De uma branca para outra, por Eliane Brum

Marcha das Mulheres Negras em Brasília, em 2015. (MARCELO CASAL JR – AGÊNCIA BRASIL)Marcha das Mulheres Negras em Brasília, em 2015.

Enviado por Vânia

O turbante e o conceito de existir violentamente

do El Pais

De uma branca para outra

por Eliane Brum

Thauane,

Em 4 de fevereiro, você postou o seguinte texto em sua página no Facebook: “Vou contar o que houve ontem, pra entenderem o porquê de eu estar brava com esse lance de apropriação cultural: eu estava na estação com o turbante toda linda, me sentindo diva. E eu comecei a reparar que tinha bastante mulheres negras, lindas aliás, que tavam me olhando torto, tipo ‘olha lá a branquinha se apropriando da nossa cultura’, enfim, veio uma falar comigo e dizer que eu não deveria usar turbante porque eu era branca. Tirei o turbante e falei ‘tá vendo essa careca, isso se chama câncer, então eu uso o que eu quero! Adeus’. Peguei e saí e ela ficou com cara de tacho. E, sinceramente, não vejo qual o PROBLEMA dessa nossa sociedade, meu Deus”.

Ao final, você fez a hashtag: #VaiTerTodosDeTurbanteSim.

O episódio relatado por você e a repercussão do seu relato são tudo menos uma banalidade. Ambos contam de um momento muito particular do Brasil no que se refere à denúncia do racismo. Um momento que, por sua riqueza, não pode ser interditado por muros. É por isso que decidi escrever minha coluna pública como uma carta para você. Porque não poderia falar de você como “a branca do turbante”, apenas. Sim, você é branca. E você colocou um turbante. Mas você também é Thauane, uma mulher e suas circunstâncias. E, assim, a carta é o gênero com que posso melhor expressar meu afeto.Desde então, Thauane, você deu entrevistas, foi xingada e foi elogiada nas redes sociais. Desde então, produziu-se uma grande quantidade de textos de opinião, matérias e posts sobre o que aconteceu com você. Uma parte significativa desse material produzido continha acusações ao movimento negro, de que estaria fazendo algo nomeado como “racismo reverso”.

Eu acredito muito em cartas, Thauane, porque elas pressupõem um remetente e um destinatário. E elas expressam algo ainda mais fabuloso, que é o desejo de alcançar o outro. Poucas coisas são mais tristes que cartas perdidas, extraviadas. Cartas que não chegam ao seu destino. E quando a gente conversa com um muro no meio, as cartas não chegam. O muro barra o movimento da palavra.

Assim, Thauane, eu inicio dizendo a você que não sei como é receber um diagnóstico de leucemia. Não sei como é perder o cabelo aos 19 anos. Não sei como é acreditar que encontrou uma saída estética para cobrir a nudez da cabeça e ouvir que esta saída não é ética. Não sei. Mas tento saber. Acredito profundamente em vestir a pele do outro. Mas sei também do limite deste gesto. Buscamos vestir, mas não conseguimos vestir por completo. A beleza deste movimento é justamente a busca.

Ao tentar vestir a sua pele, consciente dos limites deste gesto, posso sentir o quanto deve ter sido duro ouvir o que você conta ter ouvido: “Você não pode usar turbante porque é branca”. Ter câncer é estar nu de tantas maneiras diferentes, e a sua nudez estava exposta na sua cabeça. E você tinha encontrado um abrigo que te fazia sentido, que era um turbante bonito. Para você também não era só um acessório, talvez fosse quase uma casa. E a estranha que te aborda, cortando esta cena com um “não”, pode ter doído em porções do seu corpo que você nem sabia que existiam até então.

É isso que eu apalpo quando tento te alcançar tendo apenas lido você no Facebook. Você doendo. E, sentindo-se atacada, apropria-se do que considera seu direito de vestir o que quiser, de se expressar como quiser pelo que bota sobre seu corpo, e diz que, sim, TODOS podem usar turbante mesmo que negras digam a você que não porque, afinal, qual é o problema de ser branca e usar turbante? Afinal, não seria até mesmo um reconhecimento e uma homenagem, já que você considera algo identificado com a cultura negra tão bonito que escolhe botar na cabeça? E isso te parece bastante óbvio. E parece bastante óbvio para muitas pessoas que te apoiam.

Eu escuto você. E compreendo o caminho do seu pensamento. E percebo que, para mim, não é difícil vestir a sua pele, ainda que não possa, jamais poderei, vesti-la por completo. É neste ponto que sou atravessada pela primeira interrogação. É mais fácil para mim vestir a sua pele branca do que vestir a pele negra da mulher que te abordou com um não. Eu tenho mais elementos para vestir a sua pele branca e bem menos elementos para vestir a pele negra dela. Por uma razão bastante óbvia: eu tenho uma vida de mulher branca num país como o Brasil.

Esta constatação me faz perceber que, exatamente por ser mais difícil, eu preciso tentar mais. Bem mais. Sabe, Thauane, eu nasci e cresci numa cidade em que a maioria é descendente de imigrantes europeus, especialmente alemães. Eu mesma sou descendente de italianos. Cresci observando o racismo ser uma condição tão natural quanto comer e dormir. Não o racismo disfarçado de tantos, mas o racismo que sequer estranha a si mesmo. Assim, quando começaram os debates das cotas sociais X cotas raciais, e isso porque não estou contando a parcela da população que acha que não precisa de cota nenhuma, não me foi difícil concluir que as cotas deveriam ser raciais.

Na cidade da minha infância, as negras sequer eram aceitas como empregadas domésticas. Como os patrões eram descendentes de imigrantes europeus, não traziam a experiência da Casa Grande, em que os negros escravizados faziam todo o serviço pesado, dentro e fora das casas. Ao contrário. Os avós e bisavós da maioria, como os meus mesmo, conseguiram escapar da fome de seus países de origem graças à ideia de branqueamento do Brasil que esteve no cerne das políticas de imigração do século 19. Para evitar o risco de que o Brasil ficasse mais preto, importou-se carne branca. Na região em que eu vivia, havia dois párias: os indígenas e os negros.

No Brasil da minha infância, ser empregada doméstica era quase ser escrava. Como todos sabemos, ainda hoje, em tantos lugares, segue assim. Mas o racismo era tão profundo que nem para cozinhar, lavar e limpar sem limite de horas para terminar a jornada e ganhar um salário miserável ao final as negras serviam. Sabe por quê? Porque boa parte das famílias brancas não queria a pele negra “sujando” a sua comida, a sua roupa de cama, o seu mundo. Assim, até para os serviços com a pior remuneração e com as piores condições de trabalho a preferência era pelos brancos pobres. O racismo, mais uma vez, condenava as negras a ver seus filhos passarem fome.

Quando a gente ouve um “não”, Thauane, nossa primeira reação é dizer um “sim”. Sim, eu faço. Sim, eu vou. Sim, eu posso. Especialmente numa época em que se vende a ideia de que podemos tudo. E de que poder tudo é uma espécie de direito. Mas não, não podemos tudo. E nos deparamos com essa realidade a cada dia. Compreendo também, Thauane, que você sabe disso talvez melhor do que a maioria, porque não há nada mais revelador de nossos limites do que uma doença que nos coloca diante da tragédia maior da condição humana, que é morrer. E uma doença como câncer, mesmo quando há muitas chances de cura, nos lança neste abismo. Porque só a possibilidade já é devastadora.Percebi então que eu, como mulher branca, descendente de imigrantes europeus, já nasço neste país com muitos privilégios. Percebi primeiro pela intuição, ao observar o meu entorno, e depois fui estudar para compreender também através dos fatos, das reflexões e do processo histórico. Nasço neste país com privilégios. Mas não só. Percebo que já me insiro neste mundo pela experiência de “existir violentamente”. Vou aprofundar este conceito mais adiante.

Mas tenho aprendido, Thauane, e isso me veio com o envelhecimento, que, muitas vezes, mesmo quando a gente pode a gente não pode. Ou, dizendo de outro modo: o fato de poder não quer dizer que a gente deva. Assim, é verdade. Você pode usar um turbante mesmo que uma parte significativa das mulheres negras digam que você não pode. Mas você deve? Eu devo?

Como para mim é mais difícil vestir a pele de uma mulher negra, porque por ser branca eu tenho menos elementos que me permitem alcançá-la, eu preciso fazer mais esforço. Não porque sou bacana, mas por imperativo ético. E a melhor forma que conheço para alcançar um outro, especialmente quando por qualquer circunstância este outro é diferente de mim, é escutando-o. Assim, quando ouvi que não deveria usar turbante, entre outros símbolos culturais das mulheres negras, fui escutá-las. Acho que isso é algo que precisamos resgatar com urgência. Não responder a uma interdição com uma exclamação: “Sim, eu posso!”. Mas com uma interrogação: “Por que eu não deveria?”. As respostas categóricas, assim como as certezas, nos mantêm no mesmo lugar. As perguntas nos levam mais longe porque nos levam ao outro.

A resposta mais completa que encontrei na minha busca foi um texto de Ana Maria Gonçalves. Escritora de grande talento, mulher, negra. Autora de Um defeito de cor, um romance extraordinário. Sugiro a leitura do texto inteiro, publicado no Intercept. Mas reproduzo aqui os trechos que me parecem fundamentais para que eu possa continuar a escrever a minha carta de branca. Ana Maria Gonçalves diz:

“Boa parte da população branca brasileira sabe de suas origens europeias e cultiva, com carinho e orgulho, o sobrenome italiano, o livro de receitas da bisavó portuguesa, a menorá que está há várias gerações na família. Quem tem condições vai, pelo menos uma vez na vida, visitar o lugar de onde saíram seus ancestrais e conhecer os parentes que ficaram por lá. E os descendentes dos africanos da diáspora? Quando chegaram por aqui, os traficantes de pessoas já tinham apagado os registros do lugar de onde haviam saído, redefinindo etnias com nomes genéricos como Mina (todos os embarcados na costa da Mina), feito-os dar voltas e voltas em torno da Árvore do Esquecimento (ritual que acreditavam zerar memórias e história) ou passarem pela Porta do Não Retorno, para que nunca mais sentissem vontade de voltar, separando-os em lotes que eram mais valiosos quanto mais diversificados, para que não se entendessem.

Ainda em terras africanas tinham sido submetidos ao batismo católico para que deixassem de ser pagãos e adquirissem alma por meio de uma religião ‘civilizatória’, ganhando um nome ‘cristão’ que se juntava, em terras brasileiras, ao sobrenome da família que os adquiria. No Brasil, não podiam falar suas próprias línguas, manifestar suas crenças, serem donos dos próprios corpos e destinos. Para que algo fosse preservado, foram séculos de lutas, de vidas perdidas, de surras, torturas, ‘jeitinhos’, humilhações e enfrentamentos em nome dos milhares dos que aqui chegaram e dos que ficaram pelo caminho. Como resultado disto, somos o que somos: seres sem um pertencimento definido, sem raízes facilmente traçáveis, que não são mais de lá e nunca conseguiram se firmar completamente por aqui.

(…)

Viver em um turbante é uma forma de pertencimento. É juntar-se a outro ser diaspórico que também vive em um turbante e, sem precisar dizer nada, saber que ele sabe que você sabe que aquele turbante sobre nossas cabeças custou e continua custando nossas vidas. Saber que a nossa precária habitação já foi considerada ilegal, imoral, abjeta. Para carregar este turbante sobre nossas cabeças, tivemos que escondê-lo, escamoteá-lo, disfarçá-lo, renegá-lo. Era abrigo, mas também símbolo de fé, de resistência, de união. O turbante coletivo que habitamos foi constantemente racializado, desrespeitado, invadido, dessacralizado, criminalizado. Onde estavam vocês quando tudo isto acontecia? Vocês que, agora, quando quase conseguimos restaurar a dignidade dos nossos turbantes, querem meter o pé na porta e ocupar o sofá da sala. Onde estão vocês quando a gente precisa de ajuda e de humanidade para preservar estes símbolos?

(…)

Não sei como você escuta isso, Thauane. Mas posso te contar como eu escuto. Escutar a voz de Ana Maria Gonçalves, assim como de outras mulheres negras, produz movimento em mim. As vozes dessas mulheres me alargam por dentro. Alargam a minha visão de mundo. Eu não conseguiria compreender desta forma, desta forma que atravessa o meu corpo, não fosse elas terem a paciência de me explicar com palavras que também atravessam seus corpos.O turbante que habitamos não é o mesmo. O que para você pode ser simples vontade de ser descolado, de se projetar como um ser livre e sem preconceitos, para nós é um lugar de conexão”.

Eu compreendo que, para você, o turbante também significava abrigo. E talvez abrigo da dor. Mas você tem outras formas de encontrar abrigo para sua cabeça nua. Assim como eu tenho outros jeitos de me expressar através do que coloco na cabeça. As mulheres negras nos explicam que não. Que para elas o turbante é memória, é identidade e é pertencimento. É, portanto, vital. O que as mulheres negras nos dizem, Thauane, é que não querem que o turbante, que tão precioso é para elas, vire mera mercadoria na nossa cabeça. Então, Thauane, acho que eu e você precisamos escutá-las. E podemos não usar um turbante. Aliás, não usar um turbante é bem o mínimo que podemos fazer.

E podemos não usá-lo por muitos argumentos, mas aqui, me basta este. Porque são elas que me dizem. As mulheres negras, as que no passado foram arrancadas de suas terras e trazidas como carga para o Brasil para trabalharem como escravas, as mulheres negras que eram violentadas por brancos como desacontecimento cotidiano. As mulheres negras, que deixaram de amamentar seus próprios filhos para amamentar os filhos das sinhazinhas brancas. As mulheres negras, que foram obrigadas a criar os filhos de outras enquanto os seus eram esquecidos. As mulheres negras, que quando seus filhos sobreviviam à fome, aos maus tratos e às doenças, tudo o que podiam esperar de um futuro era que também fossem escravos. As mulheres negras, que no presente seguem tendo os piores salários, a mais baixa escolaridade, menos acesso a tudo. As mulheres negras, que hoje são as que mais morrem de parto, são as que mais perdem filhos pequenos para doenças que não deveriam mais matar, são as que mais sofrem com filhos adolescentes e adultos em prisões que são campos de concentração não disfarçados. As mulheres negras, que têm seus filhos executados pela polícia e por grupos de extermínio, vítimas de um genocídio que provoca escassa revolta na parcela branca da população. As mulheres negras, que são as que mais sofrem estupro e as que têm menos acesso à tratamento quando adoecem de câncer.

Mas eu entendo também, Thauane, que precisamos conversar sobre isso. Escuto de algumas mulheres negras que é demais pedir que tenham a paciência de nos explicar depois do tanto que sofreram esses séculos todos e com um genocídio negro se desenrolando agora mesmo sem causar clamor. E compreendo que é difícil. Mas ainda assim acho que é preciso. Porque se não conseguirmos estabelecer um diálogo que não seja mais do que gritos de um lado e outro, ergueremos novos muros ou aumentaremos ainda mais a altura dos já existentes. E acho que podemos concordar que se há algo que este país não precisa é de mais muros.Se as mulheres negras me dizem que não posso usar um turbante porque para elas o turbante é um símbolo de pertencimento, eu escuto. E compreendo que não devo usar um turbante. Sim, Thauane, acho que você e eu e todas as brancas deste país em que a abolição da escravatura jamais foi completada podemos e devemos baixar a nossa cabeça em sinal de respeito e não usar um turbante apenas porque as negras dizem que não podemos. Apenas porque as fere que usemos turbantes. Há muitos outros argumentos, mas só este já me parece suficiente.

