Mais de 60% dos alunos não completam o curso superior a distância, por Oscar Hipólito e Murilo Garcia Santos

O Censo do Ensino Superior publicado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) mostra que 45,9% dos alunos evadiram do ensino a distância, em 2017

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Mais de 60% dos alunos não completam o curso superior a distância

por Oscar Hipólito e Murilo Garcia Santos

Diferentemente do que ocorre no ensino presencial, a divulgação do último censo do ensino superior brasileiro 2017, mostrou que tanto o número de alunos matriculados quanto o de ingressantes nos cursos de graduação a distância vem apresentando um grande crescimento ano após ano. Nos últimos 5 anos, as taxas médias anuais de crescimento estiveram em torno de 10% no número de matrículas e 17% no número dos ingressantes.  Quando comparado ao ano de 2016, as matrículas no ensino a distância cresceram 17,6% e o número de ingressantes 27,3%, ao contrário do que acontece no ensino presencial onde desde 2015 tanto o número de matriculados quanto de ingressantes vem diminuindo.

Se, por um lado esse crescimento no ensino a distância indica que mais estudantes têm acesso ao ensino superior, compensando as perdas de alunos do presencial, por outro esconde uma questão muito preocupante. O que vem acontecendo no ensino a distância é que o alto número de alunos ingressantes não tem impactado, como deveria ocorrer, no número total de matriculados dessa modalidade. Em 2017, por exemplo ingressaram 1,07 milhões de estudantes e o número de matriculados era 1,75 milhões, uma relação de 1,64 matriculados por ingressantes. No ensino presencial essa relação é bem maior, 3,03. Isso significa que os estudantes são atraídos para o ensino a distância pelas facilidades e flexibilidades de estudo e principalmente pelo baixo custo da mensalidade vigente, mas por uma série de dificuldades, incluindo a baixa qualidade dos cursos oferecidos por muitas instituições, não conseguem acompanhar, provocando uma taxa de abandono bastante elevada.

O Censo do Ensino Superior publicado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) mostra que 45,9% dos alunos evadiram do ensino a distância, em 2017, por desistência, abandono ou trancamento de matrícula. Esse valor é mais do que o dobro da taxa de evasão dos estudantes do ensino presencial, que atingiu a marca de 22,1%.  De 2011 a 2017, a proporção dos alunos que desistiram do ensino superior a distância cresceu ano a ano de 28,5% para 45,9%. A evasão é ainda maior nas instituições privadas (47,7%), que detém mais de 90% do total de alunos matriculados, mas também notável nas públicas (26,7%). Utiliza-se como cálculo básico do percentual de alunos evadidos a comparação entre o número de alunos aptos a se matricularem no ano seguinte com aqueles que realmente efetuaram suas matrículas. Assim, mede-se a perda de alunos de um ano para outro: a evasão anual. (SILVA FILHO, Roberto Leal Lobo;  MOTEJUNAS, Paulo Roberto;  HIPOLITO, Oscar  e  LOBO, Maria Beatriz de Carvalho Melo. A evasão no ensino superior brasileiro. Cadernos de Pesquisa, v.37, n. 132, p.641-659, 2007) 

A evasão é um problema complexo, de muitas variáveis atingindo negativamente as expectativas dos estudantes e de seus familiares além de impactar fortemente o setor financeiro das instituições. Nas públicas, há um custo muito grande por aluno que é desperdiçado quando ele abandona o sistema. Nas privadas, além desse custo, há a perda de recebimento da mensalidade e prejuízos à imagem da instituição. 

Ao contrário do que se costuma dizer, as condições financeiras não são as mais impactantes na decisão de abandonar o curso. Em geral, questões de engajamento do estudante na vida universitária, mau atendimento, falta de motivação, mau desempenho acadêmico e escolha errada da profissão, podem impactar fortemente na decisão de sair. O aluno que está satisfeito com seu curso e a instituição, faz de tudo para não sair, uma vez que é a chance de sua vida em obter o diploma de formação superior.  

Além da evasão uma outra questão preocupante no ensino superior a distância é a taxa de titulação dos estudantes, isto é, a comparação entre o número de concluintes com o volume de ingressantes três anos antes, período aceito como médio para a formação nessa modalidade no país. Em 2017, essa taxa foi de 38,6%, ou seja, mais de 60% do total dos alunos ingressantes em 2015 ainda não havia concluído seu curso. 

Nas instituições públicas, que detém apenas 10% do total de alunos no ensino a distância, a taxa de titulação tem sido um pouco maior que a média nacional. Em 2017, 45,2% dos matriculados concluíram seu curso no período esperado. Já, nas privadas, a taxa de titulação em 2017 foi de 35,8%, e o número máximo nos anos anteriores foi de 45,5% em 2013.

A taxa de titulação média brasileira é baixa se comparada com a média dos países da União Europeia, onde esse índice se aproxima de 70%, segundo relatório da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Já no Japão, 90% dos estudantes de curso superior chegam ao final no tempo esperado, e nos Estados Unidos 54% dos alunos americanos finalizam o curso no período médio estabelecido. Esses dados mostram que a dificuldade para concluir o ensino superior é uma questão comum em todo mundo.

Cai a titulação e, claro, aumenta a evasão. Apesar do aumento nas taxas das matrículas no ensino a distância, a queda de matriculados que vem ocorrendo no ensino presencial sinaliza uma desaceleração no sistema como um todo. Existe algo de paradoxal em tais números, quando se constata ao mesmo tempo a necessidade premente, de profissionais qualificados. Não chega a 20% a proporção dos jovens entre 18 e 24 anos cursando o ensino superior. Trata-se de um capital humano precioso demais para ser desperdiçado. Esse é um enorme problema, especialmente para um país que tem um dos mais baixos percentuais da população com nível superior. Apenas 16,3% da população entre 25 a 34 anos e 11,3% entre 55 a 64 anos tem formação superior. Estamos atrás do México, Chile e Colômbia, para ficarmos apenas na América Latina.

Com esses números pouco animadores para o sistema de ensino superior brasileiro a distância a pergunta que se coloca é: o que seria possível fazer para minorar essa perda de alunos, uma vez que o país necessita dessa modalidade de ensino para atingir populações que não teriam condições de frequentar um curso superior presencial.  Como a evasão é um problema complexo que envolve muitos setores de uma instituição a primeira iniciativa seria identificar as causas mais importantes e atacá-las de forma planejada. Algumas ações como 1- ensinar aos estudantes hábitos de sucesso, 2- definir pequenos objetivos a serem alcançados, 3- fazer intervenções em estudantes com dificuldade de acompanhar o curso, 4- definir o sucesso do estudante ( o que se espera dele), 5- acompanhar desempenho acadêmico, frequência nas aulas e situação financeira, 6-oferecer oportunidades para o sucesso do aluno, 7- aumentar os recursos para orientação acadêmica ( tutores), 8- desenvolver aprendizado colaborativo, 9- criar material rico em conteúdo com interatividade, 10- monitorar a aprendizagem dos estudantes, 11- ter plataformas amigáveis, entre outras.

Modelos preditivos utilizando inteligência de dados (Data Science)  como o desenvolvido pela NumbersTalk ( www.numberstalk.com.br) além de classificar os estudantes em grupos com diferentes probabilidades de abandonarem a instituição oferecem orientação de como agir em casos específicos evitando assim a perda de alunos.

 

Oscar Hipólito, professor titular da USP e ex-reitor da Universidade Anhembi Morumbi

Murilo Garcia Santos, IT Trainee, Laureate International Universities-Brasil

Redação

1 Comentário

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  1. Privatizou, fica ruim, mesmo. Esse negócio de ensino à distância já é feito para causar essa “evasão”. Na prática, muito pouca gente vai contratar um formado desses cursos se a avaliação estiver centrada na “alma mater” dele. As exceções confirmam haver uma regra. Se até mestre uspiano virou motorista de Uber, imagina essa turma… Bolar estratégias para que essa “evasão” diminua sem usar os mesmos recursos que se usa, por exemplo, para vender leite condensado é que quero ver.

    O ideal seria que as empresas privadas que vendem diploma passassem a ensinar… mas o ideal seria também que empresas privadas de saúde protegessem seus clientes e não a si mesmas, que as empresas privadas que prometem serviço de telefonia (ou água ou energia elétrica etc.) não fossem as que tivessem número enorme de reclamações no Procons da vida e por aí vai.

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