Narcisismo Branco e a medida do insuportável, por Jonathan Raymundo e Djeff Amadeus

Se o corona vírus matasse somente pretos, a branquitude “progressista” jamais ia se movimentar pelo isolamento horizontal. O mesmo vale para a classe artística branca indignada com a Regina Duarte.

Narcisismo Branco e a medida do insuportável

por Jonathan Raymundo e Djeff Amadeus

Segundo o Youtuber Felipe Neto, em um vídeo que teve muitos compartilhamentos, ele, supostamente “indignado” com o governo Bolsonaro, disse o seguinte: “Agora chegou o momento insuportável”! Nosso texto, escrito em parceria (ou seria melhor dizer: em irmandade) deve-se ao fato de que muitos de nossos irmãos e irmãs do movimento negro acreditaram naquela conversa fiada e compartilharam o referido vídeo.

Irmãos e irmãs: demonstraremos – e provaremos – o porquê de não acreditarmos na indignação de Felipe Neto, que é a mesma da extragrande maioria dos brancos.

A Ditadura militar, dentro da História Branca brasileira, foi o único momento em que o Estado tomou os filhos da classe média branca como inimigos. Matou, torturou, violou e agrediu. Por isso, os brancos, talvez, só agora se sintam de fato ameaçados pelo projeto colonial que o Bolsonaro é só um dos exemplares.

O próprio Brasil é isso: um projeto colonial que mata a cada 23 minutos os jovens pretos. Para nós, democracia, cidadania e direito são palavras que nunca se efetivaram. Cidadão, pra gente, nunca significou cidadania, mas apenas uma cidade grande, muito grande!

Bolsonaro, por isso, sempre foi insuportável. Não tem essa que agora chegou longe demais. Ele sempre foi longe demais. Denunciamos isso. Como denunciamos todos os dias o Brasil: sua Necropolitica, seu racismo, seu motor produtor de desigualdades, entre outras coisas. Imaginem pretos, mulheres, homossexuais só agora se sentindo ofendido pelo Bolsonarismo? Apologia a torturador, naturalização de estupro, homofobia, ataque aos direitos indígenas e quilombolas, segundo Neto, não era o fim da picada, só agora Bolsonaro se tornou insuportável…

NÃO caiam nessa! Aliás, sabem por que o Bolsonaro era interessante e se tornou insuportável somente depois? Pelo mesmo motivo que o nazismo. Como assim? Ora, no início, o nazismo pareceu interessante porque a branquitude achou que a câmara de gás nunca viria a ser usada contra ela, branquitude.

A real é que se a câmara de gás matasse apenas judeus e negros, grande parte da branquitude faria vista grossa, mas não fizeram porque o gás que matava judeu e preto também matava europeu. Se o corona vírus matasse somente pretos, a branquitude “progressista” jamais ia se movimentar pelo isolamento horizontal. O mesmo vale para a classe artística branca indignada com a Regina Duarte.

Aliás, onde vocês estavam durante todos estes anos? Onde estava o Felipe Neto, a classe artística branca e a classe média branca quando o Bolsonaro disse que “o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gastado com eles; “Quem usa cota, no meu entender, está assinando embaixo que é incompetente; Tudo é coitadismo. Coitado do negro, coitado da mulher, coitado do gay, coitado do nordestino, coitado do piauiense. Vamos acabar com isso”…

Ora, parece coisa de feminismo branco liberal, de mulheres brancas que enquanto queimavam seus sutiãs, mantinham as mulheres pretas em servidão. Reivindicaram trabalho, enquanto mulheres negras limpavam, cozinhavam, amamentavam e cuidavam de seus filhos. É preciso falar daquilo que a Maria Aparecida Bento chamou de “pacto narcisico dos brancos”, denunciando a parceria do homem branco e da mulher branca na engenharia da dominação racial.

Por isso, chega de “brancos salvadores”! Chega dessa gente que, ao não reconhecer seus privilégios, contribui para a manutenção da meritocracia! Chega de “fadas sensatas” que, além de nunca lutarem contra seus privilégios, ainda se valem deles para repostarem postagem de mulheres negras sem dar o crédito.

Por isso, comunidade, precisamos ter nossas próprias agências, centradas no nosso próprio interesse, porque, se esperarmos a indignação dos brancos de classe média, estaria de boa o que o Bolsonaro sempre disse sobre os Pretos. O Bolsonarismo precisa ser rechaçado de forma radical e constante e quem se alia ao Bolsonarismo é inimigo dos nossos interesses. Apenas lembrem do Malcolm X: lobos ou raposas podem ter táticas diferentes, mas, no final, terminamos como seus almoços. Tenhamos nossa própria agência, porque, quando se torna insuportável pra eles, já são décadas e décadas dos nossos filhos sendo fuzilados. Nós por nós!

Jonathan Raymundo é filósofo, historiador, poeta, escritor, palestrante, ativista, criador e organizador do @wakandainmadureira

Djeff Amadeus é advogado criminalista, mestre em Direito e Hermenêutica Filosófica, pós-graduado em filosofia (PUC-RJ), Ciências Criminais (Uerj) e Processo Penal (ABDCONST). Membro da FEJUNN, do MNU e da IANB.

Redação

6 Comentários

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  1. Quem é felipe neto e pra que serve?
    O que ele faz?
    Dos campeoníssimos “youtubers” vejo Whinderson Nunes, menino simples que cada vez se demonstra mais humano e ouço dizer que ele é mais importante que o felipe neto.
    O acaso me levou ao Whinderson, de quem nem se fala, embora o comparem a felipe neto como seu contemporâneo.
    Qual então seria a graça do felipe neto? Ser branco, classe média, cosmopolita e se meter em política?
    Opinar seria injusto mas pelo teor do post, dele posso dizer: – ” não vi, não gostei”

  2. O texto começa com a citação de um caso específico, depois, generaliza. Interessante, apesar da indução falsa.
    Mas eles também trabalham com a ideia de “nós” e “eles”, prestem atenção. O que leva a afirmações estereotipadas e eventualmente paranoides. O que dá um grau de veracidade é a História, por isso, passariam despercebidas suas distorções.
    De tanto ficar distante do bolsonarismo, dele se aproxima.

  3. Que os negros não fiquem esperando a aprovação dos brancos sobre seus pontos de vista. Observem, pensem, elaborem a partir de suas próprias percepções. Se não radicalizarem, de nada adiantará o esforço de elaboração. O Brasil se encontra atrasado em décadas se comparado aos EUA e outras nações de substrato racista. Somente em nações onde já ocorreu o confrontamento radical, tanto o filosófico quanto o ativista, é possível se abrir um canal de diálogo mais aglutinador e supra-racial. Os pretos do Brasil precisam se colocar em pé de igualdade no embate de ideias e isto não se consegue fazendo o tipo “paz e amor”. Não há esperança de conciliação para os pretos do país. Nunca houve e jamais haverá enquanto não se revelarem os reais limites que sancionam a inclusão dos pretos nos motores institucionais, culturais e ideológicos que compõem a nação brasileira. Sequer haverá nação realmente, enquanto a maioria preta e mestiça não for agente direta da sociedade, de forma consciente e não-subserviente.
    Radicalizem-se!!! Este é o momento!!!

  4. Ora, se é assim que pensam, fundem o Partido Preto do Brasil, com um programa de Estado preto paralelo.

    É uma enxurrada de julgamento generalizante. O tipo da coisa que costuma ser um desastre. Não somos mais seres humanos complexos, e a ciência agora tem cor. Daqui a pouco vai surgir a química preta e a física preta.

    Me desculpem, esse discurso parece muito crítico e combativo, mas na verdade é um desastre político, porque o resultado será um massacre amplificado do povo negro. Ao invés de deixarem as questões secundárias de lado e investirem no Fora Bolsonaro, vão deixar o golpe fascista acontecer para apontar o dedo para o colega branco de faculdade.

    Ao invés de lutar contra o sistema de opressão, vamos provocar um tiroteio entre potenciais aliados. Brilhante!

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