Gostaria de acreditar, Thaune, que se você em vez de ouvir um repentino “não pode usar turbante porque é branca” fosse abordada de outra maneira, que se em vez de “não pode usar” e “vou usar sim” houvesse uma conversa entre duas pessoas capazes de se escutar mutuamente, você talvez tivesse concluído que não deveria usar um turbante. E a história que você publicou no Facebook seria então outra, mais inspiradora e com muito mais potência.

Se esse episódio acontecesse alguns anos atrás, Thauane, eu talvez aderisse à sua hashtag #VaiTerTodosDeTurbanteSim. Porque acharia uma convocação mais igualitária. Até alguns anos atrás eu acreditava que era suficiente não ser racista. Eu me achava bacana por defender os direitos humanos e denunciar a violência contra as minorias. Eu me achava legal por não distinguir raça, mas enxergar pessoas. Eu teria convicção de que, ao usar um turbante, estaria fazendo um reconhecimento e uma homenagem à outra cultura. Até alguns anos atrás eu acreditava que era isso o que eu poderia fazer de melhor como branca num país racista.

Tenho aprendido, Thauane, que é mais complicado. E tenho aprendido que é mais complicado com as mulheres negras e com os homens negros. Desde que a internet e as redes sociais tornaram possível que suas vozes ecoassem mais e mais longe, já que os espaços tradicionais eram e seguem sendo bastante interditados para os negros, eu tenho tido a chance de aprender com eles. Isso não significa que exista uma voz absoluta que possui todas as verdades e que tem razão a priori. Significa ter a oportunidade de escutar e de interrogar e até de discordar porque aprender é movimento, não deglutição.

Mas o que para mim tem se tornado mais evidente, Thauane, é o que tenho chamado de existir violentamente. Por mais éticos que nós, brancos, pudermos ser, a nossa condição de branco num país racista nos lança numa experiência cotidiana em que somos violentos apenas por existir. Quando eu nasço no Brasil, em vez de na Itália, porque as elites decidiram branquear o país, já sou de certo modo violenta ao nascer. Quando ao meu redor os negros têm os piores empregos e os piores salários, a pior saúde, o pior estudo, a pior casa, a pior vida e a pior morte, eu, na condição de branca, existo violentamente mesmo sem ser uma pessoa violenta.Escutando os vários movimentos negros, Thauane, tenho aprendido que às vezes somos racistas sem saber que somos. É algo tão entranhado na nossa apreensão de mundo que, mesmo quando acreditamos não sermos, às vezes somos. Nas palavras, nos gestos, no caminho que alguns pensamentos fazem. Quantas vezes, por exemplo, amigos brancos não acharam que eram muito bacanas por tratarem bem os negros? A própria ideia de se achar incrível por tratar bem alguém de outra raça pressupõe que haveria um motivo para não tratar bem alguém de outra raça. E este já é um pensamento racista. Ou o famoso “não sou racista, tenho até amigos negros”.

Por isso escrevi um texto aqui afirmando que, no Brasil, o melhor branco consegue no máximo ser um bom sinhozinho. Porque, sim, ainda somos sinhazinhas e sinhozinhos, mesmo quando tentamos ser igualitários. Porque a desigualdade racial é nossa condição cotidiana. E essa experiência de existir violentamente – ou de ser violenta mesmo sem ser violenta – é algo que me corrói.

É duro, Thauane, reconhecer e sentir nos ossos, a cada dia, que existo violentamente. Não posso escolher não existir violentamente, porque esta é a condição que me foi dada neste momento histórico. Mas penso que há algo que posso escolher, que é lutar para que meus netos possam viver num país em que um branco não exista violentamente apenas por ser branco. E para isso eu preciso escutar. E, principalmente, preciso perder privilégios. Me parece que hoje uma das questões mais cruciais deste país diz respeito a quanto estamos dispostos a perder para estar com o outro. Porque será preciso perder para que o Brasil se mova, para que o mundo se mova.

E às vezes os privilégios mais difíceis de perder, Thauane, são os mais sutis, assim como os mais subjetivos. Por séculos os brancos falaram praticamente sozinhos no Brasil, inclusive sobre o que é cultura e sobre o que é pertencimento. Os brancos falaram praticamente sozinhos até sobre o lugar do negro neste país. Agora, ainda bem, perdemos esse privilégio. E vamos ter que conversar. Mas o privilégio primeiro que perdemos quando as vozes negras começaram a ecoar mais longe é o da ilusão de que somos “limpinhos” porque não somos racistas. Não somos limpinhos. Porque não há como ser branco e ser limpinho num país em que os negros vivem pior e morrem primeiro. É isso que eu chamo de existir violentamente.

Escrevo esta carta para você, para todos e também para mim, na esperança de que ela atravesse os muros e chegue ao seu destino. E me despeço dizendo, Thauane, que com toda a sua dor e com toda a sua nudez, acho que você, eu, todas nós, mulheres brancas, precisamos escolher perder o privilégio de usar turbante, com tudo o que isso significa. Não apenas porque alguém barrou o gesto, mas porque somos capazes de escutar argumentos e aprender com eles. E porque queremos muito estar com o outro sem ser violentamente.

Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficção Coluna Prestes – o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos, e do romance Uma Duas. Site: desacontecimentos.com Email: [email protected] Twitter: @brumelianebrum/ Facebook: @brumelianebrum

 

 

Redação

46 Comentários

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  1. O simples fato de que as

    O simples fato de que as manifestações de racismo afloram mais comumente em momentos de relaxamento, induzido (álcool, drogas, etc.) ou não, geralmente em contexto de agrupamento em multidão (futebol, passeatas, carnaval, etc.) quando as amarras da percepção e da consciência ficam mais soltas, já seria pista suficiente de que o racismo – entendido como consciência automática de diferença e superioridade/inferioridade – é característica inata do ser humano.

    Em qualquer época e lugar.

    Aqui, no Ocidente Cristão, a História da supremacia dos brancos sobre os negros não reforça essa ideia e nem é consequência dela.

    É a própria razão da História, o “Superior” domina e escraviza o “Inferior”.

    Metrópole Vs. Colônia.

    Branco Vs. Negro.

    Ariano Vs. Judeu (e cigano, homossexuais, etc.).

    E assim por diante.

  2. Mano, na boa…
    O turbante

    Mano, na boa…

    O turbante foi introduzido na África pelos árabes.

    Isto ocorreu quando da expanção do islamismo nos territórios que um dia pertenceram ao Império Romano.

    Portanto, nenhum africano ou afrodescendente pode alegar que é dono da cultura do turbante. 

    Além do mais, toda esta discussão é bastante estúpida.

    Os negros tem sido brasileiros há séculos.

    Eles não falam dialetos africanos, não tem organizações políticas e instituíções públicas autônomas distintas daquelas que unem os brasileiros de origem portuguesa e indígena.

    Os negros bebem café (originário do Oriente Médio) em xícaras de porcelana (origem chinesa) e tomam guaraná (usado pelos indígenas) e se empanturram de cerveja (que foi do Egito para a Europa e de lá veio ao Brasil) e andam de carros (inventados por norte-americanos).

    Se querem ser autênticos, puros, purificados, os negros devem abandonar todas as coisas que eles gostam (inclusive a feijoada). Não creio que eles possam ou queiram fazer isto.

    Eu sou calvo. Se fosse cabeludo usaria tranças rastafari e, diante de questionamentos idiotas como aqueles que fazem às mulheres de turbante) mandaria qualquer filho-da-puta branco, negro ou amarelo se foder.

    Somos livres para usar aquilo que gostamos.

    E não temos obrigação nenhuma de gostar dos cretinos que ficam policiando os hábitos alheios.  

    1. Nada a ver com o que ta

      Nada a ver com o que ta escrito.  Brum entendeu perfeitamente e ja tomou sua posicao.  O turbante foi (re)lancado como simbolo coletivo.  Um simbolo de auto afirmacao e unidade negra e feminina.  Se fosse um laco cor de rosa no braco ou amarelo na arvore da porta de casa (varias coisas que ja foram usadas como simbolos coletivos, alias) ele ainda teria que ser respeitado independente de ninguem estar impedido de colocar um laco cor de rosa no braco ou faixa amarela na arvore da casa.

      Como eu ja disse:  como simbolo, o turbante nao me interessa mais que lacos amarelos (deteeesssto amarelo), so a beleza deles me interessa.

      Mas voce passa pela casa de alguem e ve que eles estao homenageando um morto, doente, ou enfermo com aquele laco e sente respeito pela dor deles instantaneamente.  E ai voce ve o simbolo coletivo quando nota que todas as arvores da vizinhanca estao com a mesma faixa amarela na frente da casa.

      Sim, eles estao la pra quem passar mesmo.  E eh pra ter respeito mesmo.

    2. Essa discussão nem devia existir

      Querer ditar o que o outro pode ou não fazer ou vestir, por pura ideologia, é algo muito próprio das ditaduras. Este pais (ainda) é livre. A pessoa vir com esse papo mole embalado em discurso fofinho de “veja bem, poder você pode, mas é melhor não usar, tem outras formas de cobrir sua cabeça “, ah vá! Vá plantar ovo, vá você se limitar por ideologia!

  3. Texto lindo.

    Há muito não leio um texto tão bom, tão esclarecedor, tão cheio de amor ao próximo. Parabéns! Você me deu uma pequena esperança na humanidade.

    1. É dose!

      A mulher quer impor uma proibição que não existe em lei nenhuma, baseada numa premissa falsa (turbante é criação e exclusividade da África), e basta embalar num discurso fofinho, que ganha até likes emocionados!

      1. Engraçado, brancas sambam

        Engraçado, brancas sambam peladas como as negras peladas, algumas vestidas como as negras vestidas, e tudo bem. Agora um pedaço de pano sobre a cabeça ter uma etnia proprietária, é dose.

  4. CUIDADO! REPROGRAMAÇÃO MENTAL PÓS-MODERNA

    Enquanto as pessoas perdem tempo engradecendo um fato tão pequeno, Golpistas destroem direitos trabalhistas, Entregam patrimonio público de bandeja e tornam uma nação mais indigna. A CEDAE no RJ pode ser privatizada!

    Textão é reprogramação mental para futilidades neoliberais. Neuroligusitica aplicada! Quem te preocupa mais? Aécio, Temer e outros destruindo a democracia, ou a briga por pano na cabeça? Com o país destruido e comido por golpistas, não haverá cultura de nenhum tipo para se discutir! 

    Leon Festinger! Textão Pós-Moderno  É caso de “Dissonância Cognitiva”!

     

  5. Com turbante ou sem turbante

    Com turbante ou sem turbante o brasileiro, negro ou branco vai assistir hoje seu país dar mais um passo em direção a desmoralização, esculhambação e deteriorização completa. O careca sem turbante, Alexandre Moraes vai ser sabatinado e aprovado para ser ministro do supremo!

    Sinceramente acho que as mulheres negras devem ser ouvidas sim, o Brasil está e contrinuará estando em dívida eterna com as populações negras. Mas como dedicar-se a um debate tão complexo e sofisticado como esse quando estão transformando o país num lugar onde impera a boçalidade?  

      

  6. Pergunta
    Que dia que a jornalista vai escrever sobre os seus amigos BRANCOS do Psol que se apropriaram da prisão do Rafael Braga pra atacar a Dilma e dizer que foram vítimas da violência policial?

  7. Uma dúvida e uma sugestão

    1. Os homens brancos estão tão indignados com a posição das mulheres do movimento negro que eu fiquei com uma dúvida.

    Vocês tão putinhos assim com essa história por que estão loucos para usar turbante? 

    2. Realmente, a situação do país é terrível! Ninguém pode negar. Então segue uma sugestão:

    Se organizem, levantem os vossos traseiros das respectivas cadeiras e vão para as ruas protestar e lutar pelo país ao invés de ficar de mimimi com este e outros temas das minorias que pra vocês são sempre irrelevantes.

    1. 1- Não uso turbante, boné,

      1- Não uso turbante, boné, chapéu, capacete, et coetera. Nunca usei e nem tenho vontade. Dificilmente seria visto como branco em qualquer outro país que não o Brasil, pois minha bisavó era negra, sou moreno, olhos pretos, cabelo preto, aliás como tantos e tantos e tantos outros que nasceram nesse país. Nem estou “putinho” (espanta-me a expressão, vindo de quem, teoricamente e pelo texto em questão, defende os temas ligados às minorias). Quero crer que se eu usasse a expressão “putinha” para definir a fala desse post ou o estado de espírito que levou à sua escrita, seria execrado. Ainda que todos aqui tivessem claro que não estaria usando esse termo de forma depreciativa. Mas ainda assim cairiam de pau em cima de mim… Não acho que quem responde a um texto ou debate uma idéia está “putinho” ou “putinha”. Está debatendo. Se o texto da Brum, que considero fraco, não fosse uma chamada ao debate, não fosse uma exposição dos argumentos que ela considera adequados, não fosse algo para ser lido, pensado e discutido, dificilmente ela perderia seu tempo. Deselegante.

      2- Não considero irrelevantes os temas das sobreditas minorias. Aliás, negro no Brasil não é minoria. É maioria. E maioria que sofre diuturnamente numa sociedade racista, autoritária e, acho eu, a um passo do fascismo. No entanto, certas falas, também no meu entendimento, são inócuas, não mobilizam, dificultam diálogos e impõe visões que eu considero (e creio que posso “considerar” ainda, né?) politicamente equivocadas. Criam um ranço bobo, desnecessário. Vi, nesses comentários, argumentos que deveriam ser melhor analisados pelos que o colocam como um símbolo africano à priori, como por exemplo a introdução desses na Africa e o sentido religioso original do seu uso. Mas sei, também, que não há interesse, pois a restrição do uso desses aos brancos, asiáticos (?), indios (?), etc, virou, infelizmente, queda de braço. Queda de braço estéril e boba, diga-se.

       

       

      1. Para min a questão é essa……

        “Aliás, negro no Brasil não é minoria”, estou de acordo, mas eu diria que no Brasil somos uma maioria de mestiços…….um grande mix racial e cultural…..Dados do senso  de 2010:

        Brancos (47.51%)Pardos (43.42%)Pretos (7.52%)Amarelos (1.1%)Indígenas (0.42%)

        Sendo que “A composição por cor ou raça é verificada por autodeclaração”………imagino que deve haver uma boa porcentagem de “autodeclarados” brancos que na verdade não são essa brancura toda  …para min a proporção de “pardos”(palavra horrorosa)mestiços é muito maior do que os tais 43.42%….e os mestiços indiguenas,vão em que categoria.. são pardos?indigenas?brancos?
        Pensemos ao nosso governo golpista de “homens brancos”,Temer por exemplo,um descendente de libaneses… seria ele um homen branco na Alemanha?ou na França?Tenho muitas duvidas…

         

         

         

  8. Consciência de classe

    Quando e onde o povo se distingue e se distancia da elite, acata as diferenças e não as transforma em discriminação. E quando e onde esse povo assume o poder sobre as instituições políticas, aí é que a discriminação mingua mesmo. O problema só começa quando e onde a moda é pensar-se VIP, elite, tenha a cor ou a etnia que for.

    ***

    O Maracanã ficou chato depois que puseram cadeiras separadas na geral. A elite sabe o que faz quando promove o individualismo egoista, a desunião…

  9. Texto chato, longo e

    Texto chato, longo e cansativo… o ar boçal e professoral da escritora beira o cinismo. Se alguém fala comigo nesse tom, eu entendo como deboche.
    Não sei se o turbante (com essas características) surgiu a África ou no Egito, mas tenho certeza de que o ato de cobrir a cabeça é bem antigo, basta ver as imagens da idade antiga. 
    Sinceramente acho essa discussão tão rasa, tão inútil, tão sem sentido, que me cansa só de ver a quantidade de energia que tem sido gasta com ela.
    Lógico que o Brasil é um país racista e é óbvio que a luta contra o racismo deve ser permanente, mas um pouco de foco não faz mal a ninguém!

  10. Emile Zola jamais poderia ter escrito Germinal e …..

    Para não colocar em discussão o racismo, que simplesmente deve ser combatido, mas colocar mais em termos universais a apropriação da cultura pode-se dizer que Emile Zola jamais poderia ter escrito Germinal e Vitor Hugo estaria proibido de escrever Os miseráveis, simplesmente porque o primeiro nunca foi mineiro de carvão nem o segundo jamais foi um proscrito para as galés.

    Este discurso de exclusividade de falar sobre um assunto não sendo pertencente a um determinado grupo social é tão burro que com exemplos se mostra que a evolução da nossa sociedade só pode ser obtida pela solidariedade humana e não pela reserva de mercado a difusão de ideias que inclusive permitam a grupos não pertencentes aos oprimidos façam algo e tentem mostrar exatamente a situação dos oprimidos.

    Devido a esta visão estreita do que se chama humanidade, querendo retribalizá-la e formar guetos torna necessário a construção de longos e tortuosos textos em que somente uma falácia colocada em seu interior consegue, distorcendo os argumentos, provar o absurdo de trazer para trás cartas de direitos universais das pessoas e dos cidadãos.

    A história da humanidade levou milhares de anos para se declarar publicamente e como lei e direito como sendo uma unidade, liberdade, igualdade e fraternidade, foi negada a humanidade pelas diversas formas de expressão, e agora se retoma a negação destes princípios básicos por mais uma, a apropriação da cultural.

  11. O turbante pode ser tomado como instrumento de opressão…..

    O turbante pode ser tomado como instrumento de opressão feminina.

    Por que o turbante entra na África com a islaminazação do continente? Por um sismples motivo, na religião muçulmana as mulheres não devem mostrar os cabelos, então se querem estabelecer críticas e serem politicamente corretas dentro da concepção liberal norte-americana, as mulheres negras brasileiras deveriam resgatando a cultura da introdução desta peça de indumentária negá-la como um instrumento de submissão da mulher ao homem,

  12. O copyright cultural

    O conceito de apropriação cultural é um raciocínio tacanho e totalitário. No mundo atual, principalmente em países com a diversidade étnica do Brasil, como separar o que pertence a uma ou a outra cultura? São séculos de miscigenação cultural e que moldaram as bases de uma nova civilização. Por acaso alguém pensa em proibir Chico Buarque de compor novos sambas? O Gilberto Gil deve ser impedido de criar músicas com ritmos dos povos originários da América? As baianas do acarajé devem passar a selecionar os seus clientes pelo tom da pele? Somente brancos podem pendurar aquele detestável pedaço de pano no pescoço?

    Turbantes, por acaso, é um acessório de vestimenta exclusivo da África subsaariana? Que tal uma restauração do quadro Moça com brinco de pérolas, de Vermeer. Talvez substituindo o turbante azul e dourado por uma cabeleira nórdica. Mas, ele é típico de qual região do mundo? Não existe do Marrocos ao sul da Ásia, e do trópico de capricórnio ao de câncer?

    Afinal, quem registrou o copyright do turbante?

    1. O brinco que o rapaz usa é apropriação cultural?

      Bobagem.

      Brancos compõem sambas e blues. Alguém acha que essas duas músicas perderam suas raizes negras?

      Onde está o esvaziamento? E samba já foi proibido no Brasil e capoeira também e candonble também.

      E o futebol que praticamos? Origem inglesa e proibido no Brasil para os negros até pelo menos 1910. Alguém julga que seja apropriação cultural pelos negros que hoje o praticam no estdo da arte?

      Cultura é construção humana. É de todos os humanos e ainda que seja traço identitário de um povo, isso não o torna proprietário dessa construção cultural ao ponto de proibir outro grupo de fazer uso dela. Ela pertencem a todos que dela se encantarem.

      A força vem do bem cultural ser partilhado por todos. 

      Basta respeito. 

    2. Muito didático, parabéns.

      Gosto dos vídeos do Murilo “Muro Pequeno”, sou inscrito no canal, já andei postando um dos seus vídeos. Mas assim como existe Apropriação Cultural, devemos alertar que existe também a “afropiração” cultural, como é descrita no vídeo a seguir, a partir de 11:10. É preciso distingui-las:

      “Apropriação Cultural é uma forma refinada de racismo e sectarismo… aprendam a separar indivíduos e pequenos grupos de massificação… [e “afropiração” cultural] … é quando o preto perde tempo atacando indivíduos e não o sistema”.

      [video:https://youtu.be/rX113Szpg1E%5D

      PS Depois publico cenas explícitas de “afropiração” cultural. Para não sermos injustos e discriminadores de uma minoria – até porque tem não negros viajando na mesma maionese – devemos reconhecer que ela é um caso particular de um fenômeno mais amplo, que prefiro chamar de Alopração (Royalties para Lula) Cultural, que acomete vários movimentos e seus militantes, de todo o leque das ideologias, de um extremo, passando ao centro, até o outro.

  13. Pessoal está muito fora da

    Pessoal está muito fora da realidade.

    O País se acabando, caindo 4,5% o PIB e a turma preocupada com “turbante”.

    O que cada um bota na cabeça ou no c* é problema de cada um.

     

  14. Por que as religiões de

    Por que as religiões de matriz africana são o principal alvo de intolerância no Brasil?

    http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/01/160120_intolerancia_religioes_africanas_jp_rm

    Dados compilados pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa do Rio de Janeiro (CCIR) mostram que mais de 70% de 1.014 casos de ofensas, abusos e atos violentos registrados no Estado entre 2012 e 2015 são contra praticantes de religiões de matrizes africanas.

    Divulgado nesta quinta-feira, Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, o documento reacende o debate: por que os adeptos da umbanda e do candomblé, e suas variações, ainda são os mais atacados por conta de sua religião?

    O tema ganhou as páginas dos jornais recentemente, em casos como o da menina Kaylane Campos, atingida por uma pedrada na cabeça em junho do ano passado, aos 11 anos, no bairro da Penha, na Zona Norte do Rio, quando voltava para casa de um culto e trajava vestimentas religiosas candomblecistas.

    Também em 2015, no mês de novembro, um terreiro de candomblé foi incendiado em Brasília, sem deixar feridos. Na época, a imprensa local já registrara 12 incêndios semelhantes desde o início daquele ano somente no Distrito Federal.

    A BBC Brasil ouviu especialistas sobre as razões da hostilidade contra as religiões de origem africana e o que pode ser feito.

    Para eles, há duas explicações. Por um lado o racismo e a discriminação que remontam à escravidão e que desde o Brasil colônia rotulam tais religiões pelo simples fato de serem de origem africana, e, pelo outro, a ação de movimentos neopentecostais que nos últimos anos teriam se valido de mitos e preconceitos para “demonizar” e insuflar a perseguição a umbandistas e candomblecistas.

    Leia também: Tom ‘bélico’ de alguns líderes evangélicos cria clima propício à intolerância, diz pastor

    Leia também: Intolerância religiosa leva terreiros de umbanda a reforçar segurança no Rio

    Direito de imagemDIVULGACAOImage captionTemplo de Luiz Fernando Barros já sofreu tentativa de invasão e teve estátuas quebradas; filhos de santo já foram discriminados

    Relatório e dados

    Os entrevistados destacam que, pela primeira vez, a CCIR, criada em 2008, aliou os dados estaduais a números nacionais, informações de outros institutos e relatos de três diferentes pesquisas acadêmicas.

    Os dados do Disque 100, criado pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos, apontam 697 casos de intolerância religiosa entre 2011 e dezembro de 2015, a maioria registrada nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. No Estado do Rio, o Centro de Promoção da Liberdade Religiosa e Direitos Humanos (Ceplir), criado em 2012, registrou 1.014 casos entre julho de 2012 e agosto de 2015, sendo 71% contra adeptos de religiões de matrizes africanas, 7,7% contra evangélicos, 3,8% contra católicos, 3,8% contra judeus e sem religião e 3,8% de ataques contra a liberdade religiosa de forma geral.

    Dentre as pesquisas citadas, um estudo da PUC-Rio sugere que há subnotificação no tema. Foram ouvidas lideranças de 847 terreiros, que revelaram 430 relatos de intolerância, sendo que apenas 160 foram legalizados com notificação. Do total, somente 58 levaram a algum tipo de ação judicial.

    O trabalho também aponta que 70% das agressões são verbais e incluem ofensas como “macumbeiro e filho do demônio”, mas as manifestações também incluem pichações em muros, postagens na internet e redes sociais, além das mais graves que chegam a invasões de terreiros, furtos, quebra de símbolos sagrados, incêndios e agressões físicas.

    Ivanir Costa, babalaô registrado há 35 anos e iniciado na Nigéria há 11 anos, está envolvido com a luta contra a intolerância há mais de duas décadas, e encabeçou a redação do relatório, como presidente da CCIR.

    Leia também: Beber moderadamente é seguro? Quatro mitos sobre o consumo de álcool

    Direito de imagemDIVULGACAOImage captionCoordenador do relatório da comissão da Alerj, Ivanir Santos diz que é preciso pressionar o Estado para resguardar direito de liberdade religiosa

    Ele diz que a própria ausência de dados consistentes nacionais, que dialoguem entre si, e a subnotificação dos casos, são indícios de como o tema ainda precisa ser levado mais a sério no Brasil.

    “Há alguns avanços isolados em lugares como o Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia, mas estamos muito aquém do que precisa ser feito neste setor”, diz o religioso, que recebeu em 2014 o Prêmio Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República pelo trabalho na comissão.

    Racismo e neopentecostais

    Para Francisco Rivas Neto, sacerdote e fundador da Faculdade de Teologia com Ênfase em Religiões Afro-Brasileiras (FTU), baseada em São Paulo e a única reconhecida pelo Ministério da Educação como formadora de bacharéis no tema, é impossível dissociar a intolerância do preconceito contra o africano, o escravo e o negro.

    “Os afro-brasileiros são discriminados, tratados com preconceito, para não dizer demonizados, por sermos de uma tradição africana/afrodescendente. Logo, estamos afirmando que o racismo é causa fundamental do preconceito ao candomblé e demais religiões afro-brasileiras”, diz.

    Direito de imagemDIVULGACAOImage captionA menina Kailane Campos (à dir.)r foi agredida em 2015 por estar portando vestimentas religiosas; caso teve ampla repercussão

    Já a pesquisadora Denise Pini Fonseca, historiadora, ex-professora da PUC-Rio e coautora do estudo que visitou os mais de 800 terreiros fluminenses, acredita que a origem da intolerância esteja muito mais conectada à crescente influência de alguns grupos neopentecostais no país.

    “É claro que o racismo tem influência, mas acredito que é muito mais forte o discurso de alguns movimentos neopentecostais que são na realidade um projeto teopolítico que se apropria de símbolos muito poderosos para atingir seus interesses, e que elegeram as religiões de matrizes africanas como alvo”, diz.

    João Luiz Carneiro, doutor em ciências da religião pela PUC-SP, especialista em teologia afro-brasileira pela FTU e autor do livro Religiões Afro-brasileiras: Uma construção teológica (Editora Vozes), defende que os dois fatores estariam completamente conectados. “A ligação entre esses dois fatores está muito bem resolvida na academia. As razões profundas na questão racial e o discurso neopentecostal que reforça no imaginário popular que é o macumbeiro, o sujo, o que faz o mal”, indica.

    Direito de imagemDIVULGACAOImage captionAdeptos praticam religião no Terreiro Templo do Oriente, na Zona norte do Rio; muitos já sofreram discriminação, diz líder Luiz Fernando Barros

    Para ele, é nítido o processo histórico em que boa parte do que é produzido pelo negro brasileiro é desumanizado, desvalorizado ou considerado estranho, exótico, folclórico, e a ascensão do discurso de alguns neopentecostais que estimula a visão da religião africana como ligada ao culto ao demônio, diabo, satanás, rituais satânicos, macumba ou que fazem o mal.

    Ed René Kivitz, pastor da Igreja Batista, formado em Teologia e mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo e que integra o movimento Missão Integral – que congrega diferentes lideranças evangélicas –, acredita que os casos de intolerância no país são localizados e “fazem parte de um recorte de tempo muito específico que estamos vivendo”.

    “Não faz parte da índole do povo brasileiro e nem da índole cristã, quer seja católica ou evangélica. E evidentemente não faz parte da índole do Evangelho”, disse ele à BBC Brasil em junho de 2015, após o ataque à menina Kaylane, no Rio.

    “Acho que é algo isolado, mas preocupante também para a imagem da Igreja Evangélica, que está sofrendo muito por conta de lideranças radicais que estão construindo no imaginário da sociedade brasileira uma ideia do ser evangélico que não corresponde à grande parcela da nossa população que se identifica como tal.”

    Casos de intolerância

    Luiz Fernando Barros, de 52 anos, já experimentou diversos exemplos de intolerância ao longo dos 37 anos em que atua como religioso da umbanda.

    “Já coloquei minha roupa branca religiosa no trabalho e vi que as pessoas queriam caçoar, fazer pouco dos meus valores espirituais. Temos filhos que frequentam escola pública e não podem usar as contas (colares religiosos). Já tive estátuas quebradas no meu templo, tentativas de invasão. Uma irmã nossa foi demitida de um hotel na Zona Sul do Rio quando a gerente descobriu que ela era de umbanda. Não foi o argumento oficial, mas ficou nítido para ela”, conta.

    Ele foi um dos vários pais de santo que revelaram à BBC Brasil em reportagem publicada no ano passado que se viu forçado a aumentar a segurança de seus terreiro após repetidas invasões. Um deles, Pai Costa, de 63 anos e há 45 atuando como líder religioso, já tinha sofrido três invasões na época e teve de gastar R$ 4.500 em sistemas de vigilância.

    Direito de imagemDIVULGACAOImage captionTradicional oferenda a deuses africanos; para especialistas, há mitos e preconceito sobre rituais de religiões de matrizes africanas

    Outro exemplo é o de Pai Márcio de Jangun, babalorixá, advogado e escritor iniciado há 36 anos no candomblé e com terreiro aberto há 15 anos. Ele diz que a intolerância pode ser sutil e parte do cotidiano, o que também configura discriminação e crime, apesar de não envolver violência física.

    “Já me recusaram vender flores quando perceberam que seriam usadas em terreiro de candomblé. No transporte público, a pessoa se levanta por não querer ficar sentada do seu lado, se benze. É algo que infelizmente faz parte do cotidiano e que os praticantes de religiões africanas lidam todos os dias no Brasil”, diz.

    No relatório da CCIR há casos como a invasão e depredação do centro de umbanda “A Caminho da Paz”, no Cachambi, na Zona Norte do Rio, em fevereiro de 2015, assim como incêndios e destruição de estátuas no Distrito Federal.

    Também são documentados xingamentos contra crianças judaicas num clube de elite da Zona Sul do Rio, na Lagoa, durante as Mascabadas, olimpíadas de colégios judaicos de todo o país, e o ataque a uma professora de teatro que recebeu uma pedrada na perna aos gritos de “muçulmana maldita” uma semana após os atentados à sede da revista Charlie Hebdo, em Paris, no início do ano passado.

    Papel do Estado

    Um dos objetivos de aumentar o escopo do relatório da CCIR é chamar a atenção para o problema e nacionalizar o debate, além de pressionar Estados e o governo federal para a implementação de políticas públicas mais efetivas. Outra meta é cobrar a execução da legislação já existente, que tipifica o crime de intolerância religiosa.

    Leia também: Cientistas dizem ter evidências de novo planeta gigante no Sistema Solar

    Direito de imagemDIVULGACAOImage captionLideranças e praticantes contam que apenas portar vestimenta tradicional e símbolos e adereços já é suficiente para despertar intolerância nas ruas

    No Rio de Janeiro, apesar de alguns avanços pontuais, os especialistas cobram a implementação de uma delegacia especializada, aprovada por lei em 2011 mas ainda sem previsão para sair do papel. São Paulo e Distrito Federal já criaram tais espaços.

    Consultado pela BBC Brasil, o governo fluminense confirmou que “não há previsão para a criação” da Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância como determinou a Lei Estadual 5931, aprovada em 25/03/2011. O governo ressaltou, no entanto, papel pioneiro com a criação do Centro de Promoção da Liberdade Religiosa & Direitos Humanos, em 2012, e disse que todas as delegacias de polícia do Estado estão aptas a registrarem casos de intolerância religiosa.

    Na visão dos especialistas, este é justamente um dos principais problemas. “Quando a pessoa vai a uma delegacia, o policial registra a queixa como briga de vizinho, rixa, ameaça. Falha ao não aplicar a lei de intolerância religiosa, que prevê a tipificação penal adequada”, diz o professor André Chevarese, do Instituto de História da UFRJ, que coordena o Laboratório de História das Experiências Religiosas.

    “Além disso, juízes tendem a ser condescendentes, não punem da forma adequada. O Estado falha ainda ao não educar melhor, não incluir mais o ensino sobre África, sobre religiões de matrizes africanas, sobre a importância das culturas africanas para a construção do país”, diz.

    Ivanir Costa, da CCIR, diz que ao longo do tempo já presenciou a entrega de documentos às mãos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff, e que ouviu promessas, mas até agora falta vontade política para implementar medidas nacionais mais eficientes, a exemplo do que foi colocado em prática na questão da violência contra a mulher.

    “Não temos órgãos que acolham denúncias e orientem vítimas em todos os Estados. Não temos uma base de dados nacional, os números são muito discrepantes ao redor do país. Há pouquíssimas delegacias. Delegados, policiais e juízes descumprem a lei. É um cenário muito incipiente ainda”, avalia.

    1. Até 1940 as religiões afro eram perseguidas pelo Estado, hoje

      Até 1940 as religiões afro eram perseguidas pelo Estado, hoje o que há é perseguição religiosa, e esta política de ghetos simplesmente isola os diversos grupos para serem perseguidos individualmente.

      De novo uma postagem que prova que re-tribalizar é pior do que considerar as liberdades de todos os grupos como algo intocável.

      Este discurso, que na França chamam de comutarismo é que está fazendo o Front Nacional de extrema direita crescer.

  15. Cantora é presa após dar

    Cantora é presa após dar sinal de desembarque em ônibus que seria incendiado

    A cantora, compositora e estudante de música, Marcella Eduarda Januária Carvalho, conhecida como Madu, de 18 anos, foi presa na madrugada da última terça-feira (14) após o ônibus em que estava ter sido incendiado por um grupo de criminosos.

    De acordo com o registro da ocorrência, a jovem estava no coletivo 342, quando, na altura do bairro Castanheiras, no Barreiro, ela deu sinal para desembarcar. A estudante é moradora da Ocupação Eliana Silva, na mesma região de BH.

    Nesse momento, dois indivíduos que estavam no ponto de embarque abordaram o veículo e anunciaram que iriam incendiar o ônibus como uma retaliação às condições precárias do presídio São Joaquim de Bicas II.

    A cantora fugiu do local, porém, foi presa próxima da região e acusada de envolvimento com o caso. A jovem foi encaminhada para a delegacia junto com os suspeitos do crime que também foram presos.

    De acordo com a mãe da estudante, Sílvia Januária, 41, ela ficou sabendo da prisão da filha por meio de uma policial que não quis se identificar. “Ela não voltou para casa e achávamos que ela havia dormido na casa de alguma amiga. Foi quando recebemos a ligação de uma agente, informando que a Marcella estava na delegacia sendo presa injustamente”, conta.

    A mãe conta que a Madu não pôde ligar pois estava com o celular sem bateria e que, além disso, os policiais envolvidos na ocorrência não deixaram que ele usasse o telefone da delegacia para contatar os pais.

    A família procurou auxílio e, na tarde desta quinta-feira, foi realizada uma audiência de custódia para debater o caso. Porém, a jovem não foi apresentada para entrevista pessoal com o juiz.

    “A Marcella está sendo acusada de um crime que não cometeu, por uma visão distorcida, preconceituosa e racista da PM. Além disso, o sistema prisional não se comprometeu a trazê-la na audiência, contrariando as indicações dos Direitos Humanos”, diz Thales Viote, advogado da cantora e representante da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

    Mesmo que a Madu nunca tenha sido presa e com as atividades de estudante e artista comprovadas, o Poder Judiciário determinou que ela só poderia ser libertada mediante pagamento de fiança de um salário mínimo, uso de tornozeleira eletrônica e recolhimento domiciliar.

    Grupos sociais se organizaram pela internet e conseguiram pagar a fiança de Marcella. Ela deve ser libertada até este sábado (18). Os advogados ainda tentam o recurso de Habeas Corpus para revogar as medidas de tornozeleira eletrônica e recolhimento domiciliar.

    http://bhaz.com.br/2017/02/17/cantora-presa-onibus-incendiado/

    1. E daí?

      Foi presa por que era negra ou por que no Brasil se prende qualquer um só porque a polícia acha bom?

      Não provou nada, o que provou que pobre além de sofrer discriminação por ser pobre sofre discriminação por ser negro(a).

      1. Claro que vocês não entenderam
        E nem querem, não é mesmo? Vocês estão muito mais ocupados em contestar do que em escutar e tentar entender.

        Na verdade é bastante simples. Ta tudo explicadinho no vídeo “essa tal de apropriação cultural” que postei aqui. Ou no artigo da Ana Maria Gonçalves que vocês rechacaram com tanta veemência. Sem mencionar o post em tela.

        Surpresa nenhuma, pra ser sincera.

        O que falta a vocês homens brancos de esquerda é empatia pelas minorias. Todas elas. Sobra vaidade e autoritarismo.

  16. Em linguagem militar isto se chama manobra de diversionismo.

    Indivíduos pagos por agências internacionais de espionagem como a CIA, usam uma coisa mais velha do que nunca, o famoso dividir para governar.

    Pegam alguém que teoricamente tem uma credibilidade dão uma grana através de uma bolsa de uma fundação do tipo Rockefeller, Soros ou outro lixo e esta pessoa fica criando manobras de diversionismo para não só confundir mas como também para tirar o foco do principal.

    São agentes da CIA ou outras agências.

  17. Texto tão ingênuo que chega a ser mal intencionado sem o sê-lo.

    Então, agora, mulheres brancas são proibidas de usarem turbantes? 

    Não, apenas devem se abster “voluntáriamente” de usá-los.

    O que é proibição do mesmo modo.

    E o que proibiremos às mulheres negras? 

    Porque é só isso que os racistas brancos estão esperando.

    PS.: também fui ouvir as mulheres negras, há vários depoimentos no You Tube sobre o assunto. Elas não estão nem aí para o fato de uma mulher branca usar turbante. Elas sabem que o buraco do racismo é muito mais embaixo. 

    1. Discordo, é um texto muito sensível.

      Ela reconhece que, no presente, as mulheres negras:

      “… seguem tendo os piores salários, a mais baixa escolaridade, menos acesso a tudo… são as que mais morrem de parto, são as que mais perdem filhos pequenos para doenças que não deveriam mais matar, são as que mais sofrem com filhos adolescentes e adultos em prisões que são campos de concentração não disfarçados… que têm seus filhos executados pela polícia e por grupos de extermínio, vítimas de um genocídio… que são as que mais sofrem estupro e as que têm menos acesso à tratamento quando adoecem… “

      Então, diante da brutal situação que muitas mulheres negras estão inseridas, Dona Brumélia Nebrum resolve escrever para uma moça branca, para “sensibilizá-la” de que é importante “problematizar” a questão da Apropriação Cultural.

      Se escrevesse para uma mulher nergra envolvida naquela terrível situação material que descreve, talvez obtivesse como resposta: “Minha ‘Senhora’, essa tal da apropriação cultural enche o bucho? Ela “fecha o corpo” do meu filho contra balas das milícias, livra minha filha de estupro e tira meu marido da cadeia”?

      1. O que tem uma coisa a ver com a outra?

        O que a moça de turbante, que, aliás, usa o turbante em função da calvice trovocada pela quimioterapia, tem a ver com situação das mulheres negras que você descreve?

        Em que a interdição a ela do uso de uma peça de vestiário  associada a um grupo étnico melhora a situação dessa hipotética mulher negra citada por você?

        E o que dá as mulheres que constrangeram a moça o direito de constranger alguém?

        1. Puta que pariu!!!!

          “O que a moça de turbante, que, aliás, usa o turbante em função da calvice trovocada pela quimioterapia, tem a ver com situação das mulheres negras que você descreve?”:

          O assunto do turbante PARA VOCE ainda eh sobre a mulher doente????

          “Em que a interdição a ela do uso de uma peça de vestiário  associada a um grupo étnico melhora a situação dessa hipotética mulher negra citada por você?”:

          Nao, o assunto nao eh esse.  Voce quer que qualquer pessoa que aponte pra alguem na rua e grite “maconheiro, cabeludo, comunista” esteja automaticamente creditada por voce enquanto milhares de mulheres so querem colocar um turbante como simbolo  de unidade na cabeca na esperanca de nao serem acusadas de discriminar pacientes de cancer?!?!?!  Ok, entao o que essas milhares de mulheres tiveram a ver com o que aconteceu com a UMA doente que disse que foi discriminada Por Todas As Pretas????

          E agora chegamos ao assunto:  essa mulher mentiu.  Ela ja apareceu no assunto ate mesmo com hashtag, coisa que me deixou de orelha em pe desde o comeco do assunto:  desde o primeiro post ela ja apareceu dizendo que “vamos sim”.

          Entendeu por qual razao ela esta mentindo?

        2. Nada a ver.

          Por isso que o artigo é de branca para branca e muito “sensível”. Se escrevesse esse textão rebuscado sobre a tal “afropiração” cultural, para uma negra na situação que descreve, teria como resposta provável a que descrevo.

  18. Quando uma discussão deste tipo chega a impasses é….

    Talvez para resolver esta discussão que parece chegar a um impasse, é possível utilizar alguns conceitos matemáticos para resolver o problema, pois como em questões sociais quando muitas vezes se chega a impasses simplesmente porque o problema não chegou a ser resolvido porque ele não é um problema bem posto.

     

    Quando por analogia uma discussão social chega a um impasse é simplesmente porque ela foi mal posta, ou seja, não se obteve as condições necessárias para definir um problema bem posto, quais sejam:

     

    Existência da solução, unicidade da mesma e uma solução dependente das condições iniciais e de contorno.

     

    Ou seja, se há um problema proposto para que ele seja bem posto, a solução deste problema em qualquer situação deve existir, ela deve ser única e depender das condições de contornos que variam continuamente no espaço e tempo.

     

    Quando este problema não tem estas características à solução inversa ou não existe ou tem diversas possibilidades de solução.

     

    Vamos aos fatos, o racismo ainda não é um problema bem posto, pois a existência da solução ainda não foi corretamente determinada não havendo um caminho perfeitamente delimitados, além disto os caminhos existentes não são únicos, e variam com as diversas condições de contorno existentes, que seriam no nosso caso as condições de contorno social que levam a diversas soluções do racismo por diversas políticas sociais existentes e para diversas classes sociais.

     

    Vamos procurar colocar mais dentro do nosso problema, a discussão da apropriação cultural é uma forma de resolver o racismo? Não. Principalmente porque como se vê em todos aqueles que discutem e estão preocupados com o assunto, colocam como condições apriorísticas e corretas de resolver o problema do racismo, que chega a atuar até sobre a autoestima do oprimido. Se, dentro dos diversos problemas do racismo, aumenta-se a autoestima do grupo social minoritário e oprimido, ele deixa de se comportar como tal e parte da ideologia opressor-oprimido vai para o passado histórico.

     

    Outro exemplo, a geração do falso sentimento do racismo inverso, é algo que não prosperaria numa sociedade homogeneamente bem definida para todas as características que distinguem os grupos sociais, étnicos e religiosos. Porém quando esta sociedade tem seus problemas mal definidos o racismo inverso é uma mera consequência de uma falsa tentativa da solução do problema inverso sem que se tenha resolvido o problema direto (que deveria ser bem posto).

     

    Explico melhor, numa sociedade em que se vencesse o racismo, a homofobia e outras fobias, a própria visão de uma autoestima natural de qualquer humano, que no passado pertencia aos grupos anteriormente discriminados, não gerará desconforto para o ex-grupo que era hegemônico, pois será considerada uma situação normal. Porém numa sociedade ainda racista ou homofobia a própria postura altiva de um que sofre ainda a discriminação do grupo hegemônico, cria um desconforto daqueles que se acham dominantes que constituiu a falsa impressão do racismo inverso.

     

    Então qual é o caminho? O caminho está na solução dos problemas diretos como o racismo e a homofobia e não na tentativa de simplesmente tentar mostrar que a solução que ainda não existem será obtida insistindo por mera imposição cultural que uma postura altiva como características de grupos, tornando-a exclusiva a este grupo oprimido sem eliminar a opressão. A solução passa a desqualificação de postura de grupos hegemônicos como uma forma de representação desta.

     

    Se resolvido o problema principal, a chamada apropriação cultural vai virar uma simples bizarrice ou um modismo por pessoas que não tem ligação nenhuma com elas, entrando no rol dos milhares de atos bizarros e modismos que ocorrem na sociedade.

     

    Em resumo, a causa deve ser combatida e não o efeito.

  19. A maoria dos comentários

    A maoria dos comentários mostram o grau de interiorisação do racismo no Brasil. Seja a esquerda ou a direita (fui ler os comentários em outros lugares), o problema é o mesmo.

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