Percival Maricato
Percival Maricato é sócio do Maricato Advogados e membro da Coordenação do PNBE – Pensamento Nacional das Bases Empresariais
[email protected]

O STF e o financiamento de campanhas por empresas, por Percival Maricato

O STF e o financiamento de campanhas por empresas, por Percival Maricato

Há mais de um ano o Ministro Gilmar Mendes pediu vistas no processo onde se pede a declaração de inconstitucionalidade do financiamento de campanhas eleitorais por empresas e sequer acena com a possibilidade de vir a julgá-lo algum dia. Muito pelo contrário, vem afirmando pública e reiteradamente que se trata de decisão que deve ser tomada pelo Congresso e não pelo STF, sinalizando que  manterá o processo na gaveta.

Talvez tenha até razão quanto ao fato de ser muito mais adequado que os congressistas decidam questão política tão relevante, mas se não o fazem, é justo os cidadãos se socorram do STF, que por sua vez, vem substituindo os parlamentares quando omissos. São exemplos o casamento homossexual, adoção de crianças por esse tipo de casal e tantas outras questões em que se necessita de segurança jurídica e direção, nas áreas social, tributária, civil, até trabalhista (só não decidiu sobre a indenização devida como aviso prévio por anos de serviço porque o Congresso, pressionado, a pôs em pauta e votou).

Evidente que o pedido feito e o processo que gerou deve ser decidido pelo STF e não apenas por um Ministro, como está acontecendo na prática. A resistência de Mendes tem resultado em desmoralização tanto para seus demais pares como para o STF, que se mostram  impotentes diante da situação criada.

Por outro lado, o Ministro pediu vistas no processo  quando este já tinha seis votos favoráveis ao pedido contra um contrário, ou seja, já  era certa sua aprovação, qualquer  que fosse seu voto. Sua conduta, é pois, abusiva (infração prevista no Código Civil) e incompreensível, pois pode atingir sua imagem, importantíssima para o setor mais conservador do espectro político, , que representa de forma competente no Tribunal.

Também se desgasta junto a sociedade, tendo em vista que o financiamento de campanhas políticas por empresas privadas tem gerado reflexos trágicos e desmoralizantes para a democracia. Isto está particularmente claro nos dias que vivemos.  Quem determina quais candidatos devem ser eleitos são as grandes empresas, especialmente empreiteiras, pois é sabido que para ser eleito um deputado precisa de dezenas de milhões de reais e um prefeito ou governador dez vezes mais. Que possibilidades tem um cidadão comum contra quem dispõe de milhões para fazer propaganda e corromper eleitores? E agora então, contra deputados já eleitos, que tem dez milhões para encaminhar por ano em emendas? Ou os que controlam partidos, que terão mais de oitocentos milhões? Trata-se de afronta ostensiva e inegável aos princípios basilares da democracia, agressão ao Estado Democrático de Direito.

Além disso é sabido que essas empresas financiam candidatos visando corrupção da administração,  peculato, favores imorais, lucros ilícitos no futuro, tanto que doam a vários candidatos e partidos, independente da ideologia ou de programas (e com raras exceções, todos as recebem sem se envergonhar).

Já se passou uma eleição e outra virá, com risco de não termos a decisão proibindo essa imoralidade. O Ministro já deixou claro na mídia e por discursos que o tema deve ser decidido pelo Congresso e não pelo STF. Ou seja, está declarando explicitamente que pretende impedir a votação até que o Congresso resolva decidir a matéria. Ou pelo menos que irá adiá-la por um bom tempo.

Como advogado, entendo que o Ministro está cometendo diversas infrações, contrariando normas éticas, legais e constitucionais, nega as  finalidades para as quais foi criado o STF, impede seu funcionamento.

Está monopolizando uma função que é de todo o STF, pois afinal, se os demais Ministros não pensam o mesmo, como pode um único decidir tão relevante questão? De que vale o voto dos demais, ainda que tão expressivos em número?  Trata-se, pois, de mais uma infração.

O Ministro está cometendo uma grave infração contra a Constituição Federal, pois a decisão na referida ação é direito do autor, conforme art 5º, inciso XXXV da Carta Magna. Na prática está negando-se a entregar a prestação jurisdicional, albergada nesse dispositivo, recusando-se a cumprir obrigação regimental, legal e constitucional.

Está dando mau exemplo e desrespeitando os demais Ministros, mais uma vez, na medida em que pela Constituição todos tem o mesmo poder e devem se respeitar mutuamente. Se os demais se julgarem no mesmo direito teremos a desmoralização completa da Instituição.

Está infringindo os princípios da legalidade, da razoabilidade, da proporcionalidade, da eficiência, da moralidade, entre outros, previstos na mesma Carta  Constitucional, pela demora na decisão. Princípios, aliás, dos quais os Ministros deveriam ser os primeiros guardiães, após jurarem cumprir a Constituição.

