Moro age como insubordinado ao se posicionar sobre vetos de Bolsonaro

Por Helena Chagas

Em Os Divergentes

Moro desafio o chefe

Normal não é. O presidente da República não acolhe todas as sugestões de veto de seu ministro da Justiça a um projeto aprovado pelo Congresso (isso é normal) e esse ministro divulga uma nota explicando sua própria posição em defesa do veto  — e, portanto, fazendo reparos à decisão presidencial que não a seguiu. É o caso de se imaginar que Sergio Moro tenha se esquecido dos protocolos mais básicos do presidencialismo: o presidente manda e os ministros obedecem. Sem choramingos.

O episódio em que o presidente Jair Bolsonaro recusou-se a seguir a recomendação de seu ministro da Justiça para vetar a criação da figura do juiz de garantia no pacote anticrime votado pelo Legislativo tem diversas leituras. A mais óbvia é a da sobrevivência: Bolsonaro manteve o texto, acima de tudo, para se livrar, ao menos parcialmente, da ação do juiz Flavio Itabaiana, do Rio, nas investigações do caso Queiroz que alcançam seu filho Flávio Bolsonaro. O senador passa a ter mais chances de se livrar com a possibilidade de entrar mais um juiz na parada, já que, pela nova regra, o juiz que faz a instrução do processo não é o mesmo que julga.

Subsidiariamente, Bolsonaro fez um agrado ao Congresso, que criou o juiz de garantia, e um desagrado a Moro, que, a seu ver, anda muito saidinho com toda aquela popularidade e seu comportamento de superministro, ou pré-candidato — ou sei lá o que que se coloca, muitas vezes, em patamar de igualdade com o presidente da República.

A nota de Moro, além de ser quase uma insubordinação — onde já se viu ministro se posicionar contra veto de presidente? — tem o claro objetivo político de sinalizar a seus apoiadores que não, ele não mudou de ideia e continua defendendo o combate à corrupção em grau máximo, com as medidas mais duras possíveis, na linha do fim que justifica os meios adotada na Lava Jato.

Moro tomou o cuidado de, horas depois, fazer mais um tuíte afirmando que a vida segue e que vamos em frente — uma maneira de dizer que não vai sair do governo e que, por lá, apesar da discordância, está tudo bem. Será? Aí é que está. Sem condições de deixar o cargo e mergulhar num limbo político de quase três anos até a próxima eleição, o ministro da Justiça está numa contagem regressiva rumo ao momento do choque irreversível com o presidente da República.

Bolsonaro sabe disso, e sabe que a saída de Moro hoje seria um estrago para seu governo. Por isso, alimenta os rumores de que poderá escolhê-lo como candidato a vice em sua futura chapa de reeleição. É uma forma de tentar manter o ministro da Justiça relativamente domesticado.

Mas trata-se de um lote na lua, e na verdade o presidente se ressente de ter um ministro mais popular e forte do que ele próprio. Na hora H, pode mudar de ideia. Ou chegar a 2022 com um nível de popularidade que não lhe permita disputar. E quem disse que Moro quer ser vice, tendo ele próprio condições de ser o titular da chapa?

Continue lendo aqui.

Redação

Redação

View Comments

  • É excelente que Moro continue atrelado ao Bolsonaro: ambos são da mesma laia, da mesma cisca (um mais perigoso que o outro). Na prática, portanto, é bom para a oposição que continuem juntos

  • Acho que com Moro muito próximo ofuscando demais, o Bolsodoido pode acabar caindo pra dentro. O melhor seria se os dois caíssem fora
    juntos e logo.

  • O ex- juiz apresenta grande semelhança com o porco Napoleao (Revolução dos Bichos, George Orwell).
    Apesar de um "combate a corrupção" sabidamente partidário, com auxílio da mídia hipócrita e do depto. de justiça dos eua, mantém-se válido para seu público. Sendo calculista como é, vai engolir o sapo bolsonaro até receber sinais dos seus chefes de que chegou a hora de iniciar a derrocada do bozo, quando então se afastará gerando um clima favorável para que o judiciário e o legislativo finalizem a famiglia. Então ele, Moro, mais uma vez representando os "homens de bem", será retratado pela mídia hipócrita e pelas autoridades policiais e eclesiásticas como o "paladino da mudança".
    Para que seja sinalizado o inicio da derrocada da era bozo, faltam poucas ações que incluem, mas não se limitam, a:
    & Ratificar a precarização do ensino publico;
    & Ratificar a precarização das relações trabalhistas e sociais;
    & Atender a indústria armamentista;
    & Atender aos evangélicos e suas seitas.
    & Atender ruralistas;
    & Entregar a fração territorial que interessa aos EUA;
    & Excluir Lula de qualquer processo político.
    & Garantir a estabilização do clima de ódio capaz de sustentar intervenções violentas nos movimentos sociais.
    E como no livro de Orwell nós, os animais da fazenda, acompanharemos placidamente todo processo de infâmias com muita dificuldade de distinguir porcos de homens.

Recent Posts

Coalizão política nos EUA avança com ajuda para aliados

Grupo bipartidário consegue aprovar projeto para enviar US$ 95 bilhões ao exterior; dinheiro pode ir…

12 horas ago

WBO destaca manobra para desmoralizar investigação do STF

Em nota, escritório destaca que extrema-direita brasileira instrumentalizou comissão dos EUA para fragilizar apuração de…

13 horas ago

Pepe Escobar: A ‘Nova Equação’ do Irã vai muito além da Ásia Ocidental

Esta mudança de jogo irá interferir na forma como o sistema anglo-americano gere a sua…

13 horas ago

“Eles queriam reuniões às escondidas”: GGN entrevista advogado que presenciou encontros da Lava Jato com agentes americanos

"Minha intuição dizia que dali não sairia nada bom", diz André de Almeida sobre reuniões…

14 horas ago

Rendimento médio sobe 11,5% e chega a R$ 1848, segundo IBGE

Montante chegou ao maior valor da série histórica; aumento do rendimento médio e expansão da…

16 horas ago

Toffoli pode reconduzir Eduardo Appio à 13ª Vara, diz jornalista

Toffoli teria dito ainda que pode reaver o afastamento dos juízes Gabriela Hardt e Danilo…

17 horas ago