Fake news é método de governo em A Grande Farsa, HQ da Comix Zone, por Rogério Faria

A narrativa de Trillo explora muito bem as convenções do gênero noir, numa história inteligente e ágil, sem enrolação.

Fake news é método de governo em A Grande Farsa, HQ da Comix Zone

por Rogério Faria

A Grande Farsa é uma importante obra dos quadrinhos argentinos trazida para o Brasil pela editora Comix Zone. Sua trama noir, com elementos do realismo fantástico, apresenta uma história policial envolvente, sem nunca cair nas armadilhas do gênero. Entre as páginas circulam ditadores, torturadores, policiais decadentes, moças indefesas e mulheres fortes.

A edição brasileira reúne dois álbuns com roteiros de Carlos Trillo e desenhos de Domingo Mandrafina, dois dos mais importantes artistas argentinos, ainda praticamente desconhecidos por estas bandas, lamentavelmente. Inclusive, a primeira HQ, que dá nome ao livro, foi vencedora na categoria Melhor Roteiro no Festival de Quadrinhos de Angoulême, na França.

Ambas as tramas se passam num país fictício da América Latina liderado por um ditador sanguinário. Na primeira HQ, uma jovem abusada pelo tio, o ditador, é transformada em uma falsa santa para manipular a população local, e precisa buscar a ajuda de um ex-policial alcoólatra para livrá-la de um escândalo que envolve fotos comprometedoras. Na segunda, uma repórter de um jornal estadunidense vai ao país para uma reportagem que desvende o sádico torturador oficial do governo, o Iguana. É ele quem rouba os holofotes, ou o nanquim, nas duas histórias.

A narrativa de Trillo explora muito bem as convenções do gênero noir, numa história inteligente e ágil, sem enrolação. Os personagens são construídos com bastante profundidade, ganhando empatia do leitor, nos levando a nos importar com seus destinos. Também é interessante destacar como as duas histórias criam um forte contraste entre uma moça indefesa de um lado e uma protagonista forte do outro.

Por sua vez, o traço de Mandrafina é belíssimo, de bastante expressividade, dando personalidade aos personagens. O artista lida de forma magistral com o contraste branco e preto, construindo seu clima noir em meio a figuras torpes e cenários decadentes.

Assim, o governo autoritário de uma nação sul-americana subdesenvolvida é apresentado através de seus líder ridículo, porém perigoso, pois violento, abusador e fazendo uso da mentira (as fake news) como método. Essa obra de quase três décadas carrega assim, em suas entrelinhas, uma contundente crítica aos regimes totalitários locais. De ontem e de hoje.

A Grande Farsa é um grande lançamento do gênero. É outro golaço da editora Comix Zone, e tem 224 páginas, formato 29cm x 21cm, sendo encontrada em gibiterias e na Amazon.

Redação

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