Cesar Locatelli
César Locatelli, economista, doutorando em Economia Política Mundial pela UFABC. Jornalista independente desde 2015.
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“Kochland”: a negação das mudanças climáticas, por César Locatelli

O capitalismo, protagonizado por pessoas como David e Charles Koch, donos da poderosa Koch Industries, pode exterminar a vida no planeta em apenas algumas centenas de anos.

“Kochland”: a negação das mudanças climáticas 

por César Locatelli

Os humanos existem sobre a Terra há muitos milhares de anos. O capitalismo, protagonizado por pessoas como David e Charles Koch, donos da poderosa Koch Industries, pode exterminar a vida no planeta em apenas algumas centenas de anos. Eles investem bilhões para que o atual curso não seja alterado.

As indústrias Koch são fechadas. Não tendo ações em bolsa, não precisam abrir relatórios, contas contábeis ou planos de negócios. Por isso podem ser “a maior empresa sobre a qual você nunca ouviu falar”, nas palavras dos próprios irmãos, David e Charles Koch, donos de 80 % da empresa. No entanto, ela é a segunda maior empresa privada fechada dos EUA e fatura mais do que o Facebook, o Banco Morgan Sachs e a US Steel juntas.

Entre seus diversos produtos, está o combustível para todos os tipos de transporte. Ela faz materiais de construção, das janelas ao carpete. Faz o tecido de roupas, como Lycra, elastano, nylon, o material de fraldas e roupas de ginástica. Produz fertilizante nitrogenado, largamente usado na produção atual de alimentos. Mas, mesmo pouco conhecida do grande público, seu gigantesco financiamento de políticos e causas conservadoras, colocaram as indústrias Koch no foco de diversos livros e reportagens.

“David Koch, que morreu na sexta-feira aos 79 anos, é mais conhecido como um dos principais financiadores de causas políticas de direita, desde cortes de impostos à desregulamentação, um patrono entusiasta das artes e um homem sobre a cidade. Mas para seus críticos, seu legado político mais duradouro pode muito bem ser o mundo em rápido aquecimento que ele deixou para trás.

(…)

A Koch Industries percebeu desde o início que seria um desastre financeiro para a empresa se o governo americano regulasse as emissões de carbono ou fizesse com que as empresas pagassem um preço pela liberação de carbono na atmosfera. Os efeitos de tal política seriam sentidos ao longo de décadas para Koch. A empresa investiu bilhões de dólares na infraestrutura complexa e cara do processamento de petróleo bruto. Se um limite de emissão de gases de efeito estufa fosse imposto, poderia diminuir a demanda por petróleo e diminuir o valor desses ativos e suas vendas futuras. As perdas totais em dólares provavelmente seriam medidas em trilhões ao longo de um período de 30 anos ou mais.”

Desse modo, o interesse dos irmãos Koch, em contestar a mudança climática, foi descrito por Christopher Leonard, em um artigo para o The New York Times intitulado “David Koch foi o contestador supremo da mudança climática”. Christopher Leonard publicou recentemente um importante livro examinando os negócios dos irmãos Koch, que é intitulado “Kochland: a história secreta das indústrias Koch e do poder corporativo na América”.

Christopher Leonard conversou longamente com o DemocracyNow!. Diz ele:

“Não é fácil mudar as políticas públicas americanas. Foi o que eu aprendi ao escrever este livro. E a Koch Industries e Charles e David Koch têm sido notavelmente inteligentes, pacientes e estratégicos em sua abordagem para afetar a política dos EUA. Eles construíram essa máquina para fazer isso, que não tem outra igual na América corporativa. Sabe, quando comecei a redigir este livro, pensei em escrever muito sobre doações de campanhas e super PACs. Gente, eu estava errado. A ação real sempre começa no dia seguinte à eleição. É aí que a Koch Industries tem sua verdadeira experiência e é aí que molda as políticas públicas.”

As ideias antigoverno são disseminadas por think tanks financiados pelos irmãos Koch. O Instituto Cato e a American Energy Alliance são exemplos de sua poderosa operação de lobby, Continua Leonard:

“Então, para fazer isso, Koch tem uma das maiores operações de lobby corporativo nos Estados Unidos, localizada a uma quadra da Casa Branca dos EUA. Em seguida, financia e apoia uma constelação de think tanks em Washington, DC, como o Instituto Cato ou a American Energy Alliance. E o que esses grupos fazem é semear o terreno em Washington com as ideias de Koch. Essas ideias libertárias e antigovernamentais são dominadas por grupos como o Instituto Cato. E eles ajudam a forçar a conversa. Eles ajudam a moldar a conversa.

Junto com isso, você tem essa rede de financiadores de campanhas que, em um ciclo eleitoral, às vezes dão mais dinheiro para campanhas políticas do que os próprios partidos políticos – centenas de milhões de dólares para atrair políticos a adotarem o ponto de vista de Koch.”

Cristopher Leonard avalia que ainda mais importante foi o ataque que o grupo fez àqueles que, especialmente republicanos, acreditavam que a mudança climática era real e que o Congresso dos EUA precisava aplicar impostos sobre a emissão de carbono:

“E então, finalmente, talvez o mais importante, Koch construiu uma rede nacional de ativistas chamada Americans for Prosperity. É é um movimento de base. O Americans for Prosperity tem comitês por todo o país. Eles podem colocar as pessoas para baterem nas portas, fazerem petições. Eles vão fretar ônibus de West Virginia, Carolina do Norte, Missouri, Ohio, de todos os lugares. Eles encherão ônibus de eleitores irados para irem à Washington, DC, e depois visitarão os escritórios do Congresso que foram especificamente identificados pela grande loja de lobby corporativa de que falamos, onde eles podem pressionar os legisladores.

E Koch colocou essa máquina política em pleno vigor em 2009 e 2010, quando parecia que os Estados Unidos estavam prestes a regular as emissões de gases de efeito estufa pela primeira vez. Sabia-se que, naquela época, havia realmente apoio dos dois partidos para fazer algo sobre as mudanças climáticas. O republicano, John McCain, se empenhava em fazer alguma coisa sobre as mudanças climáticas. Mas a Koch Industries interveio e, acho que mais do que a Exxon ou outras empresas, meio que… politizou essa questão da mudança climática. E Koch foi atrás de republicanos moderados que reconheciam que a mudança climática era real, que apoiavam qualquer esforço para colocar um preço no carbono. E Koch ajudou a tirar essas pessoas do cargo. Por isso, desempenhou um papel de vital importância ao deixar claro aos republicanos que eles não poderiam apoiar nenhum esforço em relação às mudanças climáticas.”

Esta é a primeira parte da entrevista:

Cesar Locatelli

César Locatelli, economista, doutorando em Economia Política Mundial pela UFABC. Jornalista independente desde 2015.

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