O fim de uma era, por Vilma Aguiar

No momento de uma pandemia que amedronta o mundo, o presidente vai à TV e em míseros 119 segundos pouco mais diz que a causa dos zumbis é válida.

O fim de uma era

por Vilma Aguiar

Meus amigos, meus inimigos. Verdade que ando meio apocalíptica, mas ninguém há de me condenar de desvairada nos tempos que seguem. 

Os motivos de esperança, se os houve em algum momento neste curto século XXI, já se esvaíram no suspiro de nossa república moribunda. Como é possível ter esperança se as ruas são tomadas por zumbis convictos, capazes de ignorar toda razão, toda prudência, toda vergonha para pedir e defender o inominável. 

No momento de uma pandemia que amedronta o mundo, o presidente vai à TV e em míseros 119 segundos pouco mais diz que a causa dos zumbis é válida. O apocalipse não vem tanto do que ele diz porque pela repetição não assusta mais ninguém (sim, a vírus que cria mortos-vivos se espalha mais que o corona  e estamos todos contaminados). A sensação de fim do mundo vem de sua figura mesmo. A ausência de vida atrás daqueles olhos vidrados, embaçados, rotos. Daquela boca que nada mais é que um furo. Triste o país liderado por uma figura que perdeu a alma em algum porão de tortura. Um zumbi puro sangue, transmitindo seu oco a milhões.

Como é possível ter esperança se o ocaso da civilização tal qual a conhecemos já é tangível, já está no horizonte, tomado este pela fumaça cinza do verde da Amazônia. Se já é possível ser divisado pelo degelo dos polos, pela extinção em massa de animais e plantas construídos pacientemente por milhões de anos pela natureza. 

Como é possível ter esperança se esse holocausto se casa com o da nossa civilização tropical, com o fim da promessa que nossa morenice um dia deu ao mundo de uma pluralidade, de uma diversidade que tornaria a humanidade um lugar bom para se estar.

Não há esperança possível e razoável se nosso modo de estar no mundo destrói esse mesmo mundo.

Fracassamos como país e perdemos como espécie.  Passamos do ponto em que a volta é possível. A era da abundância dos recursos ilimitados e da esperança inconsequente e ingênua acabou. 

Minha única dúvida é se Bolsonaro é o sintoma do fim desse mundo iluminista ou se é o zeitgeist do que está por vir. 

Vilma Aguiar é socióloga. Escreve sobre política e feminismo

Redação

2 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. “A sensação de fim do mundo vem de sua figura mesmo. A ausência de vida atrás daqueles olhos vidrados, embaçados, rotos. Daquela boca que nada mais é que um furo. Triste o país liderado por uma figura que perdeu a alma em algum porão de tortura. Um zumbi puro sangue, transmitindo seu oco a milhões.” É de gelar a alma… você traduziu como poucos esse… inominável!!!

  2. “A sensação de fim do mundo vem de sua figura mesmo. A ausência de vida atrás daqueles olhos vidrados, embaçados, rotos. Daquela boca que nada mais é que um furo. Triste o país liderado por uma figura que perdeu a alma em algum porão de tortura. Um zumbi puro sangue, transmitindo seu oco a milhões.” É de gelar a alma… você traduziu como poucos esse… inominável!!!

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador