Mais reflexão e menos rosas no “Dia Internacional da Mulher”

 

Artigo do Brasil Debate

por Ana Luíza Matos de Oliveira e Helga do Nascimento de Almeida

O Dia Internacional da Mulher tem sido apropriado de forma estereotipada pelo capitalismo e o patriarcado. Se em sua origem esse dia representa a luta das mulheres em uma sociedade extremamente machista, acabou por ser esvaziado de significado e de quase qualquer discussão consciente: se transformou no dia mundial de dar “parabéns” vazios para as mulheres.

E por que deveríamos ser parabenizadas por sermos mulheres? Somos parabenizadas por vivermos em um mundo que nos oprime diariamente, tanto na esfera pública como na esfera privada?

Nesse dia, presentes nos são dados como compensação pelas injustiças que vivenciamos todos os dias? Os “bom dias” educados que recebemos pelo caminho nos são oferecidos em contrapartida a todas as cantadas odiosas que ouvimos nas ruas durante o ano e ao assédio de todos os tipos que sofremos?

A rosa vermelha dada a nós em nossos locais de trabalho são uma reparação por termos salários e empregos piores e por não ocuparmos cargos públicos de importância?

O Dia Internacional da Mulher é parte de uma luta política centenária das mulheres que, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), surgiu a partir do Dia Nacional da Mulher nos EUA, por sua vez criado em homenagem às mulheres trabalhadoras do vestuário de Nova York que, no ano de 1908, se mobilizaram em uma greve emblemática. O 8 de Março, desde seu marco originário, foi idealizado como um dia para refletir sobre as lutas, vitórias e desafios das mulheres na sociedade moderna.

Nesse espírito de reflexão e pensando no Brasil, boas notícias que podemos comemorar são a redução de homicídios dentro do domicílio após a promulgação da Lei Maria da Penha, porém os desafios permanecem na luta contra a violência familiar.

Quanto ao mercado de trabalho, como já apresentado aqui, apesar das melhorias que reduziram as diferenças nas taxas de desemprego e participação da força de trabalho de 2003 a 2012, ainda há um abismo muito grande se consideramos as condições que homens e mulheres. Por exemplo, em média as mulheres gastam mais que o dobro do tempo que homens em trabalhos domésticos, o que faz com que sua jornada de trabalho total seja maior.

tabela dia da mulher1

Os diferenciais de salário entre homens e mulheres continuam altos e se elevam com o aumento da escolaridade, i.e., quanto mais uma mulher estuda, menos ela recebe (em média) em relação a um homem com a mesma escolaridade (e lembrando que nós mulheres já temos escolaridade média mais alta que a masculina).

tabela dia das mulheres2

Também as mulheres são minoria nas carreiras de nível superior do ciclo de gestão governamental do Executivo Federal: em 2014, apenas 38,4% dos diplomatas, 34,6% dos especialistas em políticas públicas e gestão governamental e 30,5% analistas de comércio exterior eram mulheres, segundo dados da Escola Nacional de Administração Pública.

 

No âmbito da maternidade, dados recentes mostram que as brasileiras são mães cada vez mais tarde: o número de mães de primeira viagem com mais de 30 anos aumentou (de 22,5% em 2000 para 30,2% em 2012) e a porcentagem de adolescentes de 15 a 19 anos que são mães diminuiu(de 2000 a 2010 percebe-se a queda desse índice de 14,8% das jovens dessa faixa etária para 11,8%).

Mas, apesar de tais índices mostrarem maior autonomia por parte da mulher, o Brasil continua longe de bater a meta dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio quanto à mortalidade materna. Ainda, pesquisas mostram que o maior índice de mortalidade no Brasil é de mulheres pobres e negras e a precária educação sexual e número insuficiente de serviços para o atendimento da mulher vítima de violência também resultam em gestações indesejadas e abortos clandestinos.

Outro agravante do problema é a alta (e crescente) realização de cesáreas, segundo a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz): o percentual de partos cesáreas no Brasil em relação ao total é de 52%, sendo 46% na rede pública e 88% na rede privada, sendo que a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e a ONU recomendam índice de somente 15%.

