do Obvious
O filme Blade Runner de 1982 no tempo
por M. Fernanda Carvalho
Termino de assistir Blade Runner. Ligo o computador e tento escrever sobre as ideias acerca dessa obra prima. Nesse momento gostaria de poder prender o passado e ter uma daquelas vitrolas para tocar as músicas e me fazer levar por elas, mas lembro de um app e puxo a sua trilha sonora e as escuto e penso que passado e futuro, coexistem no presente e sinto a temporalidade do filme que é impressionante, pois continua extraordinário como tempos atrás. Blade Runner se faz tão presente e nos manda até hoje mensagens sobre o futuro. Acho que daqui algum tempo se for assisti-lo novamente irei ter esse mesmo sentimento de ser tão atual.. e consegue até hoje ir além do tempo. Ridley Scott foi visionário impulsionado pelo romancista Philip K. Dick ao dirigir a trama.
Nessa atmosfera me deixo guiar pelas belas musicas da sua narrativa melancólica, estupenda e encantadora em ambientes frios, escuros, sujos, um destaque a pura ausência de vida.
Não quero aqui me prender a sinopse do filme, pois acho que o mundo assistiu Blade Runner.
Quero falar sobre sentimento. Sobre a humanidade dos Replicantes. Com olhos cheios de vida, pois reflete a luz que nos traz as mais variáveis possibilidades. Quatro deles fogem para a Terra, onde não podem habitar e são caçados até serem exterminados sem noção da sua existência de apenas 4 anos. Por isso que eles desembarcam na Terra em busca de informações que lhes possibilitem alterar essa temporalidade.
O homem os inventa a sua imagem e semelhança com mais inteligência e ao mesmo tempo os escraviza assim como os humanos que sobrevivem na terra. Eles são tão humanos e quase robôs. De tão perfeitos se rebelam contra os humanos, quem os criou. Essa perfeição destinada à imitação, e uma metáfora sobre Deus ao criar o ser humano e o próprio homem brincando de ser deus. O criador no filme é uma pessoa que transforma a sua impotência em uma eterna criação de seres mais perfeitos do que ele. Um paradoxo, uma ironia, um divertimento. Ele imortaliza-se na perfeição das obras finitas que projeta. Será Deus tão egoísta?
O filme é de 1982, mas a trama se passa em Los Angeles, novembro de 2019. E hoje, 2017, já estamos quase lá. E nesse momento ao refletir sobre o filme, e evidente por ser da área da psicologia com pé na filosofia lembro-me do que disse Nietzsche, sobre a história dos dois próximos séculos, quando ele diz que o futuro pronuncia-se em cem sinais, o destino anuncia-se por toda parte, com a tortura de uma tensão, que cresce de década em década, como se estivesse encaminhando-se para uma catástrofe: inquieta, violenta, precipitada como uma correnteza que anseia por chegar ao fim e que não mais se lembra, tem medo de lembra-se.
E Freud quando diz: “… qualquer que seja a maneira em que definamos o conceito de civilização, o certo é que todas as coisas com as quais buscamos nos proteger das ameaças que emanam das fontes de sofrimento são parte dessa mesma civilização“, (Sigmund Freud, O Mal-Estar na Civilização).
E um destaque é para a cena mais incrível do filme quando Roy chega ao seu fim em sua perfeição salva a vida do exterminador e diz as palavras: “Eu vi coisas que vocês não acreditariam. Naves de ataque em chamas nas bordas de órion. Vi a luz do farol cintilar no escuro na Comporta de Tannhäuser. Todos estes momentos se perderão no tempo… como lágrimas, na chuva”. Com a tristeza de saber que tem alguns minutos antes de apagar a luz levando a sua história, as memórias o passado. A sua luta pela vida que ele perseguia tanto desde o começo. Ele não poderia tirar a vida de outro ser que assim lutava como ele, pois a vida se tornou um valor inigualável. Agora. É tempo de morrer.
Não somos robôs, não somos desumanizados, não somos embotados, zumbis, somos humanos por sermos complexos demais e demasiadamente humanos somos cheios de passado, onde podemos resgatar a nossa história, como referencia da nossa humanidade e com possibilidades de futuro. É quando Roy diz: “não somos computadores, somos seres vivos”.
Em outubro chega Blade Runner 2049 com a versão do diretor Denis Villeneuve, o mesmo de homem duplicado, Enemy, incêndios, o último dele Arrival, a chegada. Após Trinta anos dos acontecimentos desse primeiro filme. Vale a pena assistir no cinema.
M. Fernanda Carvalho – Carioca, psicóloga clínica e psicanalista, nas horas vagas, blade runner, curto muito cinema, arte, livros e os meus três gatos boêmios. Sou o meu maior desafio. Alguns textos, são meramente articulações inacabadas.
Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.
Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.
O diretor mais acerta do que erra em seus filmes. Nos sete primeiros filmes. Um é dispensável. Poucos conseguem. Os três primeiros foram uma sequência magnífica.
Interpretação espetacular , meus para bens. Show!
Parabéns Fernanda, obras primas são eternas, seu artigo homenageia um filme que já faz parte das grandes obras culturais da humanidade, assim como o citado Nietzsche.
Tive o privilégio de ver o filme no cinema quando foi lançado e até hoje sempre é bom revelo, também desde que meu filho era menino, até hoje costumamos assistir juntos, ler o seu artigo de alguma maneira foi como rever o filme novamente.
M. Fernanda, Vc lida como psicologia clínica? Conhece Rosemary (Rose) Pedrosa, de Fortaleza, Ceará?
Esse artigo è de 2017, mas encontrei ele varrendo as ultimas noticias, em maio 2019… porque foi repostado?