Luiz Carlos Bresser-Pereira: Qual é o problema da indústria brasileira?

Ana Gabriela Sales
Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.
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Artigo apresenta uma explicação geral para a desindustrialização brasileira após 1990

do Portal Disparada
Qual é o problema da indústria brasileira?
Por Luiz Carlos Bresser-Pereira

Depois de uma brutal recessão (2014-2016) a economia brasileira voltou a crescer, mas muito lentamente. Os resultados da indústria de transformação são especialmente negativos. O crescimento em 2018 foi de apenas, 1,3%, o deficit comercial da indústria voltou a aumentar, e o processo de desindustrialização continua a ser mais acentuado nos setores de alta e de média-alta tecnologia.

A explicação geral que eu tenho dado para a desindustrialização brasileira a partir de 1990 é a da armadilha de juros altos e câmbio apreciado no longo prazo. Essa armadilha promoveu duas ondas de desindustrialização, a primeira nos anos 1990, em função da abertura comercial e do desmantelamento do mecanismo que neutralizava a doença holandesa, e a segunda nos anos 2010, a partir do momento em que a taxa de câmbio, que se depreciara fortemente durante a crise financeira de 2002, voltou a se tornar fortemente apreciada no final do governo Lula: a preços de hoje, cerca de R$ 2.50 por dólar, quando a taxa de câmbio competitiva ou de equilíbrio industrial devia girar em torno de R$ 4,00 por dólar. No governo Dilma, houve uma desvalorização e a taxa de câmbio passou a girar em torno de R$ 3,20 por dólar, sempre a preços de hoje – incompatível com o crescimento industrial.

Este quadro mudou depois da recessão. Com a queda radical da demanda, a inflação caiu fortemente, e a taxa de juros, embora ainda alta, também caiu. Por outro lado, a taxa de câmbio depreciou-se e hoje está em torno de R$ 3,70 por dólar. Por que, então, a recuperação da indústria é tão decepcionante? A meu ver, por três razões além do fato de a taxa de juros continuar alta e a taxa de câmbio ainda estar apreciada: porque a demanda de bens industriais tanto interna quanto externa continua baixa, porque o governo não realizou a política fiscal contracíclica necessária, e porque os empresários ainda não estão se sentido com confiança em relação ao governo.

No caso da demanda mundial, ainda não se confirmou a recessão anunciada nos países ricos, mas a crise do regime liberal argentino é muito grande e teve um forte impacto na exportação de manufaturados brasileira. Quanto à falta de uma política contracíclica em um quadro de crise fiscal desde 2014, o problema está na falta de coragem ou na ortodoxia liberal do governo. Nem o governo Temer nem o governo Bolsonaro tiveram coragem e capacidade para lograr um forte aumento do investimento público e das empresas privadas concessionárias. Coragem porque essa política envolve uma aposta: que o gasto adicional em investimento público será menor do que o aumento da receita pública decorrente da retomada do crescimento que esses investimentos provocariam.

Finalmente, em relação à falta de confiança no governo, ela é compreensível dada sua precariedade e as contradições que o definem. Os economistas liberais apostam na reforma da previdência para que volte essa confiança. Essa reforma é realmente necessária, deverá ser aprovada, e dará certa credibilidade para o governo. Não, porém, o suficiente para que o governo decida aumentar os investimentos, as empresas se sintam tranquilas, as oportunidades de investimento voltem a aparecer, e o Brasil volte a realmente crescer e realizar o alcançamento.

Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

6 Comentários

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  1. Bom post. Ao contrario dos intergrantes do atual governo, bresser Pereira conhece os problemas da industria.
    Se me permite minha opinião cada vez me convenço mais que as elites brasileiras desistiram de terem um pais industrializado. Vamos nos tornar somente exportadores de comodities. E os recursos da exportação muito bem remunerados pelo tesouro nacional. È por essa e outras razões que precisam fazer a reforma da previdencia a toque de caixa.

  2. O grande problema da indústria nacional, em que pesem as razões do Prof. Bresser, reside na mentalidade do industrial brasileiro.
    Eu poderia cravar laudas sobre o assunto, citando fatos e dados que confirmam a assertiva, mas cansaria o leitor e seria de todo inócuo, porque o empresário industrial é vítima de si mesmo e é vitimado pela incapacidade de entender a própria situação. A armadilha que o prende é, antes de tudo, mental.
    Estamos às portas de mais uma transformação radical nos modos de produção e nos arronjos produtivos, com impacto direto na forma de pensar o produto, pensar como produzi-lo e pensar em como vendê-lo e distribui-lo. Enquanto isso nosso industrial luta contra seus próprios interesses, age atacando a si mesmo e reproduz o sabido discurso do oprimido em favor do opressor.
    Ford, um dos precursores da segunda revolução industrial, entendeu que seus operários eram parte de seu público alvo e elevou os salários para poder tê-los como clientes. O empresariado nacional enxerga os empregados monocularmente como um vetor de custo que precisa ser reduzido mesmo que tal redução alije-os do consumo de seus produtos. Mesmo que o total de gastos com mão-de-obra, que segundo o IBGE na Pesquisa Anual da Industrial de 2016 representam na indústria 15% da receita líquida, sejam menos determinantes para o resultado que a perda de eficiência relativa considerando perdas nos processos, retrabalho e atraso tecnológico de produto e processo, logística falha e limitação na capacidade governança e a trabalhador e seus direitos continuam como sempre, a bola da vez para pagar aquele famoso pato.
    Sabem por quê? Porque muitos dos custos marginais acima mencionados não são facilmente medidos e reconhecidos enquanto os gastos com folha de salários e benefícios está explicito, é visível. Então, tradicionalmente, quando reconhecida a instauração da crise, a primeira a dançar é a senhora do cafezinho. Contenção de custos na veia. Se alguém já viu, conhece ou tem noticias de um empresário brasileiro que apontou a causa da sua dificuldade para algum fator “dentro da cerca” e não culpou o governo, o mercado, o concorrente ou os juros e o câmbio, peço que o aponte. Duvido.
    Ora bolas…

    1. Perfeita analise. Gostaria apenas de acrescentar que o Sr. Bresser comete os mesmos erros de todos os analistas que é culpar o governo, por ser instavel. Ora, sabemos que a maior parte dos nossos deputados estão lá representando os empresarios ( por terem sido eleitos com seus recursos) e atropelando as decisões do governo, e mirando apenas em benesses tipo ampliação de refis, subsidios … Destes empresarios nada se pode esperar a não ser choro com beicinho e tudo e nada de profissionalismo.

  3. Mais uma visão economicista, que tenta enquadrar o mundo real no imaginário acadêmico. Não diz o principal: que nosso empresariado tem pouquíssima criatividade, nenhuma ousadia e uma extraordinária ganância. Um dos erros de Dilma foi exatamente ter acreditado nesse empresariado medíocre que preferiu, em vez de investir no futuro, apostar na volta da escravidão.

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