E na política, os dados das últimas eleições não são muito animadores se utilizamos um recorte de gênero e raça: na Câmara dos Deputados, a grande maioria dos nossos representantes são homens brancos, com quadro semelhante nas Assembleias Estaduais. O gráfico abaixo mostra que, apesar de a lei determinar que pelo menos 30% das candidaturas sejam de mulheres, essa porcentagem não é alcançada entre os candidatos efetivamente eleitos.

tabela dia da mulher3

Os dados dão uma dimensão dos enormes desafios que temos adiante todos nós, mulheres (e homens!) que lutamos por igualdade. Assim, que este 8 de Março, Dia Internacional das Mulheres, nos inspire a aprofundarmos todos os dias do ano a reflexão sobre as condições sociais vividas pelos diversos grupos de mulheres excluídas e oprimidas (mulheres trabalhadoras, mulheres negras, mulheres indígenas, mulheres donas de casa, mulheres pobres, mulheres lésbicas, mulheres trans, mulheres mães, mulheres na política, mulheres estudantes, mulheres em situação de violência etc).

E que possamos entender e nos engajar na luta pela emancipação e empoderamento das mulheres.

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Redação

12 Comentários

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  1. O mais extravagante dessa

    O mais extravagante dessa questão prossegue sendo a enorme violência física e psíquica dos homens com as mulheres. Diuturnamente homens estão batendo nas namoradas, esposas, filhas e até nas próprias mães. E dituturnamente mulheres de todas as idades morrem por homens da família, como namorados, noivos, maridos, filhos. Num momento agressões e mortes se dão em razão ( e que razão!) de ciúme; em outro, porque o camarada, já predestinado aos atos, aumenta sua covardia com a ingesta de álcool ou usod e droga. 

    É tanta morte de moças e mulheres no Brasil todos os dias que tem hora que eu penso ser mentira, que pode estar havendo algum exagero por parte da imprensa. Na verdade, são os programas policiais que noticiam isso. Dificilmente a gente assiste num jornal da noite, de qualquer emissora, não digo cada crime, mas matérias a respeito da questão. A exceção é quando a vítima é alguma estrela, uma solialite. 

    Mas, há de se observar outra coisa: 

    – Enquanto um irmão, por exemplo, bate na irmã, tem outra irmã, ou a própria mãe, que acha bacana;

    – Tem muita mãe que conta para o pai o que fez uma filha para sentir o gosto de vê-lo batendo nela;

    – E tem muita mulher, com certeza, que admira um homem pela valentia dele, daí aquele tipo que dizem ser a mulher que gosta de apanhar.

    Além da Lei Marinha da Penha, que é importantíssima, sem sombra de dúvida, muito há que ser feito para melhorarmos a imagem do Brasil em relação a essa submissão da mulher em todos os cantos da sociedade, desde de sua casa, do ambiente od seu trabalho, etc. Há que se levarf em conta a atuação da Justiça com a família, e com os psícólogos também, afinal nenhum homem sadio é capaz de matar e esquartejar a mãe de seus filhos; nenhuma mãe sadia pode influir pra ver seu marido agredindo brutalmente sua filha. 

    Só por esses dados eu diria que a mulher está a quilômetros de distância de ser integralmente respeitada em nossa sociedade. 

     

  2. é bom pra eventuais visitantes do blog.

    “empoderamento” é um desses abundantes exemplos de macaquismo, de colonialismo mental, de, um  belo dia, deixarmos de usar o rico vocabulário português pra transportar traduzindo ao pé da letra ridículos termos norte-americanos. Tempos atrás usava-se divulgar uma notícia, divulgar um documento, depois passou a ser falado e escrito como “soltar” uma notícia, “soltar etc” (release). Ou, de um belo dia ao invés de falarmos a “palavra feia”, aquela que é dita em inglês no dia a dia em filmezinhos leves censura 12 anos, a censura vir, acharmos natural, e substituem-se por silêncios, ou por palavra suave que tira o sentido do diálogo do filme americano, geralmetne. Dentro do país, a influência emburrecedora da globo e cia torna moda, chique, dá um status de falar “caraca”, começar frases com “entgão…”. Falo besteira? Então Ubaldo Ribeiro tem uma crônica que fla disso faz uns 2 anos: hoje tudo é “complicado”, ao invés de se falar “difícil”. Há uma diferença, às vezes sutileza entre o que é difícil e o que é complicado. Ele, bem humorado, aborda esse empobrecimento da língua.

    1. no mais espero que se entenda a crônica de Alex que está no Mult

      no mais espero que se entenda a crônica de Alex que está no Multimídia do Dia. Por falar nisso, semana passada o GGN deixou sábado e domingo com o mesmo e dando continuidade àquela seção. Achei ótimo, até pq me parece que pouquíssimas pessoas principamente em sábados e domingos acessam aquela seção, e o blog como um todo. Terá sido um lapso? Anteontem ou ontem, sugeri que o Multimídia do sábado se repetisse, continuando no domingo. Mas não aconteceu,ô, cabeça dura esse GGN…

      1. não tô criticando o artigo título, mas fazendo uma ressalva

        a ressalva é de que – parece-me – coincidirmos que a apropriação, a festa, a homenagem…. com flores esquece o sentido de luta pela emancipaçãoda mulher contra as discrimações. Tenho a impressão de que o pessoal só vê crítica no que me meto nalgum assunto só pra contrariar. Não lêem e não gostaramde algumas coisas que coloco, ou lêm parcialmente. (Assim como , repito, me parece que textos do Nassif, de antemão, são corretos, merecem aplausos, não se percebem – por não terem lido com senso crítico – algumas contradições e equívocos em textos do GGN ou assinados por Nassif.

  3.    Redação

    As 10 notícias que ainda não veremos no Dia da Mulher

     

    As dez notícias que infelizmente não serão vistas neste 8 de Março, Dia Internacional da Mulher

    Por Leonardo Sakamoto

    Quando liguei a TV, nesta manhã de 8 de março, me deparei com colegas de profissão cumprindo suas pautas sobre o Dia Internacional da Mulher. Deu aquele desgosto ver uma importante data de reflexão e de luta novamente reduzida à distribuição de flores, promoções em salões de beleza, presentes na forma de jóias e vestidos e até equipamentos de limpeza do lar. Como se isso fosse o fundamental para garantir a dignidade das mulheres.

    Por conta disso, elenquei, abaixo, algumas coisas que gostaria de ver noticiadas nesta data. Creio que, em algum momento, isso vai ser verdade. Depende de nós para mostrar quando. E a que custo:

    dia internacional da mulher

    “No Dia Internacional da Mulher, desejo uma sociedade menos idiota” (Foto: Reprodução)

    1) O currículo escolar será aprimorado para que, nas aulas de língua portuguesa, os meninos e rapazes possam compreender o real, objetivo, profundo e simples significado da palavra “não”.

    2) As frases “Onde você acha que vai vestida assim?”, “A culpa não é minha, olha como você tá vestida!”, “Se saiu de casa assim, é porque está pedindo” a partir de agora serão banidas da boca de maridos, pais, irmãos, filhos, netos, namorados, amigos e outros barbados.

    3) Está terminantemente proibido empregar apenas atrizes em comerciais de detergentes, desinfetantes, saches de privada, sabão em pó, rodos, vassouras, esponjas de aço, palhas de aço, aspiradores de pó, cera para chão e afins. A associação direta de mulheres e produtos de limpeza em comerciais de TV está extinta.

    4) Empresas estão proibidas de distribuir flores no dia de hoje como prova de seu afeto às mulheres. Em vez disso, implantarão políticas para: 1) impedir que elas ganhem menos pela mesma função; 2) não sejam preteridas em promoções para cargos de chefia pelo fato de serem mulheres; 3) não precisem temer que a maternidade roube seu direito a ter uma carreira profissional; 4) seja punido com demissão o assédio de gênero como crime à dignidade de suas funcionárias.

    5) Cuidar da casa e criar os filhos passa a ser visto também como coisa de homem. E prazer e orgasmo também são coisa de mulher.

    6) Os editoriais dos veículos de comunicação não serão escritos por equipes eminentemente masculinas. Da mesma forma, as agências se comprometem a derrubar a hegemonia XY em suas equipes de criação, contribuindo para diminuir o machismo na publicidade.

    7) O direito da mulher a ter autonomia sobre o próprio corpo e o direito de interromper uma gravidez indesejada não precisarão ser questionados. Nem devem requerer explicação.

    8) Os partidos políticos não apenas garantirão cotas para a participação das mulheres nas eleições, mas investirão pesado em suas candidaturas a fim de contribuir para que os parlamentos representem, realmente, a sociedade brasileira. Da mesma forma, nomear mulheres como secretárias de governo, ministras e em cargos de confiança, na mesma proporção que homens, será ato corriqueiro.

    9) Homens entenderão que “um tapinha não dói” é uma idiotice sem tamanho.

    10) Por fim, feminismo será considerado sim assunto de homem. E meninos e rapazes, mas também meninas e moças, deverão ser devidamente educados desde cedo para que não sejam os monstrinhos formados em ambientes que fomentam o machismo, como a família, colégios e universidades.

    Em tempo: aproveito para agradecer novamente às mulheres que passaram pela minha vida e foram fundamentais para que fosse um homem menos idiota.

    http://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/03/as-10-noticias-que-ainda-nao-veremos-no-dia-da-mulher.html

     

  4. Uma homenagem do machismo ao

    Uma homenagem do machismo ao Dia Internacional da Mulher

     

    Feliz Dia da Mulher a você, que não tem autonomia sobre seu corpo, que faz de tudo para se encaixar num padrão imaginário e que se dá ao respeito, mas que é um fetichepor Aline Valek — publicado 05/03/2015 19:17 Leandro Pena / FlickrDia Internacional da Mulher

    Parabéns a você que sabe que se for estuprada foi porque provocou, e que, se for assassinada pelo parceiro, foi porque mereceu

      

    Parabéns pelo seu dia, mulher. Parabéns a você que é feminina, delicada e nos encanta com sua beleza. Parabéns a você que não é feminista, masculinizada ou vulgar. Parabéns a você que não fala palavrão, porque sabe que isso não é de bom tom para uma mulher.

    A você que não deixa de fazer a unha, passar batom e fazer escova, mesmo que trabalhe em serviços masculinos em que isso seja totalmente dispensável, porque você sabe, a gente precisa ter certeza de que você ainda é mulher.

    Parabéns a você, mulher perfeita. Sem estrias, sem gorduras, sem pelos, sem poros. A você que não é gorda e por isso cabe em roupas maravilhosas. A você que também não é magra demais, para podermos admirar suas curvas. Parabéns a você que faz de tudo para se encaixar nesse meio termo imaginário. Colocar peito, tirar barriga, levantar o nariz, depilar a laser, esticar o cabelo, clarear os dentes, malhar glúteos.

    Parabéns a você que, se for gorda, está tentando emagrecer; porque todos sabem que gordas são mal amadas e não se cuidam. A você que, se for velha, está tentando o tempo todo parecer mais jovem, porque mulher tem data de validade.

    Parabéns, mulher para casar. Você, que se dá ao respeito, é uma mulher de família, mulher prendada que sonha em cuidar do marido e dos filhos que ele te der. Parabéns a você que não é uma biscate, que não toma a iniciativa, que não sai na rua usando decote, minissaia e shortinho.

    A você que não fica com três caras em um mês, que não transa no primeiro encontro, que sabe que não pode ter tanta liberdade sexual quanto um homem. Parabéns também a você, mulher para transar. Que é um fetiche, é desejada, é usada e é jogada fora. Parabéns a você que não é puta, pois vale ainda menos e está abaixo do que podemos considerar como um ser humano.

    Parabéns mulher, mesmo se você não for hétero. A você que, mesmo gostando de outras mulheres, continua feminina e sexy, porque assim pode continuar sendo objeto do nosso desejo.

    Parabéns mulher, por nunca ser levada a sério quando está nervosa ou chateada, porque todos sabemos que é apenas TPM. Parabéns a você, que é má motorista, adora sapatos e sempre estoura o limite do cartão de crédito só porque é mulher. A você que é vendida como cerveja. Parabéns a você, mulher clichê que tanto amamos.

    Feliz Dia da Mulher a você, que não tem autonomia sobre seu corpo. A você que sabe que se for estuprada foi porque provocou, a você que se for assassinada pelo parceiro foi porque mereceu. Parabéns a você, que não vai tentar um aborto simplesmente porque não queremos que você faça isso, e não porque a decisão de continuar uma gestação no seu útero seja uma escolha sua. Porque não é.

    Parabéns pelo seu dia, mulher. Uma homenagem de quem é a razão de existir do Dia da Mulher e o faz tão necessário até hoje.

    Sinceramente,

    Machismo.

    *Publicado originalmente em alinevalek.com.br

    http://www.cartacapital.com.br/blogs/escritorio-feminista/parabens-pelo-seu-dia-mulher-uma-homenagem-do-machismo-2810.html?utm_content=bufferd6aab&utm_medium=social&utm_source=twitter.com&utm_campaign=buffer

     

  5. “Dê-nos pão, mas dê-nos rosas”.

    “Bread and Roses” é uma canção que veio de uma fala da pioneira do socialismo e do feminismo, Rose Schneiderman: “A (mulher) trabalhadora deve ter pão, mas deve ter rosas, também.” O escritor James Oppenheim fez o poema “Bread and Roses”, depois musicado por Martha Coleman ou Caroline Kohlsaat (possivelmente a mesma pessoa). A canção foi associada a uma grande greve de operárias têxteis dos Estados Unidos em 1912 e depois tornou-se um “hino” socialista e feminista, muito cantado e gravado.

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