O projeto de poder totalizante avança no Brasil, por Daniel Samam

O bolsonarismo não é nada afeito ao diálogo e muito menos a seguir os ritos democráticos. E mais, tem desprezo pelo Congresso.

Foto Agência Câmara

O projeto de poder totalizante avança no Brasil, por Daniel Samam

Sobre as recorrentes brigas e disputas no interior do governo e expostas nas redes sociais ou em declarações à imprensa, penso que o governo opera numa lógica do conflito permanente, controlando a pauta e desviando o foco da oposição. Ou seja, controlam o que vira e o que não vira notícia.

O bolsonarismo mantém sua base de apoio na sociedade “blocada” subindo o tom, radicalizando e dobrando a aposta ao comprar as brigas de seu ideólogo, Olavo de Carvalho, contra a ala militar do governo.

Desta vez, os alvos foram o ministro Santos Cruz, da Secretaria de Governo e, posteriormente, Olavo de Carvalho dedicou mais uma série de postagens no Twitter com ataques aos militares, mas uma em especial ganhou destaque na imprensa e repúdio de boa parte da classe política, onde o ideólogo do bolsonarismo afirma que “os generais do governo se escondem atrás de um homem preso a uma cadeira de rodas”, numa clara referência ao general Villas Bôas, que sofre de uma doença neurodegenerativa.

Antes, Bolsonaro dava de malabarista ao tentar manter o apoio popular, do mercado financeiro, das Forças Armadas, da imprensa e do Congresso ao mesmo tempo. No entanto, a estratégia vem mudando e o bolsonarismo começou a minar setores aliados e determinantes na sua eleição. Há quem acredite que a dificuldade política do governo esteja na falta de diálogo ou de habilidade entre os membros do governo com o Congresso. Pelo contrário. O bolsonarismo não é nada afeito ao diálogo e muito menos a seguir os ritos democráticos. E mais, tem desprezo pelo Congresso.

Este é o modus operandi do bolsonarismo. Não esperem um tom conciliador. Bolsonaro sabe que o Congresso aprovará alguma reforma da previdência, mesmo que mínima. E isso injetará algum grau de “otimismo” no mercado, acalmando-o e destravando a política. Ou seja, o governo espera que o Congresso entregue a mercadoria enquanto o bolsonarismo se ocupa de tomar o Estado para a partir dele consolidar seu projeto de poder totalizante.

Por isso, os parlamentares, em especial os deputados do chamado “centrão”, exitam em ajudar o governo, pois temem ser trucidados em suas bases eleitorais pelo bolsonarismo fortificado pela ocupação de cargos federais e armado do discurso de combate à “velha política” nas eleições de 2020 e 2022. Cada novato bolsonarista no primeiro, segundo e terceiro escalão do Executivo é potencial candidato em 2020 e em 2022.

Apesar do incômodo de alguns setores, a política econômica mantém apoio maciço das classes dominantes e da opinião pública. A Lava Jato mantém a caça à “velha política”. O Judiciário está dividido, parte nas cordas, sob ataque, e outra parte firme no ativismo despótico. Sem contar nas Forças Armadas, que demonstram estarem enquadradas à agenda neoliberal.

O risco dessa operação dar errado está na política econômica não dar o resultado esperado no médio e longo prazos, resultando num “Efeito Macri”, algo real e com as pesquisas apontando tal cenário.

Há quem pense ainda que Bolsonaro venha a ser derrubado por um golpe militar. Eu, particularmente, já acho que é Bolsonaro quem pode dar o golpe. No governo, é o bolsonarismo que tem militância. Tensionam o tempo todo.

Também acho que os militares garantistas e legalistas têm maioria nas no alto comando. Porém, nas bases, nas baixas patentes, há uma maioria bolsonarista, de pensamento abertamente neofascista. Sem contar as polícias militares dos estados – sem esquecer das milícias.

Na sociedade, o pensamento neoliberal e neofascista ganhou corpo à nível global nos últimos anos, desde a última crise do capital financeiro, em 2008.

Diferentemente de outros momentos históricos de polarização e forte inflexão totalizante no Brasil, esse pensamento não era expressado de forma clara pela sociedade. O fato novo é que este pensamento disputou e venceu nas urnas em 2018.

Tudo isso, aliado à concessão indiscriminada de porte de armas de fogo e munição em decreto presidencial, torna a situação extremamente preocupante.

Redação

3 Comentários

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  1. Seria um golpe de Estado bem complicado, não acha? Toda elite nacional que conservou poder e unidade no país e veio conservando até hj, perderia o controle para o Bolsonaro. É importante lembrar que ele se elegeu com votos heterogêneos de pessoas cansadas com o outro modelo de Estado, que foi demonizado por décadas, seja corretamente como incorretamente. As pessoas abstraem a realidade e simplificam pra caber em seu senso comum. Simplificaram a ponto de acreditar que o Pt carregaria tudo aquilo. Após tirá-lo, perceberam que não foi o que imaginavam. Bolsonaro é consequência de tudo isso, mas acreditar que ele tem poder pra tanto… Falta-lhe estratégia, capacidade política e força.
    Basta que o decreto seja suspenso e acabou. Ele vai decretar novamente?
    A parábola já está em queda, o sistema está retomando o espaço perdido e não haverá espaço para essa esquerda. Se ela quiser entrar no jogo, terá de mudar, fazer seu reposicionamento na mente dos eleitores para jogar novamente.
    A elite em geral já sabe que esse século é diferente, apenas não quer perder a direção da locomotiva.

  2. Me desculpe é dar muito crédito a um imbecil. Não acredito que ele ou os filhos tenham capacidade e visão para elaborar um planejamento tão complexo ou ter isso como uma estratégia pensada, para mim soa mais como algo que faz parte da personalidade facista e que desde que é deputado federal adotou como sua personalidade.

  3. Acho dificil estabelecer um regime totalitário. O lider é fraco e nao existe unidade onde se multiplicam seitas evangélicas e facções de várias origens, todos com forças equiparadas.
    Vale lembrar Sun Tzu:
    “A vitória está reservada para aqueles que estão dispostos a pagar o preço.”
    Esta turma de evangélicos e facções criminosas não abre mão de nada num butim. Mesmo que, em alguns casos, sejam cabeças da mesma hidra.

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