É preciso dar um basta ao “bolsonarismo”
por Francisco Celso Calmon
Este artigo parte de uma premissa maior, a de que o “projeto bolsonarista” é destruir a plataforma civilizatória que vinha sendo construída até o golpe do impeachment de 2016.
Nesta gravíssima conjuntura do Estado policial, sustentado pelos militares, milicianos e pelas togas fascistas, o que fazer? Esperar a casa ruir de vez ou protagonizar, com propostas, para dar um basta ao “bolsonarismo”? E por qual meio: impeachment, cassação via TSE ou acordão parlamentarista?
O poder dominante está preparando o enterro, mas o defunto resiste e ainda não sabem o que fazer com ele.
A reforma da Previdência, capitaneada pelo Paulo Guedes, cujo núcleo principal é a capitalização, uma vez derrotada frustrará o capital financeiro e irá provocar mais conflitos internos ou mesmo implosão do governo fascista de Bolsonaro e de sua confusa base de apoio parlamentar.
Quando a questão do impeachment é abordada, a primeira reação é dizer que o Mourão é um fascista mais articulado com as palavras e de relacionamento menos rude, e, portanto, poderia dar um verniz que evitasse a decadência do governo, ganhando um fôlego; o segundo argumento é o de que o governo seria de militares.
Pondero lembrando que a economia não irá se recuperar, com Mourão ou quem quer que assuma mantendo o “projeto” até aqui desenhado pelo governo; e quanto ao governo vir a ser de militares, será somente tirar a venda que a mídia coloca, pois, há mais de 100 militares participando do governo, em ministérios, secretarias e autarquias. Ocorre que, como a mídia não dá realce, não trata os militares no governo por suas respectivas patentes, esconde-as, e o fracasso da gestão está ficando na conta do Bolsonaro, Paulo Guedes e alguns histriônicos ministros. O presidente está cercado de militares, entre eles o seu fiador militar na eleição, o ex-comandante do Exército Gal. Villas Boas.
Com Mourão o governo ficará com a sua aparência verdadeira: um governo de militares. A camuflagem deixará de existir e as Forças Armadas terão que se assumir como responsáveis por esse “projeto bolsonarista” (com milicianos) ou articular um pacto com as forças vivas da nação para uma nova travessia.
A via do impeachment, que colocaria (ou colocará) o vice na presidência, é tormentosa, lenta e sujeita a negociações das mais variadas, sobretudo, por tratar-se de um Congresso de maioria inexperiente e um STF enxovalhado. E, para além disso, e especialmente, pelas imprevisíveis reações do “bolsonarismo”. Entretanto, o estoque de pressões, chantagens e extorsões é favorável aos senhores que preparam o enterro.
Sobre a cassação da chapa via TSE, razões e provas não devem faltar para comprovar que a eleição foi eivada de fraudes e financiamentos de origem comprometedora. Mas esse caminho, sem o interesse do poder dominante, somente seria viável caso a oposição conquistasse mais adeptos nas instituições e nas ruas.
A saída parlamentarista, sem ouvir o povo, é um golpe; embora as forças democráticas não devam fazer como o avestruz, é necessário um projeto de reforma política com participação popular, seja através de um referendum, plebiscito ou uma Assembleia Constituinte.
Qualquer dessas saídas para estancar a sangria que o “bolosonarismo” produz no país é prejudicial à história da democracia brasileira, é ruim para o amadurecimento democrático da sociedade. Entretanto, o país não pode servir de laboratório de gestão para que governantes incapazes tenham tempo para apreender. A sociedade não pode pagar preço tão alto porque uma maioria relativa (eleitoral) escolheu mal o seu presidente, e o fez dentro de um golpismo, que não só impediu a eleição do líder disparado nas pesquisas, como também usou de métodos corruptos (fake News, robôs, “facada”).
Não há dúvida que a banalização do impeachment é prejudicial à evolução da sociedade. Contudo, 28.4 milhões de afetados pelo desemprego e subocupação, a juventude com futuro afunilado, a educação castrada, o clima de ódio crescente, milicianos no poder, armas à disposição dos que podem pagar e usar contra pobres e militantes sociais, idosos com virtual aposentadoria da morte, tudo isso é um preço muito elevado em nome de uma eleição formalmente democrática, em nome de uma abstrata democracia, porque a democracia real é cruel, excludente e absolutamente desigual. Hitler também fora eleito e, não impedido a tempo, por quaisquer meios, produziu o holocausto da humanidade.
Os estudantes nas ruas, os trabalhadores em vias de greve, a CNBB se posicionando, o Papa engajado, as forças armadas desatinadas, o Congresso como barata voa, formam um quadro que requer da parte das forças democráticas a montagem de um comitê de crise para emitir diretrizes às lutas nas ruas e nas instituições, bem como, para protagonizar um pacto, se o caminho for esse. A correlação de forças, para tanto, estará diretamente dependente das ruas, ou seja: da manifestação da sociedade.
É chegada a ocasião da resistência agregar também um plano de ataque, um alvo de curto prazo.
A situação econômica é trágica e a situação fiscal é explosiva, num cenário internacional de guerra comercial.
Nenhuma reforma evitará o aprofundamento da crise, pois o efeito de qualquer reforma é de médio para longo prazo. Sem emprego e sem crédito não há consumo e crescimento, sem taxação de lucros/dividendos/ grandes fortunas e sem cobrança imediata das dívidas dos sonegadores não haverá como o governo fechar as contas e o presidente poderá incorrer em crime e ameaça de prisão. Um imposto tipo CPMF poderia aliviar, mas de imediato não passaria.
Segundo dados noticiados, as contas públicas não fecham e o governo pode ficar sem dinheiro já nas próximas semanas.
Para que isso não ocorra, o Congresso precisaria aprovar aproximadamente R$ 249 bilhões em dívida. “Se o Congresso não autorizar a União a fazer essa captação de recursos se endividando, o presidente terá uma escolha difícil na ponta da caneta: cancelar as despesas e agravar a crise econômica do país ou mantê-las e correr o risco de sofrer um processo de impeachment.” (Mariana Schreiber – Da BBC News Brasil).
São tempos de tensão e de desespero do governo. Quem matou matar Marielle? Quem contratou e banca o Adélio Bispo de Oliveira? Cadê Queiroz?
São também tempos de unidade, são tempos de luta de classe, são tempos de sobrevivências e resistências ao protofascismo instalado nas instituições republicanas e segmentos sociais do nosso país.
É tempo de aprender com a história, é tempo de aplicar a inteligência política e ultrapassar modelos obsoletos de luta.
Defenestrar o “bolsonarismo” do poder é um ato de legítima defesa, meu e de 29.999 999 brasileiros de esquerda que ele prometeu matar. É um ato de legítima defesa da Constituição de 88. É um ato de defesa do país, antes que liquide com o Brasil. É sobretudo um movimento legítimo de defesa da democracia.
Francisco Celso Calmon é Advogado, Administrador, Coordenador do Fórum Memória, Verdade e Justiça do ES; autor do livro Combates pela Democracia (2012) e autor de artigos nos livros A Resistência ao Golpe de 2016 (2016) e Comentários a uma Sentença Anunciada: O Processo Lula (2017).
Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.
Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.
“A situação econômica é trágica e a situação fiscal é explosiva, num cenário internacional de guerra comercial.”
Alternância de poder sem efetuar, promover, realizar AUDITORIA DA DÍVIDA PÚBLICA https://www.youtube.com/watch?v=liu_ajS1htU é pura continuidade do servilismo correspondente ao nosso IDH Educacional https://en.wikipedia.org/wiki/Education_Index que mesmo que suba dez posições não chega à da Venezuela.
Estou bloqueado por vocês. Sinal de que não aceitam comentários.