Está desmoralizando o Tribunal na medida em que  sua conduta, tão irregular, certamente terá que gerar regulamentação pelo Congresso. O constituinte não previu prazo para Ministros darem seus votos, já que ninguém imaginava que tal situação poderia ocorrer. Ministros, desembargadores, são pessoas de elevada função pública, enorme responsabilidade, como imaginar que poderiam guardar ostensivamente processos em gaveta, para evitarem a prestação jurisdicional em sentido contrário ao que querem ou pensam?  O fenômeno, aliás, não é exclusividade da Suprema Corte. Há pouco aconteceu no Tribunal de Justiça, onde um desembargador pediu vistas e segurou um processo por três anos, até ocorrer a prescrição, livrando um deputado de condenação. E nada acontece.

O Congresso, representando a sociedade, deve deixar claro que juízes não são donos, mas servidores provisórios de suas funções. Mendes  está afrontando a sociedade, que espera conduta ética,  escorreita, eficiente, do Poder Judiciário, cujo prestígio tem caído terrivelmente junto a população.

Só não se pode dizer que está infringindo o principio da transparência, vez que deixa claro quais são suas intenções.

Temos pois, inúmeras infrações, éticas, regimentais, legais e inconstitucionais, a cuja apuração se arrisca o Ministro, além de avaliações negativas no plano político. Estranho o silencia do OAB, dos parlamentares, dos demais Ministros. Quanto a mídia, imagine-se o que não aconteceria se fosse os Ministros Lewandowski ouToffoli, que fizessem esse papel.

Percival Maricato

Percival Maricato

Percival Maricato é sócio do Maricato Advogados e membro da Coordenação do PNBE – Pensamento Nacional das Bases Empresariais

8 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. A interrupção deste

    A interrupção deste julgamento, realizada por ação individual do ministro Gilmar Mendes, deve ser considerada como uma interrupção da vigência do Estado de Direito. Tamanha ruvinhosidade autoritária, conquanto agrade a iresponsáveis da imprensa, clama aos céus por uma rápida reparação. E assim sendo, que se juntem os que se julgam responsáveis pela normalidade democrática para encontrar um meio urgente e eficaz de restaurar o Estado de Direito e a segurança jurídica no país.

  2. Se Gilmar Mendes entende que

    Se Gilmar Mendes entende que a matéria deve ser decidida pelo Legislativo, que vote contra, mas vote e não fique enrolando.

    O estranho nesse embroglio é o silêncio ensurdecedor dos demais ministros.

  3. O regimento do STF permite

    O regimento do STF permite que o Presidente, decidindo questão de ordem, ponha o processo em pauta e julgamento, independente de devolução. Basta que um dos autores ou coautores peticione.

    Mas falta coragem!

  4. Isso não se faz, Gilmar.

    Nessa foto o Gilmarzinho esta bem aborrecido. Dura a vida de ministro, Gilmar? Dura a vida mesmo para os de baixo, ministro… Cansados da politica pequena, dos pequenos, dos que pensam apenas em sua grei.

    E quanto ao artigo do Percival Maricato, esta muito bom, o senhor esta incorrendo em varias infrações. Fica ai nessa retorica de que é o Congresso quem deve decidir. Pensa mesmo que ninguém esta vendo sua atuação totalmente politica? Ah, os bonequinhos do STF sendo manipulados. Tira a a ação da gaveta e devolve à corte. Se estivesse num supremo com S maiusculo, ja teria levado uma bela de uma chamada.

  5. É fácil

    Basta os outros Ministros pedirem vista de TODOS os processos que passarem pelas mãos deles e só devolverem quando o Gilmar Mendes devolver esse. Vai travar o STF se o Gilmar não devolver

  6.  
    O STF é a instituição que

     

    O STF é a instituição que padece por manter o maior índice de hipócritas e pusilânimes por metro quadrado. Acredita-se que, dentre todas as demais sinecuras instaladas no País, nenhuma supere o STF nesta “honrosa” posição.

    Não obstante, vossas senhorias, se assim desejarem. …Poderão fazer como Diógenes; acenda sua lamparina, mesmo com o sol à pino, e, adentrem naquela Corte à procura de “um verdadeiro homem.” Quiçá, tenham melhor êxito que o filósofo grego Diógenes de Sinope, também conhecido como Diógenes, o Cínico. Eu, de minha parte, não creio. Mas…

    Orlando

  7. Tinha que criar uma taxa no

    Tinha que criar uma taxa no leite, no arroz, no feijão, na conta de luz, conta de água.

    A Taxa de financiamento de campanhas eleitorais.

    Seria mais transparente e honesto.

    Não sei se vai agradar o povo.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador