O Brasil pós-Temer, uma tragédia nacional. Parte 4, por Cesar Cardoso

O Brasil pós-Temer, uma tragédia nacional. Parte 4: 4+1 motivos para não haver 2018

por Cesar Cardoso

(Relembrando da parte 1parte 2 e parte 3.)

Na parte anterior deixei de falar das eleições presidenciais de 2018. Deixando claro: continuo não acreditando que elas serão realizadas. Um belo dia seremos surpreendidos na calada da noite com alguma prorrogação de mandato de Temer, Gilmar Mendes ou algum outro presidente de plantão, ou mesmo com algum parlamentarismo (e neste caso podem até serem realizadas, mas não serão relevantes).

O quadro eleitoral de 2018 se tornou suficientemente perigoso para os dois grupos da aliança golpista; uma população desiludida, desesperançada e sendo submetida a doses cada vez mais fortes de indignação midiática seletiva é um campo aberto para salvadores da Pátria, e melhor ainda se “faxinarem” Executivo, Legislativo e Judiciário. Vamos dar uma olhada como os quatro candidatos que despontam no horizonte (e o quinto candidato que pode surgir) só reforçam esse risco para o grupo golpista.

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Começando pelo candidato que surge na aliança golpista, João Dória Júnior. Se a toda Manu Pulite corresponde um Berlusconi, o publicitário é o mais forte candiato a ser o Berlusconi à moda Brasil 2018: não-político (apesar de sua carreira ser toda feita na interseção da política com a iniciativa privada), gestor (apesar de seu exemplo público de gestão, a franquia televisiva O Aprendiz, não ter se recuperado de sua passagem pelo programa), fazedor (mesmo que seja só de marketing). Para derreter corações e mentes, começou a bater na tecla do discurso do “portador do novo Brasil” – onde o “velho Brasil” é o lulismo, claro. E conta com a mídia, devidamente irrigada com verbas e imagens, a seu favor.

Seria a situação perfeita, inclusive de ser o candidato que viabilizaria as eleições de outubro de 2018 por ganhá-las e garantir a longevidade do projeto de país da aliança golpista… se não estivesse dentro de uma fórmula com vários outros resultados que, também, começam a se achar os Berlusconis brasileiros.

Aécio Neves, que prefere implodir o PSDB e a aliança golpista a se entregar à ala paulista do partido, já começou a explorar a capacidade eleitoral de Luciano Huck. O também publicitário (e mais bem-sucedido, diriam alguns) Roberto Justus também vem explorando a ideia de uma candidatura, o que pode ser a salvação, digamos, do PMDB.

Então, no caso de uma aceleração da deterioração da aliança golpista, podemos ter não um, mas até três candidatos a Berlusconi em 2018, disputando o mesmo público e sem conseguir avançar no eleitorado de outros candidatos. O que seria o garantidor das eleições de 2018 – um candidato único, forte e com chances reais de vitória – pode se tornar o motivo para não haver eleições em 2018 – três candidatos fragmentando os votos e abrindo o espaço para os inconvenientes outros candidatos.

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Marina Silva faz o que sempre fez: fugir de qualquer questionamento, pergunta ou posicionamento que não seja “segura na minha mão e vai”. Tem a vantagem da invisibilidade, já que cresce na preferência popular a cada dia que fica calada (e decresce quando se manifesta, o que só reforça a sua incomunicabilidade). E os movimentos do seu partido rumo a figuras do Judiciário demonstra que vai tentar apoio de corporações estatais.

A aura de mistério que Marina criou em torno de si mesma ajuda a reforçar sua imagem de detentora do salvacionismo, que naturalmente se torna um autoritarismo messiânico/semireligioso. Além disso, Marina praticamente exige que confiem cegamente e sem questionar no seu julgamento, e isto pode criar um enorme problema para os setores que se aliarem a ela numa presidência; as corporações estatais, por exemplo, podem embarcar entusiasmadamente em Marina achando que ela será o veículo da democracia tutelada e descobrir que ajudaram a eleger, digamos, um Erdogan da floresta.

Marina é um salto no escuro do salvacionismo, e isto é um problema para grupos que tem projeto de redesenhar um país à sua imagem e semelhança.

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O terceiro é Jair Bolsonaro. Na superfície, é a análise mais simples: assumindo a presidência, não demorará muito para dar algum autogolpe, inclusive porque é isso que seus eleitores e apoios políticos querem e esperam dele. Numa situação extrema, em que não se consiga impedir as eleições e os conflitos sociais se agravem, boa parte do mundo político hoje reticente pode ver no coronel uma alternativa para a vitória de algum candidato mais inconveniente.

Entretanto, Bolsonaro tem um problema, particularmente para o rentismo: é ligado demais em coisas consideradas démodé no Brasil pós-Temer, como nacionalismo e soberania nacional. Ao mesmo tempo, se suavizar suas posições nacionalistas em prol de ser mais palatável ao mercado, vai ser abandonado por pelo menos parte da sua base eleitoral, minando suas chances de ser eleito.

E, como não há a garantia da versão light de Bolsonaro, melhor não arriscar.

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Deixamos propositalmente por último o ex-presidente Lula. A realização das eleições de 2018 já dependeu dele ser preso ou inabilitado, mas a demora/incapacidade/inabilidade do time Dallagnol-Moro de acharem a bala de prata acabou criando uma situação em que é cada vez mais difícil sua inabilitação sem um adiamento das eleições. Ao mesmo tempo, a ligação de Lula com os “bons tempos” começa a se tornar cada vez mais forte, particularmente nas classes populares, que começam a ver na volta do ex-presidente a salvação contra a volta à pobreza ou miséria. E grupos políticos, até mesmo no golpismo, começam a ver em Lula o canal para que haja uma chance mínima de uma pacificação nacional.

Por outro lado, Lula terá 73 anos em 1º de janeiro de 2019, data em que assumirá a presidência caso ganhe uma possível eleição em outubro de 2018. Receberá um país conflagrado e a esperança de esquerda, centro e direita de ser o árbitro do processo de pacificação nacional. É um quadro que, guardadas as devidas proporções, lembra a Argentina de quando Perón assumiu a presidência em outubro de 1973; o velho general, que deveria dar algum controle político e econômico a um país à beira de uma guerra civil, faleceu não conseguindo controlar nem a espiral do caos econômico e muito menos a violência política.

E um Lula que não consiga controlar a situação política e econômica é a última coisa que todo o espectro político e até mesmo o rentismo pode ser dar ao luxo de ter.

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O “+1” é Ciro Gomes. O ex-governador do Ceará pode entrar no jogo caso Lula não esteja habilitado, e já vem deixando mais ou menos claro que entrará na disputa para botar fogo no país, na aliança golpista, nas corporações estatais, no rentismo e em quem estiver no meio. Para bom entendedor, meio incêndio basta. Talvez seja o que a aliança golpista espera para não ter 2018.

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Ah, muito obrigado a quem leu e comentou as quatro partes. A quem no GGN achou que fazia algum sentido e publicou na página principal. E espero, principalmente, que eu esteja profundamente errado e que este período seja apenas um momento de passagem para um país forte, livre, democrático e justo (brasileiro profissão esperança né).

Redação

6 Comentários

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  1. “Entretanto, Bolsonaro tem um

    “Entretanto, Bolsonaro tem um problema, particularmente para o rentismo: é ligado demais em coisas consideradas démodé no Brasil pós-Temer, como nacionalismo e soberania nacional. Ao mesmo tempo, se suavizar suas posições nacionalistas em prol de ser mais palatável ao mercado, vai ser abandonado por pelo menos parte da sua base eleitoral, minando suas chances de ser eleito.”

    Bolsonaro Nacionalista ??

    Que apoiou a entrega do pré-sal ???

    Bolsonaro um dia foi nacionalista.

    Hoje, eu diria que nem é fascista. Não passa de um liberaleco um pouquinho mais autoritário.

     

    1. Ou seja, Marcelo33, você

      Ou seja, Marcelo33, você acredita que o Bolsonaro desinfla quando ele começar a titubear em perguntas de sua base eleitoral sobre temas nacionalistas? Aí vai ser interessante. Porque abre um espaço novo.

  2. Infelizmente acho que voce

    Infelizmente acho que voce está certo, caro Cesar. Eleições podem até ocorrer em 2018, mas não serão democráticas. E como voce, não sei se é só tirar o Lula da disputa que os donos do golpe farão. 

  3. Ciro e Lula como vice
    Pra Lula pacificar o congresso e Ciro tratorar as corporações estatais

    Lembrando de que nada adianta um Presidente sem uma bancada forte e comprometida. Presidencialismo “de coalizão” foi o que iniciou todo esse problema (alo alo golpe de Cunha!)

    Particularmente torço pra Malafaia abrir a boca com Marina acabando com os votos dela e termos Huck, Dória e Justus disputando os mesmos votos.

  4. Tem que ficar de olho no Álvaro Dias.

    Na falta de opções seguras o jogo poderá estar indo de encontro a um ex-tucano, agora de plumagem verde. A direita está com o radar ligado a procura de um candidato forte. ÁLVARO DIAS poderá ser o candidato da direita.

  5. Cesar Cardoso
    Li os 04

    Cesar Cardoso

    Li os 04 artigos publicados por voce . E gostei muito das analises neles contidas. Compartilhei todos eles na minha pagina nas redes sociais . Assim como compartilho com voce o seu desejo de estar profundamente errado .

    O Brasil merece um futuro melhor !!!

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