Entenda ponto a ponto a Reforma da Previdência

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – As mudanças com a Reforma da Previdência, apresentada pelo governo nesta terça-feira (06), trouxeram muitas dúvidas e inseguranças sobre o seu funcionamento, o impacto real na economia e na arrecadação dos trabalhadores que poderão se aposentar a partir dos 65 anos de idade e 25 de contribuição.
 
Para sanar algumas dessas dúvidas e explicar de forma clara e fácil quais serão as mudanças, o consultor legislativo do Senado e mestre e doutorando em Economia pela Universidade de Brasília (UNB), Pedro Fernando Nery, escreveu o artigo “Reforma da Previdência: Uma introdução em perguntas e respostas”, concedido ao GGN.
 
Nery destaca que a escolha do governo foi por manter as características essenciais dos regimes, tipicamente “neoliberal”, como o Regime Geral de Previdência Social e o Regime Próprio de Previdência dos Servidores, e que a proposta segue no modelo de repartição, quando os contribuintes atuais é que financiam o benefício daqueles que já se aposentaram.   
 
O especialista expõe que o total das despesas do INSS chega a R$ 500 bilhões, sendo destes R$ 150 bilhões apenas de déficit. Além disso, os gastos com o INSS de servidores públicos é de R$ 70 bilhões neste ano, sendo a metade de déficit, e os militares são objeto de R$ 35 bilhões de investimentos do governo, e quase a sua totalidade representando o rombo no sistema (R$ 32 bilhões).
 
Neste cenário, “as despesas com Previdência em todos os regimes, mais o Benefício de Prestação Continuada (BPC-Loas), corresponderão a cerca de 55% do total da despesa primária” do orçamento anual de 2017. Enquanto que a saúde receberá 7%, educação apenas 3%, Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com outros 3% e o Bolsa Família 2%.
 
O funcionalismo e outras despesas são responsáveis por 30% do orçamento da União.
 
Para explicar a necessidade de uma reforma no quadro atual da economia brasileira, Pedro Nery lembra que investimentos públicos, como de infraestrutura e ciência e tecnologia, “por mais necessários que sejam para o país se desenvolver, constituem despesas ‘discricionárias'”, enquanto que salários do funcionalismo e a Previdência são despesas obrigatórias.
 
Para reduzir os gastos e agir pela recuperação da economia, o governo teria a frente três opções, explica o consultor legislativo: elevar os impostos, aumentar o endividamento e reduzir outras despesas. “Para acomodar o crescimento dos gastos com Previdência, seriam as despesas discricionárias as com maior chance de ser comprimidas, o que atinge o investimento público. Esta questão afeta diretamente não só o governo federal, mas também os subnacionais”, analisou.
 
 
Já sobre os preceitos de que a reforma impactaria diretamente na confiança do mercado, que por sua vez induz a recuperação econômica, o especialista aponta que, nos últimos anos, outro debate foi pautado. 
 
“O Prêmio Nobel Paul Krugman, que se consolidou nos últimos anos como um dos economistas mais influentes do mundo, expressando ceticismo sobre a aplicação da lógica nos Estados Unidos cunhou o termo “fada da confiança” para ironizar o argumento. No mesmo sentido, no âmbito da PEC do teto de gastos, economistas com posição divergente da do governo lançaram o documento Austeridade e Retrocesso”, publicou.
 
No artigo, Nery ainda explica a relação intrínseca entre a Reforma da Previdência e a Proposta de Emenda 55, do Teto dos Gastos Públicos, de que uma medida não é possível sem a outra, já exposto na reportagem do GGN Consultores Legislativos comprovam efeitos devastadores da PEC 55.
 
Dedica capítulos a explicar detalhadamente cada um dos pontos da reforma do Regime Geral, incluindo a aposentadoria por tempo de contribuição, a idade mínima e distribuição de renda, as diferenças no contexto rural e urbano, a prestação continuada, a desvinculação do salário mínimo, pensões por morte, incapacidade e invalidez e, por fim, explica o argumento de que o déficit da previdência não existe.
 
Esta última tese é defendida historicamente por sindicatos, advogados previdenciários e políticos, incluindo a Parlamentar Mista em Defesa da Previdência Social, e muitos dos próprios segurados. “Seu respaldo vem de publicações de dados da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip)”, informa.
 
A questão gira em torno do fato de que qualquer déficit do INSS é coberto pelo Tesouro, não tendo a obrigação de fechar suas contas sozinho. Por isso, para ele, “a preocupação dos que defendem haver superávit, portanto, é centrada em combater uma ‘narrativa’ que daria ensejo, hoje e no futuro, a restrições aos benefícios”.
 
Ainda, em comparação, o especialista mostra que “na América do Sul muitos países cobram mais dos empregados (chegando a 15% no Uruguai), o que é incomum no grupo do G-20”, mas que em contrapartida, “se praticam alíquotas menores para os empregadores”. 
 
De modo geral, “a soma das contribuições de empregado e empregador no Brasil está bastante acima da de outros países. A média do grupo analisado (América do Sul e G-20) é de 17%, contra os 28 a 31% do Brasil. Apenas na Itália a tributação sobre o salário é maior: 33%”, aponta o artigo.
 
O artigo pode ser acessado, na íntegra, abaixo.
 
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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

10 Comentários

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  1. O que o autor chama de regime

    O que o autor chama de regime tipicamente neoliberal não são, como afirmado no artigo, os atuais RGPS e RPPS do país, que são de repartição, mas sim os regimes de “capitalização (em que o beneficio de cada trabalhador é custeado pelas suas próprias contribuições no passado, capitalizadas), típico da previdência privada no Brasil e da previdência pública em outros países emergentes6 , e tipicamente considerado uma opção “neoliberal”” (ver pág. 10).

  2. Preparar-se

    Todos devem se preparar para conter as despesas ao nivel de 1 SM e agora menos ainda. Toda a vida economica deverá depender de 1 SM de aposentadoria, explico: “Não há um unico empregado na iniciativa privada no topo da carreira que tenha 65 anos de idade e muito menos 49 anos de contribuição no teto atual de 5189,00. mesmo que ganhe mais. Perdem o emprego e são substituidos por mais jovens. Se quizerem se aposentar com esse beneficio se estiverem desempregados terão que pagar duplamente por si e pelo empregador.

    Enfim se não conseguirem tudo que antes contribuiram no topo de 5189,00 é perdido.

    O destino de todos é consumir de acordo com 1 SM!!!!!!!??????? ou se preparem para trabalhar por conta se for possivel como aqueles “Engenheiro que virou suco”

  3. Caros concidadãos, todas

    Caros concidadãos, todas essas medidas draconianas contra o Brasil e a maioria de seu povo visam tão somente escoar recursos para alimentar o grande cancro do País – não comentado com a devida veemência, inclusive, nos “blogs sujos” – , que é a tal Dívida Pública Interna, cujos encargos sangram (todos os anos!) quase 50 % do orçamento público, conforme se confere nos textos abaixo, de autoria de Maria Lucia Fatorelli – auditora aposentada da Receita Federal que, escandalizada com tais números, fundou o movimento “Auditoria Cidadã da Dívida” no Brasil. Pauta, aliás, ao que parece, Lula e seu governo tiveram que abandonar para poder se intalar no Planalto, como explicitado na tal “Carta aos Brasileiros”, em junho de 2002, ainda antes de sua eleição… Penso que, infelizmente – em minha não muito grande experiência como ex-militante na esquerda -, tal documento marca o ponto de inflexão do PT em sua história de luta no movimento social brasileiro. Seguem os textos e a Carta apaziguadora…

    http://www.auditoriacidada.org.br/blog/2016/12/02/pec-552016-e-pec-dos-banqueiros/

    http://www.cartacapital.com.br/economia/201ca-divida-publica-e-um-mega-esquema-de-corrupcao-institucionalizado201d-9552.html

    http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u33908.shtml

     

     

  4. Falácia

    Se o déficit da Previdência não é uma falácia, por que o cidadão em mais de 130 páginas de pura enrolação não coloca uma tabela com todas as receitas e despesas do INSS para podermos concluir por nós mesmos o verdadeiro estado do INSS?

  5. Reforma da previdência

    Curioso. O analista fala em 55% do orçamento para a previdência mas não fala que a previdência arrecada bilhões que são despejados no Tesouro Nacional (esse era o grande desejo da receita federal e do tesouro. A arrecadação do INSS não vai mais para o ministério da previdência). Ora a Saúde e a Educação não tem arrecadação própria. A análise já peca por aí. O próprio artigo já menciona que o percentual de arrecadação da previdência no Brasil é dos maiores do mundo. Acontece que todo o pagamento de aposentadorias do funcionalismo público, de juízes, militares, etc., que nunca pagaram nada cai nas costas do INSS e do trabalhador comum (que paga o pato). Pelo visto a reforma que se pretende continua a manter todos estes privilégios. A previdência continua a ser uma caixa preta e misteriosa. E tem mais: basta qualquer crescimento da economia, dos salários e nos níveis de emprego, para que a arrecadação do INSS cresça de forma significativa, reduzindo os gastos do tesouro. Tivemos superavit em anos não tão distantes . Quer dizer o tesouro não precisou colocar nenhum centavo. Façam um estudo de correlação histórica com todas estas variáveis e verão. O que se nota é o reconhecimento da incapacidade do governo e dos agentes econômicos de alavancar a economia, elegendo a previdência como bode expiatorio. E o não reconhecimento do Inciso I, Artigo 11, da lei 8212, que criou a Seguridade Social (fontes de recursos: tesouro nacional, arrecadação dos empregados, de empregadores e algumas outras rubricas). Ou sejam desprezam este dispositivo da lei, querendo que as despesas do INSS sejam cobertas exclusivamente por receitas próprias, ignorando a intenção do legislador que colocou muito acertadamente a previdência no mesmo nível de necessidades do ser humano pela saúde e pela educação. Em suma a previdência jamais foi deficitária.

  6. Eles não vão reformar, eles vão demolir a Previdência

    O que está vindo aí não é reforma, é demolição da previdência. Os benefícios serão arrochados ao extremo e a contribuições vão aumentar exponencialmente. Quem será o beneficiário desse saldo positivo?

     

  7. Reforma Desumana e Enganosa

    Cálculo atuarial, estatística, expectativa de vida, pacto de gerações, justiça social, são palavras chaves quando se descute a reforma previdenciária em bases racionais.

                    Um pouco de história também é importante para clarear a discussão política. Quando a previdência social teve início no Brasil, antes da unificação dos diversos institutos IAPI, IAPETEC, etc., ela tinha como fundamento a capitalização e o cálculo atuarial.

     Sim nesta época já existiam refinados cálculos matemáticos, financeiros, estatística, aliás, muito tempo antes.

                    Nesta época existiam muito mais contribuintes do que beneficiários, gerando grandes sobras financeiras no orçamento da união. Então houve uma mudança, alguém ou grupos percebendo aquilo como oportunidade sugeriu a mudança do sistema, de capitalização para fluxo de caixa, ninguém pensou em 2060, pensou-se no presente e o sistema foi mudado, semelhante ao que o governo Richa do Paraná está fazendo com o fundo dos funcionários públicos, que gerou protestos e espancamento dos professores recentemente.

                    Sobrou dinheiro era superávit, e como sobrava muito dinheiro ninguém pensou no futuro, este superávit ia para o caixa único do governo e isto certamente permitiu melhoria de proventos dos funcionários públicos da época, gastos generosos com a saúde, (embora o país fosse mais pobre, os médicos que atendiam no sistema público eram os cidadãos mais ricos principalmente nas pequenas cidades), deu para construir o Maracanã, Brasília, Petrobras, Eletrobrás, Vale do Rio Doce, Companhia Siderúrgica Nacional, etc…, fizeram coisas boas e coisas ruins.

                    Nesta época a distribuição da população brasileira em faixas etárias era na forma de uma pirâmide, com base bem larga. Muita criança e jovens, adultos na idade produtiva e poucos idosos. A demanda era em cima dos mais jovens, a cada 30 anos a população dobrava e era necessário construir outro Brasil a cada 30 anos. Nesta época o “fardo” não eram os idosos eram os mais novos, e a necessidade de prepará-los par o futuro, a população crescia 3% ao ano.

                    O Brasil urbanizou-se, cresceu, o perfil etário alterou-se. E aí a previdência já não gerava mais superávit, no ponto de vista de fluxo de caixa, gerou-se uma discussão na sociedade sobre a necessidade de reformar-se a previdência, assim aumentou-se a idade e inventou-se o fator previdenciário, “reformas do FHC”. Nesta época também se pagou juro de 40% já em plena vigência do plano real, juros reais de 25% ao ano, aumentou-se a dívida interna e para equilíbrio financeiro, além das reformas previdenciárias houve uma grande privatização. E lá se foram Vale do Rio Doce, antes já tinha ido a CSN, bancos estaduais, etc.

                    O fator previdenciário na verdade é uma forma não exata na direção de um sistema que usa o cálculo atuarial, quanto mais tempo se recebe, maior tempo de sobrevida em relação ao período contributivo, menor o fator e conseqüentemente menor o valor da aposentadoria.

                    Podemos ver nesta história, que uma geração foi tungada, primeiro no patrimônio que deveria constituir, que seria seu, tendo o estado como gestor, depois, no valor de sua aposentadoria e agora na idade permitida para aposentadoria 65 anos! (com 49 anos de contribuição, para recebê-la integral).

                    Agora vamos raciocinar do ponto de vista do cidadão, virtual usuário da previdência oficial.

                    No pacto original da previdência era seria sustentada pelo governo (toda a sociedade), pelo patrão e pelo funcionário, na proporção de 8% para cada parte. O governo nunca compareceu com a sua parte, assim o cidadão acabou contribuindo com 20% sobre os seus vencimentos, durante 35 anos.  A contribuição é sua, a direta e indireta, pois ambas saem do seu trabalho e é todo mês descontada.

                    Esta contribuição, como o sistema é fluxo de caixa vai para o pagamento dos inativos, pacto de gerações, mas do ponto de vista do cidadão esta contribuição não é poupada nem capitalizada, não rende um centavo de juro, dividendo ou renda real.

                    Qual empresário, ou aplicador colocaria seu dinheiro mensalmente durante 35 anos sem nenhuma taxa de juro real sobre a sua aplicação? Mas é isto que é feito com o contribuinte, aliás era feito.

                    Se este cidadão colocasse este dinheiro num fundo previdenciário que investisse nas principais empresas no país, Bancos, Indústrias, empresas de energia, concessões e obtivessem um retorno médio na economia produtiva, sujeito ao risco, mas minimizada pela diversificação, o valor deste hipotético capital acumulado seria considerável e suficiente não só para o pagamento de uma aposentadoria ou pensão pelo seu tempo de sobrevida, como também suficiente para gerar uma renda por tempo infinito aos seus descendentes. Parece um absurdo, mas isto é possível usando as ferramentas já citadas.

                    No livro do Thomas Piketty, O Capital do século XXI, está escrito que a remuneração média do capital nos últimos 300 anos foi e é cerca de 5% ao ano, livre dos impostos.

                    Desta forma, se isentarmos de impostos o rendimento das contribuições no período contributivo e considerarmos um rendimento de 5% sobre o capital, durante 35 anos e uma contribuição média de 20% sobre o valor de referência do salário, digamos R$100,00, teremos depois de 35 anos capitalizado um valor de R$23.647. Este capital permitiria ao contribuinte após 35 anos de contribuição uma renda perpétua de R$100,00, que poderia ser transferida aos seus herdeiros indefinidamente.

    Resumo dos Cálculos, e constatação numa calculadora financeira:

     

    Valor do salário = 100

    N = Tempo de contribuição: 35 anos ou 420 meses

    I   =Taxa de retorno médio ao mês: 0,43% ou 5% anual (composta)

    VF =   ?  =Valor Futuro = 23.647

     

    Renda mensal Perpétua = 0,43 X 21647 /100 = 100 

    Ou seja, o valor do salário de contribuição.

     

    Se houvesse o fundo, seria possível. Mas se fizéssemos isto para as futuras gerações? Atualmente não dá, pois precisamos do fluxo de caixa para pagar os atuais inativos.

     

    Mas se a união devolvesse os seus ativos produtivos, Banco do Brasil, CEF, Petrobras, Eletrobrás, Itaipu, concessões atuais e futuras, para um Fundo Geral da Previdência e constituísse uma Holding que administrasse essas empresas, e o seu retorno servisse para pagar as aposentadoria? Esta certo, não dá para recuperar a Vale do Rio Doce, não dá para devolver Brasília (seu custo na construção), mas muita coisa poderia ser feita.

     

    A sociedade sofre um bombardeiro com uma abordagem enganosa, pseudo científica, mas ideológica, sobre a impossibilidade da sustentabilidade da Previdência nas atuais condições, e aí está a prova de que ela é só insustentável por que não existe capitalização nas contribuições, pelos mesmos critérios, seria muito mais insustentável a Dívida Pública, com os juros pornográficos praticados pelo Banco Central nos últimos 21 anos.

     

    Aí teríamos no Brasil um verdadeiro capitalismo com função social. Um profundo e rotundo Não para esta reforma da previdência,

     

    Paulo de Souza Castro

    Eng. Aposentado do Banco do Brasil, com pós graduação em controladoria financeira na FGV.

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