidente do Brasil e escolher ministros tornou-se crime, melhor então parar tudo e voltarmos ao feudalismo. De certa forma é o que esta acontencendo. O Janot, que segundo Gilmar Mendes escrevia suas peças etilizado, deve estar muito satisfeito com o novo governo fundamentalista brasileiro. 

  5. Josias um jornalista abjeto.

    Josias de Souza não passa de um verme nazista. Os piores nazistas eram os velhos. Josas é um deles. Leva a sua vida, usa o seu trabalho não para fazer um jornalismo sério mais sim, para tecer comentários que mais parecem de pessoas saídas do manicômio. Seu comentário hoje no UOL de que:”Lula fortão deu lugar ao fraquinho” mostra quem é essa figura ridícula, preconceituosa, rancorosa do PIG. Seu comentário não se encerra somente quando humilha o ex-opresidente. Ele carrega nas enrelinhas uma ameaça impícita aqueles que eventualmente se disponham a libertaá-lo. Depois um descrado desses tem a coragem de criticar Bolsonaro. Enganador ridículo.

  6. Quando eu penso numa parte

    Quando eu penso numa parte miúda da esquerda detonando o PT, esperando ocupar rapidamente o espaço dele no espectro político, enfim…

    Dá náusea só de pensar na arrogância tola destes idiotas. 

  7. É tão estapafúrdia a denúncia

    É tão estapafúrdia a denúncia que ela antecipou a posse de Lula. Ou seja, diz que ele presidiu o país já em 2002. Está escrito lá “desde meados de 2002”. Lula só tomou posse em 01 de janeiro de 2003……

  8. O objetivo é exatamente este:

    O objetivo é exatamente este: destruir o PT com acusações falsas que o povo não entende absolutamente nada e no final, casar o seu registro.

    Depois, cassar o mandato e prender seus políticos.

    Depois, perseguir seus simpatizantes e eleitores.

     

  9. A democracia está morta e o

    A democracia está morta e o PT continua com seu republicanismo. Talvez seja melhor mesmo o PT na clandestinidade, quem sabe nessa condição passe a dialogar com o povo, viver a realidade das periferias, dos milhões de desempregados, da violência policial cotidiana, longe dos gabinetes, do ar condicionado e lado a lado com os militantes.

  10. Ditadura de direita é isso
    Ditadura de direita é isso aí….

    Massacra o povo, protege os ricos, e quem se revoltar é tachado de terrorista…….

    E a mídia silencia, de olho gordo nas verbas……..

  11. Como??
    Será possível eliminar um partido que tem a maior bancada no congresso (61 Dep), o maior número de governos estaduais(4) e inúmeras prefeituras distribuidas pelo país assim num passe de mágica??? Pra que planeta mandarão toda essa gte???

  12. Acabou tudo

    Que teve inicio quando a lava-jato, do sórdido juiz decretou que somente iria investigar a  Petrobrás a partir dos governos de Lula. No que foi aplaudido por toda a mídia e o silêncio dos supremos juizes , que já sabiam do papel que exerceriam no plano, juntamente com quase todo o congresso.

    Foi uma ordem dos EUA , petroleiras, investidores , etc repassada à Globo e Forças armadas, que logo trataram de colocá-la em prática, com uma faca no pescoço de cada instituição. E alguns ainda teimam em dizer que Lula e Dilma erraram nas suas nomeações ao STF. Nem Jesus Cristo sairia impune.

    Triste , muito triste, triste demais. Rasgarei meu título eleitoral !!!!

  13. A história repetida, só muda as moscas

    Em 25 de janeiro de 1933, os grupos de esquerda em Dresden se reuniram em um bar. Milicianos nazistas reuniram-se ameaçadoramente do lado de fora. Uma fila de policiais ficou entre os dois grupos. A esquerda achou que estavam ali para protege-los por que o encontro ela legal. Mas quando a briga começou, os policiais atiraram na esquerda e matou 9 pessoas. Já viram este filme atualmente no Brasil? Nas eleições nacionais de março de 1933, o partido comunista obteve 17,4% dos votos. Os nazistas baniram o partido e prenderam seus líderes. A constituição foi abolida e a democracia desmantelada. Quanto falta para os fascistas brasileiros fazerem o mesmo? 

    Taylor. Frederick. Dresden 1945, pag 68-72

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